O Agravo de Instrumento em Mandado de Segurança


Porwilliammoura- Postado em 16 novembro 2011

Autores: 
MEZZOMO, Marcelo Colombelli

 

O Agravo de Instrumento em Mandado de Segurança

Marcelo Colombelli Mezzomo

Bacharel em Direito


 

 

Sumário:1- introdução. 2- O Mandado de Segurança3- A Auto-Executoriedade e a Legalidade como princípios da Administração e o Mandado de Segurança como ação potencializada contra a Ilegalidade e o Abuso de Poder.4-Liminar em Mandado de Segurança. 5- O Agravo de Instrumento. 6- Do Agravo de Instrumento no Mandado de Segurança. 7- O Efeito Suspensivo. 8- Conclusões. 9- Blibliografia

 

 

 

 

 

1- Introdução

 

O sistema recursal é hoje alvo das atenções da doutrina do processo e constitui o punctun dollens da segunda fase das reformas previstas para o legislação processual civil. Isto se deve à constatação de que o duplo grau de jurisdição, com o sistema de recursos na forma em que está posto, é identificado como um dos grandes entraves à celeridade da tutela jurisdicional. A proficiência de nosso processo em estabelecer formas de impugnaçãoe a atribuição de efeito suspensivo ao recurso tipo da apelação tornam a demanda uma dolorosa via ao litigante que tem razão e prestigia, na mesma medida, o litigante ao qual fenece direito, pois fornece-lhe um meio de tornar o caminho a ser percorrido pelo seu adversário tão árduo e longo que, por vezes, a perspectiva da demanda judicial passa a constituir-se um verdadeiro desestímulo a que os indivíduos busquem seus direitos.

 

Mas dizer que as reformas processuais vindouras, aliás já em gestação, voltar-se-ão prioritariamente aos recursos não significa dizer que até agora nada se tenha feito. Para desmentir a conclusão de que as reformas voltaram-se a outros aspectos temos as leis 9.139/95 e 9.756/98, que propiciaram significativas mudanças no panorama dos recursos cíveis, sempre com o confessado intuito que tornar o procedimento recursal mais célere. Dentre as modificações operadas pelos novos diplomas, que complementam as reformas de 1995, especial realce ganham as referentes ao agravo de instrumento.

 

A sistemática procedimental anterior do agravo de instrumento representava significativo entrave a uma prestação jurisdicional célere e eficaz, porquanto a demorada formação do instrumento em cartório, com peças indicadas pelas partes, sendo o recurso interposto no juízo a quo, muitas vezes era responsável pela inutilização completa do julgamento do recurso pelo orgão ad quem. Cabe ressaltar que, na disciplina do CPC de 1973, o agravo é o recurso cabível das decisões interlocutórias, consoante a letra do artigo 162, § 2º do CPC c/c artigo 522 do mesmo diploma. As decisões referentes a liminares, ou seja às tutela de urgência veiculam-se, via de regra, através de decisões interlocutórias. Daí a gravidade da delonga em apreciar-se o recurso.

 

Com efeito, a tutela de urgência possui a marca do periculum in mora. As delongas representam, quase sempre, tornar inútil apreciação da demanda jurisdicional pelo Estado-Juiz. Para contornar este grave problema, a utilização do mandado de segurança em larga escala foi a saída encontra da pela doutrina, pela jurisprudência e pelos operadores jurídicos. Realmente, o jurisdicionado tem direito a uma prestação jurisdicional célere e efetiva, direito líquido e certo como requero mandamus. Assim sendo, fundamentando-se o direito líquido e certo como sendo o próprio direito pleiteado ou como sendo o direito a uma tutela efetiva,o fato é que o mandado de segurança passou a ser a salvaguarda contra a lentidão do agravo.

 

Uma das interessantes funções que desempenhou, e ainda desempenha, a ação do mandado de segurança foi a de conferir efeito suspensivo ao agravo de instrumento, haja vista o fato de que os casos em que isto era possível, antes da reforma operada pela lei 9.139/95, eram muito restritos. Desta forma, era manejado o recurso de agravo e conjuntamente o mandado de segurança para atribuir, ope judicis, efeito suspensivo à instância recursal desprovida, ex lege, deste efeito.Este expediente foi extremamente reduzido, senão eliminado por todo, com a nova redação do dispositivo doa artigo 558 do CPC, ampliando a possibilidade de concessão do efeito suspensivo não só ao agravo de instrumento, mas também às apelações desprovidas de efeito suspensivo, como verbi gratia os casos do artigo 520 do CPC, de modo a tornar sem interesse a impetração da segurança, desde que presentes certos requisitos que o caput do citado artigo elenca.

 

A discussão a que nos propomos, no entanto, é diametralmente oposta, porque o que buscaremos tratar é exatamente o cabimento do agravo no mandado de segurança. A abordagem é pertinente na medida em que grassa largo dissenso doutrinário e jurisprudencial acerca do cabimento de agravo de instrumento contra decisões proferidas no bojo do mandamus. É o que iremos analisar, não sem antes tratarmos, ainda que perfunctoriamente sobre o mandado de segurança e sobre o recurso de agravo, para depois, de posse de algumas premissas imprescindíveis, efetuarmos o cotejo de ambos os institutos do processo civil brasileiro.

 

 

 

2- O Mandado de Segurança

 

O mandado de segurança, na exata forma como se apresenta em nosso direito, não possui paralelo no direito comparado, podendo-se invocar como instituto mais próximo no direito de tradição romano canônica o "amparo", ação assemelhada que encontra previsão em alguns ordenamentos de países ibero- americanos, sendo exemplo emblemático o México, berço do instituto no século XIX. Nos ordenamentos de origem anglo-saxônica, costuma-se apontar as "injunctions", provimentos mandamentais proferidos a pedido ou ex offício pelo magistrado, como exemplo mais próximo e mesmo como origem do mandado de segurança. Tal afirmação não pode ser aceita ainda que se possa vislumbrar, como se pode, uma certa similitude entre os institutos. Isto ocorre porque a ação constitucional do mandado de segurança tem, em nosso Direito, origem na denominada "Teoria Brasileira do Habeas Corpus", fruto da interpretação larga que deu, o então Ministro do STF, Pedro Lessa ao habeas corpus. Na construção desta doutrina, a negativa de qualquer direito implica sempre uma negativa do próprio direito de liberdade, ensejando a impetração do habeas corpus, ainda que o direito violado não fosse o de ir, vir e ficar.

 

Foi a reforma constitucional de 1926 que introduziu o mandado de segurança em nosso ordenamento constitucional, mas diversos projetos de lei ordinária surgiram no primeiro quartel do século, na tentativa de sistematizar o instituto. O hiato democrático da Constituição de 1937 não contemplou o mandado de segurança, mas a Constituição de 1946 tornou a inserí-lo em seu texto. Quanto à regulamentação procedimental, já que somente as linhas mestras do instituto estavam no texto constitucional, a previsão encontrava-se no Código de processo civil de 1939, posteriormente revogado pela Lei 1.533/51, ainda vigente com diversas modificações, como sejam, as decorrentes das leis2.770/56, 4.166/62, 4.348/64, 5.021/64 e 6.014/73 só para ficarmos com as mais importantes.

 

Atualmente, o mandado de segurança está previsto no artigo 5º da Constituição Federal, inc. LXIX, (individual) e LXX ( coletivo). É a seguinte a dicção do dispositivo do inciso LXIX: " Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o autor da ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuiçõesdo poder público". Já o inciso LXX trás apenas a legitimação especial para o mandado de segurança coletivo, conferindo-a partido político com representação no congresso nacional e a organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamentohá pelo menos um ano. em defesa dos interesses de seus membros ou associados.

 

Como visto, a redação dos dispositivos, em especial do inciso LXIX, contempla uma feição de amplo espectro para o mandado de segurança, o que tem dado margem à discussões acerca da recepção de leis que estabeleciam limitações à abrangência da ação de segurança. Da leitura dos dispositivos, depreende-se de saída duas características capitais do mandado de segurança. A primeira delas diz respeito ao fato que só é cabível mandado de segurança contra agentes público por atos praticados em função do exercício da potestade pública. O segundo refere-se à necessidade de direito líquido e certo. Mas surge a questão: o que é direito líquido e certo? Primeiramente nos atenhamos a determinar o que seja certeza e liqüidez, termos estes presentes também no artigo 586 do CPC. Certeza é relacionada à existência do direito. Liqüidez diz com a extensão do direito subjetivo, da res debendi, ou seja, existe liqüidez sempre que o quantum debeatur seja determinado ou determinável. Mas ao fazermos estas observações não estamos acrescentando senão outras questões: quando o direito se reputará existente ( certo) e determinado quanto à sua extensão ( liqüido) ?

 

Esta matéria concerne à prova, pois a comprovação da certeza e liqüidez só será possível quando arrimada em prova que assim apontem. Não é por outra razão que a doutrina e a jurisprudência construíram uma conceito de certeza e liqüidez, no que diz respeito ao mandado de segurança, baseado na qualidade da prova acostada aos autos. Com efeito, não havendo possibilidade de instrução probatória, devendo o impetrante fazer prova de suas alegações com a inicial, já que não haverá momento algum após para que isto seja feito, certo e liqüido é o direito que se comprova de plano, ou seja, "in casu", documentalmente. Note-se bem, em tese pode haver direito comprovável de plano sem que esta prova seja necessariamente documental, mas na prática isto se torna de feição rara, senão impossível. Restando na prática a prova documental como forma de comprovação de plano do direito, liqüido e certo é o direito que se comprova ab initio por documentos que, a teor do artigo 283 do CPC, devem ser juntados com a inicial. Logo se vê que a construção do título executivo como sendo aquele dotado de presunção de certeza, liquidez e exigibilidade tem um certa relação comacerteza e liqüidez do mandado de segurança na medida emque ambas encartam-se em documentos.

 

Há que salientar que a certeza não possui só um aspecto material de comprovação de fatos. Para que haja certeza acerca de existência do direito subjetivo invocado a ponto de se conceder a segurança, é necessário que seja certa a existência de uma incidência do direito objetivo ao fato considerado. Significa dizer que não basta a comprovação do fato, carecendo comprovar-se que, pela incidência do direito objetivo à hipótese concreta, exsurge, de forma vislumbrável primu ictu oculi, o direito subjetivo. Desta forma, não basta a comprovação do fato. A certeza só existirá quando comprovada a existência mesma do direito subjetivo, através da demonstração do fato e do direito a ele aplicável.

 

Finalizando este tópico, insta acentuar que a locução "autoridade pública ou agente de pessoa jurídica" tem sido interpretada com parcimônia pelos aplicadores da lei e pela doutrina, a ponto se entender-se aplicável a via do mandamus quando se tratar de agentes de pessoas jurídicas privadas no exercício de poderes delegados, como ocorre com os diretores de estabelecimentos de ensino.

 

 

 

3- A Auto-Executoriedade e a Legalidade como princípios da Administração e o Mandado de Segurançacomo ação potencializada contra a Ilegalidade e o Abuso de Poder.

 

A locução " ação potencializada" é muito feliz e se deve a Cassio Scarpinella Bueno. No seu "Liminar em mandado de segurança: Um tema com variações", o autor trabalha muito bem este aspecto, frisandoque o mandamus é uma ação potencializada conta a ilegalidade e o abuso de poder haja vista a auto-executoriedade dos atos administrativos, visão que nem sempre mereceu da doutrina a atenção que merece.

 

Cientes deste aspecto, nos propomos a fazer nesta epígrafe alguns apontamentos acerca dos princípios dos atos administrativos em contraponto ao mandado de segurança. Saltam à primeira vista, como princípios cuja compreensão é fundamental para o entendimento das funções do mandado de segurança na ordem jurídica nacional, os princípios da legalidade, da auto-executoriedade e da presunção de legitimidade dos atos administrativos. É para a preservação da observância destes princípios e contra a sua aplicação imediata, simultaneamente, que existe a ação do mandado de segurança.

 

O principio da legalidade consta do texto constitucional como princípio retor da Administração Pública:"Art.37- A Administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte". Mas independentemente desta expressa consagração do texto da Magna Carta, o princípio sempre encontro acolhida na doutrina pátria.

 

Hely Lopes Meirellesafirma que:" A legalidade, como princípio da administração( CF, art 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e à exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar sob pena de praticar ato inválido e expor-se às responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.A eficácia de toda a atividade administrativa está condicionada ao atendimento da lei .Na Administração pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Públicasó é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa ' pode fazer assim'; para o administrador público significa 'deve fazer assim'(...).Tais poderes ,conferidos à Administração Pública para serem utilizados em benefício da coletividade, não podem ser renunciados ou descumpridos pelo administrador sem ofensa ao bem comum, que é o supremo e único objetivo de toda a ação administrativa"(1)

 

Celso Antônio Bandeira de Mello leciona que: " Este é o princípio capital para a configuração do regime jurídico-administrativo. Justifica-se, pois, que seja tratado - como o será- com alguma extensão e detença. Com efeito, enquanto o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é da essência de qualquer Estado, de qualquer sociedade juridicamente organizada com fins políticos, o da legalidade é especificamente do Estado de Direito, é justamente aquele que o qualifica e lhe dá a identidade própria. Por isso mesmo é o princípio basilar do regime jurídico-administrativo, já que o Direito Administrativo( pelo menos aquilo que como tal se concebe) nasce com o Estado de Direito: é uma conseqüência dele. É o fruto da submissão do estado á lei. É, em suma: a consagração da idéia de que a Administração pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.

 

Para avaliar corretamente o princípio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo cumpre atentar para o fato de que ele é a tradução jurídica de um propósito político: o de submeter os exercentes do poder em concreto - o administrativo- a um quadro normativo que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo- que é o colégio representativo de todas as tendências(inclusive minoritária) do corpo social- garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senãoa concretização desta vontade geral. O princípio da legalidade contrapõe-se portanto, e visceralmente, a quaisquer tendências de exacerbação personalista dos governantes. Opõe-se a todas as formas de poder autoritário, desde o absolutista, contra o qual irrompeu, até as manifestações caudilhescas ou messiânicas típicas dos países subdesenvolvido. O princípio da legalidade é o antídoto natural do poder monocrático ou oligárquico, pois tem como raiza idéia de soberania popular , de exaltação a cidadania. Nesta última consagra a radical subversão do anterior esquema de poder assentado na relação soberano-súdito.(...).Assim, o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração ás leis. Esta deve tão somente obedecê-las, cumpri-las e pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes. Obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no Direito brasileiro"(2)

 

José Cretella Júnior é da opinião que:" Aplicado à Administração o princípio da legalidade expressa a regra segundo a qual A administração neste ponto, não está a regime diferente a que se subordinam os particulares.(...).É o grande princípio que domina a atividade do Estado da submissão à legalidade lato sensu- sentido em que é tomado hoje ,na linha tradicional da antiga formulação do Estado legal ou Estado de Direito."(3)

 

Diogenes Gasparini opina : "Qualquer ação estatal, sem o correspondente calço legal ou que exceda ao âmbito demarcado pela lei, é anti-jurídica e expõe à anulação. Seu campo de ação, como se vê, é bem menor que o particular. De fato, este pode fazer o que a lei autoriza e tudo o que alei não proíbe; aquele só pode fazer o que a lei autoriza e, ainda assim, quando e como autoriza. Vale dizer, se a lei nada dispuser, não pode a Administração Pública agir, salvo situações excepcionais...A esse princípio também se submete o agente público. Com efeito, o agente da administração pública está preso à lei e qualquer desvio de suas imposições pode nulificar o ato e tornar seu autor responsável, conforme o caso, disciplinar, cível e criminalmente"(4).

 

Maria Sylvia Zanella Di Pietro aduz :" Segundo o princípio da legalidade, a administração só pode fazer o que a lei permite....Em decorrência disso, a Administração não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto ela depende de lei"(5).

 

Sendo um dos princípios magnos da Administração Pública, previsto com foros constitucionais, a sua violação é o fundamento do mandado de segurança. Jungido que esta o agente público, por dever do ofício, à observância deste princípio, toda a conduta que desborde dos limites estreitos da lei é passível de corrigenda via ação de mandado de segurança. E esta violação toma a forma do desvio de finalidade(6) do excesso de poder(7). Neste passo, invocável a lição de Di Pietro que, ao manifestar-se acerca dos vícios relativos ao sujeito posiciona-se afirmando: " O excesso de poder ocorre quando o agente público excede os limites de sua competência; por exemplo, quando a autoridade, competente para aplicar pena de suspensão, impõe penalidade mais grave, que não é da sua atribuição; ou quando a autoridade policial se excedeno uso da força para praticar ato de sua competência. Constitui, juntamente com o desvio de poder, que é vício quanto á finalidade, uma das espécies de abuso de poder. Este pode ser definido, em sentido amplo, como o vício do ato administrativo que ocorre quando o agente público exorbitade suas atribuições ( excesso de Poder),ou pratica o ato com finalidade diversa da que decorre implícita ou explicitamente da lei (desvio de poder)(8).

 

A necessária subsunção da atividade da Administração Pública ao primado da lei é decorrência mesma da natureza dos poderes exercidos pelo administrador e pelos agentes públicos em geral. Como lembra Celso Antônio Bandeira de Mello, o agente público, quando se investe da potestade pública, no atuar, na verdade não está exercendo um poder, mas um dever-poder, ou seja, uma função público, entendida da função exatamente como a submissão da atuação a interesses de outrem, no caso, do interesse público(9). Nestes casos reside o alvo da ação de segurança: coibir a prática de atos ilegais ou abusivos, o que é o mesmo, porque todo o ato abusivo é ilegal, sendo superfetação a referência expressa a atos abusivos no dispositivo constitucional.

 

Neste diapasão, o mandado de segurança opera em contrariedade adois princípios do Direito Administrativo, quais sejam o da auto-executoriedade e o da presunção de legitimidade dos atos administrativos. A presunção de legitimidade dos atos administrativos é uma característica que surge por imperiosa ao bom andamento das atividades da Administração Pública. O princípio da continuidade do serviço público(10) impõe que sejam os atos administrativos dotados de uma presunção iuris tantum de legitimidade, que se lhes possibilita pronta efetivação. A bem da verdade, muito provavelmente sem a presunção de legitimidade dos atos administrativos, a administração do serviços públicos, e da máquina pública de um modo generalizado, ficaria impossível. Esta presunção de legitimidade trás ínsita algumas conseqüências importantes. Seu conteúdo ( da presunção) e suas conseqüências, tratou a doutrina de nos aclarar nas vozes de:

 

Hely Lopes Meirelles: “Os atos administrativos, qualquer que seja sua categoria ou espécie, nascem com a presunção de legitimidade, independente da norma legal que a estabeleça. Essa presunção decorredo princípio da legalidadeda Administração, que, nos Estados de Direito, informa toda a atuação governamental...”

 

"A presunção de legitimidade autoriza a imediata execução ou operatividade dos atos administrativos , mesmo que argüídos de vícios ou de defeitos que os levem a invalidade. Enquanto pois não lhes sobreviero pronunciamento de nulidadeos atos administrativos são tidos por válidos e operantes, quer para a Administração, quer para ao particulares sujeitos ou beneficiários de seus efeitos”

 

"Outra conseqüência da presunção de legitimidade é a transferência do ônus da prova da invalidadedo ato administrativo para quem o invoca. Cuide-se de argüição de nulidade do ato, por vício formal ou ideológico, a prova do defeito apontado ficará sempre a cargo do impugnante, e até sua anulação o ato terá plena eficácia”.(11)

 

Maria Sylvia Zanella Di Pietro:“A presunção e legitimidade diz respeito à conformidade do ato com a lei ; em decorrência desse atributo, presumem-se , até prova em contrário, que os atos administrativos foram emitidos com observância da lei”(12).

 

Celso Antônio Bandeira de Mello: “Presunção de legitimidade é a qualidade, que reveste tais atos, de se presumirem verdadeiros e conforme o Direito, até prova em contrário. Isto è: milita em favor deles uma presunção juris tantum de legitimidade; salvo expressa disposição legal, dita presunção só existe até serem questionados em juízo. Esta característica é comum a todos os atos jurídicos em geral”.(13)

 

Cretella Júnior: “ Com efeito, toda a doutrina está de acordo em que ‘ o deslocamento do ônus da prova, relativa a legitimidade ou ilegitimidade do ato administrativo, no sentido de que não é a Administração que é obrigada a demonstrar e legitimidade antes de proceder à execução do ato, mas ao destinatário é que incumbe a legar e provar a ilegitimidade, dando início a um expresso juízo de impugnação”.(14)

 

Diogenes Gasparini: “Presunção de legitimidade: É a qualidade que tem todo e qualquer ato administrativo de ser tido como verdadeiro e conforme o Direito. Milita em seu favor uma presunção iuris tamtum de legitimidade, decorrente do princípio da legalidade”(15).

 

Em regra, a presunção de legitimidade carece, para ver-se infirmada, de uma cognição exauriente, ou seja, fruto de apreciação ampla do material probatório trazido aos autos, repelindo-se juízos de verossimilhança. Daí surge a potencialização da ação de mandado de segurança, porque é possível, em sede de cognição sumária da liminar, afastar aplicação desta presunção, sustando a operatividade do ato administrativo. Ao impedir, em via de cognição exauriente, ao final do processo, através do julgamento de mérito, ou através da liminar, em sede de cognição sumária, a operatividade do ato administrativo, afasta o mandado de segurança a presunção de legitimidade e legalidade do ato sindicado. (16)

 

De roldão, afasta, igualmente, a auto- executoriedadede que alguns atos administrativos são dotados. A auto-executoriedade implica a possibilidade de que alguns atos administrativos tenham imediata execução pela própria Administração, que não necessita valer-se de mais ninguém para pô-los em prática. O privilège dàction d`ofice ouprivilège du préalabe, como chama a doutrina francesa, só existe quando previsto em lei ou quando decorrência da própria natureza do ato, e é afastado através da eficácia do mandamus, seja final ou liminar.

 

Assim que o mandado de segurança desempenhou, em especial antes das reformas processuais, quando então não existia possibilidade de antecipação de efeitos da tutela e aposição de efeito suspensivo ao agravo de instrumento, o papel de ação potencializada contra os atos administrativos, inclusive com liminar antecipando os efeitos da tutela pretendida no bojo da ação.

 

 

 

4- A Liminar em Mandado de Segurança

 

Assunto que nos diz respeito muito de perto nesta nossa abordagem concerne à liminar em mandado de segurança. Como adiante se verá, o principal caso de invocação do agravo em mandado de segurança refere-se exatamente à concessão ou não de liminar. Neste momento, então, teremos oportunidade de qualificar dentro da sistemática do CPC o provimento que determina ou não a concessão da liminar e o recurso a ele cabível, o que é, inclusive, o tema central de nossas preocupações. Por ora, temos de tecer algumas considerações sobre a liminar em mandado de segurança.

 

Antes de mais nada, é preciso que dissequemos a significação do que seja uma liminar. Realmente, não são incomuns as erronias de se dizer liminar somente aquele provimento emanado ab initio no iter procedimental. Mas esta consideração não corresponde à verdade, pois que são possíveis liminares mesmo em fase recursal. Tal posição baseia-se, quiçá, em uma invocação da origem etimológica do termo liminar, que significa ao pórtico, ao início, defluindo daí a conseqüência de que se considere liminar somente o provimento exarado ao pórtico da relação processual. Mas não é está a significação de provimento liminar. Para dilucidarmos o significado de provimento liminar, invocável a lapidar lição de Teori Albino Zavascki ao afirmar que"a liminar consisteem provimento que antecipa providência que, pelo regime processual normal, ocorreria apenas como eficácia da futura sentença que julga definitivamente a causa, ou seja: liminar será o provimento que atende , em caráter provisório, parcial ou integralmente, o que o autor pede como provimento definitivo. Pouco importa, para esse efeito, que a decisão tenha sido proferida initio litis ou não"(17). Como se vê, o critério topográfico não é suficiente para caraterizar o que seja liminar. Por outro lado, o conceito do citado autor carece algumas correções, porque nem sempre a liminar antecipará elementos da tutela que futura sentença visa. Em primeiro grau isto é verdadeiro, mas em segundo grau não. Com efeito, a doutrina tem concebido a antecipação de tutela no âmbito dos recursos, não a antecipação dos efeitos da tutela visada no processo, mas como antecipação da tutela visada no recurso. Neste caso enquadra-se a providência prevista no artigo 558 do CPC, que prevê o efeito suspensivo. A concessão deste efeitos suspensivo representaria a antecipação dos efeitos da tutela pretendida no recurso, e não necessariamente corresponderia à tutela pretendida com o processo.Tem sido defendida até mesmo a invocação do artigo 273 do CPC nestes casos, me especial para aqueles que não admitem uma interpretação larga do dispositivo do artigo 558 para abarcar em seu teor também o efeito suspensivo ativo.Para estes que preconizam que somente está compreendido no artigo 558 o efeito suspensivo, e que nas decisões negativas não haveria o que suspender, no caso de decisões denegatórias, seria possível a concessão da providência denegada em primeiro grau através de uma antecipação da tutela recursal em segundo grau com fulcro no artigo 273, de ampla aplicação.

 

Logo, podemos afirmar que nem sempre a liminar significa a antecipação dos efeitos da tutela objeto principal do processo, podendo representar a antecipação de eficácias processuais de determinadas decisões tomadas no âmbito do procedimento, sem necessária coincidência com a tutela pretendida no processo ( direito material que materializa a res in juditio deducta). Desta forma, podemos compreender a liminar como sendo a antecipação de efeitos de um julgamento, final ou incidente, que se basearia em cognição exauriente e ou ampla, através de um julgamento de cognição sumária. Neste julgamento podem estar incluídas quaisquer matérias, não sendo de mister a presença de elementos do mérito, embora isto usualmente aconteça. Sempre que se apreciarantecipadamente, via julgamento de cognição sumária, matéria que estaria reservada à apreciação ulterior, via cognição exauriente, estaremos diante de uma liminar.

 

Seguindo este escólio, no Tribunal ad quem, poderão ser proferidas duas espécies de antecipação da tutela ( rectius = dos efeitos da tutela)(18), segundo o provimento tenha por objeto efeitos da tutela pretendida no processo ou elementos da tutela recursal. A parte, com base nos artigos 273 ou 461 do CPC, poderá requerer ao relator que antecipe os efeitos da tutela pretendida no processo por só àquele momento se terem implementado os requisitos para tanto. Tal possibilidade exsurge por aplicação analógica do artigo 800 do CPC . Mas também será possível a antecipação dos efeitos da tutela recursal em agravo de instrumento (artigo 558 , caput) ou apelação ( artigo 558, parágrafo único), não significando que estas antecipações sejam antecipações de efeitos pretendidos pela tutela visada no processo como res in juditio deducta, mas sim emsede do recurso, podendo até versar matéria exclusivamente processual, alheia portanto à tutela pretendida no processo(19).

 

No que concerne especificamente ao mandado de segurança, é de se salientar que no sistema processual vigente à época da implantação da lei 1.533/51, não havia mecanismo ordinário capaz de ter eficácia comparável à liminar em mandado de segurança. Necessitando operar o mandamus contra a auto- executoriedade e a presunção de legitimidade dos atos administrativos, era bem de ver que a previsão de liminar era ínsita ao procedimento, de forma a impedir a consolidação de lesão. O célere rito do mandado de segurança, que pode ser incluído dentre os procedimentos sumários documentais, haja vista a impossibilidade de outra prova que não seja a documental, não seria per se suficiente para fazer frente à pronta operatividade dos atos administrativos, que poderia redundar em prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação, tornando o exercício da função jurisdicional a posteriori ineficaz. Era necessária uma medida pronta e eficiente que tomou forma sob a previsão no inciso II do artigo 7º da Lei 1.533/51. Este dispositivo prevê que poderá o magistrado suspender o ato, movel do processo, quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar ineficácia da medida caso seja deferida em sentença. A necessidade de relevante fundamento revela indubitavelmente a necessidade de fumus boni iuris. Esta referência, que está presente nas cautelares e nas antecipações de tutela com outros termos, está relacionada à plausibilidade do direito alegado. Representando as liminares, como antes visto, juízos baseados em verossimilhança resultante de cognição sumária, há que resultar da perfunctória análise do material probatório e do direito invocado a plausibilidade das alegações a conceder razoável possibilidade de êxito após juízo de cognição exauriente. Para que seja atingido este desiderato, dois aspectos são importantes.

 

O primeiro diz respeito à idoneidade dos documentos. Realmente se somente a prova documental é admitida, da maior ou menor idoneidade probatória dos documentos depende a configuração fática trazida à discussão na lide. Em sendo a causa de pedir resultante da fusão de fatos e fundamentos jurídicos, o primeiro elemento, ou seja, os fatos, dependem exclusivamente da aptidão da prova documental a ensejar um juízo de probabilidade onde estejam presentes mais e mais fortes motivos de acolhida do que de rejeição da pretensão invocada. Por outro lado, a relevância da fundamentação também esta relacionada ao teor do direto invocado. Haverá plausibilidade tanto maior quanto maior for a substância dos argumentos trazidos à colação. Demonstrada a existência dos fatos, cumpre ao autor demonstrar onde reside a ilegalidade ou o abuso de poder, demonstrando em que consistiu a ilegalidade ou o abuso de poder. Como, via de regra, a Administração está jungida ao princípio da legalidade estrita, leia-se à letra da lei, é certo que quase sempre haver-se-á de invocar os dispositivos de lei violados, demonstrando-se em que foi equivocada a sua interpretação e aplicação, utilizando-se para tanto dos subsídios da doutrina e da jurisprudência, através da demonstração da pertinência de sua invocação ao caso concreto.

 

A liminar em mandado de segurança também tem como requisito a possibilidade de ineficácia do provimento final, o que significa um fumus boni iuris qualificado, que não visa afastar somente a demora do ordo judiciorum privatorum, inserta no "prejuízo grave e de difícil reparação" do artigo 273 do CPC, mas sim a real possibilidade de um provimento inútil. Em tal hipótese, assemelha-se ao requisito para a concessão da liminar "inaudita altera pars", insculpido no artigo 804 do CPC, pois neste artigo também se condiciona a providência à possibilidade de ineficácia do provimento caso o requerido seja citado. Não basta, portanto, mera possibilidade de prejuízo, carecendo mais do que isto da possibilidade de ineficácia de decisão final.

 

Vale ressaltar que a liminar em mandado de segurança é satisfativa. As liminares podem tomar duas feições diferenciadas conforme seu conteúdo corresponda ou não ao conteúdo da tutela pretendida no bojo do processo no qual são prolatadas. Podem, portanto tomar feição satisfativa ou cautelar, sendo o primeiro caso aquele no qual correspondem à tutela pretendida no processo no qual são inseridas. O segundo caso corresponde à medidas que não possuem conteúdo equivalente à pretensão veiculada no processo. Visam acautelar o resultado útil do processo ou o direito da parte(20) contra a possibilidade de ineficácia do provimento final. Não se confundem as liminares cautelares com as liminares satisfativas, e a existência de uma liminar satisfativa afasta o manejo de liminar cautelar, embora boa parte dos operadores jurídicos continue a veicular as cautelares satisfativas(21) contrariamente à existência de liminar específica para esta espécie de pretensão.

 

As lei 4.348/64 e 5.021/66 trouxeram modificações à liminar em mandado de segurança. A primeira determinou, em seu artigo 1º "b", que a liminar só terá eficácia por noventa dias a partir de sua concessão, prorrogável por mais 30 quando houver, provadamente, o acúmulo de processos a justificar o atraso. Em seu artigo 5º determina que não se concederá liminar em mandado de segurança impetrados visando à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens. O artigo 7º impõe o efeito suspensivo ao recurso voluntário ou ex offício nestes casos, contrariando à regra de que as sentenças concessiva de mandado de segurança só possuem efeito devolutivo(22). A segunda lei, em seu artigo 1º, § 4º, determina que " não se concederá medida liminar para efeitos de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias".A rigor não se há apontar pechas de inconstitucionalidade em restrições à medidas liminares, porquanto a proibição de liminares não afeta necessariamente a prestação da tutela jurisdicional. O que o artigo 5º, inc. XXXV, da CF preconiza é que não se poderá afastar de apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito, garantindo-se, com isto, apreciação pelo poder judiciário da lide. Isto, contudo, não implica garantir-se a tutela liminar sempre, podendo o legislador limitar a antecipação de efeitos da tutela assim como já fez quando a concebeu, fazendo-a carecer de pressupostos. Logo, a limitação de casos nos quais não será cabível a concessão de liminar não afronta, a nosso ver a Constituição. Mas a limitação genérica do prazo de vigência da liminar a qualquer caso como se fez em noventa dias, esta sim é uma afronta à Constituição, porque faz periclitar a prestação jurisdicional por fatores alheios ao impetrante. Não se pode aprioristicamente limitar a duração de liminares, que devem ter seus efeitos estendidos enquanto perdure a necessidade de resguardo da utilidade da prestação jurisdicional.

 

 

 

5- O Agravo de Instrumento

 

O agravo, recurso previsto para as decisões interlocutórias, é outro instituto que não encontra parâmetro exato na legislação comparada, tendo origem no direito luso-brasileiro(23). A sistemática do Código de 1973 simplificou bastante o agravo, eliminando os agravos de petição e nos autos do processo, para manter o agravo de instrumento e criar o agravo retido. A Lei 9.139/95 alterou profundamente o perfil procedimental do agravo de instrumento, determinando sua interposição direta no tribunal ad quem e carreando o ônus da formação do instrumento ao agravante. No regime anterior, a interposição se dava no juízo a quo, cabendo ao agravante a indicação das peças que formariam o instrumento. Este procedimento era considerado o grande vilão da demora do recurso(24) pois o procedimento de extração, concerto e conferência das peças pelo cartório ou secretaria chegava demorar meses, tornando o recurso por vezes inútil.

 

O agravo é o recurso interponível das decisões interlocutórias. Mas que se há de entender por decisão interlocutória? Neste passo, o código de 1973 foi explícito ao caracterizar as decisões interlocutórias, coisa que não acontecia no regime do Código de 1939. O Código Buzaid, tentando simplificar o regime dos recursos, criou um recurso para cada espécie de decisão, trazendo noartigo 162 disposição caracterizadora de cada tipo de provimento. Segundo o próprio Código, três são as espécies de provimento do juiz: despachos, decisões interlocutórias e sentenças. As sentenças são definidas como o provimento que põe fim ao processo, com ou sem julgamento do mérito. Na verdade a sentença não põe fim ao processo, mas apenasencerra o procedimento em primeiro grau de jurisdição, pois que geralmente o provimento decisório que põe fim ao processo é acórdão proferido no tribunal em julgamento de apelação, embargos infringentes, e recurso especial ou extraordinário. Isto se deve ao efeito substitutivo presente nas decisões recursais, já que o pronunciamento do tribunal é um novum judicium e não uma prior reviso instantiae ( art. 512 do CPC). Mas note-se, o fato de encerar-se o procedimento em primeiro grau de jurisdição não significa que o recurso dê início a uma nova relação processual. O procedimento recursal é continuação da relação processual instaurada em primeiro grau; logo, a sentença não representa o fim da relação processual uma vez que instaurado procedimento recursal. Esta, nas circunstâncias apontadas, só ocorrerá com o julgamento do recurso ou recursos. Assim estabelecemos que a interpretação do " põe termo ao processo" deve ser vista cun grano salis .O parágrafo 2º do artigo 162 determina que decisão interlocutória é o ato pelo qual o juiz decide questão incidente. Mas o que é questão? A definição do que seja questão nos é dada pela doutrina de Carnelluti. Para a doutrina de Carnelluti, questão é o ponto de fato ou de direito que se torna controvertido no processo. Mas a definição de decisão baseada neste pressuposto é falha. Nem sempre a decisão pressupõe ponto que se tenha tornado controvertido no sentido estrito da palavra. Sim, porque a controvérsia tem por premissa a alegação e impugnação da matéria por parte dos litigantes. Desde que inocorresse impugnação não haveria controvérsia e, portanto, não estaríamos diante de uma questão, não havendo decisão. Mas o juiz decide ainda assim e exemplo disto está nas decisões acerca da matéria imprecluível do artigo 267, inc. IV,V,VI, por força do § 3º do mesmo artigo.

 

Neste caso, verificamos que, em certos casos, inexiste verdadeira controvérsia. É pensar-se no caso de revelia. Neste aso, não haveria, por certo, controvérsia, mas ainda assim, caberia ao juiz conhecer de diversos temas, proferindo verdadeiras decisões. Cremos nós, portanto, que o ponto nodal para a caracterização do provimento decisório não épresença de questão, nos termos carnelutianos. Há decisão sem controvérsia e portanto sem questão propriamente dita. Mas quando então se pode falar que estamos frente a um provimento decisório interlocutório? Para tanto é preciso que definamos o que seja provimento decisório, matéria esta que tem interligação cm a questão da recorribiliade dos despachos e depois partamos para uma definição de interlocução.

 

Neste passo, abre-se ensanchas para invocação da definição de despacho. A definição de despacho surge como residual em relação à sentenças e interlocutórias. O artigo 504 do CPC determina irrecorríveis os despachos. Surge então a dúvida acerca do cabimento do agravo nestes casos. A definição de decisão representará ponto importante para deslindarmos ambas as questões, ou seja, sobre os despachos e decisões interlocutórias. Teremos que definir o que seja decisão, ou melhor, quando estamos frente a uma decisão. A partir daí teremos a base para definirmos a decisão interlocutória. Partindo da distinção entre decisões e despachos para fim de cabimento do agravo, a doutrina e a jurisprudência costumam afirmar que estamos frente a uma decisão interlocutória quando o provimento é apto a produzir gravame à parte. Não achamos correta esta definição.Gravame pode existir para a parte mesmo naqueles atos tipicamente qualificados como despachos, ou seja, nos quais estaria ausente um conteúdo decisório. Estes atos, defluentes de imposição direta da lei, sem que seja necessário o magistrado apreciar a conjuntura fático-jurídica, podem gerar prejuízos. A citação, típico caso de despacho, é decorrência da decisão de recebimento da inicial. Uma vez recebida a inicial, descabe ao magistrado perquirir se haverá ou não citação, porque ela é um ato automático decorrente da propositura da ação. Embora esteja ausente conteúdo decisório nesta determinação, é certo que a citação causa gravame à parte, bastando como exemplo a interrupção da prescrição. Não há decisão, mas há gravame. Mas se a definição de decisão não perpassa pelo gravame, onde estará então o punctun dollens? A nosso ver, decisão existirá sempre que o conteúdo do provimento resultar da apreciação pelo magistrado dos elementos de fato e de direito, de modo que ele tenha de pronunciar-se acerca da incidência do direito ao fato. Ao revés, quando o conteúdo do provimento for decorrência direta e imediata da existência de um fato anterior, estaremos diante de um despacho, porque o conteúdo do provimento não carecerá de análise do fato e do direito(25).

 

Definido o que seja decisão como sendo o provimento onde o juiz determina o seu conteúdo através da aplicação do direito a uma espécie fática, decisões interlocutórias são aquelas que surgem por exclusão do que sejam sentenças. Desde que exista uma decisão e elanão ponha termo ao processo ( rectius= ao primeiro grau de jurisdição) estamos diante de uma interlocutória. Já se estamos diante de um provimento cujo conteúdo é automático, ou seja, defluência da lei, estamos diante de um despacho, irrecorrível a teor do artigo 504 do CPC. Para as interlocuções, salvante previsão expressa em contrário, cabível é o agravo, de instrumento, retido ou nos próprios autos no caso dos agravos internos ou regimentais.

 

Com a nova sistemática, a definição do procedimento, se de instrumento ou retido, fica ao líbito da parte. Mas há restrição no § 4º do artigo 523 determinando que serão sempre retidos os agravos posteriores à prolação da sentença, salvo no caso de inadmissão do recurso. Mas este dispositivo carece ser aplicado com temperamentos, pois há caso vislumbrável que não se enquadra na exceção e que enseja agravo de instrumento, qual seja, o caso de ser recebida a apelação nos efeitos errados, correspondendo ao recebimento somente no efeito devolutivo quando era ocaso de efeito suspensivo, ou de efeito suspensivo quando não era o caso (art. 520 do CPC). Nestes casos, o manejo do agravo retido, como preconiza o artigo 523, § 4º, pode trazer grave prejuízo para a parte que necessita da agregação ou retirada de um efeito imediatamente, e que se tiver que esperar pelo conhecimento do recurso no órgão ad quem, sofrerá os prejuízos da demora. Da mesma forma, podem ocorrer casos de falta de interesse na interposição de agravo retido como pode ocorrer no caso de agravo manejado contra decisão denegatória ou concessiva de antecipação de tutela em sentença, que requer pronta apreciação.

 

Vale lembrar que as modificações introduzidas pela Lei 9.756/98 permitem que o relator julgue o mérito do recurso invocando a posição do próprio tribunal ou de tribunal superior. Para a denegação poderá invocar a jurisprudência do próprio tribunal ou dos tribunais superiores. Para dar provimento ao recurso ( Art. 557 do CPC) deverá invocar a posição de tribunais superiores.As medidas introduzidas pelas reformas tornaram o agravo um recurso que possui a possibilidade de rápido julgamento(26), ponto este que é de suma importância para a compreensão do cabimento do agravo no mandado de segurança.

 

 

 

6- Do Agravo de Instrumento no Mandado de Segurança.

 

Grassa, como noticiado ao início de nossa abordagem, controvérsia no que diz respeito ao cabimento do agravo para a impugnação da interlocutórias proferidas em sede de mandado de segurança. Existem três correntes de posicionamento. Uma primeira preconiza que o ato de concessão ou denegação de limiar, que é o ato que mais nos interessa, é providência administrativa do magistrado, sendo irrecorrível(27). Tal posição defende existir discricionariedadena concessão ou não da liminar. Data venia não pode ser admitida a existência de discricionariedade na tratativa da liminar. A discricionariedade é instituto pertencente à teoria Geral do Direito, porque tem aplicação em vários campos do Direito. Não podemos admitir que exista uma discricionariedade administrativa e outra judicial, assim como não podemos admitir uma prescrição administrativa, uma judicial e dentro desta última uma penal, uma cível e uma tributária, pois utilização de termos com diferente significado em diversas áreas só contribui para a balbúrdia terminológica e conceitual(28) .

 

A discricionariedade surge pela possibilidade de, através de um juízo de conveniência e oportunidade, escolher-se dentre duas ou mais soluções igualmente lícitas e com grau máximo de eficácia, aquela que, frente ao caso concreto, por escolha pessoal, reputamos a melhor solução. Partindo deste pressuposto, inexiste discricionariedade quando falamos na apreciação de pedidos liminares, ao menos quanto à sua concessão ou denegação, podendo-se alvitrar a presença de uma certa discricionariedade somente quanto à escolha da espécie de medidas a serem aplicadas no caso v.g do artigo 461, § 5, do CPC (29). O que existem nestes casos são conceitos abertos ou tipos abertos que pressupõe uma interpretação do fato para aplicação do direito de forma mais ou menos plástica. Estes conceitos vagos, geralmente utilizados nos dispositivos referentes à liminares, não caracterizam discricionariedade na media em que permitem uma avaliação objetiva. Logo, está descartada a consideração de que a discricionariedade possa ser invocada para defesa de uma irrecorribilidade das decisões concessivas ou denegatórias de liminar em mandado de segurança. Tampouco se trata de provimento administrativo, muito pelo contrário; representa, outrossim resposta à postulação da parte em exercício de atividade jurisdicional(30).

 

Uma segunda posição admite a recorribilidade das decisões interlocutórias proferidas em mandado de segurança, em especial da que trata da liminar, mas somente através dos meios de impugnação previstos na lex especialis. Neste caso não haveria preclusão da matéria alvo da interlocutória, e no caso da entidade pública, restaria o pedido de suspensão previsto no artigo 4º da Lei 4.348/64. Quanto ao agravo, dentre as opiniões pelo seu descabimento, avultam nomes como Hely Lopes Meirelles que assevera: "A lei regedora do mandado de segurança (Lei 1.533) especificou os três casos de apelação (art. 8º, parágrafo único, e art. 12), mas não excluiu a possibilidade genérica de agravo de instrumento previsto no art. 522 do Código de Processo Civil, aplicável na tramitação da segurança em tudo aquilo que não conflitar com as prescrições de sua lei especial, nem contrariar a índole do mandamus. Ora, o agravo de instrumento típico e a sua modalidade retida não conflitam com a norma específica do mandado de segurança, nem contrariam a sua índole de remédio heróico, célere na sua tramitação, pois que esses recursos, não tendo qualquer efeito suspensivo, não impedem o caminhamento da impetração, nem obstaculam o seu julgamento de mérito; apenas asseguram regularidadeem seu processamento. Daí o seu cabimento, como medida de resguardo procedimental da segurança"(31).

 

Mas o administrativista não está só. Também o idealizador do atual CPC comunga da mesma opinião como se nota ao afirma que: "Não estava certamente na intenção a lei prodigalizar recursos no mandado de segurança. As decisões interlocutórias, não impugnáveis por meio do recurso adequado previsto em lei, não operam preclusão e, portanto podem ser examinadas quando os autos subirem ao tribunal de apelação da parte vencida. Não se compadece com a índole do mandado de segurança o agravo de instrumento de decisão interlocutória"(32).

Os principais argumentos invocados para afastar o cabimento do agravo no mandado de segurança residem na morosidade do recurso e na especialidade da lei 1.533/51. Venia concessa, em que pese o destaque dos defensores desta posição, perfilhamo-nos com a corrente que propugna o cabimento do agravo de instrumento no mandado de segurança. Primeiramente, carece ser feita uma interpretação histórica dos institutos. Com efeito, se nos parece que a não previsão do recurso de agravo no âmbito da ação de segurança se deve ao fato de que na época de produção deste diploma legislativo ( referimo-nos à lei 1.533/51) o regime do agravo era de fato incompatível com a celeridadeque a apreciação da questão referente à liminar requeria. Daí, a nosso juízo, a previsão do pedido de suspensão do artigo 4º da lei 4.348/64. Mas uma vez modificada a legislação, agora já sob a vigência do CPC de 1973, através da lei 9.139/95, imprimindo-se celeridade ao procedimento do agravo, inexiste razão para a vedação. Destarte, a possibilidade de pedido de efeito suspensivo ( decisão concessiva) ou mesmo de efeito suspensivo ativo ( decisão denegatória), a ser apreciado pelo relator, torna o agravo de instrumento via adequada à veiculação da pretensão do prejudicado. Inexistindo a razão prática denão aplicação do recurso de agravo ao mandado de segurança, não vemos, sob este ponto de vista, outro qualquer empecilho à plena aplicação do recurso.

 

Obtemperar-se-á que, ainda assim, restaria o óbice do fato de não ter previsto a legislação especial a aplicação supletiva do CPC ao mandado de segurança(33). Este é um argumento frágil. O fato dealei do mandado de segurança não ter expressamente contemplado a aplicação de outros institutos do CPC não impede sua aplicação. Fôssemos dar larga aplicação aos artigos 19 e 20, de modo a afastar a aplicação subsidiária do CPC ao mandado de segurança, podemos afirmar que o seu procedimento ficaria impraticável(34). Deveras, se é a aplicação dos dois dispositivos que afasta a possibilidade de agravo em mandado de segurança, também deveria afastar toda a disciplina do CPC, pois "ubi eaden ratio legis, ub eaden legis dispositio". Mas se isto fosse feito, restaria impossível levar adiante o processamento do mandamus, porquanto as matérias regulamentadas pelo CPC são imprescindíveis(35). Ora, o processo do mandado de segurança é um processo como qualquer outro processo de conhecimento. Logo, tem carência de estipulação de disciplina para toda uma série de atos sem os quais o processo deixa de ser "processo"( caminhada). Seria rematado disparate ter que cada lei especial fazer menção expressa a toda a espécie de suporteprocedimentais de atos processuais no que não mais faria do que repetir, mutatis mutandis, a disciplina do Código de Processo Civil. Daí que os códigos serão sempre supletivos da legislação especial. Logo, se a disciplina do código é utilizada para suprir a ausência de previsão na lei especial de diversos atos, não há razão para afastar o agravo. Concluímos que, prevista ou não a supletividade do CPC, é ela uma decorrência natural, lógica e inafastável.

Mas poderia ser dito contra a aplicação do agravo de instrumento que existe o pedido de suspensão da liminar pela entidade pública interessada. A argumentação partiria do pressupostos de que a existência de um mecanismo em lei especial impede a invocação de instituto codificado para a mesma finalidade. Afaste-se de saída esta argumentação, obrando em erro os seus defensores quando olvidam que os pressupostos da recorribilidade e do pedido de suspensão são diferentes. O texto do artigo 4º da lei 4.348/64 determina viável o pedido de suspensão desde que haja pedido da parte interessada e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Como se vê, motivos relacionados à formalidade do ato, ou seja, à nulidades processuais não entram em jogo. Mas está espécie de vício pode estar presente na decisão concessiva da liminar. Neste caso poderia não haver perigo à ordem, segurança, saúde ou economia publica e ainda assim ser totalmente descabida a concessão da liminar por contrariar o direito vigente. Desta forma, restaria ampliarmos a amplitude da norma em apreço para admitir o pedido de suspensão, mesmo que ausente o risco referido, ou ao revés, admitir a impetração de mandado de segurança contra a decisão. Sim, porque incontrastável não poderia ficar a decisão, pena de violação do artigo 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal.

Esta solução não nos parece a melhor, pois o que a reforma processual visou evitar foi exatamente a impetração de um novo mandado de segurança. Se existe hoje um instrumento capaz de corrigir "errores in procedendo", instrumento ordinário ( agravo), para que valermo-nos de um expediente anômalo?. Ademais, há que se notar que o pedido seria remédio para a hipótese de concessão da medida, não havendo disposição similar para a denegação. Outra alternativa não restaria à parte que necessita de medida urgente senão ingressar com cautelar(36) ou , o que é mais provável, com outro mandado de segurança.

Somos, portanto, levados a concordar com Cassio Scarpinella Bueno que vê no pedido de suspensão um "plus" em relação ao agravo, quer dizer, a Administração pode se valer de um ou de outro, desde que presentes os pressupostos. Não se há falar em violação aoprincípio da unirrecorribilidade, porque, in casu, não se trata de dois recursos, já que o pedido de suspensão não é recurso. Mesmo porque as espécies recursais tem previsão expressa, não se podendo vislumbrar no caso do pedido de suspensão um recurso, não carecendo ele de preparo, nem estando sujeito a prazo. Assim sendo, vislumbra-se no pedido de suspensão, não uma decisão que substitui a decisão proferida no juízo a quo,como ocorre quando do julgamento de recurso que pede a revogação de uma decisão, mas sim uma decisão que é com aquela incompatível e que por isto implica a obtenção de efeitos idênticos a uma reforma daquele decisum concessivo da liminar, no caso do mandado de segurança, a retomada da plena eficácia do ato inquinado de nulo. Desta forma, não se pode falar em uma cassação da decisão a quo na exata acepção do vocábulo, que representa a retirada do mundo jurídico de uma decisão eivada de nulidade ( error in procedendo).

Faculta-se, por conseguinte, à Administração o manejo tanto do pedido de suspensão como do agravo, cumprindo trazer à lume o fato de que não há, no pedido de suspensão, uma censura de igual teor a que se opera no agravo, isto porque poderá ocorrer de termos uma decisão formalmente hígida e conforme os ditames legais no que concerne aos pressupostos de concessão relativos ao mérito, e mesmo assim ser o caso de suspensão da liminar. Tal situação, aparentemente paradoxal, resulta do fato de que no pedido de suspensão é a presença de interesses maiores que impõe a supressão da eficácia da liminar. Note-se bem, ambos os direitos em confronto encontram igual respaldo frente ao Direito, não se vislumbrando, a priori, nenhuma irregularidade formal na concessão da liminar e estando presentes os requisitos para tanto. No entanto, a presença da possibilidade de lesão a interesses coletivos impõe que a eficácia do ato administrativo seja reposta. Não há, aqui, como corre na antecipação de tutela ou na medida cautelar liminar, elementos que façam presumir que um dos direitos tem maior embasamento e possibilidade de ser efetivamente existente, há sim é um confronto de direitos em pé de igualdade no que diz respeito a sua existência, optando-se por um deles por motivos políticos.

Claro que não podemos, por outro lado, permitir a dualidade de instrumentos sucessivos de impugnação tendo por fundamento a mesma fundamentação, o que diga-se "en passant", representaria ofensa à coisa julgada, que ocorreria quando, tendo sido veiculada a matéria concernente à existência de lesão à ordem, saúde, economia e segurança como fundamento de pedido de efeito suspensivo do artigo 558 do CPC, se viesse novamente com a mesma argumentação e pedido em sede de pedido de suspensão. Verifica-se, à luz desta constatação, que a concomitância só poderá existir, entre agravo e pedido de suspensão, quando na via do agravo se veicular pretensão arrimada v.g. em nulidade procedimental, e no pedido de suspensão os fundamentos que lhe são próprios. Assim não haveria identidadede fundamentos.

Na jurisprudência encontramos julgados propendendo para ambos os lados, mas é sem dúvida maior o número de julgados que ainda se reportam a uma impossibilidade de manejo do agravo de instrumento no mandado de segurança. Pelo não cabimento citam-se arestos do TJRS: "Agravo de instrumento. Recurso interposto de decisão proferida em ação de mandado de segurança. Os recursos da ação mandamental (lei n 1.533/51) são os previstos nos arts. 8 e 12 e, neles não ha previsão de recurso contra ato que defere ou indefere pedido liminar, em primeiro ou segundo grau de jurisdição. Recurso não conhecido". (4fls) (Agi nº 70000852889, Segunda Câmara Cível, TJRS, relator: des. Teresinha de Oliveira Silva, julgado em 04/10/2000).

 

Esposando a mesma posição: "Agravo Interno. Processual Civil. Agravo de instrumento. Mandado de segurança. Indeferimento de liminar. Inadmissibilidade. Não cabe agravo de instrumento contra decisão que indefere liminar em mandado de segurança. Ausência de previsão legal. Agravo interno com base no artigo 557, par. único do CPC, da decisão que nega seguimento ao agravo de instrumento. pelas razões, impõe-se seu não-provimento. Recurso não provido". (04 fls). (Ait nº 70001326388, Primeira Câmara Especial Cível, TJRS, relator: des. Alzir Felippe Schmitz, julgado em 16/08/2000).

 

Por outro lado, embora mais raros, coligem-se julgados em sentido contrário e consoantes à posição aqui defendida, como v.g: "Agravo de instrumento em mandado de segurançaa. Cabimento. Direito Previdenciário. Filha solteira maior de 21 anos. Dependência. Presença dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, autorizadores da concessão da liminar para fins de restabelecimento da pensão. Regra de transitoriedade a garantir as filhas menores o direito de conservarem a condição de dependentes, mesmo com o implemento da maioridade, desde que, à época da edição da lei, figurassem como tal junto ao instituto. Presentes os requisitos para a concessão da liminar, a fim de ser restabelecido o pagamento da pensão. Preliminar de não conhecimento rejeitada. agravo conhecido e provido". (06 fls). (Agi nº 70001349315, Primeira Câmara Cível, TJRS, relator: des. Henrique Osvaldo Poeta Roenick, julgado em 13/09/2000)

 

Da mesa forma:"Tributário. Agravo de Instrumento. Cabimento do agravo contra decisão que nega liminar em mandado de segurança. Negativa de autorização de impressão de documentos fiscais. É agravável a decisão que nega liminar em mandado de segurança. precedentes do STJ. Negativa pura e simples de autorização de impressão de documentos fiscais, inclusive de forma verbal, sem que tivessem sido exigidas garantias dos alegados débitos (CTN, art-183; lei/RS n. 8.820/89, art-40, na redação da lei n. 10.908/96). Não ha notícia de que os débitos alegados estejam com exigibilidade suspensa (CTN, art-151) e nem de que tenha o Estado tomado alguma atitude no sentido de ajuizar eventual execução objetivando penhora para segurança do juízo. Nem a notícia de possível medida cautelar fiscal e nem de que o contribuinte tenha praticado algum ilícito. A exigência que, no caso, configura coação para o pagamento de tributo. Agravo provido". (fls.06) (Agi nº 70000024869, Primeira Câmara de Férias Cível, TJRS, relator: des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, julgado em 16/11/1999)(37).

 

Também no STJ a tese encontra acolhida, sendodaquele Egrégio Tribunal os procedentes utilizados pelos tribunais de segundo grau para arrimar a tese do cabimento do agravo de instrumento em mandado de segurança como se observa do seguinte julgado: "Processual civil. Agravo de instrumento. Efeito suspensivo. Mandado de segurança. Decisão que defere pedido de liminar. Cabimento. Artigos 520 e 558, do Código de Processo Civil. - A decisão que concede ou nega liminar em sede de mandado de segurança é de natureza interlocutória, passível de ataque por meio de agravo de instrumento.- precedentes deste Superior Tribunal de Justiça.- o artigo 558, do códigode processo civil, com a nova redação que lhe foi conferida pela lei nº 9.139/95, confere ao relator de agravo de instrumento competência para suspender a execução da decisão agravada, desde que susceptível de causar lesão grave e de difícil reparação". (Resp.184984/GO. DJ.data:18/06/2001. pg:00200 min. Vicente Leal (1103) 01/12/1998).

 

A conclusão desta epígrafe nos conduz a admitir o agravo de instrumento no mandado de segurança, embasados para tanto na necessidade de existência de contraste da decisão concessiva ou denegatória da liminar, havendo para este fim o agravo de instrumento que, com a nova feição que lhe deu a lei 9.139/95, pode se constituir em mecanismo hábil para veicular pretensões com fundamentos antes não aptos a serem trazidos à colação no pedido de suspensão da liminar(38).

 

7- O Efeito Suspensivo.

Cabe agora, estabelecido o cabimento do agravoemmandado de segurança, analisarmos o cabimento do efeito suspensivo no bojo do agravo. Na redação anterior à lei 9.139/95, cabível era o efeito suspensivo somente em algumas hipóteses elencadas em numerus clausus no dispositivo do artigo 558 do CPC. Esta impossibilidade de pedido de efeitos suspensivo fora dos casos ali expressamente referidos, deu margem a que, durante muito tempo, se valesse o jurisdicionado do mandado de segurança para obtenção de efeito suspensivo em recurso dele desprovido. Esta situação anômala era extremamente prejudicial a uma boa prestação jurisdicional porquanto implicava a duplicação de lides, ampliando a duração e os custos do processo, além de representar uma deturpação da finalidade do mandado de segurança.

A reforma processual levada a efeito pela lei 9.139/95 ampliou as hipótese de cabimento do efeito suspensivo que, desde que presentes uma relevante fundamentação e perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, pode ser concedida em recursos de agravo e apelação em quaisquer espécies de processos. Mas a dicção do dispositivo fala em suspender os efeitos da decisão. Rigorosamente não haveria o que se suspender em caso de decisão denegatória, de tal modo que continuaria o mandado de segurança aparecendo como "via electa" paraa corrigenda da ausência de possibilidade obtenção, em segundo grau, de providência equivalente à liminar denegada.

Em vista deste quadro, a doutrina, interpretando o dispositivo, criou o chamado efeito suspensivo ativo(39), ou efeito suspensivo dos efeitos denegatórios da decisão(40). Através de uma interpretação ampla dos disposto no artigo 558 do CPC, que preconiza: "Art. 558- O Relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, adjudicação, remissão de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamentodefinitivo da turma ou câmara ", a decisão denegatória pode ter seus efeitos suspensos, implicando que o relator conceda a medida denegada.

Assim aplicado, o artigo possibilita dois efeitos diametralmente opostos quando admitido o agravo em sede de mandado de segurança. O primeiro deles é o que ocorre na decisão concessiva. Manejado agravo contra esta decisão e requerido o efeito suspensivo, o relator poderá sustar os efeitos da decisão recorrida, aqui verdadeiramente reformando ou cassando a liminar, ao contrário do que ocorre no pedido de suspensão, onde não há uma reforma ou cassação, porque não é o acerto ou legalidade da medida concessiva que está em apreciação no pedido de suspensão, podendo estas circunstâncias funcionarem, quanto muito, como elementos enquadráveis na relevante fundamentação, hipótese que não constitui a finalidade do pedido a reforma ou cassação. Como antes visto, poderão ser invocados argumentos de ordem formal ou meritória da decisão concessiva da liminar do mandado de segurança para ensejar substanciação do mérito do agravo.

De outra banda, se denegatória a decisão referente à liminar, poderá ser requerido o efeito suspensivo ativo, de modo que, sustando-se os efeitos da decisão denegatória, tenhamos a concessão da medida pleiteada e denegada em primeiro grau. Por se tratar de agravo, as considerações do parágrafo anterior também se aplicam no que tange aos juízos reformatórios ou cassatórios e da matéria veiculável na impugnação. Tal expediente afasta, como confessadamente quis a reforma processual, o uso do mandado de segurança com fim anômalo, representando grande vantagem por valer-se de um mecanismo ordinário.

 

8- Conclusões

Indubitavelmente a demora na prestação jurisdicional é um dos grandes problemas enfrentados pelo Direito Moderno. As grandes mudanças que se operaram nas últimas décadas, criando uma"sociedade de massas", com reconhecimento de novos direitos de cunho coletivo, subvertendo os esquemas ortodoxos, produzidos sob a égide do privatismo, e criaram novas demandas jurisdicionais. Por outro lado, se acresce, como mecanismo de pressão neste quadro, o fato de que o Estado Social de Direito tem por princípio a efetividade dos direitos e, por conseguinte, o princípio da efetividade da tutela jurisdicional ( Art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal de 1988)ganha especial força e realce. Se existe a necessidade de o cidadão valer-se de meios lícitos para a solução dos conflitos, vedando-se o uso da força própria, salvo raras exceções em que não se pode aguardar o meios oficiais de tutela, e sendo este meio preponderantemente a hetero-composição jurisdicional, é certo que o Estado tem que colocar à disposição dos jurisdicionados uma tutela efetiva, capaz de, transcendendo a uma mera afirmação formal do direito, ter eficácia concreta, material, possibilitando uma concretização fática do direito afirmado.

O procedimento ordinário de cognição exaurinete e plenária demonstra-se cada vez mais inapto a propiciar, diante deste mutante quadro social, econômico e cultural que vivemos, uma tutela célere e ao mesmo tempo segura. Aliás, aqui reside o grande embate do processo moderno: celeridade ou segurança jurídica, qual o valor a preponderar? O primeiro deles tem ganho um grande espaço com a introdução de mecanismos como os artigo 273, 461 e 558 do CPC. E agora as atenções voltam-se para o recurso, questionando- se, na esteira de um questionamento do dogma da certeza jurídica, o próprio dogma do duplo grau de jurisdição. A prodigalidade do sistema recursal do nosso processo civil tem sido apontada como um dos grandes entraves à celeridade da prestação jurisdicional. Por isso que vieram as reformas, e cumpre-nos investigar a ampliação dos seus horizontes de aplicação exatamente para que as novas conquistas da visão instrumentalista sejam conduzidas a todos os campos do processo. Assim nos propusemos a tratar do agravo de instrumento em mandado de segurança.

Três correntes jurisprudenciais e doutrinárias podemser identificadas quanto ao cabimento do agravo em mandado de segurança, indo-se desde a vedação completa de recorribilidade das decisões, e neste caso a apreciação da decisão acerca da medida liminar seria discricionária, passando pela admissibilidade somente do sistema de impugnações da lei especial, e por fim a corrente, com a qual nos filiamos, que profliga a ampla aplicação do agravo de instrumento na ação de segurança.

Os diversos óbices que podem ser apontados para impedir a possibilidade do agravo na ação constitucional, data venia, não resistem diante de uma análise mais profunda do atual momento do processo civilbrasileiro.Primeiramente, resta induvidoso que, na apreciação dos conceitos abertos ou vagos relacionados aos requisitos de concessão dos provimentos liminares, não se pode vislumbrar discricionariedade quanto à sua concessão ou não. Se existe discricionariedade é quanto à escolha das medidas quando prevista esta possibilidade em lei. Há, portanto, um provimento de conteúdo decisório, e por isto, e não por causar gravame, o que diz com o interesse recursal, recorrível, no caso por agravo de instrumentoou retido.

A morosidade do agravo, antes invocada como motivo de incompatibilidade do instituto com o célere rito da ação mandamental, hoje não mais representa obstáculo, eis que a reforma empreendida pela Lei 9.139/95 tornou o agravo um instrumento eficaz para a pronta impugnação de decisões interlocutórias proferidas no bojo de qualquer ação, em especial as decisões concessivas ou denegatórias de liminares, dada a gravidade de que se revestem. Mas não é só a formação do instrumento pelo próprio agravante e a interposição direta no Tribunal ad quem que recomendam a utilização do agravo. Soma-se a este aspecto a possibilidade de concessão do efeito suspensivo ou suspensivo ativo.

A concessão pelo relator do recurso, ab initio do trâmite recursal, de efeito suspensivo tanto se presta à impugnação de decisões concessivas como denegatórias. No primeiro caso, o efeito atrelado pelo relator poderá fazer as vezes, na prática, do pedido de suspensão previsto no artigo 4º da Lei 4.348/ 64. Nocaso de uma decisão denegatória, o efeito suspensivo concedido ao agravo em sede recursal implicará a concessão da medida denegada em primeiro grau de jurisdição. Evita-se, com este procedimento, a utilização de outro mandado de segurança, em anômala função repelida pela reforma processual, visando a conferir efeito suspensivo a recurso dele desprovido ou à concessão da liminar denegada.

O argumento de que a lei especial afasta a aplicação subsidiária do CPC não calha acolhida, porquanto inúmeras são as disposições codificadas invocadas e aplicadas no procedimento do mandamus inobstante a não existência de uma remissão expressa ao CPC, e mesmo, segundo alguns, contra a previsão expressa de não aplicação suplementar do CPC. A não utilização da disciplina codificada tornaria o processamento da ação de segurança impraticável. Se a aplicação dos artigos 19 e 20 da lei 1.533/51 é invocada apara afastar a aplicação da sistemática recursal do CPC, também deveria ser invocável para afastar a aplicação supletiva do CPC em matérias como atos processuais, pressupostos processuais, condições da ação dentre outros. Ora se aplicam-se alguns, muitos dispositivos supletivamente, e se não foi estabelecida nenhuma distinção legal porque se haveria de afastar o cabimento do agravo de instrumento?. "Quod legis non distingit, nec nos distinguire debemus".

Desta forma, diante dos argumentos expostos, concluímos que é perfeitamente aplicável a recorribilidade de decisões interlocutórias por agravo de instrumento no mandado de segurança. medida que está consentânea ao processo instrumentalista do Estado Social e vai ao encontro do compromisso de efetividade da tutela jurisdicional.

 

 

9-Bibliografia

 

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Jurisdição, ação e processo à luz da processualística moderna. Todos na página do curso de direito da UFSM na internet: www.ufsm.br/direito.

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·ZAVASCKI, Teori Albino, Antecipação da Tutela, saraiva, 1997.

 

 

 

Notas de fim

 

1.Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 22ª ed., 1997, p. 82.

2.Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 12º ed., 1999, p. 71-72

3.José Cretella Júnior.Tratado de Direito Administrativo, Forense, 1º ed., 1972, t. X, p. 37 e 38

4.Diogenes Gasparini.Direito Administrativo, Saraiva, 3º ed., 1993, p. 6.

5.Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito Administrativo, Atlas, 10ed., 1999, p. 61

6.Segundo Hely Lopes Meirelles, estas duas formas são gêneros da espécie abuso de poder. Segundo o autor:" O desvio de finalidade ou de poder verifica-se quando a autoridade, embora atuando nos limites de sua competência, pratica o ato por motivosou com fins diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse público. O desvio de finalidade ou de poder é, assim, a violação ideológica da lei, ou por outras palavras, a violação moral da lei, colimando o administrador público fins não queridos pelo legislador, ou utilizando motivos e mios imorais para a práticade um ato administrativo aparentemente legal"( Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 17ª ed. 1992, p. 96)

7.Quanto ao excesso de poder, Meirelles leciona:"O excesso de poder ocorre quando a autoridade, embora competente para praticar o ato, vai além do permitido e exorbita no uso de suas faculdades administrativas. Excede, portanto, a sua competência legal, e, com isso, invalida o ato, porque ninguémpode agir em nome da Administração fora do que a lei lhe permite. O excesso de poder torna o ato arbitrário, ilícito e nulo. É uma forma de abuso de poder que retiraa legitimidade da conduta do administrador público, colocando-o na ilegalidade e até mesmo no crime de abuso de autoridade quando incide nas previsões penais da Lei 4.898, de 9.12.65, que visa melhor preservar as liberdades individuais já asseguradas na Constituição ( art. 5º)" ( Op. et loc cit).

8.Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito Administrativo, Atlas, 13ª ed. , 2001, p. 221.

9.Diz o autor que: "Éque a Administração exerce função: a função administrativa. Existe função quando alguém esta investido no deverde satisfazer certas finalidades em prol do interessede outrem, necessitando,para tanto, manejar os poderes requeridos para suprí-las. Logo, tais poderes são instrumentais ao alcancedas sobreditas finalidades. Sem eles, o sujeito investidona função não teria como desincumbir-se do dever posto a seu cargo. Donde, quem os titulariza maneja, na verdade, ' deveres-poderes', no interesse alheio"( Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 13ª ed., 2000, p. 32.)

10.Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito Administrativo, Atlas, 13ª ed. , 2001, p.74. Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 13º ed., 2001, p. 41 afirma: " O princípio da continuidadedo serviço público é um subprincípio, ou, se se quiser, princípio derivado, que decorre da obrigatoriedade do desempenho da atividade administrativa. Estaúltima, na conformidade do que se vemexpondo, é, por sua vez, oriunda do principio fundamental da 'indisponibilidade, para a administração, dos interesses públicos', noção que bem se aclara ao se ter presente o significado fundamental já exposto da 'relação de Administração' ".

11.Hely Lopes Meirelles; Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros Editores, 22 ed., 1997, p. 141.

12.Maria Sylvia Zanella Di Pietro; Direito Administrativo, Atlas, 10º ed., 1999, p. 164.

13.Celso Antônio Bandeira de Mello; Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 12º ed., 1999, p. 358-359.

14.Cretella Júnior; Tratado de Direito Administrativo, Forense, 1 ed., 1972, v. X, p. 120. “ Sob a forma de proposição do princípio da verdade e legitimidade dos atos administrativos pode ser expressa do seguinte modo:‘ Os atos administrativos trazem em si a presunção de veracidade e da legitimidade, sendo, pois verdadeiros até prova em contrário, cabendo o ônus da prova a quem contestar-lhe tais atributos”.(Op. cit., p. 121)

15.Diogenes Gasparini; Direito Administrativo, Saraiva, 3 ed.,1993,p. 77.

16.Hely Lopes Meirelles; Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros Editores, 17ª ed,, 1992. Define a auto- executoriedade da seguinte forma: " A auto- executoriedade consiste na possibilidae que certos atos administrativos ensejam de imediata e direta execução pela própria Administração, independentemente de ordem judicial. Os autores mais modernos não se cansam de apontar esse atributo nos atos administrativos que o possuem. Entretanto as nossasAdministrações se mostram tímidas na sua utilização e a nossa Justiça, enm sempre atualizada com o Direito Público, em pronunciamentos felizmente raros, tem pretendido condicionar a execução de atos tipicamente auto-executórios a previa apreciação judicial. mas em contraposição a estes julgados esporádicos e errôneos, firma-se cada vez mais a jurisprudência na boa doutrina, reconhecendo à Administração- especialmente quanto atos de polícia-o poder de executar direta e imediatamente seus atos imperativos, independentemente de pedido cominatórioou mandado judicial." Celso Antônio Bandeira de Mello; Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 13º ed., 2001, p. 374- 376 dimensiona a auto- executoriedade como sendo :"a qualidade pela qual o Poder Público pode compelir materialmente o administrado, sem precisão de buscar previamenteas vias judiciais, ao cumprimento da obrigação que impôs e exigiu " Segue afirmando ,com inteira propriedade que: " A executoriedade não se confunde com a exigibilidade, pois esta não garante, sópor si ,a possibilidade de coação material, de execução do ato. assim, há atos dotados de exigibiliadade mas que não possuem executoriedade". E, após, acrescenta lapidarmente: " Se compararmos estesdiferentes atributos mencionados, vamos verificar que, pela presunção de legitimidade, o ato administrativo, quer seja impositivo de uma obrigação, quer seja atributivo de uma vantagem, é presumido como legítimo; pela imperatividade, o ato cria para terceiro, independentemente de sua aquiescência, uma obrigação; pelaexigibilidade, o ato sujeita o administrado á observânciade uma dada situaçãopor meio indiretos impostos pela própria Administração, sem recorrer ao Judiciário; pela executoriedade, o ato subjuga o administrado à obediência por meio de coação direta aplicada pela Administração, independentemente de ordem judicial". Di Pietro afirma, quanto a auto- executoriedade: " Consiste a auto- executoriedade em atributo pelo qual o ato administrativo pode ser posto em execução pela própria Administração Pública, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário."(Direito Administrativo, Atlas, 13º ed., 2001, p. 185).

 

17.Teori Albino Zavascki; Antecipação da Tutela, Saraiva, 1997, p. 162-163

18.Vale lembrarque o que se antecipam, segundo a doutrina dominante, são os efeitos da tutela, e não a tutela em si, porque a tutela em si só se apresenta completa com o signo da definitividade resultante da exauriência cognitiva, ainda que não haja coisa julgada. O que são antecipados são alguns dos efeitos da tutela pretendida.

19.Um exemplo esclarece bem o que aludimos. É o caso de o autor ter sua pretensão alijada em manifesta contrariedade ao direito e ao mesmo tempo argüir vício processual. Poderia requerer em sede de recurso de apelação a antecipação dos efeitos da tutela pretendida ao início com a demanda, antecipação que não pedira em primeiro grau porque ausentes os requisitos. Ao mesmo tempo, requereria, no que tange à argüição de nulidade, antecipação dos efeitos da tutela recursal, baseado no artigo 558, parágrafo único, do CPC. ou mesmo no artigo 273 do mesmo diploma, antecipando efeitos de uma tutela que não fora veiculada ao início da demanda exatamente por envolver matéria processual. Um pedido representa genuína antecipação dos efeitos da tutela pretendida com a demanda já ao início do processo, representado antecipação de efeitos que correspondem ao direito material invocado. No segundo caso, os efeitos antecipados são de uma demandajurisdicional só surgida no transcurso do processo, não correspondendo à antecipação dos efeitos da tutela originalmente pretendida e correspondendo à invocação de direito processual, não material.

20.Segundo a doutrina dominante, a cautela possui uma função de acautelamento do processo, ou seja, do interesse do estado e não primordialmente do direito da parte. Contra se insurge Ovídio Baptista da Silva para o qual o que se visa com a acautela é a proteção do direito da parte ( Curos de Processo Civil, Forense, 2000,v.III)

21.No meu "Cautelares Satisfativas?" tratei com maior profundidade da matéria acabando por concluir queapós a reforma processual que introduziu a antecipação dos efeitos da tutela através dos artigos 273 e 461 do CPC, não cabem mais as chamadas cautelares satisfativas, antes toleradas pela inexistência de mecanismos eficientes para resguardo destes casos de liminares satisfativas. A conclusão parte da premissa de que o legislador previu nos artigos 273 3 461 requisitos mais graves para a concessão de antecipação de efeitos da tutela do que os previstos para as liminares cautelares. Logo, a manutenção da possibilidade de manejo de cautelares satisfativas em lugar da antecipação de tutela ( rectius = de efeitos da tutela) representaria burla à lei, tornando letra morta o artigo 273 e produzindo resultado diametralmente oposto ao pretendido pela reforma: banir o uso do mandado de segurança e das cautelares satisfativas como instrumentos anômalos. Naquela oportunidade, referindo-nos ao escólio de Theodoro Júnior, alvitramos a impossibilidade de aplicação da fungibilidade, hipótese permitida , a nosso juízo, somente quando for o caso de receber cautelar em lugar de pedido de antecipação de tutela erroneamente formulado, isto desde que admitida a possibilidade de fungibilidade entre tutelas diferentes . No caso inverso, ou seja, pedido de cautelar em lugar da antecipação de tutela, o erro grosseiro, e a impossibilidade de conversão de ritos de funções jurisdicionais diferentes ( cautela e conhecimento). O magistrado deve extinguir o feito por carência de ação haja vista impossibilidade jurídica do pedido, com base no artigo 267, inc. VI do CPC. Na doutrina , encontramos diversas manifestações repelindo a equiparação das cautelares à antecipação de tutela. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira leciona:“No processo cautelar, a prevenção do dano dá-se sem interferência do plano do direito material, nele não se verificando efeito antecipado da futura sentença de mérito. A ordem cautelar atua no plano sensível com caráter puramente conservativo, destinado apenas à garantir o resultado útil do processo de conhecimento ou de execução.Já na hipótese do art. 273 não basta apenas conservar para garantir a insatisfação decorrente do estado antijurídico, mostrando-se necessária a antecipação, total ou parcial, dos próprios efeitos materiais da sentença a serproferida no processo de conhecimento.”(Comentários ao Código de Processo Cívil, Forense, 4º ed., 1999, v.VIII, t. II. n.º 4, p.10)E conclui que:Dessa forma, embora cautela e antecipação trabalhem com a urgência, buscando preservação do dano decorrente da demora do curso do processo de conhecimento ou de execução, não há como afastar a manifesta diversidade da natureza do receio de lesão, elemento importante para diferenciá-las”.(Op. cit., n.º 5, p. 11).Também neste diapasão, a irrepreensível lição de Teori Albino Zavascki:“Assim, após a reforma, já não se pode mais questionar da legitimidade das medidas provisórias satisfativas, providência cabível, agora, em qualquer ação de conhecimento. No entanto, sua concessão está sujeita a regime próprio, inconfundível e, em alguns aspectos, mais rigoroso que o das medidas cautelares...O que se operou, inquestionavelmente, foi a purificação do processo cautelar, que assim readquiriu sua finalidade clássica: a de instrumento para a obtenção de medidas adequadas a tutelar o direito, sem satisfazê-lo. Todas as demais medidas assecurativas, que constituam satisfação antecipada de efeitos da tutela de mérito, já não caberão em ação cautelar, podendo ser, ou melhor, devendo ser reclamados na própria ação de conhecimento, exceto nos casos, raros, já referidos, em que a lei expressamente prevê ação autônoma com tal finalidade. Postulá-las em ação cautelar, na qual os requisitos para a concessão são menos rigorosos, significará fraudar o art. 273 do Código de Processo Civil, que, para satisfazer antecipadamente, supõe cognição em nível mais aprofundado, pois exige verossimilhança construída sobre prova inequívoca”(Antecipação da Tutela, Saraiva, 2º ed. 1999, p. 45)

22.Nelson Nery Júniore Rosa Maria Andrade Nery. Código de Processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, RT, 3ª ed. 1997, p. 1820, nota nº 2.

23.Segundo Barbosa Moreira, " o recurso de agravo surgiu no velho direito português como reação daprática judiciária ante a restrição imposta por Afonso IV à faculdade de apelar contra as interlocutórias. Não se conformavam as partes com decisões desse tipo, que lhes causavam, às vezes, prejuízo irreparável. Insistiam em pleitear a imediata correção do agravo sofrido. Começaram, então, a valer-se do expediente de dirigir petições ao Rei( querimas ou querimônias), requerendo 'cartas de justiça' , cuja eficácia ficava subordinada à cláusula de serem verdadeiras as alegações. Para evitar inúteis perdas de tempo, determinou D. Duarte que as petições lhe subissem já acompanhadas da resposta do juiz que proferira a decisão impugnada: eis a origem do juízo de retratação. Assim se configuraram as chamadas 'cartas testemunháveis' ou 'instrumentos de agravo'."( Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 8ª ed. 1999, v. V, nº 265, p. 477)

24.Conforme Barbosa Moreira: " A substituição do regime , inspirada em evidente propósitode simplificação, eliminou os notórios inconvenientes que implicava a sinuosa tramitação do agravo em primeiro grau, e espera-se que contribua não só para acelerar a marcha do recurso, mas também para libertar de perturbações a do processo mesmo".( Op. cit, p. 498)

25.Em outro trabalho, "Considerações acerca da penhora de rendas, ativos financeiros e ações e direitos sobre bens alienados fiduciariamente nos Executivos Fiscais", já tratamos da matéria, afirmando na ocasião que:" Rigorosamente, no entanto, in casu, não haveria falar-se necessariamente em controvérsia, entendida como a contrariedade estabelecida entre as partes acerca e determinado ponto de fato ou de direito, pois que o executado pode mesmo até aquiescer em que seja operada a constrição nas formas por nós tratadas e ainda assim negar o magistrado a medida. Tal ocorre porque o juiz agiria invocando os poderes que lhe são concedidos para, no bojo do processo, qualquer que seja a espécie de tutela, velar pelo seu regular andamento e aplicação correta da lei, mormente as normas de interesse público. Logo, não haveria questão. Em sendo, via de regra, invocado como argumento para denegação da medida fundamentos de ordem pública, poderia o magistrado agir oficiosamente. Entretanto, acreditamos que esta circunstância não afasta o fato de estarmos frente a uma verdadeira questão. Isto se deve ao fato de que, em nosso entendimento, questão há sempre que o magistrado tenha que se pronunciarem manifestação de conteúdo decisório. Seja por atividade da parte, seja ex lege, impõe-se o dever de decidir. O que separa o despacho da decisão é que no despacho não há decisão entre duas ou mais possibilidades possíveis de constituírem objeto de julgamento. Os despachos são provimentos oriundos de imposição legal. As decisões interlocutórias submetem-se à possibilidade de apreciação decisória, ou seja, não há a imposição automática da lei de determinado ato em caráter excludente de qualquer outra hipótese. Nestes casos, a escolha da alternativa do direito aplicável à espécie depende de previa decisão, só passando a operar a partir da decisão como alternativa única. Nos despachos, existe a prévia imposição de um determinado conteúdo no provimento, sem a alternativa. Um exemplo elucida. O provimento que recebe a inicial é decisão porque há a possibilidade de o magistrado pronunciar-se inversamente, rejeitando a peça preambular. Mas uma vez decidido por receber-se a inicial, o provimento, geralmente simultâneo, que determina a citação é despacho, porque é defluência automática e lógica do recebimento da inicial. E assim ocorre em todos os despachos e decisões. Logo, desde que exista possibilidade de pronunciamentos diferenciados, dependendo qual será o conteúdo do provimento de atividade de aplicação do direito executadapreviamente pelo magistrado e de seu pronunciamento acerca da hipótese de fato e de direito, estaremos diante de uma decisão. Ao revés, se estivermos diante de um provimento (entendido como subsumidos na hipótese quaisquer manifestações do juiz, cujo conteúdo é imposto automaticamente pela lei), tratar-se-á de despacho, porque decorrência imediata da lei, não carecendo da manifestação prévia de acertamento do conteúdo mediante análise das hipótes fático-jurídicas. Tem sido utilizado, comumente, como critério de distinção entre despachos e decisões o fato de que os despachos não trariam gravame à parte. Não nos parece seja este critério passível de per se estabelecer a distinção. É possível despachos que causem gravame e em tal caso, a contrario sensu do que preconiza a doutrina majoritária, o só fato de casuar gravame não tem o condão de tornar recorrível o pronunciamento. Nestes casos, por ser conseqüência automática da lei, o pronunciamento, entendemos nós, é irrecorrível se não existir nele conteúdo decisório. Por outro lado, desde que exista possibilidade de mais de um conteúdo, dependendo qual será ele da análise do fato e do direito, então haverá decisão e portanto será impugnável.

26.Já pudemos verificar julgamentos de agravos em menos de uma semana, tempo este contado entre a sua protocolização no correio e o seu julgamento pelo relator.

27.Na doutrina ver J.M. Othon Sidou,Habeas Corpus, Mandado de Segurança, Mandado de Injunção, Habeas Data e Ação Popular, Forense, 5º ed. 2000, p. 188.

28.Já tivemos oportunidade de nos manifestar quanto à prescrição, preclusão e coisa julgada administrativa tratadas como sinônimos e com significado diferente do empregado em outros ramos do Direito em argumento que vale ser invocado: "Irretratabilidade, preclusão e coisa julgada administrativa não são, nem no âmbito do Direito Administrativo, nem em ramo nenhum, a mesma coisa. Esclareçamos os conceitos. Tratemos primeiramente da preclusão e da coisa julgada administrativa. A preclusão, caro relator, é outro instituto da Teoria Geral do Direito, e tem entroncamento na Teoria Geral do Processo. É por isso que o termo preclusão tem um sentido unívoco dentrodo direito e este sentido nos é dado pela palavra de Giuseppe Chiovenda, que foi quem desenvolveu a doutrina da preclusão, que ainda que desenvolvida dentro do processo civil é universal. Preclusão, ( que vem de preclusio,precludere) é definida como a perda de uma faculdade, direito ou situação pelo seu não exercício no prazo( temporal), pelo seu exercício anterior( consumativa), ou por ter o atingido tomado uma atitude logicamente incompatível com oexercíciodo direito faculdade ou situação precluso (lógica). Pelo instituto da preclusão ocorre a impossibilidade de retorno no tempo para realizar o ato precluso. Precluir é perder. E isto independe da erronia que, por ventura, tenha cometido o legislador no artigo 63, § 2º da Lei 9.784 ou em que tenha incorrido algum doutrinador tomado por uma visão estanque do fenômeno jurídico. A coisa julgada administrativa, por seu turno, é própria do processo administrativo, pois não se há falar em coisa julgada senão por via de um processo. A coisa julgada administrativa surge pelos mesmo motivos pelos quais surge a coisa julgada judicial. Isto ocorre, sempre ao fim do processo, pela não interposição do recurso ou por sua interposição e julgamento, ou ainda por sua interposição e não conhecimento. Como se vê, estas forma são qualificáveis como resultados da preclusão. Não seria preclusão e coisa julgada a mesma espécie? Não.Assim como no processo judicial não se confundem preclusão e coisa julgada, também no âmbito administrativo isto não ocorre, não sem erro. A coisa julgada é o efeito da preclusão ao fim do processo. Há entre elas uma relação de causa e efeito. Não podem ser a mesma coisa e não são. Há que observar que enquanto a preclusão opera em qualquer fase do processo administrativo ( lato sensu), a coisa julgada, como efeito que se agrega ao resultado para torná-lo imutável, só acontece ao termo do processo e nem sempre acontece. Há preclusão sem coisa julgada, não só pelos momentos diferentes em que operam, mas também pelo fato de ainda quando se dá a preclusão própria do fim do processo poder não haver coisa julgada. A irretratabilidade também é uma conseqüência da preclusão e é a característica marcante de que se compõe a coisa julgada. No entanto, não se confunde com elas. Isto ocorre porque existe irretratabilidade que não é fruto da preclusão. Destarte, só existe preclusão quando há possibilidade de ação, entendida como a possbilidade de dar-se inicio ao processo judicial ou administrativo. Quando a lei corta cerce esta possibilidade ab initio, pode haver irretratabilidade sem que haja preclusão, lembrando sempre que, conforme visto na questão anterior, inexiste irretratabilidade quanto às nulidades. A conseqüência é lógica: Não posso me referir à irretrabilidade como sinônimo de preclusão porque pode haver irretrabilidade sem preclusão. Para que fossem a mesma coisa, teriam que coincidir perfeitamente. Mas se há irretratabilidade sem preclusão, não posso dizer que ambas sejam a mesma coisa, ainda no âmbito administrativo. Aquele que disser que preclusão e irretratabilidade são a mesma coisa estará colocando dentro do conceito de preclusão algo que nele inexiste, pois nem sempre a irretratabilidade surge da preclusão. Preclusão é fato; irretratabilidade efeito, qualidade. Da mesma forma, não se pode dizer que coisa julgada administrativa e irretratabilidade compreendam a mesma coisa. Basta notar que embora tenha ocorrido coisa julgada administrativa pode ainda haver retratabilidade desde que aplicada a súmula do STF. Por outro lado se afirmamos que a irretratabilidade é própria da coisa julgada é preciso que refiramos que a irretratabilidade pode existir em outras fases do processo como decorrência da preclusão, sem que ocorra coisa julgada administrativa que é uma característica de irretratabilidade própria da decisão final. Assim sendo, se posso dizer que na coisa julgada há sempre irretratabilidde, o inverso não é verdadeiro. Pelo que se nota, os termos tem âmbitos e limites diferentes. Enquanto a irretratabilidade, que é uma conseqüência da preclusão, mas pode existir sem ela, e a preclusão podem operar em qualquer fase do processo, a coisa julgada que é uma das formas de irretratabilidade qualificada à hipótese de decisão final e tão somente, ao termo final do feito. Logo se verifica que o âmbito de atuação o da irretratabilidade e da preclusão é maior do que o da coisa julgada. Não posso por isso equipará-las. Ademais, a irretratabilidade é uma das conseqüências da preclusão e a cracterística marcante da coisa julgada, mas não é a mesma coisa que preclusão e coisa julgada. É certo que na doutrina estes conceitos se baralham lamentavelmente até mesmo administrativistas do porte de um Hely Lopes Meirelles ou de uma Maria Sylvia Zanella Di Pietro não atentam para o fatode que não se pode ter uma visão estanque do Direito e como sua doutrina é corrente e moente acaba se tornando uma verdade fruto de um equívoco repetido mil vezes, como preconizava Goebells. Venia concessa, estão errados, sem embargo do quilate deste juristas, e não é a errada conceituação que dão que irá mudar a natureza e o real conceito dos institutos. Tivesse a obra destes autores a amplitude aheterogeneidade da obra de um Pontes de Miranda ou de um Frederico Marques certamente não teriam cometido esta cinca.. Deveriam ler Cândido Rangel Dinamarco ( A Instrumentalidade do Processo) e saberiam que preclusão ecoisa julgada existem no processo administrativo assim como no penal e no civil, e não se confundem. A sua autoridade de administrativistas não pode mudar a natureza das coisas. Assim sendo, coisa julgada administrativa, preclusão eirretratabilidade não são a mesma coisa nem nunca foram, nem nunca o serão, em parte nenhuma. São termos que designam fenômenos de natureza,características e limites diferenciados.

29.Esta a correta opinião de Eduardo Talamini, Recorribilidade das decisões sobre Tutela de Urgência in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e outras formas de impugnação das decisões judiciais, RT, 2000, p. 268-277.

30.Chegamos à esta conlusão verificando que o exercício do poder se dá em investidura de postestade pública dotada de poder de coerção, tomada por via do exercício de ação e tendo a aplicação do direito a uma hipótese concreta como atividade fim, caracterizando exercício do poder jurisdicional. Sobre tal tema ver o meu "Jurisdição, ação e processo à luz da processualística moderna".

31.Hely Lopes Meirelles; Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 12ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989. pp. 78/79. Segue aduzindo que no caso da entidade de direito público o remédio é o pedido de suspensão: "A suspensão da liminar ou dos efeitos da sentença concessiva é providencia admitida pelas Leis 1.533/51 (art. 13) e 4.348/64 (art. 4º) para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Essa suspensão cabe ao Presidente do Tribunal competente para conhecer do recurso respectivo e só poderá ser requerida pela entidade ou órgão interessado."( op. cit, p. 57)

32.Alfredo Buzaid;DoMandado de Segurança. São Paulo, Saraiva, 1989, p. 261. Da mesma opinião Carlos Mário da Silva Velloso, " Do Mandado de Segurança e institutos afins na Constituição de 1988", São Paulo, Saraiva, 1990, p. 88/89, Sálvio de Figueiredo Teixeira, "Mandado de segurança: uma visão de conjunto in Mandados de Segurança e de Injunção", São Paulo, Saraiva, 1990, 119-120 eAraken de Assis, Recorribilidade das interlocutórias no mandado de segurança in Revista de Processo, nº 84, p. 99.

33.Esposando este posicionamento, encontramos julgado referido por Theotonio Negrão, Código de Processo civil e Legislação processual em vigor, Saraiva, 31º ed. 2000, p.1612: "A lei prevê um procedimento específico para o mandado de segurança e os recursos admissíveis são aqueles nela definidos. As decisões interlocutórias não impugnáveis na legislação de regência ( Lei nº 1.533/51, arts. 8º e 13 ) não operam preclusão e podem ser examinadas pelo Tribunal competente, em grau de recurso ( apelatório ou especial).O Código de Processo Civil não é substitutivoao procedimento do mandado de segurança, a este se aplicando, como proposições basilares e diretoras, os princípios gerais do processo civil. É incabível agravo de instrumento, em processo de ação de segurança, interposto com base no artigo 522 do Código de Processo civil, porquanto os recursos cabíveis, em primeira instância, são os previstos nos artigos 8º e 12 da Lei 1.533 de 1951. A questão sobre ser ou não ser obrigatória a efetiva intervenção do Ministério Público, no mandado de segurança, discutida ou não, na fase intercalar, não preclui, podendo ser reexaminada, quer na sentença finaldo juiz monocrático, quer pelo tribunal, no julgamento da apelação. ( RSTJ 47/85,maioria)"

34.Como aliás ressalvam Accácio Cambi e Eduardo Cambi; Cabimento do Agravo de Instrumento contra s decisões interlocutórias em Mandado de Segurança in Aspectos polêmicos e atuais dos Recursos Cíveis e outras formas de impugnação às decisões judiciais, RT, 2001, p. 15.

35.Tudo quanto compete v.g à citações, intimações, validade dos atos processuais, disciplina de parte e procuradores, só exemplificativamente, repita-se, porque muito mais encontra aplicação subsidiária, é invocável paraa possibilitação de que o mandado de segurança tenha seguimento

36.As cautelares são largamente aceitas no âmbito do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça para fim de atribuir efeitos suspensivo aos recursos extraordinários ou especiais, respectivamente, fundamentada esta aceitação no poder cautela concedido pelos regimentos internos e pelo CPC.

37."Direito publico inespecífico - mandado de segurança - Agravo de instrumento contra decisão que revogou liminar. Cabimento do agravo de instrumento em mandado de segurança. Posição amparada em precedentes. Acerto da decisão que revogou liminar, autorizando que o veículo permaneça na posse do agravado em face da prova da propriedade. Agravo improvido". (06 fls). (Agi nº 599255775, Terceira Câmara Cível, TJRS, relator: des. Nelson Antônio Monteiro Pacheco, julgado em 02/09/1999)

38.Admitindo a aplicação do agravo no mandado de segurança Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 8º ed. 1999, v. V, nº 268, p. 485: " De modo algum se exclui o cabimento do agravo no processo do mandado de segurança: errôneas a doutrina e a jurisprudência em sentido contrário" . Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery; Código de Processo civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, RT, 3º ed. 1997, p. 1810. Cássio Scarpinella Bueno,A liminar em Mandado de Segurança:: um tema com variações. RT, 1998, p. 137 et seq.

39.Calha a invocação do magistério de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery:" Quando a decisão agravada tiver conteúdo negativo, como por exemplo no caso de o juizde primeiro grau indeferir pedido de liminar, pode o relator conceder a medida pleiteada no primeiro grau de, por aplicação extensiva do CPC 527, II, combinado com o CPC 558. A concessão, pelo relator, da medida denegada pelo juiz de primeiro grau é, na verdade, antecipação do resultado do mérito do agravo de instrumento, perfeitamente admissível no sistema brasileiro, à luz do CPC 273. A essa circunstância a doutrina dá o nome de efeito suspensivo ativo do agravo..."( Código de Processo Civil Comentado e legislação processual extravagante em vigor, RT, 3º ed. 1997, p. 772, nota 13 ao artigo 527.Ver ainda nota 8 ao artigo 558., p. 802). Também Theotonio Negão colacionaque " Ainda que a decisão interlocutória seja de conteúdo negativo, a via adequada para impugná-la é o recurso de agravo de instrumento, ao qual pode ser conferido o denominado efeito suspensivo ativo".(Código de Processo civil e Legislação processual em vigor, Saraiva, 31º ed. 2000, p. 560, nota 4a ao artigo 527).

40.Ver Cassio Scarpinella Bueno; Execução Provisória e Antecipação da Tutela. Dinâmica do efeito suspensivo da apelação e da execução provisória: conserto para a efetividade do processo, Saraiva,1999, p. 321 et seq.

 

 

 


Informações Bibliográficas

 

Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
MEZZOMO, Marcelo Colombelli. O Agravo de Instrumento em Mandado de Segurança. Site do Curso de Direito da UFSM. Santa Maria-RS. Disponível em: <http://www.ufsm.br/direito/artigos/processo-civil/agravo.htm>.

 

Acesso em: 16.NOV.2011