Visão multidisciplinar acerca do casamento, da união estável e da adoção por par homoafetivo, com enfoque psicanalítico


Pormarina.cordeiro- Postado em 20 junho 2012

Autores: 
SANDIM, Emerson Odilon

A Psicanálise contemporânea, cujos conceitos sofreram a devida evolução, não seria uma barreira para impedir a adoção por pares homoafetivos. O Direito, igualmente, está concorde com a adoção pelas pessoas do mesmo sexo.

RESUMO

Os tempos mudaram, a noção de família também. A base da união das pessoas para constituírem um lar comum, sejam do mesmo sexo ou não, é o amor. Sendo assim, aqueles que desejam ter filhos também podem lançar mão da adoção.

A antropologia, a etnografia e a psicologia, em momento algum, detém estudos que não prestigiem a adoção por pares homoafetivos.

A Psicanálise contemporânea, cujos conceitos sofreram a devida evolução, não seria uma barreira para impedir a adoção por pares homoafetivos, principalmente porque o complexo de Édipo na atualidade não mais é focado numa família patriarcal, mas sim consentâneo com uma entidade nuclear polimórfica e transgeracional.

O Direito, igualmente, está concorde com a adoção pelas pessoas do mesmo sexo. O Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição da República, legitimou a união estável dos homoafetivos.

Por fim, há de se entender a homoafetividade alcançando as lésbicas, gays, travestis, transexuais e transgêneros, porque nenhum deles é menos humano por conta da orientação sexual que envergam.

Palavras-chave: Família, Amor, Adoção, Antropologia, Etnografia, Psicologia, Psicanálise, Homoafetivo, Lésbicas, Gays, Travestis, Transexuais, Transgêneros, Édipo, Direito, Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça.

SUMÁRIO: 1 – INTRODUÇÃO. 2 - AS CONTRIBUÇÕES DA ANTROPOLOGIA, DA ETNOGRAFIA E DA PSICOLOGIA  PARA O ESTUDO DO HOMEM. 3 – A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FAMÍLIA. 4 – O COMPLEXO DE ÉDIPO. 4.1 – Noções gerais. 4.2 – Visão estática – Freud. 4.3 – Objeto parcial e complexo de Édipo - Melanie Klein. 4.4 – Prisma lacaniano. 4.5 – Contribuição ampliativa – Karen Horney. 4.6 – Aspecto espiritual e matrilinear – Malinowski. 4.7 – Caracterização sob o ponto de vista de Násio. 4.8 – Dimensão contemporânea – João Neto. 5 – DIREITOS RECONHECIDOS AOS PAIS HOMOAFETIVOS. 5.1 – Dignidade da pessoa humana e igualdade. 5.2 – Reconhecimento da união estável pelo Supremo Tribunal Federal e suas consequências. 6 – A ADOÇÃO POR CONVIVENTES HOMOAFETIVOS E UM NOVO ENFOQUE DO COMPLEXO DE ÉDIPO. 7 – A ALTERAÇÃO DIMENSIONAL DO ÉDIPO E SUAS DECORRÊNCIAS. 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS

 

1 – INTRODUÇÃO

Este trabalho, conjugando a Psicologia, a Antropologia, a Etnografia, a Psicanálise e o Direito, desagua na alteração dos papéis de seus atores, cotejando a remodelação da ambiência familiar, desde as épocas mais remotas até o mundo contemporâneo.

Infere-se, nesse ponto, em sede psicanalítica que o complexo de Édipo, focalizado por Freud em momento histórico vitoriano – auge do modelo patriarcal no ocidente -, não deixou de existir, porém sofreu – e continua sofrendo na pós-modernidade - profundas modificações.

Com o fito de proceder a um criterioso exame de como os estudiosos da psicanálise veem a figura do Édipo, lançar-se-ão os nomes mais luminares dessa ciência/arte sobre o assunto, para, ao depois, alinhavar-se o tema central deste escrito, qual seja, os direitos a que fazem jus os pares homoafetivos, mormente à adoção, e a conjugação deste agir com o complexo de Édipo, com o avanço da comunidade em geral, por intermédio das contribuições da multidisciplinaridade.

No campo jurídico, é bom que se diga que, após a célebre decisão do Supremo Tribunal Federal – STF, reconhecendo a união estável entre pessoas do mesmo sexo, acrescido ao que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, desde que perfaçam os requisitos biopsicossociais que protejam os interesses do menor e apontem para a existência de um lar com caracteres favoráveis, nenhum obstáculo existe quanto à adoção por homoafetivos, como se verá em tópico próprio, inclusive porque a jurisprudência vem convertendo união estável por parceiros do mesmo sexo em casamento.

Intenta-se, nestas páginas, destacar a evolução do conceito de família, demonstrando a historicidade que a marca, além de evidenciar que o Direito e Psicanálise e tantas outras disciplinas, voltadas aos saberes do humano, andam de mãos dadas em prol da adoção por pessoas com mesma orientação sexual, porque o complexo de Édipo ampliou sua dimensionalidade. Com tal proposta haveria a transcendência do preconceito e a prevalência do cuidado com aqueles cujo futuro fica à mercê da decisão social.


2 - AS CONTRIBUÇÕES DA ANTROPOLOGIA, DA ETNOGRAFIA E DA PSICOLOGIA PARA O ESTUDO DO HOMEM

É do ser humano o anelo de comparar a sua vida com a do próximo, e, desde as priscas eras, tal desiderato tornara-se perceptível com este ideário de cotejar sua aldeia com a vizinha, observando a diversidade de ritos, costumes e tantas outras gamas de condutas.

Surge, pois, a antropologia, que vem bem definida na fala de Rossano Carvalho Nunes:

“Etimologicamente, o termo Antropologia deriva da junção dos vocábulos gregos anthropos (homem) e logia (estudo/tratado), o que significa “o estudo do homem”.  A Antropologia é o estudo do homem e da humanidade em sua totalidade, abrangendo suas dimensões biológicas, sociais e culturais; incluindo sua origem, seus agrupamentos e relações sociais, comportamento, desenvolvimento social, cultural e físico, suas relações com o meio natural, variações biológicas e sua produção cultural. Ou seja, a antropologia procura estudar a humanidade em todos os seus aspectos.”

A par disso, não se pode olvidar o viés biológico do ente humano, como se infere dos antropólogos Hoebel e Frost (2005):  “desde o tempo das origens primitivas da cultura, todo desenvolvimento humano foi biológico e cultural. Nenhuma tentativa de estudar a humanidade pode ignorar este fato”. O biólogo evolutivo e geneticista russo Theodosius Dobzhansky (1963) concorda quando afirma que a evolução humana somente pode ser compreendida quando entendida como uma interação entre os desenvolvimentos culturais e biológicos.

Aprofundando o estudo sobre a raça humana nascera uma disciplina nova como uma especialidade da antropologia que é a etnologia, a qual na pena de Dirceu Lindoso:

“A palavra etnologia é de origem grega, e significa estudo dos povos. Esta saber, que povos? Há quem acredite que todos, mas não é bem assim. Uma corrente surgiu que delimita o estudo da etnologia aos povos que, comumente, chamava-se de selvagens e primitivos. E que seriam povos selvagens ou primitivos? Assim chamava-se aos povos que não conhecem a escrita nem as técnicas modernas. Mas há quem aplique, sob o nome de antropologia cultura, a etnografia a povos que conhecem a escrita e as técnicas modernas. E, portanto, aplicam o método etnológico, apurado no estudo de sociedades primitivas ou arcaicas, às sociedades industriais e urbanas. É o caso entre nós do antropólogo Darcy Ribeiro, que tanto estudou as sociedades primitivas, como a dos índios Kadiwéu e Urubu-Kaapor, quando estudou as sociedades complexas, como as sociedades nacionais brasileira e latino-americana. E Claude Lévi-Strauss pôs à sua cadeira no Collège de France o nome de antropologia social, embora considerasse um etnólogo.”

De nada adiantaria todo este escorço científico se o comportamento do humano não restasse aquilatado, o que fez emergir outro ramo imprescindível na árvore do conhecimento, qual seja, a Psicologia, assim definida por Alessandra A. F. Calbucci:

Em linhas gerais a Psicologia é uma  ciência que visa compreender as emoções, a forma de pensar e o comportamento do ser  humano. Embora existam diversas áreas e linhas de atuação, a Psicologia busca o conhecimento e o desenvolvimento humano individualmente ou em grupo.

Sem qualquer desconsideração para com a psicologia, surgira a psicanálise que Betelhin (1982) enquadra como:

“Psique é a alma – um termo repleto do mais rico significado, dotado de emoção, abrangentemente humano e não científico. Análise, por seu lado, implica a decomposição de um todo em suas partes componentes, um exame científico.”

Sem o concurso dessas ciências, incompossível entender o ser humano, a constituição das famílias, e muito menos, a instituição da adoção, mormente no campo da homoafetividade, o que revela que hodiernamente só se apreende com justeza qualquer critério relacional mediante a interdisciplinaridade, do contrário, perdoada a metáfora empobrecida, seria como antever a floresta em sua biodiversidade por meio de uma só árvore.


3 – A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FAMÍLIA

Principia-se invocando Engels (1982), no que tange a evolutividade familiar, onde este aponta os seguintes aspectos:

a) no Estágio Selvagem: o ser humano vivia muito mais sob as rédeas do instinto, apropriando-se dos bens aptos ao consumo e, no plano da sexualidade, tanto o homem quanto a mulher não definiam parceiros e viviam imersos na libertinagem;

b) sob o ângulo da Barbárie: aqui já se alvorece a agricultura, ocorre a domesticação dos animais e o progresso já se faz sentir com a produção de alimentos, ou seja, a razão se faz bem mais perceptível;

c) no campo da Civilização: desponta, nesta quadra, a industrialização e as artes, estas de forma a incitar a imaginação simbólica dos humanos.

Toma-se de empréstimo a lapidar explanação de João da Silva Carvalho Neto (2010), quando assevera que na Barbárie apareceu “a família sindiásmica, caracterizada pela redução do grupo à sua unidade última que é o par, o casal.” Asserciona ainda que “A família sindiásmica era aquela na qual o homem poderia estabelecer relações poligâmicas. No entanto, à mulher era vedado o adultério, sob pena de severos castigos.”

Igualmente, dando-se de ombros à fecundidade que assinala a peculiaridade da mulher, o homem, para subverter a ordem da vocação hereditária – apropriação dos bens quando da morte do cônjuge -, tornou-a  mera serviçal.

Daí porque se traz à baila as sábias palavras de Giovanna de Fraga Carneiro (1990) ao dizer que

As filhas eram totalmente excluídas da sucessão, quando contraíam matrimônio recebiam um dote, constituído de bens que seriam administrados pelo marido.  A linhagem beneficiava apenas componentes do sexo masculino, e a herança só era passada para o primogênito, isso como forma de evitar a divisão dos bens da família. Quando a mulher se casava passava a fazer parte da família do esposo. Nessa nova família, quando viúva, não tinha direito à herança. O casamento era um pacto entre duas famílias, seu objetivo era simplesmente a procriação. A mulher era ao mesmo tempo doada e recebida, como um ser passivo. Sua principal virtude, dentro e fora do casamento, deveria ser a obediência, submissão. Filha, irmã, esposa: servia somente de referência ao homem que estava servindo.

Porém, ainda que no campo da Civilização, não se abandonou muito o aspecto bárbaro do inferior trato à mulher, já que o homem passa a ser o chefe único da família, como se nota, por exemplo, em Roma, na figura do pater familiae.

É de bom alvitre a lição de João Carvalho Neto (2010), quando este afirma que o homem

era o chefe religioso, único dono da propriedade e juiz. Exercia o poder total sobre todos do grupo familiar, inclusive a esposa, que era considerada apenas um membro do marido, e após a morte dele ficava submetida ao seu sucessor, não tendo nunca independência e autonomia. O mesmo se estendia a todos aqueles ligados a ele pelo vínculo religioso, que era o que estabelecia as regras familiares.

Tal minimização da condição feminina seguiu o rumo da história, alcançando a Idade Média e, também, a época de Sigmund Freud, onde a questão sexual de tal gênero punha-se da maneira mais oculta possível, ou seja, este discurso deveria ser evitado ou, na melhor das hipóteses ser confiado a um clérigo, no ato confessional.

Ora, neste contexto histórico, a família era hierarquizada e rigidamente organizada, isto é, cabia ao pai gestar toda sorte de interdição, à mãe o signo da passividade e à criança a obediência estrita. Logo, a mulher era a rainha do lar, a procriadora e a criadora da prole, o seu tempo com o rebento era o maior possível; enquanto a figura do pai representava o tacão da ordem.

Novamente, vem à lume o escrito de Neto (2010):

A família, naquele tempo, tem o homem como único elemento identificador e a mulher era, no casamento, sujeito incapaz. Dentro do processo evolutivo das expressões instintuais, percebe-se a manifestação mais livre do desejo sexual nos dois primeiros estágios considerados por Engels, onde a união sexual não caracterizava estabilidade para constituição de famílias. A partir do terceiro estágio, amplia-se a figura do superego, nas expressões da moral e da ética[1], a definir normas e procedimentos para prática familiar. Claro que este superego coletivo é fruto dos superegos individuais e se desenvolve quando da definição vivencial da figura paterna, que se torna única e representante da lei que interdita o gozo no âmbito familiar.

Contudo, o êxodo rural, a globalização, dentre outros fatores importantes, fizera surgir um novo modelo de família. Anota, vez outra, Neto (2010):

A família contemporânea passou a ser, ao mesmo tempo e paradoxalmente, relacional e individualista. É na tensão entre esses dois pólos que se constroem e se desfazem os laços familiares, onde cada um busca a fórmula mágica que lhe permita ser livre e feliz junto, onde o ideal é a alternância entre um eu sozinho e um eu com.

Em nosso país, como registro histórico, a mulher casada até o ano de 1962 era relativamente incapaz, ou seja, qualquer ato seu só seria válido se confirmado pelo marido, ficava em condição similar ao dos índios. Quem a colocou em pé de igualdade com o seu consorte foi a Lei nº 4.121, de 27 de agosto de 1962, que “dispõe sobre a situação jurídica da mulher casada”. No entanto o chefe do lar não era ela, tal como se lia no Código Civil de 1916, após a edição do Estatuto da Mulher Casada: “Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos.”

De outra banda, merece, também, lançar neste tópico a evolução da, porque não dizer, família homoafetiva. Neste tanto, até meados do século XX, a homossexualidade era tida por doença[2] e, sendo assim, jamais se poderia cogitar de direitos daqueles humanos que portassem tal condição.

Veio à tona maior visibilidade do assunto em comento, no episódio denominado de Rebelião de Stonewall, em 1969, na cidade de Nova York. Daí porque no-lo dizem Lima e Veloso (2011)

A Rebelião de Stonewall foi um violento conflito na cidade de Nova Iorque em que, pela primeira vez, um grande número de gays, lésbicas, bissexuais e trangêneros enfrentou a polícia em protesto aos maus tratos sofridos por quem possuía uma orientação sexual diferente da considerada ‘normal’.

A ocorrência acima mencionada, por óbvio, deu nascença a estudos sobre a homoafetividade e, mais que isso, fez com que os homossexuais, de um modo geral, reivindicassem espaço perante a sociedade, advindo o conhecido movimento gay.

Volta à tona Lima e Veloso (2011) ao elucidarem que

Em 1973 a Associação Americana de Psiquiatria deixou de classificar a homossexualidade como transtorno mental. Uma grande conquista conseguida no Brasil em 1985 foi a retirada da homossexualidade como desvio sexual pelo Conselho Federal de Medicina. Cinco anos mais tarde foi a vez de a OMS (Organização Mundial de Saúde) retirar a homossexualidade de sua lista de doenças mentais.

Na linha de tal historicidade, em nossa pátria, Rodrigo Couto (2010) assinala que

Em 1999, o Conselho Federal de Psicologia baixou uma resolução que reforça o tom e estabelece regras para a atuação dos psicólogos em relação à orientação sexual. ‘Foi um momento histórico e importante, com outras decisões, para proteger os direitos humanos. À época, os 16 conselhos regionais referendaram a decisão e os movimentos dos homossexuais fizeram grandes manifestações de apoio’, lembra Ana Bock, então presidente do CFP e responsável por assinar a resolução que criou as normas.

Ultimamente, no campo da homoafetividade, Lima e Veloso (2011) esclarecem o fato de que

No Brasil, é perceptível também a mudança de tratamento dada a gays, lésbicas, bissexuais e transexuais, identificados pela sigla LGBT, principalmente a partir do fim do período da Ditadura Militar. As escolas e a mídia, antes mais preocupadas em não entrar na questão polêmica, passaram a propagar a necessidade de garantir-se tratamento igualitário a quem possui orientação sexual diferente da heterossexual.

Entrementes, com a Constituição de 1988, sensíveis foram as alterações. Destaca-se, entre elas, a igualdade entre os sexos, quando o art. 5º, I, afirma que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição” e a família transpondo os umbrais da dominação marital, uma vez que a própria Lei Suprema averba a seguinte redação:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...]

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

Dito isso, observa-se, com meridiana clareza, que os vínculos coercitivos que marcavam as famílias do passado desapareceram para dar lugar à busca da felicidade, do amor, do companheirismo, sempre resguardando o princípio da dignidade da pessoa humana e evitando qualquer modalidade de discriminação, como se infere da mesma Magna Carta, em seu artigo 3º, IV: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

Soa oportuna a lira de Neto (2010) ao afirmar que “Essa família, mais sublimada nas suas ligações libidinais, caracteriza-se como um grupo regulado pelo sentimento do amor, no qual os adultos, independente de serem homens ou mulheres, estão a serviço do grupo e principalmente das crianças.”

Não é à toa que a família homoafetiva, e assim entendo que deva ser chamada, está ganhando contornos de reconhecimento mundial, pois veja-se:

a) a orientação sexual encontra-se – e assim deve sê-lo – entronizada no ser humano, que deve ser respeitado em seus direitos no mundo de suas emoções e sentimentos, independentemente de qualquer mensuração outra que não a própria condição humana, ou seja, tendo o sagrado “direito a ser humano”;

b) qualquer tratamento diferenciado que venha a ser proclamado em razão da orientação sexual, além de ser uma verdadeira violência psíquica, é uma ofensa à norma constitucional que prioriza o cânone da isonomia.

Evoco aqui o escrito de Luiz Caversan (2011), da Folha de São Paulo, ao registrar:

“Chega de meios termos: homofobia é crime, sim.

Se não está previsto em lei ainda é porque nós somos atrasados em tudo ou quase.”

Mesmo em nossa plaga, onde a sociedade caminha no rumo de perceber e acolher o conceito múltiplo de família, já existe o projeto de lei nº 122/2006, que restara aprovado pelo plenário da Câmara para tipificar o crime de preconceito de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero, o qual se encontrava na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa no Senado Federal de 29 de março de 2012 até 14 de maio de 2012, donde voltara para a relatoria da nobre Senadora Marta Suplicy.

Todavia, na data de 25 de maio de 2012, a Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou o projeto de lei que torna legal a união estável entre pessoas do mesmo sexo, como noticia o site Espaço Vital:

“Transforma assim em lei os entendimentos do STF e do STJ sobre a matéria (...). O texto do projeto de lei prevê que, "para a união estável ser convertida em casamento, é preciso que o casal declare em cartório não ter impedimentos para casar”".  (Os itálicos pertencem à fonte, porém as reticências de os parênteses escritos não).”

Além desta medida, o legislador brasileiro, mormente diante da indeterminação dos conceitos em Direito de Família, acrescido da mutabilidade de tais institutos em razão dos avanços tecnológicos, somado ao fato de que o Código Civil de 2002 tivera gênese em projeto de lavra do saudoso professor Miguel Reale na década de 60 do século passado, entende, por bem em criar um microssistema para a proteção do complexo familiar, cognominado estatuto das famílias, e, em especial, quanto a união homoafetiva vem apontado que:

“O estágio cultural que a sociedade brasileira vive, na atualidade, encaminha-se para o pleno reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar. A norma do art. 226 da Constituição é de inclusão - diferentemente das normas de exclusão das Constituições pré-1988 -, abrigando generosamente os arranjos familiares existentes na sociedade, ainda que diferentes do modelo matrimonial. A explicitação do casamento, da união estável e da família monoparental não exclui as demais que se constituem como comunhão de vida afetiva, com finalidade de família, de modo público e contínuo. Em momento algum a Constituição veda o relacionamento de pessoas do mesmo sexo. A jurisprudência brasileira tem procurado preencher o vazio normativo infraconstitucional, atribuindo efeitos pessoais e familiares às relações entre essas pessoas. Ignorar essa realidade é negar direitos às minorias, incompatível com o Estado Democrático. Tratar essas relações cuja natureza familiar salta aos olhos como meras sociedades de fato, como se as pessoas fossem sócios de uma sociedade de fins lucrativos, é violência que se perpetra contra o princípio da dignidade das pessoas humanas, consagrado no art. 1º, III, da Constituição. Se esses cidadãos brasileiros trabalham, pagam impostos, contribuem para o progresso do país, é inconcebível interditar- lhes direitos assegurados a todos, em razão de suas orientações sexuais.”

Não é outro, como já se assinalou,  o viés mundial quanto à homoafetividade, como se observa:

a) no Brasil o casamento de homossexual foi deflagrado por decisão do Supremo Tribunal Federal – STF, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.277. Por efeito desta decisão, permitiu-se à magistratura nacional a convolação de união estável em casamento. Os juízes, após a ímpar decisão da Suprema Corte, passaram a proceder a conversão da União Estável homoafetiva em casamento, onde, dentre outras, colige-se esta brilhante decisão prolatada pela iminente  juíza Junia de Souza Antunes, da 4ª Vara de Família de Brasília,  que passa, para conhecimento de todos, a dar-lhe publicidade abaixo:

b) na Argentina, primeiro país da América do Sul que admite o casamento gay, o mesmo viera à baila através da aprovação da lei pelo Senado, mediante o cômputo de 33 votos, com o apoio da presidente Cristina Kirchner, conforme notícia infra:

Depois de 14 horas de discussão, o Senado da Argentina aprovou na madrugada desta quinta-feira (15) a lei que autoriza o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo no país.

A decisão, apoiada pela presidente Cristina Kirchner, transforma o país no primeiro da América Latina a permitir o casamento gay.

Assim, a Argentina é décimo país no mundo a autorizar casamento entre pessoas do mesmo sexo, depois de Holanda, Bélgica, Espanha, Canadá, África do Sul, Noruega, Suécia, Portugal e Islândia.

c) Na Europa, o casamento homoafetivo já é de todo sedimentado na Holanda, Bélgica, Espanha, Noruega, Suécia, Islândia e Portugal.

d) No Canadá e na África do Sul o matrimônio homoafetivo também recebe aplauso do ordenamento jurídico.

e) Já existem três estados dos Estados Unidos que admitem enlace entre pessoas do mesmo sexo, daí porque na campanha presidencial hodierna tem-se que:

Casamento gay: Obama vinca diferenças para Romney.

Candidato republicano considera que o matrimónio “é a união entre homem e mulher”

Barack Obama assumiu ser a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo e o tema passou a ser o mais abordado nos Estados Unidos, lançando pistas para a campanha Presidencial. As diferenças para Mitt Romney são grandes, nomeadamente nestas questões fraturantes.

Enquanto o atual Presidente americano dizia em entrevista à ABC: “Para mim, é importante que os casais do mesmo sexo possam casar. Esta ideia tem que avançar”; Mitt Romney, o candidato republicano, vai na direção oposta: “Creio que o matrimónio não é outra coisa senão a união entre homem e mulher”.

Registro com muito pesar, no que tange ao casamento homoafetivo que “em cinco nações esse ato é punido com pena de morte, e em 39 dá direito à prisão. Pasme-se, isto em pelo século XXI, onde prima-se pela liberdade.

Porém, no contexto histórico as barbáries vêm cedendo passo à evolução dos conceitos arrimados na dignidade da pessoa humana, que independe da orientação sexual. O mesmo já ocorrera com as mulheres, que em épocas não muito recuadas, eram tidas como seres despidas de alma, mormente no período medieval, onde uma rainha só assumia tal posto quando seu marido havia de ir para a guerra!

4 – O COMPLEXO DE ÉDIPO

4.1 – Noções gerais

O pai da Psicanálise valera-se de um mito para explicar a sexualidade em uma das fases de seu transcurso nas crianças[3], denominando-o “complexo de Édipo”, uma vez que o mesmo deflagra na chamada fase fálica – quando da descoberta pelo infante de seus órgãos genitais.

Sendo assim, deve-se transcrever o referido mito, onde se vale do texto de João Neto (2010), conforme se segue:

O termo Édipo utilizado por Freud vem da mitologia grega e, de alguma forma, já traduzia uma ideia presente no imaginário humano.

 Édipo, filho de Laio e de Jocasta, herdeiro da maldição que assolava os Labdácias, foi abandonado ao nascer no Monte Citerão, já que Apolo havia predito a seu pai que se ele gerasse um filho, este o mataria. O criado, encarregado de executar essa missão, perfurou-lhe os pés com um gancho de forma a poder suspender o menino numa árvore. Isso explica o fato pelo qual, ao ser encontrado por alguns pastores, foi chamado Édipo, que em grego significa “pés inchados”. Foi levado ao rei de Corinto, Pólibo, que, por não ter filhos, embora fosse casado com a rainha Peribéia, o adotou. Em certa ocasião, o jovem participava de um banquete, quando um coríntio referiu-se indiscretamente ao jovem como filho postiço. Intrigado, Édipo resolveu consultar o oráculo de Delfos para saber sua real origem. Além de não obter uma resposta precisa, o jovem se defrontou com uma revelação aterrorizante.

A resposta que Édipo recebeu é que, não somente mataria seu pai, mas desposaria sua própria mãe, gerando uma raça maldita. No intuito de evitar uma tragédia, desesperado, resolveu fugir de Corinto, deixando para trás Pólibo e Peribéia, quem de fato acreditava serem seus pais verdadeiros. A caminho da Fócida, onde as estradas de Cáulis e Tebas se bifurcam, o pobre rapaz se deparou com Laio e sua escolta, composta por quatro pessoas além do rei: o arauto, um cocheiro e mais dois escravos. Laio, cheio de empáfia, ordenou-lhe que desse passagem ao rei de Tebas. Como Édipo se recusasse sequer a alterar o passo, teve um de seus cavalos executados pelo rei. Ignorando a verdadeira identidade do rei, Édipo o atacou com grande violência, utilizando o cajado que trazia consigo, acabando por matá-lo.

 

Chegando à Tebas, deparou com a Esfinge, monstro com cabeça e busto de mulher, patas de leão, corpo de cão, cauda de dragão e asas como as das Harpias.

 Instalada à entrada da cidade, mais precisamente no Monte Ficeu, propunha aos forasteiros que ali chegavam um enigma de grande complexidade e de difícil resolução. Os que não fossem capazes de decifrá-lo eram sumariamente eliminados, pois a criatura além de matar, devorava sua vítima. O monstro já havia feito muitas vítimas e os habitantes estavam alarmados quando Édipo, buscando exílio, chegou a Tebas. Ao enfrentá-la, foi recebido com a seguinte pergunta: ‘Qual é o animal que pela manhã tem quatro pés, ao meio dia dois e à tarde três?’ Édipo sem dificuldade respondeu que este animal era o homem, que na infância engatinha, depois passa a caminhar com os dois pés e na velhice, com o peso dos anos, necessita de uma bengala, ou seja, de uma terceira perna para se sustentar. Como já estava previsto pelo destino que no dia que alguém lograsse decifrar seu enigma a Esfinge morreria, ela precipitou-se do alto de um precipício e morreu espatifada contra os rochedos.

Aclamado pela população agradecida, tornou-se rei, e, por conseguinte, recebeu também a mão da rainha Jocasta em casamento. Em outras palavras, Édipo cumpriu a segunda e última parte da profecia, pois ao casar-se com a rainha, desposava na verdade, sua própria mãe. Quatro filhos foram gerados desta união: Etéocles, Polinice, Antígona e Ismena. O rei de Tebas reinou durante anos tranqüilamente até o dia em que a população local começou a ser assolada por uma peste. O oráculo, novamente consultado, declarou que para cessar a epidemia, se fazia necessário encontrar o assassino de Laio e bani-lo definitivamente de Tebas. Tirésias, o grande vidente cego, trazido até a corte revelou a verdade sobre o crime e esclareceu a identidade e a história de Édipo. Jocasta, humilhada e sem poder suportar a vergonha, suicidou-se. Édipo, ao lado do corpo de sua mãe, vazou seus olhos.

Nota-se, então, que por trás desse mito tem-se a barreira do incesto, a figura simbólica da castração (o gancho nos pés de Édipo), a curiosidade como estímulo para manter desejos proibidos (filho postiço) e, por fim, uma grande culpa quando se realiza às claras a incestuosidade (Édipo vazara seus olhos).

O sexo, como representação, denota uma ambiguidade entre o permitido e o interditado e, exatamente por causa dele, poderá advir neuroses, psicoses, perversões e sintomas psicossomáticos, como no-lo ensina João Ferreira (2008)[4].

Derradeiramente, de modo muito simplista, pode-se dizer que o complexo de Édipo seria uma ligação erótica entre a criança e o seu cuidador do sexo oposto.

4.2 – Visão estática – Freud

Freud, tanto na análise de seus pacientes quanto em sua própria autoanálise, percebeu que havia uma ligação estreita – de cunho erótico – entre a mãe e seu filho e a filha e seu pai, de jeito que este liame adviria da libido. 

A tal processo nomeou, valendo-se da cultura grega do complexo de Édipo – dado que, ao perceber a questão trinária do aparelho psíquico, ancorou-se na filosofia platônica (FREUD, 1923).

Prosseguindo, é de bom alvitre lançar mão do gizado por Neto (2010) ao afirmar o seguinte:

O complexo de Édipo caracteriza-se por sentimentos contraditórios de amor e hostilidade. Metaforicamente, este conceito é visto como amor à mãe e ódio ao pai, mas esta ideia permanece, apenas, porque o mundo infantil resume-se a estas figuras parentais ou aos representantes delas.

O autor ainda exemplifica as interdições que geram o complexo em análise, aduzindo:

A criança não pode mais fazer certas coisas porque já está ‘grandinha’, não pode mais passar a noite inteira na cama dos pais, andar pelado pela casa ou na praia, é incentivada a sentar de forma correta e controlar o esfíncter, além de outras cobranças. Neste momento, a criança começa a perceber que não é o centro do mundo e precisa renunciar à sua ilusão de proteção e amor total. (grifo do autor)

Sintetizando, a visão freudiana do complexo de Édipo é limitadora, dir-se-ia estanque, porque dá-se a idéia de um conflito de sentimentos ambíguos (amor versus ódio), entre o infante e o pai – cuidador – do sexo oposto, porém na verdade não é de sentimento que se trata, mas sim de uma questão puramente sexual – corpos que desejam tocar-se profundamente (NÁSIO, 2007).

4.3 – Objeto parcial e complexo de Édipo - Melanie Klein

O seio da mãe representa para o bebê, ora um objeto bom – quando o sacia e ora um objeto mal, quando ausenta-se. Sendo assim, a criança, na mais tenra idade, tem o desejo quando possui o seio em sua boca de introjetá-lo em si mesma, aparecendo uma cena de destruição do objeto parcial. Sequencialmente, na ausência dele, projeta a sua existência, o que se denominaria de um momento esquizoparanóide.

A posição subseqüente, Melanie Klein denomina de depressiva, onde surge sentimentos de amorosidade e, neste passo, advém, a seu ver, o complexo de Édipo como enfatiza Oliveira e Amaral (2009). A explicação desta transição é singela, pois os atos que marcam a posição esquizoparanóide são destruidores/persecutórios e na escala depressiva surge o desejo da criança reparar tais cometimentos, agradando seus genitores. Sem a presença do Édipo, evidentemente, não se transporia da posição esquizoparanóide para a depressiva. Daí porque Klein (1921-1945) relata o fato de “O superego se desenvolve a partir dessas figuras introje­tadas – as identificações da criança – influen­ciando, por sua vez, a relação com os pais e todo o desenvolvimento sexual.”

4.4 – Prisma lacaniano

Para Lacan, no complexo edípico, existem três tempos, a saber:

1º tempo: a criança em tal momento possui um desejo, consistente em satisfazer o desejo da mãe, “to be or not to be” o objeto de desejo da mãe, ou seja, em se excitando apresenta-se à genitora. A mãe, neste instante, é o espelho do desejo do filho e é satisfazê-la que ele deseja, surgindo a etapa fálica primitiva consistente numa relação de identificação, que se houver extrapolação poderá resultar na perversão.

2º tempo: aqui surge a figura do pai, que corta o profundo liame entre o filho e a mãe, representando aquele a lei. O caráter decisivo do Édipo deve ser isolado como relação, não com o pai, mas com a palavra do pai. O pai onipotente é aquele que priva a mãe, no segundo tempo. Desvio nesta etapa fará advir psicose.

João Neto (2010) esclarece sobre

as ameaças verbais que visam proibir à criança suas práticas auto-eróticas e obrigá-la a renunciar a suas fantasias incestuosas. Mas no fundo, o verdadeiro desejo que se vê restringido é o de possuir a mãe e de tomar o lugar do pai, do que a criança abre mão pelo medo de ver perder seu pênis, já que existem outros que supostamente o perderam.

3º tempo: o pai pode dar a mãe o que ela deseja, porque o possui – o falo. Aqui intervém a potência no sentido genital da palavra. A identificação que pode ser feita com a instância paterna realiza-se, portanto, nesses três tempos.

Pondo luz sobre o assunto, registra Elisa Alvarenga[5]: “Na mulher, a terceira etapa é diferente. Ela não tem que fazer esta identificação viril. A mulher sabe onde ele está, onde deve ir buscá-lo, do lado do pai, e vai em direção àquele que tem.”

4.5 – Contribuição ampliativa – Karen Horney

A autora, pelo que se percebe, dá muito mais ênfase à questão educacional e sociocultural da criança na fase edípica, do que à uma biologização fenomenológica, isto é, uma dimensão libidinal.

Sendo assim, argumenta que

O complexo de Édipo tal como se revela no consultório psicanalítico não é gerado por fatores inscritos na natureza humana e no desenvolvimento da libido, mas por determinadas condições culturais[6]: desarmonia do casal devido às relações conflitivas entre os sexos, poder autoritário ilimitado por parte dos pais; tabus em todo e qualquer meio de expressão sexual da criança; tendência para conservar o filho em estágio infantil e emocionalmente dependente dos pais. Em vez de ser causa da neurose, o complexo é uma formação neurótica cuja causa está nos fatores culturais. (HORNEY, 1972).

Prosseguindo, a autora em foco traz mais dois elementos que compõem a estrutura do complexo de Édipo, quais sejam:

a) excesso de estímulo dos pais em relação às zonas erógenas da criança ou, ainda, um ambiente por demais sexualizado;

b) angústia avassaladora no infante, decorrente do desrespeito dos pais para com ele e, igualmente, eventual sensação de isolamento que o atravesse.

Por conta disso, Karen Horney (1972), elucida:

Uma das maneiras de acalmar esta angústia é apegar-se a um deles, a fim de receber o afeto tranquilizador de que necessita. O quadro que resulta disso tudo pode parecer exatamente com o que Freud descreveu como sendo o Complexo de Édipo. Mas no apego provocado principalmente pela angústia, o elemento sexual não seria o essencial. Na ligação afetiva incestuosa a finalidade é o amor, ao passo que na ligação afetiva condicionada pela angústia a meta é a segurança.

4.6 – Aspecto espiritual e matrilinear – Malinowski

O etnólogo Malinowski pesquisou junto a ilhéus de Trobriand o papel da cultura na formação do complexo edípico, uma vez que na sociedade trobriandese a família era matrilinear e a sexualidade não sofria qualquer interdição.

Tanto assim o é que

As crianças são inseridas no útero materno como minúsculos espíritos, geralmente pela ação do espírito de uma parenta morta da mãe. O marido desta tem de proteger e cuidar das crianças, recebê-las em seus braços quando nascem, mas não são dele, no sentido de que ele tenha contribuído de alguma forma na sua procriação. O pai é assim um amigo amado, benevolente, mas não é reconhecido como parente dos filhos. O parentesco real, isto é a identidade da substância, o mesmo corpo, só existe através da mãe. (MALINOWSKI, 1973) (grifo do autor)

No que tange a inexistência de repressão com relação à sexualidade da criança, no-lo diz Malinowski (1973):

[...] a sexualidade infantil segue canais institucionalizados dentro dos quais ela pode se expressar livremente, sem nenhum tipo de controle ou censura. A partir do momento em que o menino ou a menina fazem quatro ou cinco anos, já há uma expectativa generalizada de que ela se interessará pelos prazeres genitais e que os exercerá, em forma de brincadeira, com as crianças do outro sexo. Esse deslocamento da sexualidade infantil objetos alternativos seria um dos fatores que fazem com ‘que todo o desejo infantil pela mãe se extinga gradualmente de maneira natural e espontânea’.

Como se vê, na sociedade trobriandese, o complexo de Édipo se diluiria porque não haveria a figura paterna como a impositora de uma ordem autoritária, uma fez que era o tio, irmão da mãe, que cuidava do menino a partir  de seis anos, fazendo com que ele, ao trabalhar na terra deste seu parente, sentisse que ela era sua aldeia e não aquela que pertencia ao seu pai e onde ele até então vivia, de modo que era esse tio quem “representa e encarna o princípio da disciplina e do poder executivo.”, como bem enfatiza Josefina Pimenta Lobato (1999).

4.7 – Caracterização sob o ponto de vista de Násio

Násio (2007), por sua vez, visualiza no complexo de Édipo uma questão que nada tem de sentimento, mas sim de sexo em sua acepção pura.

Tanto assim o é, que para ele

o complexo de Édipo não é uma história de amor e ódio entre pais e filhos, é uma história de sexo, isto é, uma história de corpos que sentem prazer em se acariciar, se beijar e se morder, em se exibir e se olhar, em suma, corpos que sentem tanto prazer em se tocar quanto em se fazer mal.

Em outras palavras, a criança edípica apenas imita os gestos sexuais de seus pais, fazendo isso movida por fantasias como objeto de desejo. Logo, no Édipo, que se dá por volta dos quatro anos de idade, a criança se vê tolhida dos desejos sexuais em relação aos seus genitores (ocorre uma transição “de um desejo selvagem para um desejo socializado”). A próxima erupção dele manifesta-se na puberdade e, também, na vida adulta, em havendo conflito na área da afetividade poderão reaparecer as fantasias encobertas como comportamentos neuróticos (fobia, histeria e obsessão).

4.8 – Dimensão contemporânea – João Neto

Anota o psicanalista em pauta, na pegada de seus antecedentes, que no complexo de Édipo existe uma clara ambigüidade entre a criança e o genitor do sexo oposto, pois lhe dirige sentimentos hostis e ao mesmo tempo o ama. Porém, tem ele uma contribuição notável, abrangendo um viés mais espiritualizado do Édipo, ao averbar: “Com o aparecimento do complexo de Édipo, a criança sai do reinado exclusivo dos instintos e passa para um plano mais racional.” (NETO, 2010).

O estudioso em comento ressalta algo de grande relevo:

Mas a forma original, conforme Freud a notou, é apenas uma simplificação ou esquematização relativamente à complexidade da experiência, porque o menino não vai ter apenas a possibilidade de uma escolha objetal terna dirigida à mãe, mas, ao mesmo tempo, pode ter uma atitude ambivalente comportando-se como uma menina, demonstrando uma atitude feminina terna em relação ao pai e a atitude correspondente de hostilidade ciumenta em relação à mãe.

5 – DIREITOS RECONHECIDOS AOS PAIS HOMOAFETIVOS

5.1 – Dignidade da pessoa humana e igualdade

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que homenageia a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), a orientação sexual não mais é um entrave para diferenciar a espécie hominal. O Direito, como norma, não mais é o centro do sistema protetivo, mas sim é o Homem[7] que deve merecer toda atenção justa da lei.

É por isso que a jurista de vanguarda Maria Berenice Dias (2007), brada imorredouramente que “enquanto houver tratamento desigualitário em razão do gênero e a homossexualidade for vista como crime, castigo ou pecado, não se estará vivendo em um Estado que respeita a dignidade humana, tendo a igualdade e a liberdade como princípios fundamentais.”

5.2 – Reconhecimento da união estável pelo Supremo Tribunal Federal e suas consequências

Considerando a igualdade entre os humanos como norte para evitar a discriminação (Lei das Leis, art. 3º, IV) e, ainda, o respeito à dignidade da pessoa humana como a pedra fundamental de uma sociedade livre, justa e solidária – objetivo da República Federativa do Brasil (CF, art. 3º, I) – outra não poderia ter sido a louvável posição do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a união estável dos pares homoafetivos para todos os fins de direito, na ADPF nº 132-RJ.

Colhe-se excertos de votos dos eméritos ministros da Augusta Corte Constitucional Pátria:

a) Ministro Ayres Britto:

“ (...) Com o que este Plenário terá bem mais abrangentes possibilidades de, pela primeira vez no curso de sua longa história, apreciar o mérito dessa tão recorrente quanto intrinsecamente relevante controvérsia em torno da união estável entre pessoas do mesmo sexo, com todos os seus consectários jurídicos. Em suma, estamos a lidar com um tipo de dissenso judicial que reflete o fato histórico de que nada incomoda mais as pessoas do que a preferência sexual alheia, quando tal preferência já não corresponde ao padrão social da heterossexualidade.  É a perene postura de reação conservadora aos que, nos insondáveis domínios do afeto, soltam por inteiro as amarras desse navio chamado coração.  (...)

(...)  Pedido de “interpretação conforme à Constituição” do dispositivo legal impugnado (art. 1.723 do Código Civil), porquanto nela mesma, Constituição, é que se encontram as decisivas respostas para o tratamento jurídico a ser conferido às uniões homoafetivas que se caracterizem por sua durabilidade, conhecimento do público (não-clandestinidade, portanto) e continuidade, além do propósito ou verdadeiro anseio de constituição de uma  família.  Ainda nesse ponto de partida da análise meritória da questão, calha anotar que o termo “homoafetividade”, aqui utilizado para identificar o vínculo de afeto e solidariedade entre os pares ou parceiros do mesmo sexo, não constava dos dicionários da língua portuguesa. O vocábulo foi cunhado pela vez primeira na obra “União Homossexual, o Preconceito e a Justiça”, da autoria da desembargadora aposentada e jurista Maria Berenice Dias, consoante a seguinte passagem: “Há palavras que carregam o estigma do preconceito. Assim, o afeto a pessoa do mesmo sexo chamava-se 'homossexualismo'. Reconhecida a inconveniência do sufixo 'ismo', que está ligado a doença, passou-se a falar em 'homossexualidade', que sinaliza um determinado jeito de ser. Tal mudança, no entanto, não foi suficiente para pôr fim ao repúdio social ao amor entre iguais” (Homoafetividade: um novo substantivo)”.

(...) Trata-se, isto sim, de um voluntário navegar por um rio sem margens fixas e sem outra embocadura que não seja a experimentação de um novo a dois que se alonga tanto que se faz universal. E não compreender isso talvez comprometa por modo irremediável a própria capacidade de interpretar os institutos jurídicos há pouco invocados, pois − é Platão quem o diz -,  “quem não começa pelo amor nunca saberá o que é filosofia”. É a categoria do afeto como pré-condição do pensamento, o que levou  Max Scheler a também ajuizar que “O ser humano, antes de um ser pensante ou volitivo, é um ser amante” (...)

(...) Textos recolhidos de ensaio escrito por Sérgio da Silva Mendes e a ser publicado no XX Compedi, com nome de “Unidos pelo afeto, separados por um parágrafo”, a propósito, justamente, da questão homoafetiva perante o §3º do art. 226 da CF (...) 

(...) Prossigo para ajuizar que esse primeiro trato normativo da matéria já antecipa que  o sexo das pessoas, salvo expressa disposição constitucional em contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica.  É como dizer: o que se tem no dispositivo constitucional aqui reproduzido em nota de rodapé (inciso IV do art. 3º) é a explícita vedação de tratamento  Discriminatório ou preconceituoso em razão do sexo dos seres humanos. Tratamento discriminatório ou  desigualitário  sem causa que, se intentado pelo comum das pessoas ou pelo próprio Estado, passa a colidir frontalmente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos” (este o explícito objetivo que se lê no inciso em foco). (...) (ausentes parênteses e reticências na fonte)

b) Ministra Cármen Lúcia:

(...) Observo, inicialmente, que a conquista de direitos é tão difícil quanto curiosa. A luta pelos direitos é árdua para a geração que cuida de batalhar pela sua aquisição. E parece uma obviedade, quase uma banalidade, para as gerações que os vivem como realidades conquistadas e consolidadas.

Bobbio afirmou, na década de oitenta do séc. XX, que a época não era de conquistar novos direitos, mas tornar efetivos os direitos conquistados. 

Este julgamento demonstra que ainda há uma longa trilha, que é permanente na história humana, para a conquista de novos direitos. A violência continua, minorias são violentadas, discriminações persistem. Veredas há a serem palmilhadas, picadas novas há a serem abertas para o caminhar mais confortável do ser humano.

(...)

O que se enfatiza, na multiplicidade de peças que compõem os autos, a partir da petição inicial, é que a união entre pessoas do mesmo sexo haveria de ser respeitada e assegurada pelo Estado, com base na norma para a qual se pede a interpretação conforme à Constituição, ao argumento de que definir a união estável entre homem e mulher e excluir outras opções contrariaria preceitos constitucionais fundamentais, como os princípios da liberdade, da intimidade, da igualdade e da proibição de discriminação.

Faço-o enfatizando, inicialmente, que não se está aqui a discutir, nem de longe, a covardia dos atos, muitos dos quais violentos, contrários a toda forma de direito, que a manifestação dos preconceitos tem dado mostra contra os que fazem a opção pela convivência homossexual.

Contra todas as formas de preconceito, contra quem quer que  seja, há o direito constitucional. E este é um tribunal que tem  a função precípua de defender e garantir os direitos constitucionais.

E, reitere-se, todas as formas de preconceito merecem repúdio de todas as pessoas que se comprometam com a justiça, com a democracia, mais ainda os juízes do Estado Democrático de Direito.

Até porque, como afirmaram muitos dos advogados que assumiram a tribuna, a escolha de uma união homoafetiva é individual, íntima e, nos termos da Constituição brasileira, manifestação da liberdade individual. Talvez explicasse isso melhor Guimarães Rosa, na descrição de Riobaldo, ao encontrar Reinaldo/Diadorim: “enquanto coisa assim se ata, a gente sente mais é o que o corpo a próprio é: coração bem batendo. ...o real roda e põe diante. Essas são as horas da gente. As  outras, de todo tempo, são as horas de todos...amor desse, cresce primeiro; brota é depois. ... a vida não é entendível”  (Grande sertão: veredas).

É certo; nem sempre a vida é entendível. E pode-se tocar a vida sem se entender; pode-se não adotar a mesma escolha do outro; só não se pode deixar de aceitar essa escolha, especialmente porque a vida é do outro e a forma escolhida para se viver não esbarra nos limites do Direito. Principalmente, porque o Direito existe para a vida, não a vida para o Direito. (inocorrentes reticências e parênteses no texto primígeno)

c) Ministro Ricardo Lewandowski

(...) Como, então, enquadrar-se, juridicamente, o convívio duradouro e ostensivo entre pessoas do mesmo sexo, fundado em laços afetivos, que alguns – a meu ver, de forma apropriada - denominam de “relação homoafetiva”?

Ora, embora essa relação não se caracterize como uma união estável, penso que se está diante de outra forma de entidade familiar, um quarto gênero, não previsto no rol encartado no art. 226 da Carta Magna, a qual pode ser deduzida a partir de uma leitura sistemática do texto constitucional e, sobretudo, diante da necessidade de dar-se concreção aos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da liberdade, da preservação da intimidade e da não-discriminação por orientação sexual aplicáveis às situações sob análise. 

Entendo que as uniões de pessoas do mesmo sexo que se projetam no tempo e ostentam a marca da publicidade, na medida em que constituem um dado da realidade fenomênica e, de resto, não são proibidas pelo ordenamento jurídico, devem ser reconhecidas pelo Direito, pois, como já diziam os jurisconsultos romanos, ex facto oritur jus.]

Creio que se está, repito, diante de outra entidade familiar, distinta daquela que caracteriza as uniões estáveis heterossexuais.

A diferença, embora sutil, reside no fato de que, apesar de semelhante em muitos aspectos à união estável entre pessoas de sexo distinto, especialmente no que tange ao vínculo afetivo, à publicidade e à duração no tempo, a união homossexual não se confunde com aquela, eis que, por definição legal, abarca, exclusivamente, casais de gênero diverso.

Para conceituar-se, juridicamente, a relação duradoura e ostensiva entre pessoas do mesmo sexo, já que não há previsão normativa expressa a ampará-la, seja na Constituição, seja na legislação ordinária, cumpre que se lance mão da integração analógica.

Como se sabe, ante a ausência de regramento legal específico, pode o intérprete empregar a técnica da integração, mediante o emprego da analogia, com o fim de colmatar as lacunas porventura existentes no ordenamento legal, aplicando, no que couber, a disciplina normativa mais próxima à espécie que lhe cabe examinar, mesmo porque o Direito, como é curial, não convive com a anomia.

Visto isso, resta, então, estabelecer se o rol de entidades familiares, definido no art. 226 da Constituição, é taxativo ou meramente exemplificativo. Valho-me, no ponto, de um trecho, abaixo transcrito, de instigante artigo da lavra de Suzana Borges Viegas de Lima:

"Para demonstrar que as relações homoafetivas constituem verdadeiras entidades familiares, temos como ponto de partida o rol descrito no artigo 226 da Constituição Federal, que, em nossa opinião, não é  numerus clausus, e sim um rol exemplificativo, dada a natureza aberta das normas constitucionais. Para tanto, é essencial que se considere a evolução da família a partir de seus aspectos civis e constitucionais, buscando nos fenômenos da publicização e constitucionalização do Direito de Família, e, também, na repersonalização das relações familiares, os elementos para a afirmação das relações homoafetivas. A partir disso, encontramos um vasto campo para uma análise mais aprofundada da proteção legal das relações homoafetivas, assim como dos direitos que delas emanam, segundo o ordenamento jurídico vigente". ( VIEGAS DE LIMA, Suzana Borges.  Por m estatuto jurídico das relações homoafetivas: uma perspectiva civil-constitucional. Direito Civil Constitucional. Brasília: Editora Obcursos, 2009, p.47.)

(...) Não há, ademais, penso eu, como escapar da evidência de que a união homossexual, em nossos dias, é uma realidade de elementar constatação empírica, a qual está a exigir o devido enquadramento jurídico, visto que dela resultam direitos e obrigações que não podem colocar-se à margem da proteção do Estado, ainda que não haja norma específica a assegurá-los. (...) (apôs-se parênteses e reticências)

d) Ministro Marco Aurélio

(...)

Pois bem, eis o cerne da questão em debate: saber se a convivência pública, duradoura e com o ânimo de formar família, por pessoas de sexo igual deve ser admitida como entidade familiar à luz da Lei Maior, considerada a omissão legislativa. Em caso positivo, cabe a aplicação do regime previsto no artigo 1.723 do Código Civil de 2002?

(...)

Em 19 de agosto de 2007, em artigo intitulado “A igualdade é colorida”, publicado na Folha de São Paulo, destaquei o preconceito vivido pelos homossexuais. O índice de homicídios decorrentes da homofobia é revelador. Ao ressaltar a necessidade de atuação legislativa, disse, então, que são 18 milhões de cidadãos considerados de segunda categoria: pagam impostos, votam, sujeitam se a normas legais, mas, ainda assim, são vítimas preferenciais de preconceitos, discriminações, insultos e chacotas, sem que lei específica a isso coíba. Em se tratando de homofobia, o Brasil ocupa o primeiro lugar, com mais de cem homicídios anuais cujas vítimas foram trucidadas apenas por serem homossexuais.

No fecho do artigo fiz ver: felizmente, o aumento do número de pessoas envolvidas nas manifestações e nas organizações em prol da obtenção de visibilidade e, portanto, dos benefícios já conquistados pelos heterossexuais faz pressupor um quadro de maior compreensão no futuro. Mesmo a reboque dos países mais avançados, onde a união civil homossexual é reconhecida legalmente, o Brasil está vencendo a guerra desumana contra o preconceito, o que significa fortalecer o Estado Democrático de Direito, sem dúvida alguma, a maior prova de desenvolvimento social.

Há não mais de sessenta anos, na Inglaterra, foi intensamente discutido se as relações homossexuais deveriam ser legalizadas.  As conclusões ficaram registradas no relatório Wolfenden, de 1957. Vejam que apenas seis décadas nos separam de leis que previam a absoluta criminalização da sodomia, isso no país considerado um dos mais liberais e avançados do mundo. Em lados opostos no debate, estavam o renomado professor L. A. Hart e o magistrado Lorde Patrick Devlin. O primeiro sustentava o respeito à individualidade e à autonomia privada e o segundo, a prevalência da moralidade coletiva, que à época repudiava relações sexuais entre pessoas de igual gênero (Os pontos de vista estão expressos nas obras seguintes: H. L. A. Hart,  Liberta and. Moralista, e Patrick Devlin, The enormemente desligado moral)

(…)

As garantias de liberdade religiosa e do Estado Laico impedem que concepções morais religiosas guiem o tratamento estatal dispensado a direitos fundamentais, tais como o direito à dignidade da pessoa humana, o direito à autodeterminação, o direito à privacidade e o direito à liberdade de orientação sexual.

A ausência de aprovação dos diversos projetos de lei que encampam a tese sustentada pelo requerente, descontada a morosidade na tramitação, indica a falta de vontade coletiva quanto à tutela jurídica das uniões homoafetivas. As demonstrações públicas e privadas de preconceito em relação à orientação sexual, tão comuns em noticiários, revelam a dimensão do problema. 

O reconhecimento de efeitos jurídicos às uniões estáveis representa a superação dos costumes e convenções sociais que, por muito tempo, embalaram o Direito Civil, notadamente o direito de família. A união de pessoas com o fim de procriação, auxílio mútuo e compartilhamento de  destino é um fato da natureza, encontra-se mesmo em outras espécies. A família, por outro lado, é uma construção cultural. Como esclarece Maria Berenice Dias (Manual de direito das famílias, 2010, p. 28), no passado, as famílias formavam-se para fins exclusivos de procriação, considerada a necessidade do maior número possível de pessoas para trabalhar em campos rurais. Quanto mais membros, maior a força de trabalho, mais riqueza seria possível extrair da terra. Os componentes da família organizavam-se hierarquicamente em torno da figura do pai, que ostentava a chefia da entidade familiar, cabendo aos filhos e à mulher posição de subserviência e obediência. Esse modelo patriarcal, fundado na hierarquia e no patrimônio oriundo de tempos imemoriais, sofreu profundas mudanças ao tempo da revolução industrial, quando as indústrias recém-nascidas passaram a absorver a mão de obra nos centros urbanos. O capitalismo exigiu a entrada da mulher no mercado de trabalho, modificando para sempre o papel do sexo feminino nos setores públicos e privados. A aglomeração de pessoas em espaços cada vez mais escassos nas cidades agravou os custos de manutenção da prole, tanto assim que hoje se pode falar em família nuclear, em contraposição à família extensa que existia no passado.

As modificações pelas quais a família passou não impediram a permanência de resquícios do modelo antigo, os quais perduraram – e alguns ainda perduram – até os dias recentes. Faço referência a países em que ainda há a proeminência do homem sobre a mulher, como ocorre no Oriente Médio, e os casamentos arranjados por genitores – feito por interesses deles e não dos nubentes –, que continuam a ter vez em determinadas áreas da Índia.

Especificamente no Brasil, o Código Civil de 1916 atribuía efeitos jurídicos somente à família tradicional, consumada pelo matrimônio entre homem e mulher, em vínculo indissolúvel. Família era apenas uma: aquela resultante do matrimônio. Os relacionamentos situados fora dessa  esfera estavam fadados à invisibilidade jurídica, quando não condenados à pecha da ilicitude, rotulados com expressões pouco elogiosas – lembrem-se dos filhos adulterinos, amásias e concubinas.

A situação foi mudando gradualmente. Primeiro, com a edição da Lei nº 4.121/62 – Estatuto da Mulher Casada, que atribuiu capacidade de fato à mulher, admitindo-lhe ainda a administração dos bens reservados. Em seguida, o divórcio, implementado pela Emenda Constitucional nº 9/77 e pela Lei nº 6.515/77, modificou definitivamente o conceito de família, ficando reconhecidas a dissolução do vínculo e a formação de novas famílias. 

O processo evolutivo encontrou ápice na promulgação da Carta de 1988. O Diploma é o marco divisor: antes dele, família era só a matrimonial, com ele, veio a democratização – o reconhecimento jurídico de outras formas familiares. (...) (demarcou-se com parênteses e reticências)

Bem se observou que o Supremo Tribunal Federal cuidou de espancar o vezo do preconceito, deitando raízes profundas, de modo indelével, calcado na garantia da não discriminação  por conta da diversidade da orientação sexual, fazendo questão de ostentar qual a verdadeira razão de ser do Homem  é a garantia de sua dignidade em todos os quadrantes da vida.

Seguindo esta trilha, o Superior Tribunal de Justiça, de vez por todas, autorizou o casamento civil homoafetivo, como se extrai de trechos do brilhante voto do Min. Luís Felipe Salomão (REsp. nº 1.183.378/RS):

Nesse contexto, a controvérsia instalada nos autos consiste em saber se é possível o pedido de habilitação para o casamento de pessoas do mesmo sexo, tendo as recorrentes recebido respostas negativas, tanto na esfera cartorária, quanto nas instâncias judiciais - sentença e acórdão de apelação.

O acórdão, além de invocar doutrina sobre teoria geral do direito e de hermenêutica jurídica, acionou os arts. 1.514, 1.535 e 1.565, todos do Código Civil de 2002, enfatizando as alusões aos termos ‘homem’ e ‘mulher’ ou ‘marido e mulher’, reciprocamente considerados, cuja união seria a única forma de constituição válida do casamento civil.

[...]

Ressalto que os óbices relativos às expressões ‘homem e mulher", utilizadas pelo Código Civil de 2002, art. 1.723, e pela Constituição Federal, art. 226, § 3º, foram afastados por esta Corte e pelo Supremo Tribunal Federal para permitir a caracterização de união estável entre pessoas do mesmo sexo, denominada ‘união homoafetiva’.

E continua o Ministro:

Por isso não se pode examinar o casamento de hoje como exatamente o mesmo de dois séculos passados, cuja união entre Estado e Igreja engendrou um casamento civil sacramental, de núcleo essencial fincado na procriação, na indissolubilidade e na heterossexualidade.

[...]

Com efeito, se é verdade que o casamento civil é a forma pela qual o Estado melhor protege a família, e sendo múltiplos os arranjos familiares reconhecidos pela Carta Magna, não há de ser negada essa via a nenhuma família que por ela optar, independentemente de orientação sexual dos partícipes, uma vez que as famílias constituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos núcleos axiológicos daquelas constituídas por casais heteroafetivos, quais sejam, a dignidade das pessoas de seus membros e o afeto.” (grifo do autor)

Confira, por oportuno, que o Supremo Tribunal Federal, por mais de uma vez, avaliza o viés da não discriminação entre seres humanos por questão de orientação sexual, afirmando:

União civil entre pessoas do mesmo sexo – alta relevância social e jurídico-constitucional da questão pertinente às uniões homoafetivas - legitimidade constitucional do reconhecimento e qualificação da união estável homoafetiva como entidade familiar: posição consagrada na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ADPF 132/RJ e ADI 4.277/DF) - o afeto como valor jurídico impregnado de natureza constitucional: a valorização desse novo paradigma como núcleo conformador do conceito de família - o direito à busca da felicidade, verdadeiro postulado constitucional implícito e expressão de uma ideia-força que deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa humana – alguns precedentes do Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte Americana sobre o direito fundamental à busca da felicidade - princípios de Yogyakarta (2006): direito de qualquer pessoa de constituir família, independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero - direito do companheiro, na união estável homoafetiva, à percepção do benefício da pensão por morte de seu parceiro, desde que observados os requisitos do art. 1.723 do Código Civil - o Art. 226, § 3º, da lei fundamental constitui típica norma de inclusão - a função contramajoritária do supremo tribunal federal no estado democrático de direito – a proteção das minorias analisada na perspectiva de uma concepção material de democracia constitucional – o dever constitucional do estado de impedir (e, até mesmo, de punir) ‘qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais’ (CF, art. 5º, XLI) - a força normativa dos princípios constitucionais e o fortalecimento da jurisdição constitucional: elementos que compõem o marco doutrinário que confere suporte teórico ao neoconstitucionalismo - recurso de agravo improvido.

Ninguém pode ser privado de seus direitos em razão de sua orientação sexual.

- Ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual. Os homossexuais, por tal razão, têm direito de receber a igual proteção tanto das leis quanto do sistema político-jurídico instituído pela Constituição da República, mostrando-se arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que puna, que exclua, que discrimine, que fomente a intolerância, que estimule o desrespeito e que desiguale as pessoas em razão de sua orientação sexual.

Reconhecimento e qualificação da união homoafetiva como entidade familiar.

- O Supremo Tribunal Federal - apoiando-se em valiosa hermenêutica construtiva e invocando princípios essenciais (como os da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da autodeterminação, da igualdade, do pluralismo, da intimidade, da não discriminação e da busca da felicidade) - reconhece assistir, a qualquer pessoa, o direito fundamental à orientação sexual, havendo proclamado, por isso mesmo, a plena legitimidade ético-jurídica da união homoafetiva como entidade familiar, atribuindo-lhe, em conseqüência, verdadeiro estatuto de cidadania, em ordem a permitir que se extraiam, em favor de parceiros homossexuais, relevantes conseqüências no plano do Direito, notadamente no campo previdenciário, e, também, na esfera das relações sociais e familiares.

- A extensão, às uniões homoafetivas, do mesmo regime jurídico aplicável à união estável entre pessoas de gênero distinto justifica-se e legitima-se pela direta incidência, dentre outros, dos princípios constitucionais da igualdade, da liberdade, da dignidade, da segurança jurídica e do postulado constitucional implícito que consagra o direito à busca da felicidade, os quais configuram, numa estrita dimensão que privilegia o sentido de inclusão decorrente da própria Constituição da República (art. 1º, III, e art. 3º, IV), fundamentos autônomos e suficientes aptos a conferir suporte legitimador à qualificação das conjugalidades entre pessoas do mesmo sexo como espécie do gênero entidade familiar.

- Toda pessoa tem o direito fundamental de constituir família, independentemente de sua orientação sexual ou de identidade de gênero. A família resultante da união homoafetiva não pode sofrer discriminação, cabendo-lhe os mesmos direitos, prerrogativas, benefícios e obrigações que se mostrem acessíveis a parceiros de sexo distinto que integrem uniões heteroafetivas.

A dimensão constitucional do afeto como um dos fundamentos da família moderna.

- O reconhecimento do afeto como valor jurídico impregnado de natureza constitucional: um novo paradigma que informa e inspira a formulação do próprio conceito de família. Doutrina.

Dignidade da pessoa humana e busca da felicidade.

- O postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso país, traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo.

Doutrina.

- O princípio constitucional da busca da felicidade, que decorre, por implicitude, do núcleo de que se irradia o postulado da dignidade da pessoa humana, assume papel de extremo relevo no processo de afirmação, gozo e expansão dos direitos fundamentais, qualificando-se, em função de sua própria teleologia, como fator de neutralização de práticas ou de omissões lesivas cuja ocorrência possa comprometer, afetar ou, até mesmo, esterilizar direitos e franquias individuais.

- Assiste, por isso mesmo, a todos, sem qualquer exclusão, o direito à busca da felicidade, verdadeiro postulado constitucional implícito, que se qualifica como expressão de uma idéia-força que deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa humana. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte Americana. Positivação desse princípio no plano do direito comparado.

 A função contramajoritária do Supremo Tribunal Federal e a proteção das minorias.

- A proteção das minorias e dos grupos vulneráveis qualifica-se como fundamento imprescindível à plena legitimação material do estado democrático de direito.

- Incumbe, por isso mesmo, ao Supremo Tribunal Federal, em sua condição institucional de guarda da constituição (o que lhe confere ‘o monopólio da última palavra’ em matéria de interpretação constitucional), desempenhar função contramajoritária, em ordem a dispensar efetiva proteção às minorias contra eventuais excessos (ou omissões) da maioria, eis que ninguém se sobrepõe, nem mesmo os grupos majoritários, à autoridade hierárquico-normativa e aos princípios superiores consagrados na Lei Fundamental do Estado. Precedentes. Doutrina. (AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 477.554 MINAS GERAIS, Segunda Turma,  Rel.Min. Celso de Melo). (grifo do autor)

Em que pese o reconhecimento da união estável homoafetiva pelo Supremo Tribunal Federal, infelizmente o casamento de pessoas do mesmo sexo abre divergência entre os tribunais, como se lê no escandido pelo site de notícias do “Bol”, em 03 de junho de 2012 :

FABIO BRISOLLADO RIO

A autorização para casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo está deixando sem rumo os tribunais brasileiros. As decisões têm sido tomadas de formas diversas em cada Estado do país.No Rio, o vem juiz Luiz Marques negando todos os pedidos encaminhados por casais gays desde que assumiu a função de titular da Vara de Registros Públicos, há sete meses. Ao justificar o veto, afirma que a lei associa casamento a homem e mulher.Mas a posição do juiz não é consenso. Rio Grande do Sul e Alagoas, por exemplo, têm decidido de forma oposta.Para oficializar um matrimônio, o primeiro passo é preencher um requerimento em cartório. Se houver dúvida, o caso pode ser encaminhado para avaliação do juiz.No caso do Rio, Luiz Marques orientou os cartórios cariocas a repassarem a ele todos os pedidos associados a casamento civil homoafetivo."As decisões do juiz são fundamentadas e devem ser respeitadas", avaliza a desembargadora Maria Regina Nova, do Tribunal de Justiça do Rio, que, no entanto, tem uma interpretação diferente da lei. "Eu entendo que a Constituição também veda expressamente atos discriminatórios, seja em razão de sexo, raça, cor ou religião."São Paulo e Belo Horizonte seguem o exemplo carioca. Nas duas cidades, as decisões quase sempre têm sido contrárias. Julgamentos favoráveis surgem pontualmente em instâncias superiores.Na última quinta, o Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou o casamento civil de um casal de dois homens de Bauru, interior do Estado.Os resultados favoráveis chamam atenção em Porto Alegre e Maceió. Na capital gaúcha, dois dos cinco cartórios da cidade vêm autorizando as uniões homoafetivas."Fui ao cartório em abril passado e, na mesma hora, marcaram a data. Deu tudo certo", comemora o arquiteto gaúcho José Pacheco, 39, que se casou no último dia 14.Em dezembro de 2011, o Tribunal de Justiça de Alagoas autorizou os cartórios do Estado a habilitarem o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo. "Fizemos uma festa no ano passado para comemorar a união estável e agora estamos marcando o casamento", diz a cantora Luciana Lima, 28, que mora em Maceió com a mulher, a enfermeira Viviane Rodrigues, 33”.

Contudo, no rumo de uma sociedade justa, solidária e igualitária despida de qualquer eiva de preconceito, como, aliás, reclama a Constituição Federal (Art. 1º, III e Art. 3º, I e IV), está a decisão do juiz Luís Antônio de Abreu Johnson, da comarca de Lajeado/RS como evidencia o site Espaço Vital:

“(...) reconheceu o casamento homoafetivo contraído no exterior entre um brasileiro e um britânico. Na sentença, o magistrado julga procedente o pedido do requerente a fim de reconhecer, registralmente, o casamento celebrado entre ele e o inglês, que passará a adotar o sobrenome do brasileiro. No assento do casamento, constará como regime matrimonial a "comunhão parcial de bens". (...)Ao julgar o pedido, o magistrado adotou como razões de decidir os fundamentos do parecer da promotora de Justiça Velocy Melo Pivatto. Sob o ponto de vista formal, o juiz entendeu que "todas as formalidades exigidas para o reconhecimento da união matrimonial celebrada no estrangeiro, conforme disposto no artigo 1.544 do Código Civil, foram cumpridas".Quanto ao reconhecimento em território brasileiro da união civil de uma dupla de sexo idêntico, realizada em solo estrangeiro, o juiz entendeu que, "embora o documento faça referência à união civil, sem utilizar a expressão ´casamento´, deve ser reconhecida a equivalência dos institutos para fins registrais no Brasil".  (ausentes reticências no original)

Sabe-se, porém, que tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça, estão bem posicionados quanto à valorização da dignidade da pessoa humana, bem como homenageando o tratamento igualitário entre os sexos.  Deste modo, decisões de juízes e desembargadores que venham por obstáculos ao casamento homoafetivo, com todo respeito, além de estarem no fosso do preconceito serão reformadas em nível de recurso. Entrementes, ainda assim, até o desate da questão recursal, anos terão transcorrido e os interesses dos pares homossexuais, já por este ângulo, estarão prejudicados.

Em suma, além da principiologia jurídica retratada, a busca da felicidade já é o suficiente para igualitarizar, no plano dos direitos, os homossexuais e os heterossexuais, desprezando-se a questão anatômica, visto que o mais importante é o arranjo familiar calcado na dignidade da pessoa humana, onde heterossexual e homossexual não pode ser distinguido, porque ambos têm o selo do humano[8].

6 – A ADOÇÃO POR CONVIVENTES HOMOAFETIVOS E UM NOVO ENFOQUE DO COMPLEXO DE ÉDIPO

A baliza da adoção encontra-se, em nível de Brasil, no Estatuto da Criança e do Adolescente[9]:

Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil:

§ 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando;

§ 2º  Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família;

§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.

§ 4º  Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão.

§ 5º  Nos casos do § 4º deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.

§ 6º  A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.

Como se nota no § 2º, do diploma legal supracitado, é possível a adoção conjunta em “união estável, comprovada a estabilidade da família”. Logo, se o Supremo Tribunal Federal aludiu que os pares homoafetivos que vivem com os requisitos de uma habitação duradoura[10] equiparam-se à união estável, não mais subsiste qualquer discussão jurídica quanto à viabilidade da adoção de uma criança por eles.

 

É bom que se transcreva aqui, para dar conteúdo às discussões, algumas normas presentes no Código Civil:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.

§ 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.

Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.

O que houve, com a decisão do Supremo Tribunal Federal, foi uma interpretação construtiva, isto é, organizando a leitura das normas infraconstitucionais com a Constituição Federal. Disso resulta que:

a) não mais deve ser tida como união estável apenas a relação entre homem e mulher, abarcando-se também, a ocorrida entre pessoas do mesmo sexo;

b) continuam válidas para se ter união estável, as seguintes condicionantes:

b.1) existência de convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família;

b.2) presença de lealdade e respeito entre os conviventes.

Caracterizando os elementos evidenciadores dos predicamentos para se ter uma família homoafetiva, certamente, além de elementos materiais (conta bancária conjunta, declaração de dependência em imposto de renda, plano de saúde) haverão outros pontos imprescindíveis, tais como fotografias em festividades familiares de ambos os conviventes, viagens conjuntas, dentre outros. Porém o mais significativo, entende-se como sendo a vinculação emocional entre eles, comparecendo a importância da lealdade, afetividade, o de desejo de se portarem em obediência às normas dos bons costumes – destacando-se, claramente, que estes tratam-se de fatores subjetivos e de difícil mensuração, o que não impede que deixem de ser requisitos fundamentais ao que se alude.

Naturalmente, não é qualquer encontro de pessoas do mesmo sexo, ou de sexos diversos, que desembocará em união estável, mas sim um liame duradouro e respeitoso. Somente uma entificação desta natureza é que tem viabilidade jurídica para legitimar a busca de um processo adotivo.

E para fechar a adoção, no patamar jurídico, pontua-se mais esta regra da Lei nº 8.069/90:

“Art. 43: A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”.

Em decorrência da norma supracitada, pode-se inferir, ao se tratar da adoção por pares homoafetivos, que a criança teria reais vantagens. Neste ponto, remonta-se ao triste fato de diversos abrigos, por mais que tentem, não serem capazes de fornecer à criança, as condições de um desenvolvimento saudável. Em contraponto, a adoção bem direcionada e em conformidade com as determinações ora levantadas, seja ela por pais homoafetivos ou não, se não dão a garantia do pleno sucesso, ao menos apresentam, quando comparadas aos abrigos, iguais chances de fracassar.

Então, uma união estável homoafetiva – aquela que deve amoldar-se aos requisitos acima elencados -, tem toda a fundamentação legítima para pleitear a adoção de um infante, bastando que isso seja uma real vantagem para este último.

Abebera-se da lição de Mariana de Oliveira Farias e Ana Cláudia Bortolozzi Maia (2009)

Ora, se o que se busca com a adoção é o bem-estar da criança, como prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente, poderíamos dizer que o não-reconhecimento das famílias compostas por pais/mães homossexuais e, assim, a impossibilidade da adoção por ambos os (as) parceiros (as) iria contra os princípios legais, já que facilitaria o fato de a criança se sentir diferente e discriminada. Assim, a criança poderia se sentir estigmatizada não por ser adotada por pessoas homossexuais, mas pela lei de seu país não considerar sua família como tal.

Derradeiramente, além da União Estável que envolve a homoafetividade, atualmente, se preenchidos os requisitos da nubência,  aquela poderá ser convertida em casamento, como já alinhado dantes, ou mesmo haver o próprio ato do enlace matrimonial perante o cartório de registro civil, como se vislumbra:

 Embora casadas as pessoas do mesmo sexo (por conta da conversão da União Estável, ou mesmo já frente ao notário), para a adoção perduram todas as exigências da norma pertinente, tal como se daria no campo da heterossexualidade.

Ultrapassada a formalidade legal, surge a análise da adoção por par homoafetivo (em União Estável ou casados entre si) no campo psicanalítico.

A primeira preocupação, sem qualquer ideia preconceituosa, seria a de que, por imitação/identificação, a criança adotada, por um par homoafetivo, acabaria se tornando homossexual/transexual.

Ora, não é a identificação da criança adotada com os adotantes, sejam do mesmo sexo ou não, que a fará homossexual/transexual. Até mesmo porque, é por demais sabido serem inúmeros os filhos de casais heterossexuais que propendem para a homossexualidade lato sensu, em caso tal não se poderia cogitar de um processo de identificação.

O complexo de Édipo, por sua vez, mormente numa família não mais hierarquizada (patriarcal), circula, além das figuras objetais mais próximas, atingindo outros parentes, principalmente na atualidade, onde é corriqueiro a monoparentalidade – descendentes de um só genitor em comum -, somado à existência de diversas gerações em um só lar, por exemplo, com a permanência de avós, pais, tios e filhos. Não é à toa que o escritor mineiro, Rodrigo da Cunha Pereira (1997), tem a rara sensibilidade de lecionar que

ela não se constitui apenas por um homem, mulher e filhos. Ela é antes uma estruturação psíquica, onde cada um de seus membros ocupa um lugar, uma função. Lugar do pai, lugar da mãe, lugar dos filhos, sem entretanto estarem necessariamente ligados biologicamente. Tanto é assim, uma questão de lugar, que um indivíduo pode ocupar o lugar do pai sem que seja o pai biológico.

Por conseguinte, não há mais como se enxergar no complexo de Édipo um fenômeno puramente calcado na relação triádica – pai, mãe e filho(a), na percepção puramente genitalizada. Essa visão deveria se voltar para as dimensões afetiva, cultural e espiritual, como pode ser extraído dos escritos de Lacan, Horney, Malinowski e João Neto.

Não se está aqui, de modo algum, embotando o grande labor de Sigmund Freud, que devassou o psiquismo humano em um contexto patriarcal. Porém, soa o momento de grafar a evolução da sociedade, tanto no plano jurídico quanto no viés psíquico e ético, máxime separando o campo do prazer – que é veiculado pela cópula sexual – do ato da procriação.

Em outras palavras, na época freudiana, com o intento de se evitar gravidez indesejada o método viável era a interrupção do coito, o que certamente deslustrava a performance da relação sexual e, mesmo no Brasil, até o surgimento da Constituição Federal de 1988 a ideia de casamento era imantada diretamente à da procriação, legitimando-a. Tanto assim que filhos havidos fora das núpcias eram tidos como ilegítimos ou bastardos, o que não fazia com que eles deixassem de aumentar, afinal as pulsões sexuais eram (ou talvez sempre foram) maiores do que as convenções sociais, muito efêmeras e pautadas em um falso self[11].

Esse separatismo entre “casamento” (aqui compreendido também a união estável, seja por pessoas de sexo comum ou diverso) e procriação é que não fora antevista pelo pai da Psicanálise – e nem havia qualquer indício sociocultural para tanto –, como no-lo ensina Roudinesco (2003), “Freud desconhece a força da ruptura a que deu início, recusando-se a enxergar o quanto ela já contribuiu para a separação do desejo e da procriação, sem porém colocar em risco a civilização”.

Logicamente que, assim que sobreveio a pílula anticoncepcional, o ser humano sentiu maior liberdade para a prática sexual, descobrindo de certo modo o prazer decorrente desse encontro de corpos. Todavia tal ordem de coisa gerou a onda do “amor livre”, mesclado com o uso de drogas, o que alterou a formatação familiar, surgindo figuras típicas como as das mães solteiras e, também, a assunção do nascimento de grupos organizados para reivindicação de espaços sociais, como sói ocorrer com a representatividade homossexual, lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBTTT).

Esta visibilidade, evidentemente, gera uma dificuldade de aceitação por parte dos conservadores que, em muitas vezes, preferem a hipocrisia à transparência no campo da sexualidade. Exemplificando: tem pessoas que se chocam com a adoção por par homoafetivo, sob o argumento de desestruturação do psiquismo infantil por falta da presença de um homem e de uma mulher, mas tem um caso com a cunhada e torna-se pai e, mesmo assim, não esboça qualquer preocupação com a sua prole decorrente da esposa e a confrontação com o oriundo da irmã daquela.

Logo, vale a pena citar trecho do voto do Min. Luis Felipe Salomão (2010), ao escandir que:

Em síntese, tais estudos mencionados pelo acórdão (por exemplo, da Universidade de Virgínia, da Universidade de Valência e da Academia Americana de Pediatria) são respeitados e com fortes bases científicas, indicando:

 - ‘ser pai ou ser mãe não está tanto no fato de gerar, quanto na circunstância de amar e servir’;

- ‘nem sempre, na definição dos papéis maternos e paternos, há coincidência do sexo biológico com o sexo social’;

- ‘o papel de pai nem sempre é exercido por um indivíduo do sexo masculino’;

- os comportamentos de crianças criadas em lares homossexuais ‘não variam fundamentalmente daqueles da população em geral’;

- ‘as crianças que crescem em uma família de lésbicas não apresentam necessariamente problemas ligados a isso na idade adulta’;

- ‘não há dados que permitam afirmar que as lésbicas e os gays não são pais adequados ou mesmo que o desenvolvimento psicossocial dos filhos de gays e lésbicas seja comprometido sob qualquer aspecto em relação aos filhos de pais heterossexuais’;

- ‘educar e criar os filhos de forma saudável o realizam semelhantemente os pais homossexuais e os heterossexuais’;

- ‘a criança que cresce com 1 ou 2 pais gays ou lésbicas se desenvolve tão bem sob os aspectos emocional, cognitivo, social e do funcionamento sexual quanto à criança cujos pais são heterossexuais’.

Feitas tais considerações, observando-se o complexo de Édipo como um fenômeno de cunho extremamente cultural e histórico, como já mencionado antecedentemente, não se há como entender nociva a adoção por par homoafetivo, porque o que une os seres – aqui incluídos adotantes e adotado(s) – é o signo da afetividade.

Registra-se que não se entende como par homoafetivo aqueles exibicionistas, transformistas e adeptos de comportamentos ditos pervertidos, porque estes, sem qualquer traço de discriminação, não encontram legitimidade sociopsíquica para a adoção.

Não deve aqui ser encarada de forma nociva o travestismo sem fetichismo e também a transgenitalização, enfim o que recomenda, aliás, a distinção que se segue:

O transexual não se confunde com o homossexual, pois este não nega seu sexo, embora mantendo relações sexuais com pessoas do seu próprio sexo. Não se confunde com o travesti, que em seu fetichismo é levado a se vestir nos moldes do sexo oposto. Nem se identifica com o bissexual, indivíduo que mantém relações sexuais com parceiros de ambos os sexos.

No campo da transexualidade, o que no concurso da atualidade, mostra-se acobertada pelas decisões judiciais[12] , e de todo conforme com uma visão psicanalítica contemporânea,  nada há que desabone, por si só o processo de adoção.

No que tangue ao travestismo, vale salientar a notícia seguinte:

“O Patronato Nacional da Infância (PANI) da Costa Rica, instituição estatal encarregada da proteção a menores, concedeu direito de adoção de um menino de dez anos a uma travesti, que cuida da criança desde os três meses de idade. A decisão contraria pressão de grupos religiosos conservadores que pediam a perda da guarda da criança por sua educadora. Mairena Rodriguez  vive com seu filho Michael em um pequeno povoado próximo à capital San José. A ministra da Infância e Adolescência Rosalia Gil afirma que “não existe razão para tirar a criança”, já que funcionários do PANI acompanharam o caso por seis meses e não verificaram “nada de estranho” na educação do menor, que estuda em uma escola particular.”

Por analogia igual tratamento deve ser dado ao travesti brasileiro, porque não é a orientação sexual que dirá sobre a otimização da função paterna/materna, como no-lo ensina Elizabeth Zambrano:

O uso do termo "família homoparental" costuma ser objeto de muitos questionamentos, pois coloca o acento na "orientação sexual" (homoerótica) dos pais/mães e a associa ao cuidado dos filhos (parentalidade). Essa associação (homossexualidade dos pais/mães e cuidado com os filhos) é, justamente, o que os estudos sobre homoparentalidade se propõem a desfazer, demonstrando que homens e mulheres homossexuais podem ser ou não bons pais/mães, da mesma forma como homens e mulheres heterossexuais.3 Os estudos demonstram que é a capacidade de cuidar e a qualidade do relacionamento com os filhos o determinante da boa parentalidade, e não a orientação sexual dos pais.

Já o fetichismo, derivativo do vocábulo  fetiche,  tomado de empréstimo, pela psicanálise, da antropologia, designando como objeto material enfeixado como ídolo, já o era empregado pelos sexologistas antecedentemente à época freudiana.

Freud, em um primeiro momento, classificou o fetichismo como perversão no campo da sexualidade, já que tratava-se da vinculação do sujeito do desejo voltando sua atenção para parte do corpo de outrem (pé, boca, seios, etc.) ou para um objeto determinado (sapato, calcinha, etc.). Porém, em 1927, com o trabalho denominado Fetichismo, o pai da psicanálise altera o seu ponto de vista, vendo o fetichismo como uma organização patológica resultante de uma denegação ou recusa da percepção de que falta um pênis na menina.

Daí porque, nas pegadas de Freud,  seria o fetichismo exclusivo no homem, já que para a mulher era o seu corpo na integralidade que seria fetichizado e, por fim, representaria um paradigma das perversões em geral.

Todavia, com o evolver da psicanálise, com os estudos de Melanie Klein e R. Stoller, não se contesta o fetichismo também nas mulheres, ou seja, a prática de tal conduta enreda-se no campo da perversão.

 Certos travestis, conduzindo-se por intermédio de fetiches, tornam-se seres limítrofes em termos de personalidade, isto é, abeiram-se da psicose, porém, o transexualismo como um todo, para a psiquiatria é tido como um quadro mórbido.[13]

Com todo respeito, a própria situação psíquica do transexual, de um modo geral, para alguns, tem levado ao afastamento da probabilidade da adoção, ainda que realize eventual cirurgia para “adequação” da sexuação. Toma-se, aqui, de empréstimo, a lição de Contardo Calligaris (1989), citado por Arán (2006), ao afirmar que “no transexualismo a cirurgia pode ser compreendida como um esforço de constituição de uma ‘metáfora delirante no real do corpo’".

Então, a meu ver diante do movimento internacional para tornar análoga a cirurgia da transgenitalização por aquele que possua dupla formação anatômico-sexual com aqueles que apenas não se sintam psicologicamente adequados com o sexo biológico que possuem – sendo que estes para a certa porção da psicanálise contemporânea são tidos como limítrofes da psicose –, ainda assim, creio no momento evolutivo do pensamento psicanalítico que se está a viver, de que a adoção nesta última hipótese, por si só, não deixa de ser recomendável por conta de uma suposta situação emocional que restaria alterada por serem  transexuais/travestis[14].

Colaciona-se por oportuno esta lição de Danielle de Luca:

O que tem que ser realmente levado em consideração aqui, não é a opção sexual do indivíduo (transexual), mas sim o seu caráter e sua capacidade enquanto ser humano, além, é claro, do direito dessa criança de pertencer a uma família que lhe dará não só uma estrutura financeira, mas sim muito amor, carinho e respeito, que é a base de toda família, e isso, não é a opção sexual que define.

Em que pese o transexualismo encontrar classificado como transtorno de identificação sexual, não é por isso só que lhe deve ser despido o direito humano a uma dignidade que alcance os altiplanos da viabilidade da adoção, até mesmo porque no correr da história muito do que era tido como morbidez para a psiquiatria, deixou de sê-lo, incluindo aqui o homossexualismo.

Por fim, no que tange a preconceitos de outrem com relação a uma criança/adolescente adotado por homoafetivos, deve ser vencido pela sociedade, como aliás o fora em tantos aspectos da história, como por exemplo a proibição do casamento inter-racial em alguns estados dos Estados Unidos da América, assim como no Brasil negros eram barrados em bailes de brancos, eram tidas como de má vida mulheres separadas ou mães solteiras. Neste ponto, há de se levantar a célebre frase do pai da Psicanálise, quando ele diz que “A substituição do poder do indivíduo pelo poder da comunidade é o passo cultural decisivo.” (FREUD, 2010)

Aliás, o doloroso selo do preconceito, também, às vezes, é conferido por instituições públicas como se entrevê desta notícia publicada no portal do Superior Tribunal de Justiça, intitulada “Rejeitado recurso contra decisão que afastou limite de idade em adoção por homossexuais”:

“(...)órgão ministerial – idade mínima de 12 anos para o adotando em caso de adoção por casal homoafetivo – não encontra o mínimo suporte legal, ante a absoluta ausência de previsão no ordenamento jurídico sobre idade mínima da pessoa a ser adotada. “O magistrado que estabelecesse uma idade mínima da criança a ser adotada, só porque os adotantes seriam pessoas do mesmo sexo, estaria infringindo a própria Constituição republicana, pois estaria criando norma sem o devido e legal suporte”, afirmou o tribunal estadual. Para o TJPR, a pretensão de estabelecer idade-limite para a criança ser adotada, em razão da orientação sexual dos adotantes, configura “exigência ilegal e de cunho discriminatório e preconceituoso (...)”. (ausentes reticências e parênteses no texto primitivo)

Ao que parece, somente adolescentes – posto que possuiriam idade igual/superior a doze anos -, poderiam ser adotados por casal homoafetivo, como se um menor de idade pudesse vir a ser “contagiado” pela orientação sexual dos adotantes. Não existe nenhuma evidência científica, como já se deitou nesse trabalho, que apontasse pela identificação do adotando com a manifestação da sexualidade de seus pais. O nome desta fixação de idade mínima para a adoção por par homossexual é um só: discriminação.

Sobre esta chaga da discriminação, que quem a usa coloca-se indevidamente acima do outro, este brado de Maria Berenice Dias (2011) evoca significativa reflexão: “Um dado consolador é que os jovens, as pessoas com melhor nível de escolaridade e maior poder aquisitivo se mostraram mais tolerantes. Pelo jeito este é o caminho. Educação. Só ela permite melhor renda e mais condições sociais.”

Somente com evolver do conjunto social, até mesmo como desafio, é que se rompem barreiras, evitam-se constrangimentos e verdadeiras torturas – que outrora eram meras troças – como o malsinado bullying. Nota-se, como apresentado por Freud em uma de suas obras (2010) que “a agressão é introjetada, interiorizada, na verdade mandada de volta à sua origem; portanto, dirigida contra o próprio eu”.

Arrematando-se, uma ideia de verdadeira espiritualidade do ser, aquela que o percebe de forma transcendente buscando enxergar nele os valores de sua alma, conseguirá não coagular a visão de futuro sobre algo aparentemente não compreendido com as balizas do que se entende no presente. Derruindo-se, de vez, os grilhões do preconceito.

Adverte, com a maestria de sempre, em reportagem dada ao Jornal Folha de São Paulo, no dia 4 de agosto de 2009, o Min. Luis Felipe Salomão (2010):

A adoção, quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do menor, como no caso dos autos, é um gesto de humanidade, e LRM foi além, adotando duas crianças e delas cuidando. Os menores são, ainda, irmãos biológicos – e, segundo o Conselho Nacional de Justiça, que criou, em 29 de abril de 2008, o Cadastro Nacional de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua intenção a apenas uma criança. (Jornal Folha de São Paulo de 4 de agosto de 2009).

Arrematando, é de se dizer que, na própria natureza como um todo, ressai a diversidade. Um olhar reducionista só enxerga o que é semelhante, mas uma captura holística admira a completitude do todo, que é composto de partes. Não admitir a diversidade da sexualidade para a adoção é perder de vista a riqueza do gênero humano, contentando-se com uma raça pura, tão a gosto do nazismo, de ontem e de hoje.

 

7 – A ALTERAÇÃO DIMENSIONAL DO ÉDIPO E SUAS DECORRÊNCIAS

Vimos no transcorrer das páginas antecedentes, arrimados na antropologia, na psicologia e na etnografia que a família sofreu severa alteração, deixando de ser vertical e hierarquizada (pais, filhos, netos), para tornar-se horizontal e desorganizada (convivência múltipla em um mesmo reduto entre membros diversos: avós, sobrinhos, agregados, etc.). O vocábulo desorganizado[15], aqui posto, tem a finalidade de deixar entrever que não mais é o pai – homem – que dita as regras da família, até mesmo porque as tarefas caseiras, acompanhado do fato da mulher também ter ido para o mercado de trabalho, dissipara este papel paterno.

Sabidamente, a contar das eras primitivas o homem era o provedor e a mulher a fertilizadora e, deste contexto, surgia o medo desta última em se ver abandonada – o que a fazia suportar toda a sorte de mandos e desmandos; enquanto que para o homem, desde que preenchida a sua função provedora nada lhe obstava ter o encontro sexual com outras mulheres, as tão conhecidas histórias das amantes, bom exemplo disso era a Marquesa de Santos, Domitília de Castro e Canto Melo, que mantinha liame extraconjugal com D. Pedro I.

A ideia patriarcal ainda vigente na época vitoriana de Freud perdeu campo com a transformação da família, sendo ainda mais invalidada com a introdução da homoafetividade. Na qual a aparente igualdade de sexo detona gêneros diversos, confundindo, aos olhos dos conservadores, o papel do provedor e sepultando, pelo menos a nível biológico, e em regra, a função fertilizadora da mulher.

Todavia, ao que parece, seja qual seja a orientação sexual, quando dois seres se unem com o intento de permanência, brota no imo de suas almas o desejo de ter filho. Não poderia, em nível jurídico, desde que preenchidos os requisitos legais, o par homoafetivo ser alijado deste ideário. Cabendo, de igual sorte, retirar obstáculos no que tange a adoção em nível de uma visão psicanalítica, como se demonstrará.

 

O Édipo, em uma visão contextualizada, não foi sepultado, porque há, sem sombra de dúvida, uma ambiguidade de sentimentos por parte da criança com relação aos objetos primários[16]. Porém, deve ele, ser visualizado por uma ótica mais contemporânea, isto é, mantendo-se a função do corte pela autoridade e da continência, independentemente da anatomia sexual daqueles que tenham relação direta com o infante.

Logo, em uma união homoafetiva que permita a adoção (ocorrida entre lésbicas, gays, transexuais, travestis e transgêneros), haverá a intenção de ser ela duradoura e, mais que isso, ter um contexto familiar com acolhimento e autoridade, tal como é esperado que se ocorra em uma relação heterossexual. Dito de outra forma, o adotado teria a sua representação desses papeis que ele colocaria nos novos pais e não que necessariamente os pais deixariam isso evidente.

Geralmente, até mesmo porque no campo da homoafetividade se torna muito difícil a procriação de modo espontânea, decorrendo daí uma sensibilidade maior, os adotantes se tornam mais delicados para com o inter-relacionamento com o ser adotado, e também, não visa a escolha de semelhanças físicas dessas crianças com as suas (geralmente brancos de olhos azuis almejam adotar rebentos que tenham fisionomia próxima deles).

É sabido, por outro lado, como ensina Peiter (2011) que

 Os trabalhos publicados que buscam avaliar as condições psicológicas indicativas do potencial e da disponibilidade da criança para realização de novos vínculos apontam para circunstâncias em que elas teriam vivido traumas tão dramáticos que inviabilizariam as possibilidades de nova inserção familiar.

Talvez, até mesmo em função da diferença de um lar homoafetivo, onde se convive pessoas anatomicamente idênticas no plano da sexualidade, não guardaria, por conta disso, semelhança com o ambiente heterossexual em que a criança tenha passado por um trauma, favorecendo a inserção social dela mediante o processo de adoção, porque não ocorreria identificação com os representantes psíquicos do meio em que se vira objeto de molestações (exemplo disso é o não incomum abuso sexual de homens quanto às suas enteadas).

Este inédito, que, aliás, marca o humano, uma vez mais serviria, não só no processo maturacional do adulto – haja vista que o psiquismo encontra-se constantemente em transformação –, mas também recolocaria um ser galvanizado pela dor diante da possibilidade de receber afeto, cujo sentimento e sensação independem da orientação sexual.

Ao longo da constância deste adotado portador de um trauma iriam sendo removidas as figuras do pai e mãe biológicos que lhe infligia tratamentos não humanitários, apagando de seu psiquismo aquelas cenas terroríficas e dantescas, criando-lhe um espaço potencial para uma nova vida. Na verdade, ocorreria, aqui, uma substituição de afetos, dando curso normal ao complexo de Édipo.

Há um trabalho, é bom que se diga, no plano da adoção internacional, especificamente entre o Brasil e a Europa, que é dotado de cinco etapas, antecedentemente à consumação do processo adotivo, como nos informa Peiter (2011), quais sejam:

 a) o processo de luto: a criança é informada, pelo profissional responsável, que fora destituída definitivamente de seu antigo lar, bem como este cria um laço de afetividade com ela, a ponto de que ela possa contar sua história de vida até sua chegada no abrigo (lar substituto).

O não desabrochar desse luto, assevera Peiter (2011) que “o silêncio e os não ditos trazem entraves ou dificuldades na necessária elaboração narrativa da própria história”.

Nesta etapa, Crine e Nabinger (2004) deixa entremostrado que às vezes mesmo destratada, a criança guarda tamanha lealdade com sua família originária, que resiste à um processo de adoção, cabendo, em caso tal outras formas alternativas de acolhimento, visto que o(a) candidato(a) não teria características de uma “adotabilidade afetiva”.

Mais uma vez, crê-se, seja uma das saídas para a hipótese elencada acima, o acolhimento dessa criança pelo par homoafetivo, dado que não sofreria o petiz qualquer pressão psíquica em caso tal, haja vista o fato de não estar diante da figura tradicional da convivência constituída por homem e mulher.

b) o trabalho com as representações: a criança é estimulada a idealizar o futuro lar, ou seja, julga-se ser de maior importância a criação desta representação psíquica do que o atingimento do alvo em si. Nada há que dasabone o par homoafetivo em fazer parte desta representação psíquica do futuro adotando, incutindo-lhe a firme idéia de que será deveras bem cuidado, que frequentará uma escola, que se ficar doente será assistido e assim por diante. Trabalhando nessa criança a fenda emocional até então existente, fornecendo-lhe a tão almejada hospitalidade e segurança.

c) o  matching: intercruza-se os desejos da criança e dos eventuais adotantes, onde, mais uma vez, se bem executada  as fases das representações, nada há que desabone, por si só, a adoção por par homoafetivo.

d) a preparação específica: na preparação propriamente dita, levando em consideração o programa de adoção internacional já citado, um psicólogo, por meio lúdico, informa à criança que fora encontrada uma família que lhe abrigará, bem como fará com aquela todo um percurso externo ao abrigo e cientificará os cuidados que ela receberá de seus adotantes. Uma vez mais, desde que bem recebido pela criança, nada contradiz a viabilidade de que ela venha a ser inserida em lar homoafetivo.

Não é à toa que Nabinger e Crine (2004) aduzem: “De uma parte e da outra, irão realizando o afinamento das representações recíprocas, a expressão de emoções diversas, com suas ambivalências e uma busca tateante de signos de identificação”.

e) o encontro: antes da criança se por frente a frente aos adotantes a equipe multidisciplinar servirá como mediadora dessa etapa e, no tribunal, além dos procedimentos formais, existe uma revivescência de todo o percurso que marcou o processo de adoção.

Há um estágio de convivência onde os profissionais se põem à disposição para cooperarem, isso já no lar onde viverão adotado e adotantes.

Listadas estas etapas, cumpre realçar, mormente no Brasil, onde o índice de crianças em lares substitutos é alarmante e, por outro lado, havendo pares homoafetivos, dotados de total estabilidade e até mesmo quiçá casados civilmente, ávidos em terem consigo uma criança, torna-se mais que recomendável a viabilização desse caminho que conduzirá todos em direção ao encontro da formação de uma família com a maior completitude possível.

Não deve ser esquecida a lição de Nabinger e Crine (2004), onde registram que “a perda de tempo é grave e por vezes irreparável se a permanência da criança na instituição se prolonga, quando sua situação familiar não está clara, principalmente enquanto os pais não aparecem e nem consentem que a criança seja adotada.”

Por todo o exposto, pode-se notar que, tanto o Direito quanto as demais ciências afetas ao estudo do humano, e em especial a Psicanálise, desprendem-se da questão anatômica que constitui o par homoafetivo para ver a singularidade de cada qual; bem como, o complexo de Édipo não mais tem o formato da verticalidade que grassava ao tempo da família patriarcal, mas sim é dotado da horizontalidade que peculiariza os núcleos familiares contemporâneos, onde se situam em um mesmo lar gerações diversas, a chamada família nuclear do meio urbano, a qual é “constituída por um casal (ou somente pela mãe, em pelo menos um terço das famílias segundo o IBGE) e um ou dois filhos, longe do grupo familiar de origem, anônimos, desenraizados de suas culturas”, na fala de José Outeiral.  

Sendo assim, o importante não é o sexo oposto dos adotantes, mas a função que cada qual ocupe – estavelmente – na ambiência que esteja inserido o adotado, isto é, o papel de ordem (direcionado culturalmente ao paterno) e de continência (mais próprio ao feminino, em termos culturais), que se tem no casal homoafetivo.

Soam interessantes estas palavras de Sandra Camargos (2010):

 [...] Podemos observar, nesse entendimento, que Freud utiliza o termo objeto para designar o objeto de amor. Isto nos leva a pensar que, mesmo usando o termo mãe, não se refere especificamente à mãe biológica, mas alguém que exerce a função de portar condição de fazer marcas mediante seus cuidados.


8 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se que não existe incompatibilidade na adoção por par homoafetivo, seja no plano jurídico, antropológico, etnográfico, psicológico e psicanalítico. No campo do Direito, a dignidade da pessoa humana, a liberdade de orientação sexual e a vedação de tratamento discriminatório, deixam à mostra que, hodiernamente, a noção de família é plural e, por isso mesmo, tanto hetero como homossexual devem ser vistos como seres humanos integrais.

A adoção, no plano normativo, leva em consideração, acima de tudo, o melhor interesse do adotado e, se estável a união homoafetiva, composta por lésbicas, gays, transexuais, travestis e transgêneros, sejam os integrantes casados entre si ou não, a afetividade é o signo que deve compor o viés adotivo.

No espectro antropológico, etnográfico e psicológico, não se encontra qualquer estudo que deslustre a adoção por pares homoafetivos, visto que tais ciências abarcam a noção de que o humano é selado pela diversidade e ao mesmo tempo pela singularidade de cada ser. Não há identificação da criança adotada com a orientação sexual de seus pais, mas sim, com os papéis e com o caráter que deles ressaem cotidianamente para o percurso da vida societária.

Já no campo psicanalítico, o complexo de Édipo, onde predomina a ambivalência da criança em relação aos adotantes – que substituem os genitores –, pode muito bem ser trabalhado ainda que estes últimos sejam do mesmo sexo, isto porque, a identificação operará pelo papel que eles exercerão na ambiência doméstica e/ou fora dela e não por conta das diferenças anatômicas, tal como restou afirmado no parágrafo antecedente.

Deve-se registrar, outrossim, que no Brasil há uma enorme gama de crianças em abrigos[17], muito dos quais sem as melhores condições para o acolhimento de seres em formação, o que justifica, ainda mais, a adotabilidade em geral, sem qualquer exclusão à homoafetiva.

Cumpre anotar, ademais, que pelo fato de uma criança ter sido adotada por um par/casal homoafetivo não significa, de nenhum modo, que por isso mesmo ela terá dificuldade na identificação de seu gênero, como comprovam estudos já realizados em outros países e retratados neste escrito. Até porque, em regra, os homossexuais são filhos de casais heterossexuais, o que evidencia que a homoafetividade transcende às questões meramente socioculturais, incursionando em origens ainda desconhecidas e pouca exploradas pela ciência, crivada por inescondível preconceito.

Enfim, a adoção é ineludivelmente um ato de amor e, por isso mesmo, dará à criança ou ao adolescente uma nova oportunidade de ter um lar, que se estiver pautado na afetividade, evitará que o adotado resvale para os desvãos de estruturas clínicas cravadas pelos transtornos. Por isso, a Psicanálise jamais poderá desproteger a adoção por par homoafetivo, senão ela apartaria do seu destino apregoado por Sigmund Freud, em carta enviada à Carl Gustav Jung, qual seja, a cura pelo amor.

 Se grupos rechaçam a homossexualidade como desvios de conduta, apregoando que destoam da realidade normal do homem, como seria lícito a eles enfrentar o fato de que uma criança precisa e busca no amor o refúgio e o alicerce para seu pleno desenvolvimento? Diga-se de passagem que mesmo os pais mais ditosos cometem equívocos durante o transcurso da criação, o que, nem por isso, os desmerece do apostolado que a vida lhes confia. Seria lícito para com o amor que se almeja, vergastar as esperanças daqueles que já quase a perderam? Se diante do exposto e de toda composição desta obra não houve uma clareza científica julgada suficiente para comprovar aquilo que se pretende, com toda certeza, ainda sim, seria, no universo das possibilidades, sensato o benefício da dúvida!

Arrematando, a religião prenhe de dogmas, aquela que não se constitui na guardiã da religiosidade e muito menos da espiritualidade do Homem, é a que mais agride e condena o casamento homoafetivo e, por obvio penaliza a adoção levada a efeito por tal par. Com todo respeito, não é capaz de capturar a alma humana, visto que está ementada no plano da imanência e não alcança o cume da transcendência, dado que engessada em conceitos – melhor dizendo preconceitos – onde mais vale a “verdade” do que o “desejo lícito” calcado na amorosidade.

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ABSTRACT

Times have changed, the notion of family as well. The basis of the unity of the people to constitute a common home, are of the same sex or not, is love. So those who wish to have children may resort to adoption.

Anthropology, ethnography and psychology, at any time, has not prestigiem studies thatadoption by homosexual couples.

Contemporary Psychoanalysis, whose concepts have suffered due to evolution, would not be a barrier to prevent adoption by homosexual couples, mainly because the Oedipus complex today is no longer focused on a patriarchal family, but consistent with a polymorphic entity nuclear and transgenerational.

The law also is agreeing to the adoption for the same sex. The Supreme Court, the guardian of the Constitution, the stable of legitimized homosexual.

Finally, we must understand the homoafetividade reaching lesbians, gays, transvestites, transsexuals and transgendered people, because no one is less human because of sexual orientation who wear.

Keywords: Family, Love, Adoption, Anthropology, Ethnografy, Psychology, Psychoanalysis, Homoaffective, Lesbians, Gays, Transvestites, Transsexuals, Transgenders, Oedipus, Law, Supreme Court and Superior Court of Justice.

RESUMEN

Los tiempos han cambiado, la noción de familia. La base de la unidad del pueblo para constituir un hogar común, son del mismo sexo o no, es el amor. Por lo tanto, aquellos que deseen tener hijos también pueden hacer uso de la adopción.

La antropología, la etnografía y la psicología, en cualquier momento, no tiene estudios de prestigiem que la adopción por parejas homosexuales.

El psicoanálisis contemporáneo, cuyos conceptos han experimentado un desarrollo adecuado, no sería una barrera para impedir la adopción por parejas homosexuales, principalmente porque el complejo de Edipo, hoy ya no se centra en una familia patriarcal, pero en línea con una entidad polimórfica nuclear y transgeneracional.

La ley también está de acuerdo a la adopción por personas del mismo sexo. La Corte Suprema de Justicia, el guardián de la Constitución, legitimó la unión de homosexuales estables.

Por último, debemos entender a las lesbianas, los gays que llegan a homoafetividade, travestis, transexuales y personas transgénero, porque nadie es menos humana a causa de la orientación sexual que llevan.

Palabras clave: Familia, amor, aprobación, Antropología, Etnografía, Psicología, Psicoanálisis, Homoaffective, Lesbianas, Gays, Travestis, Transexuales, Transgéneros, Edipo, el Derecho, la Corte Suprema y Corte Superior de Justicia.

RIASSUNTO

I tempi sono cambiati, il concetto di famiglia. La base della unità del popolo per costituire una casa comune, sono dello stesso sesso o no, è l'amore. Pertanto, coloro che desiderano avere figli può anche fare uso di adozione.

Antropologia, etnografia e la psicologia, in qualsiasi momento, non ha studi prestigiem che l'adozione da coppie omosessuali.

La psicoanalisi contemporanea, i cui concetti sono stati sottoposti a un corretto sviluppo, non sarebbe una barriera per impedire l'adozione da parte di coppie omosessuali, soprattutto perché il complesso di Edipo oggi non è più focalizzato su una famiglia patriarcale, ma in linea con un'entità polimorfa nucleare e transgenerazionale.

La legge è anche concordare l'adozione da parte dello stesso sesso. La Corte Suprema, il guardiano della Costituzione, legittimato l'unione omosessuale stabile.

Infine, dobbiamo capire le lesbiche homoafetividade raggiungono, gay, travestiti, transessuali e persone transgender, perché nessuno è meno umana a causa di orientamento sessuale che indossano.

Parole chiave: famiglia, amore, Adozione, Antropologia, Etnografia, Psicologia, Psicoanalisi, Homoaffective, lesbiche, gay, travestiti, transessuali, transgender, Edipo, la legge, la Corte Suprema e Corte Superiore di Giustizia.


Notas

[1] “... são resumidas sob o nome de ética aquelas [exigências] que dizem respeito às relações dos seres humanos entre si. Em todas as épocas se atribui enorme valor à ética, como se justamente dela se esperasse as maiores realizações... [a ética] pode ser compreendida como uma tentativa terapêutica, como um esforço para alcançar, por meio de um mandamento do supereu, aquilo que até então não pôde ser alcançado por meio do trabalho usual da cultura.” (FREUD, 2010).

[2] O sufixo “ismo”, como se sabe, remete a um estado patológico, daí porque se dizia homossexualismo. “A medicina e a psicanálise” durante muito tempo, consideraram a homossexualidade como doença, tanto que era tratada por “homossexualismo” em que o sufixo “ismo” conferia a idéia de doença, sendo, dessa forma, tratado como tal, nas palavras de Moreira Filho e Madrid (2009).

[3] Ao ver de Freud, há fases de desenvolvimento psicossexual, onde ele às enumera em oral, anal, fálica e genital, já que a latência é considerada como um período. (SANDIM, 2010).

[4] O complexo de Édipo se desenvolve ao longo da vida do indivíduo. Caracterizado pela escolha que o indivíduo deve fazer, perante o conflito entre as exigências impostas por forças exógenas (família, sociedade, religião, leis), de continência ao prazer individual, e o desejo do indivíduo pelo prazer sem limites; o Édipo mal resolvido pode ser fonte de angustias, neuroses, perversões e outras formas de distúrbios psíquicos e de comportamento. (FERREIRA, 2008)

Ressalve-se que na atualidade existem outras estruturas clínicas que desaguam do nó residente no Édipo inconcluso, tais como o autismo, síndrome do vazio, formação de dupla pele psíquica.

[5] Cf. Elisa Alvarenga na matéria intitulada “As formações do inconsciente – os três tempos do Édipo”. Disponível em http://www.pailegal.net/ser-pai/ser-pai/analises/246-as-formacoes-do-inc.... Acesso em 12/maio/2012.

[6] Para Freud (2010) “... a palavra ‘cultura’ designa a soma total de realizações e disposições pelas quais a nossa vida se afasta da de nossos antepassados animais, sendo que tais realizações e disposições servem a dois fins: a proteção do homem contra a natureza e a regulamentação das relações dos homens entre si”.

[7] Toda interpretação jurídica, para ter legitimidade social, para ser aceita verdadeiramente pelo grupo, deve ter em mira o resultado a que ela se destina, qual seja a pacificação de um conflito em prol do humano e não do formal.

[8] É constitucional e psíquico do humano a dupla sexualidade, como se infere de Groddeck (1992) quando este nos diz: “[...] o mais varonil dos homens ou a mais feminina das mulheres é um ser humano, um ser masculino-feminino, de dupla sexualidade. [...] A realidade de que não existe o homem separado da mulher, de que o ser humano é ao mesmo tempo feminino e masculino, é recalcada.[...]”.

[9] Percebe-se pela norma inserida nos §§ 1º, 3º e 4º claras discriminações. Pessoas vinculadas ao adotante, como irmãos ou pais, não podem adotar. Ademais, uma pessoa de 30 anos, bem estruturada econômica, social e psicologicamente, somente pela questão etária não poderia adotar um adolescente de 15 anos. Por fim, a incongruência é tamanha que, em casos de uma ruptura da conjugalidade ou da união estável, ainda sim poder-se-ia adotar, conquanto a consanguinidade e a faixa etária, já enumeradas, impediriam o gesto nobre.

[10] Lei nº 9.278/96: Art. 2° São direitos e deveres iguais dos conviventes: I - respeito e consideração mútuos; II - assistência moral e material recíproca; III - guarda, sustento e educação dos filhos comuns.

[11] Moura, citando Winnicott (2008), diz que a “’mãe boa’ é a que responde a onipotência do lactante e, de certo modo, dá-lhe sentido. O self verdadeiro começa a adquirir vida, através da força que a mãe, ao cumprir as expressões da onipotência infantil, dá ao ego débil da criança. A mãe que ‘não é boa’ é incapaz de cumprir a onipotência da criança, pelo que repentinamente deixa de responder ao gesto da mesma, em seu lugar coloca o seu próprio gesto, cujo sentido depende da submissão ou acatamento do mesmo por parte da criança. Esta submissão constitui a primeira fase do self falso e é própria da incapacidade materna para interpretar as necessidades da criança”.

[12] STJ: Direito civil. Recurso especial. Transexual submetido à cirurgia de redesignação sexual. Alteração do prenome e designativo de sexo. Princípio da dignidade da pessoa humana.

- Sob a perspectiva dos princípios da Bioética – de beneficência, autonomia e justiça –, a dignidade da pessoa humana deve ser resguardada, em um âmbito de tolerância, para que a mitigação do sofrimento humano possa ser o sustentáculo de decisões judiciais, no sentido de salvaguardar o bem supremo e foco principal do Direito: o ser humano em sua integridade física, psicológica, socioambiental e ético-espiritual.

- A afirmação da identidade sexual, compreendida pela identidade humana, encerra a realização da dignidade, no que tange à possibilidade de expressar todos os atributos e características do gênero imanente a cada pessoa. Para o transexual, ter uma vida digna importa em ver reconhecida a sua identidade sexual, sob a ótica psicossocial, a refletir a verdade real por ele vivenciada e que se reflete na sociedade. (REsp 1008398 / SP).

[13] “A observação clínica demonstraria que importa mais a aparência de ‘ser’ mulher, do que a possibilidade de ‘ter’ relações sexuais. Diferentemente da neurose e da perversão, os transexuais não teriam acesso à castração dita simbólica, o que em última instância os aproximaria dos psicóticos” (ARÁN, 2006).

[14] De acordo com a Classificação Internacional de Doenças – CID 10, o Transexualismo se enquadra no Código F64.0 – Transtorno de Identidade Sexual – e “Trata-se de um desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto. Este desejo se acompanha em geral de um sentimento de mal estar ou de inadaptação por referência a seu próprio sexo anatômico e do desejo de submeter-se a uma intervenção cirúrgica ou a um tratamento hormonal a fim de tornar seu corpo tão conforme quanto possível ao sexo desejado”. Entrementes, tal como se dera com a homossexualidade que deixara de ser catalogada na Classificação Internacional de Doenças (CID 10), acredito que, no porvir, o transexualismo em geral perderá este viés nosográfico, já que o estudo psiquiátrico focará, não mais a questão da sexuação biológica, mas sim distúrbios próprios do ser humano em geral.

[15] Em linguagem comum, leia-se também “descentralizado”, considerando ademais que, em muitos casos, essa horizontalidade foi tão favorável a ponto de humanizar os integrantes da família e dá-los o espaço na participação efetiva das atividades do lar.

[16] “O Édipo de que vou falar é uma lenda que explica a origem de nossa identidade sexual de homem e mulher e, além disso, a origem de nossos sofrimentos neuróticos. Essa lenda envolve todas as crianças, vivam em uma família clássica, monoparental, recomposta ou, ainda, cresçam no seio de um casal homossexual, ou até mesmo sejam crianças abandonadas, órfãs e adotadas pela sociedade.” (NÁSIO, 2007).

[17] Último balanço do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), criado para facilitar os magistrados das varas da infância e da juventude na condução dos procedimentos de adoção, mostra que no Brasil há atualmente 4.416 crianças e adolescentes aptas a serem adotadas. Destas, 385 encontraram uma nova família. Outras 163 estão em processo de adoção. O sistema traz também informações acerca do perfil das 8.598 crianças e adolescentes que já passaram pelo cadastro. Dentre eles, 2.518 (29,29% do total) são da raça branca. Os negros somam 1.509 (17,55%). Jovens da cor parda são 4.491 (52,23%). Em menor número estão os da raça amarela e indígena, com 41 (0,48%) e 39 (0,45%) crianças e adolescentes atualmente disponíveis, respectivamente. Segundo o CNA, 6.105 crianças e adolescentes (ou 71% do total) possuem irmãos. No entanto, apenas 1.567 deles (o que representa 18,23%) têm seu familiar cadastrado no banco de dados do Conselho Nacional de Justiça. O banco de dados mostra ainda que adolescentes com 13 anos de idade chegam a 715, superando o número de crianças com zero ano de idade que somam 80; um ano de idade, 237; dois anos de idade, 340; e três anos de idade, 345.  (Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/13562-mais-de-4-mil-criancas-estao-ap... . Acesso em 15/maio/2012)