Uma breve análise da Execução Fiscal


Porvinicius.pj- Postado em 11 outubro 2011

Autores: 
FIGUEIREDO, Pedro Henrique Meira

Resumo: o presente artigo visa a abordar os aspectos gerais do processo de execução da divida ativa da Fazenda Pública, regulamentado pela Lei nº 6.830/80, sem adentrar no mérito de discussões acerca da necessidade de alterações no sistema. Trata-se de pequena contribuição acadêmica a um tema pouco abordado nos bancos das Universidades.

Palavras-chave: Execução Fiscal; dívida ativa; Fazenda Pública; embargos.


1 Conceito e espécies de dívida ativa

Dívida ativa, num conceito simples e conciso de Kiyoshi Harada, “é o oposto de dívida pública. Esta é débito do poder público para com terceiros e aquela é crédito do Estado a ser cobrado executivamente” (2008, p. 521).

Há duas espécies de dívida ativa, consolidadas tanto pela legislação quanto pela doutrina: a tributária e a não tributária. O Código Tributário Nacional (CTN), em seu art. 201, conceituara a primeira; logo em seguida, o Decreto-lei no 1.735/79 abrangeu o conceito de ambas as espécies, ao inserir o § 2o no art. 39 da Lei no 4.320/64:

Art. 39.

(...)

§ 2o Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de sub-rogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.

Por fim, a Lei no 6.830/1980 (LEF), em seu art. 2o, §§ 1o e 2o, trouxe consigo um conceito mais simples e amplo de dívida ativa, sem, contudo, modificar suas espécies, além de definir a sua composição:

Art. 2o. (...)

§ 1o Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o art. 1o (União, Estados, Distrito Federal, Municípios e respectivas autarquias), será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.

§ 2o A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.

Com isso, sempre que se falar em dívida ativa, considerar-se-á, além do valor da dívida, a atualização monetária, os juros e multa de mora, além dos demais encargos fixados legal ou contratualmente.

2 Termo de Inscrição da Dívida Ativa

A inscrição da dívida ativa é promovida pela Procuradoria da Fazenda Nacional, em se tratando da União, ou pelo órgão competente nos demais entes federativos, constituindo-se em ato de controle administrativo da legalidade.

A principal consequência dessa inscrição é o nascimento da exequibilidade da dívida. De outra forma, não há que se falar em execução fiscal sem que haja dívida ativa devidamente inscrita pelo órgão competente.

Outros efeitos determinados por esse ato de inscrição são a presunção de liquidez e certeza do crédito e a suspensão do prazo prescricional, para todos os efeitos de direito, por 180 dias ou até a distribuição da execução fiscal.

Dispõe o § 5o do art. 2o da LEF sobre os requisitos do Termo de Inscrição de Dívida Ativa:

Art. 2o.

(...)

§ 5º O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter:

I - o nome do devedor, dos corresponsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros;

II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;

III - a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida;

IV - a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;

V - a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; e

VI - o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.

A Certidão de Dívida Ativa conterá os mesmos elementos do Termo, além de apontar o número do livro e da folha em que foi inscrita a dívida, e será autenticada pela autoridade competente, constituindo, nos termos do art. 585, VII, do Código de Processo Civil (CPC), título executivo extrajudicial.

Esses requisitos são indispensáveis ao exercício de ampla defesa do sujeito passivo, a ser implementado através de embargos à execução. Como consequência, a omissão desses dados ou o erro em relação a estes constituem causas de nulidade da inscrição e do processo executivo, podendo, contudo, a nulidade ser sanada antes da decisão de primeira instância, mediante emenda ou substituição da certidão, hipótese em que será devolvido o prazo para embargos ao executado, nos termos do art. 2o, § 8o, da LEF.

3 Processo de execução fiscal

Conforme exposto anteriormente, a exequibilidade da dívida ativa dar-se-á com a sua inscrição, efetuada pelo órgão competente. Em se tratando de dívida ativa tributária, uma vez efetuado o lançamento, notificado o contribuinte e esgotado o procedimento administrativo, torna-se exigível, porém ainda não exequível. A exequibilidade da dívida ativa tributária só se dará, da mesma forma, com a sua devida inscrição.

O processo de execução fiscal, simplificado e desburocratizado, é regulado pela LEF, aplicando-se subsidiariamente, no que couber, as disposições do CPC, e pode ser sumariado nas seguintes fases:

3.1 Petição inicial

A peça exordial, instruída da certidão da dívida ativa, indicará, nos termos do art. 6o da LEF, apenas o juiz a quem é dirigida, o pedido e o requerimento para a citação do executado.

A produção de provas pela Fazenda Pública independe de requerimento na petição inicial e o valor da causa será o da dívida constante da certidão, com os encargos legais.

O despacho judicial que defere a inicial importa em ordem para: citação; penhora, caso não haja pagamento da dívida nem garantia da execução; arresto, se o executado não tiver domicílio ou dele se ocultar; registro da penhora ou do arresto; e avaliação dos bens penhorados ou arrestados.

3.2 Citação e penhora

O despacho que ordena a citação, deferindo a inicial, interrompe o prazo prescricional, nos termos do art. 8o, § 2o, da LEF. Efetuada a citação, em regra via postal, terá o executado prazo de 5 dias para efetuar o pagamento da dívida ativa ou garantir a execução por uma das modalidades previstas no art. 9o da LEF.

Art. 8o. O executado será citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, ou garantir a execução, observadas as seguintes normas:

I - a citação será feita pelo correio, com aviso de recepção, se a Fazenda Pública não a requerer por outra forma;

II - a citação pelo correio considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do executado, ou, se a data for omitida, no aviso de recepção, 10 (dez) dias após a entrega da carta à agência postal;

III - se o aviso de recepção não retornar no prazo de 15 (quinze) dias da entrega da carta à agência postal, a citação será feita por Oficial de Justiça ou por edital;

IV - o edital de citação será afixado na sede do Juízo, publicado uma só vez no órgão oficial, gratuitamente, como expediente judiciário, com o prazo de 30 (trinta) dias, e conterá, apenas, a indicação da exequente, o nome do devedor e dos corresponsáveis, a quantia devida, a natureza da dívida, a data e o número da inscrição no Registro da Dívida Ativa, o prazo e o endereço da sede do Juízo.

§ 1o O executado ausente do País será citado por edital, com prazo de 60 (sessenta) dias.

§ 2o O despacho do Juiz, que ordenar a citação, interrompe a prescrição.

Art. 9o. Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:

I - efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária;

II - oferecer fiança bancária;

III - nomear bens à penhora, observada a ordem do art. 11; ou

IV - indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública.

§ 1o O executado só poderá indicar e o terceiro oferecer bem imóvel à penhora com o consentimento expresso do respectivo cônjuge.

§ 2o Juntar-se-á aos autos a prova do depósito, da fiança bancária ou da penhora dos bens do executado ou de terceiros.

§ 3o A garantia da execução, por meio de depósito em dinheiro ou fiança bancária, produz os mesmos efeitos da penhora.

§ 4o Somente o depósito em dinheiro, na forma do art. 32, faz cessar a responsabilidade pela atualização monetária e juros de mora.

§ 5o A fiança bancária prevista no inciso II obedecerá às condições preestabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

§ 6o O executado poderá pagar parcela da dívida, que julgar incontroversa, e garantir a execução do saldo devedor.

Não havendo pagamento ou a garantia da execução, serão penhorados os bens do executado, excetuados aqueles legalmente declarados absolutamente impenhoráveis. Far-se-á a intimação do executado via publicação em órgão oficial ou via postal, nas seções judiciárias do interior, e do cônjuge, se a penhora recair sobre bens imóveis. Caso o aviso de recebimento não contiver a assinatura do próprio executado ou de seu representante legal, far-se-á intimação pessoal, entregando o oficial a contrafé e cópia do termo ou do auto de penhora, que deverá conter a avaliação dos bens apenhados. Para efeitos de registro da penhora, o oficial deverá ainda promover a entrega da contrafé e do auto de penhora ao órgão competente.

Se a avaliação feita pelo oficial de justiça que efetuou a penhora for impugnada, antes de publicado o edital de leilão, o juiz, ouvida a parte contrária, nomeará avaliador oficial, nos termos do art. 13 da LEF.

O art. 11 da LEF determina a ordem de preferência de bens do executado a serem penhorados:

Art. 11. A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:

I - dinheiro;

II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa;

III - pedras e metais preciosos;

IV - imóveis;

V - navios e aeronaves;

VI - veículos;

VII - móveis ou semoventes; e

VIII - direitos e ações.

§ 1o Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção.

§ 2o A penhora efetuada em dinheiro será convertida no depósito de que trata o inciso I do art. 9o.

§ 3o O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública exequente, sempre que esta o requerer, em qualquer fase do processo.

Em qualquer fase do processo, será deferida pelo juiz a substituição da penhora por depósito em dinheiro ou fiança bancária, a pedido do executado, ou a substituição dos bens penhorados por outros, independentemente da ordem do art. 11 da LEF, bem como o reforço da penhora insuficiente, a pedido da Fazenda Pública. Ressalte-se que a recém-publicada Súmula no 406 do STJ possibilita à Fazenda Pública a recusa de substituição de bem penhorado por precatório.

3.3 Embargos do executado

O executado poderá oferecer embargos no prazo de 30 dias, contados do dia em que garantiu a execução por uma das formas do art. 9o da LEF, alegando toda a matéria útil à defesa, requerendo as provas e juntando documentos e o rol de testemunhas, até três. Não se permite reconvenção nem compensação.

As exceções, salvo as de incompetência, suspeição e impedimento, serão arguidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos. Recebidos estes, a Fazenda Pública será intimada para impugná-los no prazo de 30 dias, designando-se, logo a seguir, a audiência de instrução e julgamento.

A audiência poderá ser suprimida, no entanto, se a discussão limitar-se a matéria de direito, ou, sendo de fato e de direito, a prova for exclusivamente documental, hipótese em que a sentença deverá ser proferida no prazo de 30 dias – o que normalmente ocorre.

Na execução por carta precatória, os embargos do executado serão oferecidos no juízo deprecado, que os remeterá ao juízo deprecante para instrução e julgamento. Caso, porém, os embargos versarem apenas sobre vícios ou irregularidades dos atos do próprio juízo deprecado, caber-lhe-á o julgamento dessa matéria em específico – vide Súmula no 46 do STJ.

3.4 Expropriação dos bens

Caso a execução não seja embargada, ouvida a Fazenda Pública, proceder-se-á à expropriação dos bens do executado, sem necessidade de prolação de sentença.

Se houver terceiro vinculado por garantia real ou fidejussória, na hipótese de revelia do executado ou da rejeição dos embargos, será aquele intimado, sob pena de contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para no prazo de 15 dias remir o bem, se a garantia for real, ou pagar a dívida, se a garantia for fidejussória.

3.5 Arrematação e adjudicação

A arrematação deverá ser precedida de edital afixado na sede do juízo, no local de costume, publicado resumidamente uma só vez no Diário Oficial. O prazo entre as datas de publicação do edital e do leilão não poderá ser inferior a 10 dias, nem superior a 30 dias, devendo o representante da Fazenda Pública ser pessoalmente intimado da realização da hasta pública, dentro do citado prazo.

A alienação de quaisquer bens penhorados somente pode ser feita em leilão público, em lugar designado pelo juiz. Na hipótese de alienação antecipada dos bens penhorados, o produto será depositado em garantia da execução.

O art. 24 da LEF autoriza a adjudicação dos bens penhorados:

Art. 24. A Fazenda Pública poderá adjudicar os bens penhorados:

I - antes do leilão, pelo preço da avaliação, se a execução não for embargada ou se rejeitados os embargos;

II - findo o leilão:

a) se não houver licitante, pelo preço da avaliação;

b) havendo licitantes, com preferência, em igualdade de condições com a melhor oferta, no prazo de 30 (trinta) dias.

Parágrafo Único. Se o preço da avaliação ou o valor da melhor oferta for superior ao dos créditos da Fazenda Pública, a adjudicação somente será deferida pelo Juiz se a diferença for depositada, pela exequente, à ordem do Juízo, no prazo de 30 (trinta) dias.

3.6 Recursos

Nas execuções de valor igual ou inferior a 50 Obrigações do Tesouro Nacional (OTN), não haverá apelação nem recurso de ofício. O embargante, no caso, poderá apresentar embargos infringentes, no prazo de 10 dias, os quais serão julgados pelo juiz da execução, que poderá rejeitá-los ou reformar a sentença.

Nas apelações, por outro lado, poderão ser dispensados os revisores. Elas serão julgadas pelo Tribunal Regional Federal ou pelo Tribunal de Justiça, conforme a natureza da dívida ativa.

Da decisão de segunda instância caberá recurso especial ou recurso extraordinário, nos casos previstos nos arts. 105, III, e 102, III, da Constituição Federal.

3.7 Exceção de preexecutividade

 O art. 16, § 1o, da LEF veda a apresentação de embargos antes de garantida a execução. Entretanto, é possível, na execução fiscal, o executado defender-se, independentemente de assegurar o juízo da execução, por meio de uma figura processual, resultante de construção doutrinário-jurisprudencial, denominada exceção de preexecutividade.

Por meio dela, busca-se evitar o desenvolvimento de atos de execução fundados em título executivo nulo, por razões de economia processual e de lógica. A exceção de preexecutividade é meio processual hábil para atacar o título não revestido de liquidez, certeza e exigibilidade.

Aponta-se, através dessa exceção, a falta de requisitos formais do título, de tal sorte que o reconhecimento de sua nulidade independa da análise de premissas de fato. Cabe, portanto, nos casos de consumação do prazo prescricional, superveniência da prescrição intercorrente, paralisação do processo por mais de 5 anos, ou até mesmo de comprovação documental irrefutável de que a dívida sob execução já havia sido paga.

Referências bibliográficas:

HARADA, Kyoshi. Direito financeiro e tributário. São Paulo: Atlas, 2008.

SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011.