A PIRATARIA MARÍTIMA NA SOMÁLIA EM CONSEQUÊNCIA DA VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS


Porwilliammoura- Postado em 08 dezembro 2011

Autores: 
PENA, Marcela Lopes Silveira

O mundo, em pleno século XXI, está ameaçado por uma velha inimiga: a pirataria marítima. Este fantasma, maciçamente materializado no contexto global, assombra, de maneira repentina, a segurança das rotas comerciais ultramarinas, uma vez que, 90% do comércio mundial é feito pelas vias oceânicas. No entanto, as causas verdadeiras deste ressurgimento não são reveladas pela mídia, visto que, os crimes são conseqüências de atos maiores e piores, de autoria dos países desenvolvidos, os detentores da economia e dos veículos de informação global.

A pirataria, de acordo com a classificação da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS, em inglês), de 1982, pode ser definida como qualquer ato de violência, detenção ou depredação para benefício pessoal, cometidos pela tripulação, ou passageiros, de um navio sobre outro, ou sobre pessoas, ou propriedade a bordo desse navio, fora da jurisdição de um Estado (artigo 101). Informa-se que, desde o fim do Mundo Bipolar, existem mais piratas do que anteriormente na História, o que causa grande impacto mundial, bem como, demanda um custo elevadíssimo e, tragicamente, um considerável número de vítimas. O tema já é explorado comercialmente pela indústria cinematográfica hollywoodiana, em filmes, como “Os Mercenários” (The Explendables) e “Scott Pilgrim Contra o Mundo” (Scott Pilgrim vs. the World), onde um dos personagens informa que ser pirata está na moda.

Por outro lado, a pirataria romantizada dos séculos XVII e XVIII, está vinculada com a luta contra a exploração e a opressão. Durante a época das grandes navegações, a miséria e a pobreza assolaram, de uma maneira extremada, as grandes cidades. Assim, a única oportunidade para alguns, principalmente para os jovens, era se aventurar em alto mar, em busca de salário e melhores condições de vida. Contudo, o que os esperavam era trabalho forçado, castigos cruéis, inanição e nada de retribuição pecuniária, ou seja, não havia dignidade, compaixão, alimentação decente e percebimento justo, características do sistema trabalhista da época, apoiado pelas primeiras ideias liberais. Diante desses meios condenáveis e subumanos, muitos se amotinaram contra os comandantes das galés e criaram um modo diferente de agir nos mares ao redor do planeta.

Embora fossem considerados ladrões improdutivos, os rebelados, renomeados de piratas, demonstraram para as forças navais, principalmente a Marinha Real inglesa, que os navios não necessitavam ser comandados com brutalidade e repressão e, ao contrário do que faziam os dirigentes políticos, partilhavam o butim entre todos. Esta divisão foi um dos planos mais igualitários da distribuição de recursos jamais existente. Logo, por causa dos constantes saques, do apoderamento das naus marciais e dos prejuízos aos cofres, incitaram a ira das nações empilhadas. Desse modo, uma campanha mundial contra a pirataria foi implantada, com a imposição da pena de morte para quem se atrevesse a praticar tal ato e, como recurso de propaganda para coibir, foi inventado o pirata como um ícone selvagem e demoníaco. Porém, a população pobre não se intimidou; os defenderam e os ajudaram, visto que, os “Barbas Negras”, representaram o sentimento de libertação e vingança da sociedade massacrada e oprimida.

Por conseguinte, os piratas modernos estão completamente diferente da figura dos ladrões dos mares fantasiada nos clássicos da literatura, a que eram homens sanguinários e beberrões que usavam perna de pau, tapa-olho, desfilavam com um papagaio no ombro e ostentava, como símbolo oficial, a peculiar bandeira negra, com a caveira entre espadas, criação de Jolly Roger, um dos saqueadores mais famosos. Hoje, conhecidos também como terroristas dos mares, superam os pioneiros em violência, número, tecnologia, no modo de atuação e no vestir. No lugar das espadas e mosquetões, entram em cena os fuzis de assalto, principalmente o mundialmente conhecido Kalashnikov AK-47, de fabricação russa, entre outros artefatos militares. Além disso, as constantes navegações a olho nu na procura pelas vítimas cederam espaço para os atuais equipamentos de localização, como o Sistema de Posicionamento Global (GPS, em inglês), e de comunicação. Assim, é evidente que os ataques são estrategicamente mais precisos, mais coordenados e, relativamente, menos perigosos para os criminosos, do que no passado.

Entretanto, as motivações entre o passado e o futuro se assemelham. Segundo o capitão-de-corveta Antonio Carlos Rebelo Loureiro (2010, p. 67), menciona-se que “a história da pirataria moderna está imersa em sete pecados mortais: pobreza, desespero, fome, oportunidade, violência, inveja e ambição.” O militar da marinha brasileira discute as formas que levam o ser humano, no contexto atual, a participar de tal fato. Alguns, por necessidade básica de subsistência, outros, meramente por enxergarem um grande negócio lucrativo.
Salienta-se que uma das principais rotas marítimas para o comércio e para o transporte do petróleo, proveniente do Golfo Pérsico e com destinação para os EUA e para a Europa, é a região do Golfo de Aden, bem como o Chifre da África, regiões geográficas em que está inserido um dos países que encabeça a lista da pirataria, a Somália. Este país africano, assolado por guerras tribais, provenientes dos efeitos do neocolonialismo do século XIX, entrou em colapso em 1991. Desde então, mais de nove milhões de somalis sofrem com a miséria, a desnutrição e com a falta de um governo organizado, dividido entre clãs e gangues rivais.

O mundo ocidental, é importante frisar, não se conteve apenas em explorar, retirar toda riqueza da África oriental e abandonar esta região. A recente intenção, absurdamente, é transformar a área do Golfo de Aden e da costa leste da Somália em um imenso lixão tóxico europeu. Segundo o enviado da ONU, Ahmedou Ould-Abdallah, “alguém está jogando lixo atômico no litoral da Somália. E chumbo e metais pesados, cádmio, mercúrio, encontram-se praticamente todos.” Indagado sobre a posição das grandes potências, mediante os fatos, apenas suspira: “Nada. Não há nem descontaminação, nem compensação, nem prevenção”. Em conformidade com o agente humanitário, o renomado economista e professor universitário, Marçal Rogério Rizzo, informa que “tem ocorrido uma rápida expansão no tráfico internacional de lixo. Já houve registros de carregamentos de lixo para países da África, do sudeste asiático, México, Chile, Bolívia, Argentina e Brasil.”

Para confirmar este relato há provas em que a população somali litorânea está com a saúde prejudicada e aumentou o número de nascimentos de crianças com má formação gestacional. As pessoas apresentaram os sintomas de contaminação por radiação e, segundo uma estatística, houve mais de 300 mortes. Destarte, com o tsunami de 2005, algumas centenas de barris enferrujados vieram à tona em variados pontos do litoral. Estranhamente, depois da saída das nações estrangeiras desenvolvidas do território somali, no início da década de 1990, misteriosos navios europeus apareceram e começaram a jogar ao mar barris e contêineres no litoral da Somália. Ao rastrear estes dejetos, pode se perceber que são provenientes de hospitais e de indústrias dos colonizadores.

Ocorre, também, uma grande exploração ao pecado, um dos maiores e restante recurso somali. Portanto, a população desta parte do continente africano, não sofre unicamente com a intoxicação do lixo nocivo ocidental disseminado impunemente, como também possui a escassa fonte de alimentação saqueada pelos grandes pesqueiros ilegais a serviço das gigantescas corporações comerciais, os verdadeiros piratas. Segundo a Agência Reuters, um pescador que vive em Marka, cidade a 100 quilômetros ao sul de Mogadíscio, a capital somali, declarou que “se nada for feito, acabarão com todo o pescado de todo o litoral da Somália”.

Diante do exposto, é evidente que a população, ao contrário do que esperavam os países ricos, saísse da omissão e se manifestasse de alguma forma, uma vez que os direitos e as garantias fundamentais, da nação africana, são violados descaradamente. É ilógico e oposto a razão descobrir que transformaram um dos territórios mais pobres e esquecidos em latrina e esgoto, e que tais ações lesivas a integridade física, psicológica e social da vida humana são praticados pelos Estados idealizadores da Organização das Nações Unidas e da Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948. No entanto, é importante citar que a reação somali amparada na pirataria é uma forma ilegal, reprovável e, também, desumana, passível de punição, deve ser desarticulada e desapoiada. Afinal, os revolucionários agem mediante o exercício arbitrário das próprias razões, numa definição prática dos fins em justificativa dos meios, ou seja, em consequência do atentado a dignidade da pessoa humana. Nada substitui a luta politicamente correta com a utilização dos meio diplomáticos, a fim de conseguirem a ajuda internacional, para que cesse a deposição de imundícias, a exploração pesqueira e reerga a política e a economia local.

Por causa dos inúmeros ataques e sequestros, uma imensa frota naval militar, formada por diversos países, do oriente ao ocidente, se deslocou para a região do Golfo de Aden, em 2009, uma atitude razoável para impedir que mais pessoas sejam feridas ou mortas, se não fosse por um detalhe sempre predominante nas relações humanas: o fator econômico. Bastou que simples e iletrados pescadores se intrometessem no caminho, pelo qual passa 20% do petróleo do mundo, que, imediatamente, as nações dominantes despacharam a artilharia marítima.

É fácil prever que, se ajudassem o país africano a se reestruturar, de maneira geral, em vez de destruir, contaminar e “piratear”, não teriam este problema e vidas seriam salvas. Quanto dinheiro foi gasto desnecessariamente na operação, ao contrário de melhor emprega-lo na ajuda à sociedade somali. Deve-se “cortar o mal pela raiz”, e isso se faz com a efetivação de melhores situações. Por que não se reúnem, nesse porte, para empregar medidas de salvação definitiva ao povo somali? Não é esta a função da ONU? Em defesa da organização, inúmeras intervenções foram e são feitas, principalmente a de 1993 e a atual distribuição de comida, pelo World Food Programme. A crítica, em todo caso, é na maneira errada e insuficiente do auxílio.

Os “piratas” somalis, em síntese, são meros trabalhadores marítimos responsáveis em suprir as necessidades básicas das próprias famílias, os quais capturam os navios, na tentativa de assustar, de dissuadir os pesqueiros exploradores e de alimentar os entes familiares, além de protegerem a soberania, fomentar a discussão da verídica motivação da pirataria moderna e lutar contra os abusos das potências mundiais, em prol da própria subsistência. Souberam atrair a atenção de todos, ao mexer num “ponto dolorido” dos países de primeiro mundo, uma vez que a própria situação precária de sobrevivência, de elevada pertinência, não reuniu tantos olhares e importância. Apenas as ações violentas são registradas, ao invés das causas.

Por fim, a humanidade, completamente unida, deveria encabeçar uma espécie de “impeachment” em desfavor das nações, as que mais desrespeitam a cartilha dos direitos humanos, titulares da cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, para que haja a rotatividade e a reforma, a favor de todos os outros participantes preconceituosamente inferiorizados, como o Brasil. Assim, porventura, acontecimentos desse porte não existiriam e o planeta ficaria um tanto melhor, não apenas com a recém “morte” do terrorista saudita Osama Bin Laden, o arquiteto dos atentados aos Estados Unidos da América, no ano de 2001, embora, o falecimento, o planejamento dos ataques ou a existência do líder da Al-Qaeda suscitem dúvidas e teorias de conspiração, conjuntamente a referida rede terrorista. Quem garante a veracidade de todas as informações veiculadas? A maior potência mundial jurou a existência das armas químicas e biológicas no Iraque. Até o momento não as encontraram. Falta de competência?