NOVA ORDEM GLOBAL E A POLÍTICA: O ESPAÇO DA PERIFERIA


PoreGov- Postado em 05 março 2011

Autores: 
DUPAS, Gilberto

Compreender a nova ordem mundial ? e o papel das chamadas ?potências
emergentes? dentro dela - exige examinar a lógica das relações de poder que resultou
em vitória retumbante do capitalismo globalizado, atualmente o único modelo
disponível para fazer mover a economia mundial com padrões mínimos de eficiência.
Para isso faz-se necessário ir além do equilíbrio de forças definido a partir da conduta
internacional dos Estados Unidos pós-11 de setembro, contingência histórica que fez
coexistirem uma ação política terrorista dramática com um governo norte-americano de
inspiração fundamentalista. Analisar o longo caminho percorrido pelo capitalismo até o
que hoje se designa economia global é investigar as suas crises, no melhor estilo da
metáfora schumpteriana da destruição criativa. Dois raros pensadores do final do século
XIX tiveram suas idéias confirmadas na emergência do capitalismo em sua forma
hegemônica deste início de século XXI: Max Weber e Karl Marx. Weber designou ?a
diáspora calvinista como o viveiro em que floresceu a economia capitalista?. E
lembrava as máximas de Benjamin Franklin como sendo uma espécie de profissão de fé
ianque que expressava a essência do espírito capitalista, uma filosofia da avareza que
definia o homem digno de confiança como aquele que tinha crédito e valorizava o dever
do aumento das posses como um objetivo em si mesmo.
Para Weber, o espírito capitalista transformou-se num vitorioso fenômeno de
massa que deu origem a um sistema econômico bem sucedido e avassalador. Dizia ele:
?Atualmente a ordem econômica capitalista é um imenso cosmos em que o indivíduo já
nasce dentro e que para ele, ao menos enquanto indivíduo, dá-se como um fato, uma
crosta que ele não pode alterar e dentro da qual tem que viver. Esse cosmos impõe ao
indivíduo, preso nas redes do mercado, as normas de ação econômica. O fabricante que
insistir em transgredir essas normas é indefectivelmente eliminado, do mesmo modo
que o operário que a elas não possa ou não queira se adaptar é posto no olho da rua
como desempregado?. Além do mais, esse sistema encontrou sempre à mão - do século
que se seguiu até os dias de hoje - uma permanente abundância de uma das suas
condições de vitalidade, a mão-de-obra barata. É mais uma vez Weber quem previa que,
?para sua expansão, o capitalismo requer a existência de um excedente populacional que
ele possa alugar a preço baixo no mercado de trabalho?.
No caso de Marx, O Capital continha a explicação tanto do que fazia o
capitalismo funcionar, ou seja, de como os lucros eram gerados pela extração da maisvalia
dos trabalhadores, como as indicações sobre o futuro provável do sistema. O
Manifesto foi uma verdadeira premonição do que viria a ser o capitalismo global: ?A
necessidade de expandir constantemente o mercado para os seus produtos impulsiona a
burguesia em toda a superfície da terra. Ela precisa criar abrigos em toda parte,
estabelecer-se em todos os lugares, afirmar conexões em todo o mundo. Com a
exploração do mercado mundial, a burguesia deu um caráter cosmopolita à produção e
ao consumo em todos os países. Para grande pesar dos reacionários, retirou de sob os pés da indústria o solo nacional sobre o qual ela existia. Todas as indústrias nacionais
foram destruídas ou estão sendo destruídas diariamente. São deslocadas por novas
indústrias, cuja introdução passa a ser uma questão de vida e morte em todas as nações
civilizadas; por indústrias que não trabalham mais com as matérias-primas locais,
porém com materiais trazidos das regiões mais remotas. Indústrias cujos produtos são
consumidos não só naquele país mas em todas as partes do mundo. Em lugar das antigas
necessidades, atendidas pela produção nacional, temos novas necessidades, que para a
sua satisfação exigem os produtos de terra e climas distantes. Em lugar do antigo
isolamento e da auto-suficiência local e nacional, temos um intercâmbio em todas as
direções, a interdependência universal das nações?.
Com referência à duração do capitalismo, no curto prefácio de Uma
Contribuição à Crítica da Economia Política, publicado em 1859, Marx escreveu:
?Nenhuma ordem social jamais desaparece antes que todas as forças produtivas que
acolhe se tenham desenvolvido; e novas relações superiores de produção nunca surgem
antes que as condições materiais para a sua existência tenham amadurecido no seio da
antiga sociedade. Assim, a humanidade sempre se propõe só as tarefas que pode
executar; ao examinar o assunto mais de perto sempre verificamos que a própria tarefa
só surge quando há condições materiais necessárias para a sua solução?. O capitalismo
sobreviveu e fortaleceu-se. Nenhuma das condições imaginadas então como possíveis
causas do fim do sistema capitalista pareceu poder detê-lo: a redução do consumo e a
falta de mercados, a organização dos trabalhadores, a perda do império colonial, a
escassez de petróleo e a ameaça proletária do terceiro mundo. E ele não desaparecerá
até esgotar ? se é que um dia esgotará ? o seu potencial. O século XX foi uma brilhante
e assustadora demonstração de sua força. Se a taxa de acumulação global se elevou, as
assimetrias foram radicalizadas, aumentou a exclusão social, concentrou-se renda e
riqueza e agravaram-se os imperativos de legitimação.

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