Do regime de bens no Código Civil de 2002


PorJeison- Postado em 08 outubro 2012

Autores: 
PINHEIRO, Raphael Fernando.

 

 

Com a ocorrência do matrimônio ou a caracterização da união estável, incute-se o casal ao regramento jurídico do regime de bens, incidindo o direito patrimonial no microuniverso jurídico do Direito de Família.

O regime de bens, em sua objetiva definição, é o conjunto de normas a ser aplicada às relações e interesses econômicos resultantes da formação da família matrimonial ou pela união estável, envolvendo as questões inerentes à propriedade, fruição, administração de bens e disponibilidade de bens de ambos, desde da formação da entidade familiar até a sua dissolução. Assim, trata-se do estatuto patrimonial do casal.[i]

Segundo o art. 1.639 do Código Civil, com o casamento, tem início o regime de bens, começando a vigorar na data do ato nupcial.[ii] Ampliando-se a interpretação deste artigo para contemplar a união estável  e observando-se o que dispõe a Lei n. 9.278/96, em seu art. 5°,  sobre o contrato de convivência, evidencia-se a incidência do regime patrimonial nessas relações no momento em que constata-se os requisitos legais para sua configuração - durabilidade, publicidade e continuidade – permitindo com isso o seu reconhecimento.

Caracterizando o princípio da variedade do regime de bens, o Código Civil possibilita ao casal quatro modelos a serem escolhidos, não excluindo a possibilidade de criarem para si um regime próprio, por meio de pacto antinupcial ou contrato de convivência. Os regimes de bens a serem escolhidos são: comunhão parcial; comunhão universal; separação; e  participação final nos aquestos.[iii]

O regime da comunhão parcial de bens foi eleito pelo legislador como o modelo legal para reger o patrimônio daqueles que não optaram pelos demais tipos. Neste regime, basicamente, excluem-se da comunhão os bens que o casal possuía antes de formar a entidade familiar, comunicando-se os bens adquiridos posteriormente a título oneroso.[iv]

Cabe ressaltar que a jurisprudência firmou entendimento de que não há necessidade do cônjuge ou convivente que não laborava, apresentar prova de contribuição para a aquisição de patrimônio comum, tendo em vista que o enlaçamento de vidas e a colaboração, quase sempre da mulher que abdica de sua carreira profissional para cuidar da casa e dos filhos,  é essencial para a mantença da estrutura familiar e possibilita, logicamente, a dedicação do varão a sua carreira.

No que pese aos bens que excluem-se do regime da comunhão parcial, o art. 1.659 do CC elenca os bens que cada cônjuge/convivente possuir ao casar/formar união estável, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento/união estável, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges/conviventes em sub-rogação dos bens particulares; as obrigações anteriores ao casamento/união estável; as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge/convivente; e as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

O regime da comunhão universal de bens é aquele no qual todos os bens, presentes e futuros, individuais e comuns, antes ou depois do matrimônio/união estável, e as dívidas passivas comuns tornam-se apenas uma só massa.[v] É o regime em que instaura-se a mancomunhão, passando a propriedade para a mão comum.

Apesar disso, o legislador civilista estabeleceu exceções a comunicação de bens, excluindo-se dos efeitos do regime os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; as dívidas anteriores ao casamento/união estável, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges/conviventes ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge/convivente; e as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.[vi]

No regime de separação de bens, o cônjuges e os conviventes conservam o domínio, a administração e a disponibilidade de seus bens presentes e futuros, bem como arcaram com a responsabilidade pelas dívidas anteriores e posteriores a formação da entidade familiar.[vii]

Vigorando a separação do acervo, a jurisprudência passou a admitir a divisão do patrimônio constituído durante o matrimônio e a união estável, visando evitar o enriquecimento sem causa, desde que quem não possua o patrimônio em seu nome comprove sua contribuição onerosa para a aquisição.[viii]

Por fim, como o último regime de bens disciplinado no Código Civil, está a participação final nos aquestos, sistema encontrado, dentre outros países, na Alemanha, França, Espanha, Portugal e Argentina.

Trata-se de um regime híbrido, pois prevê a separação de bens  enquanto perdurar o casamento ou união estável, preservando cada cônjuge ou convivente seu patrimônio pessoal, com a livre administração de seus bens, necessitando apenas da autorização do outro para vender bens imóveis. Pode porém, estabelecer, em pacto antinupcial ou contrato de convivência, cláusula que dispense a necessidade desta anuência.[ix]

Terminada a relação, fica estabelecido a cada um o direito à metade dos bens adquiridos a título oneroso pelo casal durante o tempo em que configuraram entidade familiar, estabelecendo o Código a forma como se dará a operação contábil para o cálculo participação de um sobre os aquestos do outro, regulamentando como ocorrerá a liquidação do acervo. Ressalta-se que a participação será sobre o patrimônio adquirido pelo outro de forma contábil, e não por meio da constituição de um condomínio.[x]

Ficam excluído dos aquestos, nos termos do art. 1.674, os bens anteriores ao casamento/união estável e os que em seu lugar se sub-rogaram; os que sobrevieram a cada cônjuge/convivente por sucessão ou liberalidade; as dívidas relativas a esses bens.

O regime de bens é uma das consequências jurídicas do matrimônio e da união estável, se o casal não o escolhe, a lei trata de determinar um para  vigorar durante a relação. Boa doutrina, fazendo analogia, já comparou o enlace familiar  a um verdadeiro contrato de adesão, ficando a vontade do casal subordinada à lei, que estabelece um normatização com o fim de regulamentar a vida à dois.[xi]

Dos efeitos do regime de bens ninguém pode fugir, então que escolha o casal o que melhor lhe convir, lembrando que o entrelaçamento de vidas não reflete-se apenas na comunhão de afetos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2010.

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2010.

DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2005.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2008.

Notas:

[i] DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 1166. 

[ii] DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado, p. 1166. 

[iii] DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 155. 

[iv] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2008, p.178.

[v] DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: direito de família, p. 173.

[vi] Artigo 1.668 do Código Civil.

[vii] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família, p. 191.

[viii] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2010, p. 245.

[ix] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família, p. 194.

[x] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família, p. 194.

[xi] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, p. 219.

 

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