Royalties: compensação pela exploração de recursos naturais


PorThais Silveira- Postado em 29 maio 2012

Autores: 
Kayonara Fontão de Freitas

 

Sumário: 1 - Introdução. 2 - Da propriedade dos recursos minerais. 3 – Da natureza jurídica dos royalties. 4 – Da impossibilidade da divisão dos royalties com estados federados não afetados pela exploração . 5- Conclusão.


 

1.    Introdução

Depois de descoberto o pré-sal iniciou-se uma discussão sobre os royalties e seu atual sistema de distribuição. Atualmente a maior parcela dos royalties é para aos Estados e Municípios produtores, mas há uma discussão sobre a justiça dessa divisão, sugerindo que os royalties deveriam ser divididos de forma igualitária a todos.

O presente trabalho vai abordar essa temática e tentar esclarecer os motivos que determinam a divisão atual dessa compensação.

2.    Da propriedade dos recursos minerais

A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seu art. 20, incisos V, VI e IX, quais são bens da União:

 Art. 20. São bens da União:

 V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;

 VI - o mar territorial;

IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;

            Num mesmo sentido o texto constitucional traz em seu art. 176 a seguinte redação:

Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra.

            Pela simples leitura dos artigos entende-se que os recursos naturais são bens públicos e pertencentes à União.      

3.    Na natureza jurídica dos Royalties

Não obstante tais recursos pertençam à União é assegurada, entretanto, aos Estados, Distrito Federal e Municípios produtores, efetiva participação nos resultados ou compensação financeira pela exploração desses recursos que estiverem em seu território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, vejamos:

 § 1º - É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.

Essas formas de participações governamentais é contraprestação paga pelo particular em virtude da exploração de um recurso público e esgotável. Parcela dessas contraprestações são devidas aos órgãos da Administração Federal, em virtude de ser a União a proprietária desses recursos. Por outro lado, os Estados e Municípios produtores também recebem royalties como forma de compensação pelos reflexos que a atividade extrativista causa diretamente em nessas áreas.

A atividade extrativista é lícita e tem tratamento legal no nosso ordenamento jurídico, todavia é atividade que causa, direta e indiretamente, diversos danos que atingem a sociedade e o  meio ambiente.

Os danos ambientais associados diretamente à exploração e produção de petróleo podem ocasionar distúrbios físicos, químicos e biológicos, podendo ser citados desde despejos de resíduos durante a perfuração dos poços e a contaminação da água, vegetação marinha e animais pelo derramamento do óleo que sempre causa ao meio ambiente prejuízos catastróficos. Também atinge a economia local, exige infra-estrutura e mão de obra especializada, causa elevação da frota de veículos circulantes na região, entre outros.

Nesse entendimento, já se posicionou HARADA (2009) quando bem disse que:

(...) Compreende-se a inclusão dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, já que a exploração dessas atividades em seus territórios pode trazer prejuízos decorrentes de ocupação de áreas para instalação de equipamentos e de invasão por águas dos reservatórios. Mesmo em se tratando de extração de petróleo ou gás natural, do mar territorial ou da plataforma continental, sempre haverá instalações marítimas ou terrestres, de embarque ou desembarque, que justificam essa compensação. (grifo nosso)

A supracitada autora também disse que em casos de acidentes, decorrentes dessas atividades, torna-se imperiosa a imediata mobilização de recursos materiais e humanos pelos poderes públicos. E o poder público local é sempre aquele que se encontra na linha de frente para prestar os primeiros socorros à população atingida. Daí o caráter contraprestacional desse tipo de ingresso de dinheiro, denominado compensação financeira.

Machado (2001), ao discorrer sobre o Federalismo e os royalties do petróleo, na Revista Tributária e de Finanças Públicas, justificou a atual divisão, como se transcreve breve trecho abaixo:

Vê-se que o legislador ordinário mostrou preferência no beneficiamento dos entes federados que tenham risco efetivo de dano ambiental, pois que eles deverão atual no sentido de minorar os malefícios de um acidente na área em questão. Ademais, reconheceu-se que há necessidade de uma estrutura de serviços públicos ligados, ainda que apenas indiretamente, à área de exploração, uma vez que um empreendimento dessa envergadura demanda recursos humanos e logísticos consideráveis. Estradas, portos, aeroportos, heliportos, hospitais, escolas, segurança pública, enfim, uma gama de serviços que se altera, em face de um maior afluxo de máquinas e de homens, com a finalidade precípua de oferecer condições mínimas para que a exploração comercial dos recursos naturais seja viável. Em última instância, é a participação de Estados e de Municípios na busca pela efetividade de um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: garantir o desenvolvimento nacional.

4.    Da impossibilidade da divisão dos royalties com estados federados não afetados pela exploração

Como se pode aferir, a divisão dos royalties entre Estados e Municípios produtores e não produtores fere o princípio da isonomia, uma vez que tenta igualar os desiguais, entes federados que nada forem em decorrência da exploração do petróleo e entes federados que precisam suportar a atividade como todo seu ônus.

Outro ponto importante a se considerar é que a Constituição Federal proibiu a tributação do ICMS pelos Estados produtores, vejamos:

 “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços de transporte interestadual (...)

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

(...)

X – não incidirá: 

b) sobre operações que destinem a outros estados  petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos de Le derivados, e energia elétrica”

Nesse sentido, Estados e Municípios não produtores percebam receita na comercialização de petróleo e derivados, e aqueles que toleram os reflexos da atividade de exploração não são beneficiados com a respectiva tributação que deveria dar-se na origem.

Não se pode assim dizer que Estados não afetados não são beneficiados pela exploração mineraria uma vez que recebem as parcelas do ICMS recolhido por eles. Do mesmo, mais uma vez se justifica a compensação financeira estabelecida no art. 20, § 1º da Carta Magna em virtude do ICMS retirado dos Estados e Municípios produtores, conforme julgado do Ministro Nelson Jobim na decisão do Mandado de Segurança nº 24.312/DF:

Em 1988, quando se discutiu a questão do ICMS, o que tínhamos? Houve uma grande discussão na constituinte sobre se o ICMS tinha que ser na origem ou no destino.

A decisão foi que o ICMS tinha que ser na origem, ou seja, os Estados do Sul continuavam gratuitamente tributando as poupanças consumidas nos Estados do Norte e do Nordeste.

Aí surgiu um problema envolvendo dois grandes assuntos: energia elétrica - recursos hídricos - e petróleo.

Ocorreu o seguinte: os estados onde ficasse sediada a produção de petróleo e a produção de energia elétrica acabariam recebendo ICMS incidente sobre o petróleo e energia elétrica.

O que se fez? Participei disso diretamente, lembro-me que era, na época, o Senador Richard quem defendia os interesses do Estado do Paraná e o Senador Almir Gabriel quem defendia os interesses do Estado do Pará, além do Rio de Janeiro e Sergipe, em relação às plataformas de petróleo.

Então, qual foi o entendimento político naquela época que deu origem a dois dispositivos na Constituição? Daí por que preciso ler o § 1º do Art. 20, em combinação com o inciso X do art. 155, ambos da Constituição Federal.

O que se fez? Estabeleceu-se que o ICMS não incidiria sobre operações que se destinassem a outros estados - petróleo, inclusive lubrificante, combustíveis líquidos, gasosos e derivados e energia elétrica -, ou seja, tirou-se da origem a incidência do ICMS.

Veja bem, toda a produção de petróleo realizada no Estado do Rio de Janeiro, ou toda produção de energia elétrica, no Paraná e no Pará, eram decorrentes de investimentos da União. Toda arrecadação do País contribuiu para aquela produção.

Assim, decidiu-se da seguinte forma: tira-se o ICMS da origem e se dá aos estados uma compensação financeira pela perda dessa receita. Aí criou-se o § 1º do art. 20 [...].

5.    Conclusão

Parece ser claro que a compensação financeira paga aos Estados e Municípios afetados é decorrente da exploração dos recursos minerais em virtude, não da propriedade, e dos prejuízos gerados pela atividade nestes entes federados, conferindo-lhe a função de minimizar os reflexos da exploração de recursos naturais nas suas contas públicas e modo de vida local.

Num mesmo sentido pode-se concluir que só se pode compensar quem sofre os prejuízos (são afetados) da exploração, uma vez que não faz sentido compensar alguém que nada sofreu nem corre o risco de sofrer pelo simples compensar.

Referência Bibliográfica

BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 10 maio. 2012.

MACHADO, Luiz Henrique Travassos. Federalismo e os royalties do petróleo. In: Revista tributária e de finanças públicas. São Paulo, ano 19, vol. 98, maio/jun. 2011.

HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

STF. http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=86118 - acesso em 19 maio. 2012.

Rocha, Wallace da Silva. http://www.portalabpg.org.br/PDPetro/4/resumos/4PDPETRO_8_1_0231-2.pdf Acesso em: 15 maio 2012.