O MEIO AMBIENTE COMO DIREITO DE TODOS: O ambiente nos tempos da desumanidade


Porwilliammoura- Postado em 08 dezembro 2011

Autores: 
NASCIMENTO, Saulo Ferreira Silva Oliveira

O MEIO AMBIENTE COMO DIREITO DE TODOS:
O ambiente nos tempos da desumanidade.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 ACOMODAÇÃO DO PROBLEMA; 2 SOBRE AS INSTITUIÇOES DA TUTELA VERDE; CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.

RESUMO
O presente artigo reflete de forma geral as condições do debate acerca do ambiente, homem e sociedade dentro do contexto da problemática dos tempos atuais. Tecendo breves comentários sobre crise da condição humana e a oportunidade de superação de um paradigma, tentamos encaixar o ambiente como pressuposto necessário para a dignidade da pessoa humana.

Palavras-Chave: Ambiente; Crise de consciência; Direitos fundamentais e Sociedade

INTRODUÇÃO

O início do nosso querido século XXI é marcado por sucessivas crises. Crises estas que demonstram a inaptidão do homem em controlar as conseqüências de sua própria sociedade, os efeitos da sua própria evolução, seja ela, espiritual, intelectual ou orgânica. Após os grandes marcos e viradas dos dois séculos antecessores, XIX e XX, os quais determinaram o aparecimento de instituições e extinção de outras, fatos estes de certa forma determinantes para a construção dos valores atuais, o homem sofre consigo mesmo.
Falar em crise é lembrar o colapso do sistema financeiro mundial, do desentendimento reiterado ao longo do mundo, em se tratando de política externa, guerras promovidas em favor de seguimentos corporativos e a criação de estado de medo, pela ameaça terrorista ou o comando do narcotráfico, repercutido por alguns dos principais líderes mundiais e agências de noticiais.
É absolutamente possível e necessária uma reflexão sobre o que nos propõem o quadro atual das relações humanas. A crise a qual muitos se referem, ligada à qualquer segmento ou instituição social, formará um complexo de relações decadentes que, ao meu ver, constrói a verdadeira questão a ser re-pensada, a condição humana no paradigma do “no sense”. Sofremos hoje por uma depressão nas ambições da coletividade, dentro de uma circunstancia de perda de sentido, de referencial.
As crises que formam a crise demonstram a perda da humanidade pelo homem. Em tempos de globalização, era informacional e o ritmo incessante do dia-a-dia, as relações interpessoais se distanciaram, as pessoas tornaram-se estranhos e, esses estranhos, são encarados sempre como uma ameaça à integridade. Pensando no paradigma do “no sense”, perderam-se também aspirações e desejos a serem alcançados, tão presentes nas gerações da década de 1960 e 1970. Sonha-se menos e cobra-se demais, a um padrão a ser alcançado e, no meu caso, o estudante de direito, deverá ser aprovado em concurso público, se possível, federal.
As questões levantadas neste artigo levaram em conta a crise da condição humana, seus reflexos na sociedade e no estudo do direito, até alcançar a questão ambiental como um ‘pré-direito’.
Assim como os gregos tinham sua filosofia, os renascentistas e iluministas sua razão e a ciência, Gramsci sua educação e Martin Luther King, os direitos civis, vamos à busca da re-acomodação do homem, em si e coletivamente considerado.

1 ACOMODAÇÃO DO PROBLEMA

Os aspectos da crise generalizada nos apontam uma crise de consciência. A sociedade nutri valores vazios e infecundos que representam posturas hegemônicas modeladoras da ideologia massificante do cotidiano do indivíduo. A dimensão nuclear da satisfação pessoal é reproduzida a partir de critérios hedonistas e egoístas, transformando o conteúdo humano das relações globalizadas, um imenso espaço vazio.
Os problemas sociais, políticos e econômicos são maximizados pela desorientação do homem frente às inovações do século XX (NUNES, P. 5, 2008). Na idéia da era informacional, buscam-se prazeres utilitários e inúteis os quais fragmentam as possibilidades da ação comunitária, da realização do homem como animal político, relacional. Se vivemos uma o estado do medo globalizado perverso, o homem é fadado ao descaso mutuo, consigo e com o meio.

O ethos da contemporaneidade é marcado por rápidas mudanças, correrias, clima e fenômenos naturais fora do nosso controle (Giddens, 2000). O que nos cerca é confuso e confusamente percebido (Santos, 2000:17). A civilização do século XXI é fria, de concreto, procura preencher ou satisfazer o homem mas o leva ao consumo estimulado e desenfreado, ao desencanto e desamor, a buscar e estabelecer, nos relacionamentos pessoais e familiares assim como no convívio com estranhos, laços líquidos, cada vez mais flexíveis, propensos a mudar com rapidez e de forma imprevisível (Bauman, 2004). É uma civilização que precisa ouvir e se convencer de que homem algum é uma ilha, completo em si mesmo e, portanto, não pode permanecer isolado, cercado pela fluidez. (NUNES, P. 5, 2008)

Neste turno, a questão ambiental emerge. A compreensão do ambiente, um passo para despertar a humanidade do homem, supera a busca da satisfação imediatista do interesses egocêntricos e detona a visão materialista-comunista. A gestão de bens comuns, como o bem ambiental, pode recompor o caráter inter-relacional do homem em frente à questões de alcance geral e dar nova vida a natureza da coletividade, como meio de autoconhecimento do homem, reconstruindo sentidos e identidades.
A questão ambiental apresenta-se perante essa crise de consciência como uma ferramenta de reconstrução do ser humano, projetando, com efeito, a possibilidade de um novo pensar, integro e completo, assegurando a unidade básica de sustentação da vida humana – o ambiente – e revolucionando valores. Pensando numa crise no sentido grego krisis e krinein que significam, respectivamente, discriminação e decisão (com examinação), estamos diante da oportunidade de mudança, como já dito, de re-construção da condição humana.
Nas palavras de Leonardo Boff, em prefácio à Olmiro Silva, “esta situação criou uma nova centralidade. A questão fundamental não é que futuro possui a cultura ocidental com sua tecnociência, nem o cristianismo com sua promessa de ressurreição de toda carne, nem a democracia como valor universal. A questão das questões agora é: como garantir futuro para a humanidade e para o planeta Terra? Como cada saber, cada instancia social cada pessoa ajuda nessa tarefa messiânica? Da sinergia de todos nasce uma esperança bem fundada de que teremos ainda futuro e de que faremos uma história única, a da espécie humana vivendo na Casa Comum, o Planeta Terra”.
E assim, transportando a necessidade mútua do equilíbrio do homem (numa reflexão ontológica) com o equilíbrio externo, o ambiente no todo, construímos um principio de auto-preservação e, com a possibilidade da influencia humana nas instâncias naturais, moldá-las à nosso beneficio, significando a possibilidade do usufruto em todo seu esplendor.
Diante disso, o direito precisa da uma resposta, inobstante o comando constitucional do meio-ambiente ecologicamente equilibrado, refletindo sobre todo o seu aparato técnico, não só numa dogmática jurídico-ambiental, mas na promoção das possibilidades de tutela ambiental, por conseguinte, tutela do homem, nos seus diferentes ramos. O que se propõem é lançar novas bases para um direito mais humano, menos burocrático, fortificando o super-princípio da dignidade da pessoa humana.
Ainda sob a luz do autor Leonardo Boff, é preciso construir algo que ele chama de ecologia social, mental e integral. Será o novo pensar humano sobre as questões da sociedade e de si próprio, agrupadas na forma de uma reflexão sobre as condições materiais da vida humana no cotidiano – por isso social – levando em conta como referendar a ele certa dignidade. Assim Boff assevera:

A ecologia social não quer apenas o meio ambiente. Quer o ambiente inteiro. Insere o ser humano e a sociedade dentro da natureza. Preocupa-se não apenas com o embelezamento da cidade, com melhores avenidas, com praças ou praias mais atrativas. Mas prioriza o saneamento básico, uma boa rede escolar e um serviço de saúde decente. A injustiça social significa uma violência contra o ser mais complexo e singular da criação que é o ser humano, homem e mulher. Ele é parte e parcela da natureza(BOFF, P, 14,2000).

Completando a idéia, é preciso atenção com a necessária mudança paradigmática da consciência humana, em detrimento daquelas relações massificadas, de “contrato de adesão”, resgatando o homem da impessoalidade e dos valores frios, a ecologia mental comporta a idéia dessa reflexão, encara a problemática humana e do clima como um efeito construído por gerações, na ordem de que quanto mais o homem avança nas questões de sofisticação tecnológica, da globalização negocial, mais distante se torna da “sensibilização pela profundidade misteriosa da vida e sua capacidade de maravilhamento” (BOFF, P. 35, 1995).
No turno da ecologia integral, interessa a total comunhão entre homem e Terra, numa espécie de pacto sócio-cósmico, onde o Planeta também é sujeito na busca pelo resgate (ou salvamento) da humanidade. Ainda no prefácio de Boff a Olmiro Silva: “o ideal do novo direito soa: gestar uma sociedade na qual todos possam caber, a natureza incluída”.

2 SOBRE AS INSTITUIÇOES DA TUTELA VERDE

Sabendo das contradições da era informacional, donde cresce e fortalece a demanda pela auto-preservação coletiva, é importante versarmos sobre as formas de incidência dos princípios supramencionados nas circunstâncias de fato, naqueles órgãos que promovem o direito e coordenam a sociedade. O direito do ambiente requer tutela especial, haja vista seu caráter além de multidisciplinar, transindividual.
A este caráter de titularidade, o bem ambiental é indisponível e goza de prerrogativas que incidem em outros ramos do direito. Vemos que os principais impasses desta disciplina ocorrem em matéria de direito civil, especificamente na hipótese de dano ao patrimônio ou inviabilidade de empreendimento devido vedação imposta para a preservação da área ecológica. A idéia-força do direito, vinculando suas agencias promotoras, é de sustentabilidade dentro do comando constitucional do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Este texto de norma demonstra o interesse do legislador em uma política ambiental preventiva e proativa, procurando a melhor ação individual e coletiva que melhor se coadunem com a especificidade do contexto socioecológico.
É tranqüilo entre a doutrina, o caráter compositivo do direito ao ambiente com relação ao principio da dignidade humana. Esta consciência acadêmica nacional jurídica, cria um sofisticado complexo de tutela ambiental e, através da Lex superior de 1988, o ambiente consubstancia-se como pressuposto transindividual à dignidade da pessoa humana, onde sua preservação, fortalecimento e expansão é objeto justo e necessário para um equilíbrio aristotélico tão necessário para uma nova consciência ontológica e social.
O patrimônio natural foi convencionado e instituído pela dogmática jurídica com bem jurídico geral e difuso que deve ser convenientemente assegurado para o gozo e em defesa do coletivo. Não haverá, portanto, propriedade sobre esse bem que legitime qualquer forma de uso, e nem estarão à disposição de interesse individual ou de grupos localizados.
Adotou-se o ambiente como bem transindividual, de natureza difusa que está para todos, não estando à disposição de ninguém. Acompanhando o nosso sistema constitucional, a matéria ambiental tornou-se um principio que se agregou à força do valor da dignidade da pessoa humana. Cria-se um ambiente de responsabilidade e ética que traz à discussão uma reforma sociológica que quebre a base patriarcalista da consciência humana.

A preocupação com o ambiente (ou com a ecologia) não é, enfim, luxo de classes dominantes ou modismo momentâneo – a questão ecológica remete a um novo estágio da consciência mundial: a importância da terra como um todo, o destino comum da natureza e do ser humano, o bem comum tanto como bem das pessoas, das sociedades, como do conjunto dos seres da natureza lembra ‘o risco apocalíptico que pesa sobre todo o criado’ – pois o homem pode tanto ser ‘o anjo da guarda como o satã da Terra’ – terra que é nossa responsabilidade comum e sofre e sangra, ‘especialmente em seus filhos mais singulares, os oprimidos, os marginalizados e os excluídos’ – que são as grandes maiorias dos tempos atuais, a partir das quais impõem-se pensar o equilíbrio universal e a nova ordem ecológica mundial. (BOFF, p. 15, 1995)

O problema a ser combatido é o sistema político de fragmentação institucional que favorece o exercício reiterado de atividades exploratórias ecologicamente predatórias, em vista do desenvolvimento econômico. A questão deve tomar abrangência e estabelecer vínculo entre a prosperidade do homem e a possibilidade e disponibilidade dos recursos naturais.
Para a dignidade da pessoa humana, importante se faz o acesso à meios materiais de manutenção da vida e ainda o horizonte de satisfação pessoal dos indivíduos. Esta assertiva nos dirige a temas como repartição de riqueza e as relações de poder. O homem, dignamente compreendido, mantém certa aderência a uma cultura, costumes e modos, e a ele deve ser facultado o poder de escolha no uso dos seus bens ‘sociais’. Defender a tutela verde, para assegurar, numa perspectiva pragmática, a manutenção dos insumos e meio útil à vida e, no futuro, favorecer a minimização dos riscos que corre a humanidade, haja vista o atual estado de exploração dos recursos naturais.
O bem ambiental é basilar para a vida humana e sua dignidade, entra na ordem de 1988 com uma importância para o indivíduo e para a sociedade. As relações das pessoas ligam-se diretamente a que tipo de decisões políticas elas aderem, os problemas que devem ser repensados durante a crise na qual vivemos são produtos de circunstâncias aparentemente distantes, contudo, não o são.
A confusão climática é produto do avanço industrial, fomentado pela globalização dos negócios e a apoteose da sociedade de consumo. Este quadro político e social tem apoio dos governos nacionais, inaptos ou desmotivados ao combate de fenômenos como marginalização social e violência. Um mundo novo, de uma nova consciência, é absolutamente possível e necessário.

CONCLUSAO

Direito ao ambiente como direito de todos levanta o corolário da revisão das relações que se estabelecem na sociedade. Assim, pensar numa defesa a natureza que não alcança uma mudança no entendimento dos fins da indústria, comércio e consumo, no plano de desenvolvimento comprometido com as zonas de proteção ambiental ou com o bem ambiental ordinário, os recursos naturais que o homem capta, é falar com as paredes.
A questão ambiental pode ser também o primeiro referencial para o restabelecimento e aproximação entre as pessoas, congregando valores comuns com interesses gerais, em prol da própria manutenção viável da vida humana.

REFERENCIAS

BOFF, Leonardo, Ecologia social em face da pobreza e da exclusão, em Ética da vida, Letraativa, Brasília 2000.

______________, Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres, Atica, S.Paulo 1995.

MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente, gestão ambiental em foco. Ed. Revista dos Tribunais, 5º Ed, São Paulo, 2007.

NUNES, Miriam Brito Correa. O amor em tempos de desamor. Instituto Nacional de Altos Estudos, Rio de janeiro, 2008.