O direito dos empregados de missões diplomáticas e consulares no Brasil


PorThais Silveira- Postado em 24 abril 2012

Autores: 
Rubens Curado Silveira

O direito dos empregados de missões diplomáticas e consulares no Brasil

 

I. Introdução

Em dezembro de 2004, a Assembléia Geral das Nações Unidas, por meio da Resolução 59 /38, aprovou a Convenção sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e de seus bens

diante de um tribunal de outro Estado, com o objetivo de estabelecer um instrumento básico geral que uniformizasse internacionalmente o entendimento acerca desse privilégio, nas fases de conhecimento e de execução.

Desde então o texto dessa Convenção está aberto à assinatura dos Estados e entrará em vigor internacionalmente no 30º dia a partir do depósito do 30º instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, nos termos do seu artigo 30 .

A vigência internacional da Convenção da ONU, por si só, não a tornará aplicável no Brasil. Para tanto, ainda será necessária a sua ratificação pelo nosso país, procedimento que

gera a internalização das normas do direito das gentes.

Mesmo não estando formalmente em vigor, interna ou internacionalmente, o teor dessa convenção é de grande relevância para o estudo do tema, seja porque resultou de um longo trabalho levado a efeito pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, seja porque foi aprovada e convertida em Resolução pela Assembléia da ONU, a indicar, no mínimo, que reflete uma forte tendência internacional.

Este rápido trabalho não tem como objetivo analisar detidamente o conteúdo dessa convenção. A pretensão é mais singela: reviver a imunidade de jurisdição trabalhista à luz dessa novel convenção, nas fases de conhecimento e de cumprimento (ou execução), destacar eventuais evoluções e involuções e, quem sabe, lançar ao debate a conveniência ou não da sua ratificação pelo Brasil. II. A legislação aplicável ao contrato de emprego firmado entre trabalhador brasileiro e Estado estrangeiro Princípio da lex loci executionis

Qual a legislação aplicável aos contratos de emprego celebrados no Brasil entre trabalhadores nacionais e Estados estrangeiros: a legislação brasileira ou a do Estado empregador? Embora se trate de discussão antiga e já devidamente sedimentada, o fato dela ser insistentemente suscitada em ações trabalhistas em face de Estados Estrangeiros impõe a necessidade do seu esclarecimento.

Normas do Direito das Gentes não deixam dúvidas: aplica-se a legislação trabalhista local. Nesse sentido, o artigo 41 da Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas (1961) e o artigo 55 da Convenção de Viena sobre as Relações Consulares (1963).

Esse entendimento foi endossado pela recente Convenção da ONU sobre Imunidade de Estados quando, em seu Anexo, mencionou as previsões das Convenções de Viena de 1961 e 1963, e renovou o dever de respeito às leis e regramentos do país anfitrião, inclusive no tocante à normativa laboral.

Também nesse sentido o princípio da lex loci executionis, consolidado no Brasil pela Súmula 207 do Tribunal Superior do Trabalho.

III. A imunidade de jurisdição Fase de conhecimento

Está pacífico nos tribunais nacionais e em praticamente todo o cenário internacional que a imunidade dos Estados estrangeiros é relativa, e não mais absoluta, o que implica em dizer que esse privilégio não sobrevive na fase de conhecimento de processos decorrentes da atuação estatal jus gestiones (atos de gestão ou de direito privado), a exemplo das reclamatórias trabalhistas, venda de imóveis, veículos e demais contratos privados, embora subsista nos atos jus imperii (atos de império ou de autoridade soberana).

Vale lembrar que a relativização da imunidade de jurisdição estatal foi fruto de um movimento internacional dinâmico e gradual ao longo do século XX, iniciado a partir da constatação de que alguns Estados estavam se fazendo representar em outros países como típicos empresários, em

atividades mercantis inteiramente estranhas às rotinas diplomáticas e consulares. Tribunais belgas e italianos, seguindo desenvolvimentos doutrinais, foram os primeiros a reagir ao incremento da atividade estatal por meio de uma distinção entre atos de governo e atos de natureza comercial, negando nestes últimos a imunidade de jurisdição.

A teoria da imunidade relativa, apesar de firmada internacionalmente já na década de 70 do século passado, só foi admitida no Brasil em 1989, por ocasião do julgamento do caso Genny de Oliveira x Embaixada da República Democrática Alemã pelo Supremo Tribunal Federal, a sugerir um atraso

ou uma desatualização da Corte brasileira quanto à evolução desse aspecto particular do Direito Internacional.

A Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e de seus Bens, talvez por antever a nem sempre fácil missão de diferenciar os atos de império dos atos de gestão, não faz nenhuma referência expressa a essa dicotomia. Não obstante, ela confirma a teoria da imunidade relativa ao descrever as diversas hipóteses em que não sobrevive a imunidade dos Estados.

Em linhas gerais, a recente convenção estabelece que não há imunidade de jurisdição em litígios relacionados a: 1) transações mercantis (art. 10); 2) contratos de trabalho (art. 11); 3) lesões a pessoas e danos a bens (art. 12); 4) propriedade, posse e uso de bens (art. 13); 5) propriedade intelectual e industrial (art. 14); 6) participação societária (art. 15); 7) navios de propriedade de um Estado ou por ele explorado (art. 16); 8) convenção arbitral firmada pelo Estado (art. 17).

Como essas hipóteses retratam, em maioria, atividades privadas ou comerciais do Estado, estariam igualmente excluídas da imunidade de jurisdição se analisadas sob a dicotomia atos de império e atos de gestão, com um único avanço. Esse avanço merece destaque. Trata-se do artigo 12 dessa Convenção, que autoriza o exercício da jurisdição em ações indenizatórias decorrentes de morte ou lesão a uma pessoa ou danos a bens, causados por ato ou omissão supostamente atribuído ao Estado, quando produzido total ou parcialmente no território do outro Estado. Como essa regra

não traz nenhuma exceção, parece clara a sua aplicação mesmo quando a lesão ou dano tenha decorrido de ato tradicionalmente considerado de império.

No tocante à imunidade de jurisdição trabalhista, não há nenhuma inovação a comemorar. Embora estabeleça, regra geral, a inexistência de imunidade em ações relacionadas a contratos de trabalho, o 2º do artigo 11 prevê algumas exceções que, comparadas ao entendimento até então consagrado, evidenciam um retrocesso. Por exemplo, esse dispositivo afirma que sobrevive a imunidade se o objeto do processo for a contratação, a renovação do contrato de trabalho ou a reintegração de uma pessoa natural.

Também afirma subsistir a imunidade se o processo tiver como objeto a destituição ou a rescisão do contrato e, conforme determine o Chefe de Estado, o Chefe de Governo ou o Ministro das Relações Exteriores do Estado empregador, esse processo possa interferir no interesse de segurança do Estado.

Embora a redação não seja totalmente clara, a possibilitar interpretações, a convenção parece excluir da jurisdição local matérias trabalhistas das mais relevantes, mormente aquelas que ensejam o retorno do trabalhador ao emprego, a exigir que este, nessas hipóteses, se desloque até o território do Estado empregador para ajuizar eventual ação, o que muitas vezes pode representar um veto indireto ao acesso à jurisdição.

Vale repetir que essa Convenção ainda não está em vigor, interna ou internacionalmente. O entendimento vigente no Brasil é no sentido da inexistência de imunidade de jurisdição na fase de conhecimento de ações trabalhistas em face de Estados estrangeiros, porquanto decorrentes de

típico ato de gestão, sem distinguir ou excetuar nenhuma matéria.

Sobrevive, contudo, o problema crônico da execução dos julgados. Mesmo os defensores da imunidade relativa parecem relutantes em aplicá-la na fase de execução a ponto de permitir o confisco de bens do Estado devedor. Nas palavras de Ian Browlie, em seu Princípios de Direito Internacional Público, os próprios defensores do princípio restritivo não o aplicam na fase mais crítica do processo judicial.

IV. A execução de sentença contra Estados estrangeiros

James Crawford identificou, já no início da década de 80, quatro correntes de entendimento sobre execução contra Estados estrangeiros. Após a análise de casos julgados, de disposições convencionais, da prática dos Estados e da literatura especializada, Crawford concluiu pela prevalência da terceira corrente, segundo a qual a execução contra Estado estrangeiro

é possível e permitida, embora com restrições. Observadas essas restrições, relacionadas principalmente à natureza dos bens a serem constritos, a execução prescinde do consentimento (ou

renúncia) do Estado-executado.

A atualidade ratifica esse entendimento. De acordo com Antenor Pereira Madruga Filho, em A Renúncia à Imunidade de Jurisdição pelo Estado Brasileiro e o novo Direito da Imunidade

de Jurisdição: (...) não existe uma regra de direito internacional consuetudinário excluindo da jurisdição territorial a possibilidade de promover medidas coercitivas contra determinada parte do

patrimônio de um Estado soberano estrangeiro. Assim como as atividades do Estado soberano dividem-se em ações cognoscíveis e em ações imunes ao foro estrangeiro, também há critérios para

classificar os bens dos Estados estrangeiros no território do foro como imunes e não imunes à execução.

Os critérios utilizados para identificar se o bem é passível ou não de constrição estão ligados à sua finalidade imediata. Não basta, portanto, ser da propriedade ou estar na posse do Estado estrangeiro.

Esse entendimento é confirmado por J. Francisco Rezek em Direito Internacional Público: Curso Elementar, inclusive ao identificar essas restrições nas disposições das Convenções de Viena de 1961 e 1963:

A execução forçada da eventual sentença condenatória, entretanto, só é possível na medida em que o Estado estrangeiro tenha, no âmbito espacial de nossa jurisdição, bens estranhos à sua própria representação diplomática ou consular visto que estes se encontram protegidos contra a penhora ou medida congênere pela inviolabilidade que lhes asseguram as Convenções de Viena de 1961 e 1963, estas seguramente não derrogadas por qualquer norma ulterior.

Com fulcro na lição de Rezek, o Supremo Tribunal Federal abraçou esse entendimento:

É bem verdade que o Supremo Tribunal Federal, tratandose da questão pertinente à imunidade de execução (matéria que não se confunde com o tema concernente à imunidade de jurisdição

ora em exame), continua, quanto a ela (imunidade de execução), a entendê-la como prerrogativa institucional de caráter mais abrangente, ressalvadas as hipóteses excepcionais (a) de renúncia, por parte do Estado estrangeiro, à prerrogativa da intangibilidade dos seus próprios bens (RTJ 167/761,

Rel. Min. Ilmar Galvão ACOr 543-SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence) ou (b) de existência, em território brasileiro, de bens, que, embora pertencentes ao Estado estrangeiro, sejam estranhos,

quanto à sua destinação ou utilização, às legações diplomáticas ou representações consulares por ele mantidas em nosso País. (grifo nosso).

Embora Rezek não explique o exato alcance do termo bens estranhos, para o STF são aqueles não ligados, quanto à sua destinação ou utilização, às missões diplomáticas

e consulares. Esse entendimento, contudo, parece ampliar significativamente o alcance dos dispositivos convencionais a que se refere, quais sejam, o artigo 22 (3) da Convenção

de Viena sobre Relações Diplomáticas e o artigo 31 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares.

A própria literalidade do artigo 22 (3) da Convencao de 1961 revela que são invioláveis apenas e tão-somente os locais da missão, seu mobiliário e demais bens neles situados, além dos meios de transporte da Missão. Sob esse prisma, todo e qualquer outro bem, ainda que pertencente à Missão ou ao Estado estrangeiro, não está abrangido por esta vedação.

Não há dúvida de que não se pode adentrar sem consentimento nos locais das missões, o que já impossibilita a constrição dos bens ali localizados. Todavia, a Convenção de Viena de 1961 não veda, tácita ou expressamente, penhora de bens externos ao local da missão.

No tocante às repartições consulares, a possibilidade de constrição de bens é ainda maior. Isso porque a inviolabilidade descrita no 4º do artigo 31 é restrita à hipótese de requisição para fins de defesa nacional ou de utilizada pública, o que parece não abranger as medidas executivas decorrentes de processo judicial transitado em julgado. Persiste apenas a inviabilidade de penhora dos seus bens internos, ante a impossibilidade de neles adentrar sem consentimento prévio.

Foi neste contexto que ganhou corpo a possibilidade de constrição dos numerários de contas bancárias e aplicações financeiras das missões diplomáticas e repartições consulares

no território do foro, a ser efetivada por ordem judicial dirigida diretamente à instituição financeira, entendimento acolhido pela própria Consultoria Jurídica da Coordenadoria Geral de Direito Internacional do Ministério das Relações Exteriores.

Para Browlie, a Convenção de Viena de 1961 de fato não veda a penhora da conta da missão diplomática, vedação que, se existir, tem natureza consuetudinária. Ocasionalmente, como no caso das contas bancárias das missões diplomáticas, a existência de imunidade diplomática pode ser questionável (tais contas não estão protegidas pelas disposições sobre inviolabilidade da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas), dependendo então a imunidade, conforme

os casos, da existência de uma regra de Direito Internacional consuetudinário, não contida na Convenção de Viena, ou do alcance da imunidade do Estado enquanto tal.

Todavia, o próprio BROWNLIE registrou que na opinião do relator especial e da própria Comissão de Direito Internacional, só os bens utilizados ou destinados a ser utilizados pelo Estado para fins comerciais (ou não oficiais) não estão imunes às medidas de execução. Neste contexto, uma conta bancária de uma missão diplomática destinada à gestão corrente da embaixada não pode ser objeto de medidas de execução. Foi este o entendimento que prevaleceu na Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e seus Bens, cujo artigo 19 veda medidas executivas contra bens dos Estados, exceto: 1) quando o Estado tenha consentido expressamente com a adoção de tais medidas, nos casos especificados; 2) quando o Estado tenha destinado bens à satisfação da demanda objeto do processo; 3) quando os bens são utilizados ou se destinam a ser utilizados para fins distintos dos fins oficiais não comerciais e se encontrem no território do Estado do foro.

O artigo 21 dessa convenção especifica alguns bens com fins oficiais não comerciais, não sujeitos à constrição: a) os bens, incluídas as contas bancárias, que sejam utilizados ou destinados ao desempenho das funções da missão diplomática do Estado ou de seus escritórios consulares, suas missões especiais, suas missões perante organizações internacionais ou suas delegações em órgão de organizações internacionais ou em conferências internacionais; b) os bens de caráter militar

ou os que sejam utilizados ou estejam destinados ao desempenho de funções militares; c) os bens do banco central ou de outra autoridade monetária do Estado; d) os bens que formem parte do patrimônio cultural do Estado, ou parte dos seus arquivos, e não tenham sido postos e nem estejam destinados a serem postos à venda; e) os bens que sejam parte de uma exposição de objetos de interesse científico, cultural ou histórico e que não tenham sido postos e estejam destinados

a serem postos à venda.

Note-se que essa previsão não obsta a possibilidade de penhora de toda e qualquer conta bancária, mas apenas daquelas utilizadas ou destinadas às funções oficiais que descreve. Como o juízo não pode previamente deduzir a finalidade imediata de nenhuma conta ou aplicação financeira, eventual ordem de constrição não carrega intrinsecamente nenhuma ofensa à norma internacional escrita ou consuetudinária.

Nesse passo, constitui ônus do Estado-executado comparecer em juízo e demonstrar a finalidade oficial do numerário objeto da penhora. A parte final do item c do artigo 19 da recente Convenção

(...si bien únicamente podrán tomarse medidas coercitivas posteriores al fallo contra bienes que tengan un nexo con la entidad contra la cual se haya incoado el proceso) também merece consideração especial. Afinal, não exige que os bens objeto da constrição sejam da propriedade da entidade que integrou o pólo passivo da ação, mas apenas que tenham nexo com essa entidade, termo bem mais abrangente, conforme interpretação expressa do próprio anexo a essa convenção.

Com efeito, a convenção parece autorizar a constrição de bens de empresas estatais e congêneres, criadas e controladas pelo Estado para exploração de atividade econômica, em nível de competição de mercado com as empresas mercantis em geral. Por serem formadas total ou parcialmente

por capital do Estado-executado e, por óbvio, não estarem sob o manto da proteção diplomática e consular, os bens dessas empresas podem responder pelas dívidas estatais, embora sob o domínio de uma pessoa jurídica distinta. Essa possibilidade, aliás, há muito é admitida por Guido Fernando Silva Soares, em Das Imunidades de Jurisdição e de Execução:

Assim equiparadas às empresas privadas, e sempre com a ressalva de não prejudicar a continuidade dos serviços públicos e dada a natureza do bem executando, cremos ser possível a

execução forçada contra as empresas organizadas e exploradas pelo Estado, para os fins de, em caráter suplementar, exercer atividades econômicas, pois do contrário, não se poderia explicar

por que o Estado moderno buscou formas de agilizar sua atividade, adotando procedimentos unicamente compatíveis com as empresas mercantis, que são eficientes, racionais e, por isso

mesmo, que estão sujeitas aos riscos imanentes às atividades econômicas, em situações que, de modo absoluto, repelem privilégios ou imunidades de execução contra seus bens.

Rezek recorda de casos em que empresas nacionais, como o Loyd Brasileiro e Instituto Brasileiro do Café, foram alvos de constrições dessa natureza determinadas pelo Judiciário da Itália e Alemanha para quitação de dívidas trabalhistas do Estado brasileiro. Em caso semelhante, a 18ª Vara do

Trabalho de Brasília penhorou conta corrente do Conselho Britânico a fim de garantir execução contra o Reino Unido, o que resultou na interposição de embargos de terceiros por parte daquela instituição. Antes do julgamento, contudo, foi firmado acordo no processo principal. V. Conclusão

Do exposto, é de se concluir que a Convenção da ONU sobre as imunidades dos Estados representa, na fase de conhecimento, um retrocesso no que se refere à imunidade de

jurisdição trabalhista. No tocante à fase de cumprimento, o seu texto não traz nenhuma novidade que possa ensejar uma execução mais efetiva, que no mais das vezes continuará obstada pela inviolabilidade dos bens que servem as missões diplomáticas e consulares. Com efeito, as suas previsões estão longe de compatibilizar de modo razoável a necessidade estatal de manutenção dos serviços oficiais com o legítimo interesse dos particulares beneficiados pelas decisões judiciais

que o próprio Direito Internacional reconhece como válidas.

As Nações Unidas, talvez cedendo às pressões dos Estados que a compõem, perderam a grande oportunidade de resolver definitivamente esse grave problema. É frustrante ver o intenso movimento relativizador da imunidade estatal, que abalou as estruturas tradicionais do século XX, desembocar na entrega judicial de julgados desprovidos de real eficácia. A Convenção apresentada pela ONU no mais das vezes transforma a res judicata em vitória de Pirro e acaba por lançar ao descrédito o próprio Direito Internacional. Sobrou disposição para proteger o patrimônio estatal e faltou a compreensão de que o princípio universal do direito à justiça abrange não só a disponibilização de remédio judicial e a obrigação de proferir sentença de mérito, mas também o dever de conferir efetividade ao provimento judicial, vista como a reparação concreta do direito violado.

Pelos motivos expostos, parece inadequada e inconveniente a ratificação pelo Brasil dessa novel convenção internacional. A sua implementação talvez sirva apenas ao indesejado engessamento de uma matéria ainda em plena ebulição.

Rubens Curado Silveira

Juiz do Trabalho do TRT da 10ª Região,

em auxílio à Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

rubens.silveira@cnj.jus.br

Artigo publicado na Revista da Anamatra nº 56