Direito Penal - ABORTO


Porwilliammoura- Postado em 07 março 2012

Autores: 
DALVI, Stella

ABORTO:

ARTIGOS: 124, 125, 126, 127 e 128.

Obs.: Aborto é o produto da interrupção da gravidez, com a expulsão do feto, ainda em formação: "abortamento"

Auto aborto ou com o consentimento da gestante:  art. 124

Aborto provocado por terceiro: arts.125, 126 e parág. Único

Forma qualificada: arts.127 e 128

Estabelecer diferença entre o "consentir que outrem lho provoque" e "provocar ... com o consentimento (consensual) da gestante".

Considerações gerais:

Durante muito tempo não era prevista – a prática – como delito. Deixava-se ao critério da mulher a decisão acerca da conveniência ou não de dar prosseguimento à gravidez.

         Roma: não era sancionada a morte dada ao feto. As práticas abortivas eram freqüentes. Após um tempo, passou a ser considerado como sendo uma lesão ao direito de paternidade. Sua incriminação foi justificada pela frustração das expectativas paternas quanto à sua descendência. Pela mãe – desterro; por terceiro – mais grave: desterro e outras penas.

         Cristianismo: reprovação por completo. Foi equiparado ao homicídio.

         Germânicos: inicialmente, por estranho – patrimonial; depois fora equiparado ao homicídio, em se tratando de feto animado.

         Idade Média e Direito Canônico: perda da alma do nascituro.

         Iluminismo: equiparação entre aborto e homicídio fora abandonada. Redução de pena para o auto-aborto, quando praticado por motivo de causa honoris.

         Brasil – Código Imperial (1830): auto-aborto não era tipificado.

         1890: auto-aborto, com o fim de ocultar desonra própria, era atenuado.

        

Atualidade: é tipificado, na maioria das legislações, como ilícito penal,  com algumas optando pela despenalização.

         Motivos:

  1. feto é parte da mulher e esta pode dispor do produto da concepção;
  2. a vida do feto não é um bem jurídico individual, mas um interesse da sociedade a ser protegido em alguns casos;
  3. a pena não logra evitar as práticas abortivas;
  4. aborto é uma lei de exceção endereçada às classes mais pobres;
  5. é necessário proteger a vida e a saúde das numerosas mulheres que recorrem ao aborto clandestino.

Bem jurídico: é a vida do ser humano em formação, intra-ulterina. CF, art. 5º, caput. Com um plus em torno da saúde psíquica e física da mulher.

-         provocado por terceiro (com ou sem o consentimento): além da vida em formação, tutela-se a vida e a incolumidade física e psíquica da mulher grávida.

Obs.: liberdade e integridade pessoal como bens jurídicos secundariamente protegidos em se tratando de aborto não consentido (art. 125) ou qualificado pelo resultado (127), apenas.

Objeto material: embrião ou feto humano vivo.

Sujeito ativo:

-         auto-aborto: própria mãe (crime de mão própria)

-         demais hipóteses: qq. Pessoa (comum).

Sujeito passivo: ser humano em formação é o titular do bem jurídico (124).

Obs.: vários fetos: concurso de crimes.

Obs.: figurará a mãe como sujeito passivo quando se atente também contra a sua liberdade (aborto não consentido) ou contra a sua vida ou integridade pessoal (aborto qualificado pelo resultado), como bens jurídicos mediatos.

Obs.: auto-aborto/aborto consentido/aborto consensual – não há autolesão.

Obs.: não há interesse coletivo, logo o Estado não pode figurar como sujeito passivo, específico para este crime.

Tipicidade objetiva e subjetiva

         Aborto: interrupção da gravidez (abortamento). Muito vago, pois pode haver confusão com o infanticídio – expulsão e morte após.

-         morte intra uterum ou pela provocação de sua expulsão.

-         prova da viabilidade do feto. A morte deve ser conseqüências direta das manobras abortivas.

Limite: termo inicial – começo de gravidez; termo final – início do parto (normal ou cesariana).

Obs.: outro tipo de gravidez que não a normal (não patológica) não configura o crime – extra-uterina e molar.

Meios:

-         químicos ou bioquímicos;

-         físicos;

-         psíquicos;

Obs.: meios ineficazes não configuram o delito – art. 17/impossível. Mulher não-grávida, também – impropriedade do objeto.

Tipo subjetivo: dolo natural: consciência e vontade de produzir a morte do feto.

-         dolo eventual: não querendo o resultado, aceita-o como possível.

Ex.: agente que pretendo promover um nascimento prematuro, para fins de herança, prevê a possível morte do feto e aceita o risco de sua produção. Mulher que pratica esportes de alto impacto e que, prevendo a possibilidade de abortar, assume o risco.

-         agressão dirigida a mulher grávida, conhecendo o agente essa circunstância e assumindo a eventual morte (129 e 125), age em concurso formal de delitos (art. 70).

-         dolo de lesionar a integridade, cuja gravidez conhecia ou não podia desconhecer (art. 129, § 2º, V).

-         morte dada a gestante, ciente da gravidez: concurso formal de crimes. 121 consumado e 125 (sem o consentimento), consumado ou tentado.

Obs.: e se a gestante tenta o suicídio e não consegue? Responderá pelo aborto? Depende de sua ciência (gravidez) e das circunstâncias do fato.

"Culpa": não é previsto.

Obs.: Terceiro que, culposamente, provoca o aborto, responde por lesão corporal culposa (art. 129, § 6º).

Causa honoris: não há previsão.

Material e instantâneo, mão própria (auto-aborto) e comum (demais figuras) de forma livre,  doloso e admite tentativa.

Obs.: a expulsão do produto da concepção não é imprescindível para a consumação do delito.

Ex.: facada no ventre de mulher grávida de nove meses, sem lograr matá-la; dias depois nasce a criança, que morre pela lesão que lhe foi produzida. (nexo causal relevante para o direito).

Solução: dolo de 2º grau.

  1. homicídio tentado à mulher e consumado em relação ao recém-nascido;
  2. homicídio tentado em concurso formal com o aborto consumado. (correta).
  3. Expulso o feto com vida e morte por nova conduta: concurso material (aborto tentado e homicídio ou infanticídio consumado).
  4. Manobras abortivas e aceleração do parto, mas o feto sobrevive, por circunstâncias alheias à vontade do agente, haverá tentativa.

Espécies de aborto

  1. 1.    auto-aborto consentido:

-         delito de mão própria (1ª parte);

-         2ª parte – aborto consentido. Não o pratica mas, permite que o façam (art. 126). É um crime duplo: o consentimento (124) + terceiro (126).

-         Co-autoria: inadmissível., exceção à teoria monista: único crime com concurso de pessoas.

-         Participação: dependerá do que o partícipe quis participar.... (art.124 ou art. 126).

  1. 2.    Provocado por terceiro.

-         125, sem o consentimento: violência, ameaça ou fraude;

-         126, com o consentimento: é sancionado de forma menos severa.

Obs.: de acordo com o parág. Único, art. 126, aplica-se as penas do art. 125.

É indispensável o consentimento da gestante do começo ao fim do da conduta.

Erro: supor consentimento – erro de tipo.

  1. 3.    Qualificado pelo resultado: diz respeito aos arts. 125 e 126.

O resultado é atribuído ao agente a título de culpa (art.19). Se abarcados pelo dolo (direto ou eventual) – concurso formal de crimes – aborto e lesão corporal grave ou homicídio consumado.

-         o crime qualificado pelo resultado não admite tentativa: se dos meios empregados o aborto não advir. Responderá pelo aborto qualificado pelo resultado e não pelo aborto qualificado tentado. O tipo em exame não exige a consumação do aborto.

Obs.: o auto-aborto e o consentido (2ª parte, 124) não admitem a forma qualificada, visto que não se pune a auto-lesão.

Conseqüência: o partícipe do auto-aborto e do consentido não terá sua pena aumentada, por lesão corporal grave ou homicídio culposo, já que não há participação dolosa em delito culposo.

Obs. Inexistindo a gravidez será a lesão grave ou o homicídio, apenas: 129, § 6º e 121, § 3º.

Aborto necessário: apesar de ter uma característica de permissibilidade, não passa de uma indicação com teor de perdão, pois, o aborto é crime.

Para a maioria da doutrina: regra-exceção.

Indicações na legislação comparada:

-         sentimental; ética ou criminológica (delito de natureza sexual ou da aplicação de uma técnica de reprodução assistida não consentida pela mulher).

-         Terapêutica (exige grave perigo para a vida ou a saúde da gestante).

-         Eugenésica (risco comprovados de que o feto nasça com graves anomalias físicas ou psíquicas);

-         Econômica-social (quando razões de natureza, tais como a prole numerosa, a escassez de recursos financeiros, motivem a opção pelo aborto).

Obs.: somente a terapêutica e a sentimental são adotadas pela nossa legislação, com restrições.

Terapêutico: estado de necessidade – excludente de ilicitude[1].

-         por pessoa não habilitada: estado de necessidade justificante (23, I e 24): perigo atual e iminente para a gestante.

Sentimental: ético ou humanitário

Obs.: norma não-incriminadora não admite analogia – 214[2].

-         exercício regular de um direito (art. 23, III): com base no consentimento da mulher, que é indispensável.

Obs.: no aborto sentimental o mal causado é maior do que o evitado – teoria diferenciadora – temos uma exclusão de culpabilidade pela inexigibilidade de conduta diversa.

Obs.: não precisa nem sentença nem, tampouco, autorização judicial.

Erro induzido pela gestante ou por terceiro: erro de tipo permissivo.

Eugenésico: não está agasalhado pelo nosso ordenamento – oportunidade para o alargamento das indicações – possível seleção da vida: somente os "fortes devem viver"; somente aqueles que "tiverem qualidade de vida" devem nascer.

Econômico: não está agasalhado pelo nosso ordenamento – insegurança jurídica. Somente os que puderem se manter "economicamente" devem viver.

[1] Há controvérsias, pois, aonde está a ponderação de bens ou interesses. Onde, para salvaguardar um bem de maior valor se sacrifica um de menor valor???? Entretanto, a doutrina majoritária entende que há estado de necessidade. Veja-se que o próprio artigo diz: "não se pune" e não "é licito". Mesmo porque, se assim o fosse não precisaria de tipo especial, bastaria aplicar o art. 24.

[2] Há controvérsias, pois, alguns doutrinadores admitem, como: Cezar Bittencourt, Manual...., pág. 170, v. II.