Contrato de transporte aéreo


Porrafael- Postado em 28 novembro 2011

Autores: 
NASIHGIL, Arion Augusto Nardello
SPONHOLZ, Sandres

Contrato de transporte aéreo

O contrato de transporte aéreo, pela sua relevância no contexto do exercício da liberdade de locomoção, servindo de suporte para a realização dos demais atos da vida civil, possui características próprias, essenciais para o bom funcionamento da aviação.

INTRODUÇÃO

Quando se fala em contratos, estamos falando de um acordo de vontades entre de duas ou mais pessoas. Nas palavras de Washington de Barros Monteiro, o contrato é o resultado do encontro das vontades dos contratantes e produz seus efeitos jurídicos – cria, modifica ou extingue direitos ou obrigações – em função dessa convergência.[1]

O contrato é a mais comum e a mais importante fonte de obrigação, devido às suas múltiplas formas e inúmeras repercussões no mundo jurídico.[2]

É praticamente impossível imaginarmos uma sociedade sem contratos, sem acordo de vontades, sem obrigações recíprocas. E é por este motivo que o Direito dos Contratos é uma das mais importantes matérias no ramo do Direito Civil.

O Código Civil de 2002 trouxe 22 modalidades de contratos, possibilitando ainda aos contratantes a criação de novos e inéditos contratos, desde que respeitadas as disposições legais.

Entre as principais e mais utilizadas modalidades de contratos, encontramos o Contrato de Transporte, disposto nos Artigos 730 a 756 do Código Civil.

Novamente abre-se um enorme leque de modalidades de negócios jurídicos quando se fala em Contrato de Transporte, tais como os contratos de transporte terrestre, aéreo e marítimo.

Com a necessidade da população mundial em se deslocar – ir e vir – da forma mais rápida e no menor tempo possível, não restam dúvidas de que o transporte aéreo é hoje uns dos meios de locomoção mais utilizados e mais procurados do mundo.

Portanto, a cada dia que passa, o Contrato de Transporte Aéreo vem se tornando mais necessário para o bom funcionamento da aviação.

E é exatamente esta modalidade de contrato, interessante e complexa, que, devido ao seu constante uso e aperfeiçoamento, vem chamando a atenção dos juristas em todos os cantos do mundo.

Ademais, por ser a aeronáutica um mercado em extremo crescimento, sobretudo em razão da ascensão econômica da classe C da população, diariamente constatamos o fantástico crescimento do número de passageiros e de companhias aéreas.

É por este motivo que hoje, mais do que nunca, se formulam e se aperfeiçoam os contratos de transporte aéreo, a fim de garantir aos consumidores e às empresas o bom funcionamento do transporte aéreo em nosso país e no mundo, sem esquecer que o contrato visa suprir um dos direitos fundamentais do indivíduo, qual seja, a locomoção – ir e vir.

Portanto, com este trabalho pretende-se abordar de uma forma bastante ampla o Contrato de Transporte Aéreo, que, conforme já dito, a cada dia que passa, vem se tornando mais importante e necessário em nosso dia-a-dia, seja para o transporte de pessoas, de bagagem ou de carga.


1 – DAS CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DOS CONTRATOS

1.1 – Do Conceito

Quando o homem usa de sua manifestação de vontade com a intenção precípua de gerar efeitos jurídicos, a expressão dessa vontade constitui-se num negócio jurídico.[3] Pela classificação clássica do Código Civil de 2002, negócio jurídico é toda ação ou omissão humana cujos efeitos jurídicos – criação, modificação, conservação ou extinção de direitos – derivam essencialmente da manifestação de vontade.

Os contratos nada mais são do que um negócio jurídico entre dois ou mais sujeitos de direito correspondido pela vontade, da responsabilidade do ato firmado, resguardado pela segurança jurídica em seu equilíbrio social, ou seja, é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral. É o acordo de vontades, capaz de criar, modificar ou extinguir direitos. Nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho, o contrato é o resultado do encontro das vontades dos contratantes e produz seus efeitos jurídicos – cria, modifica ou extingue direitos ou obrigações – em função dessa convergência.[4]

No Direito Romano primitivo, os contratos, como todos os atos jurídicos, tinham caráter rigoroso. As formas deviam ser obedecidas, ainda que não expressassem extremamente a vontade das partes.

Desde àquela época até hoje em dia, os contratos exercem um papel fundamental e indispensável nas nossas relações. Conforme nos ensina Venosa, a sociedade contemporânea é imediatista e consumista. Os bens e serviços são adquiridos para serem prontamente utilizados e consumidos. Rareiam os bens duráveis. As coisas tornam-se descartáveis. A economia de massa é levada pela mídia dos meios de comunicação. O que tem valor hoje não terá amanhã e vice-versa. Nesse contexto cumpre ao jurista analisar a posição do contratante individual, aquele que é tratado como "consumidor", o qual consegue, na sociedade capitalista, ser ao mesmo tempo a pessoa mais importante e, paradoxalmente, mais desprotegida na relação negocial. A ingerência do direito público nesse relacionamento não retira do campo do direito privado esse exame.[5]

Ante o todo exposto, resta claro que o contrato, e não mais a propriedade, passa a ser o instrumento fundamental do mundo negocial, da geração de recursos e da propulsão da economia.


1.2 – Dos Requisitos de Validade dos Contratos

Porém, para que os negócios jurídicos, em especial os contratos, produzam efeitos, estes devem preencher alguns requisitos, apresentados como os de sua validade. Os negócios jurídicos só serão válidos e produzirão efeitos se presentes estes requisitos. Caso contrário, o negócio será inválido, não produzirá efeitos jurídicos e será nulo ou anulável. Os requisitos de validade dos contratos estão divididos em três classes, quais sejam: subjetivos, objetivos e formais.


1.2.1 – Dos Requisitos Subjetivos

Os requisitos subjetivos consistem: a) na manifestação de duas ou mais vontades e capacidade genérica dos contraentes; b) na aptidão específica para contratar; c) no consentimento.[6]


1.2.1.1 – Da Capacidade Genérica

A capacidade genérica dos contratantes é o primeiro elemento ou condição subjetiva de ordem geral para a validade dos contratos. Estes serão nulos ou anuláveis, se a incapacidade, absoluta ou relativa, não for suprida pela representação ou pela assistência. A capacidade exigida nada mais é do que a capacidade de agir em geral, que pode inexistir em razão da menoridade, da falta do necessário discernimento ou de causa transitória, ou ser reduzida nas hipóteses mencionadas no Artigo 4º do Código Civil de 2002, quais sejam, a menoridade relativa, embriaguez habitual, dependência de tóxicos, discernimento reduzido e a prodigalidade.[7]


1.2.1.2 – Da Aptidão Específica para Contratar

Em alguns casos, a lei exige, além da capacidade genérica, a capacidade especial para contratar, como ocorre na doação, na transação e na alienação onerosa, que exigem a capacidade de disposição das coisas ou dos direitos que são objeto do contrato. Em outros casos, também é necessária a outorga uxória ou o consentimento dos descendentes para contratar.

Essas hipóteses não dizem respeito à capacidade geral, mas sim, à falta de legitimação ou impedimentos para o ato.


1.2.1.3 – Do Consentimento

O consentimento diz respeito ao acordo de vontade entre as partes. Este consentimento deve ser livre e espontâneo, não podendo, de forma alguma, ter vícios ou defeitos, visto que o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo, a lesão e a fraude ensejam a invalidade do negócio jurídico.


1.2.2 – Dos Requisitos Objetivos

Os requisitos objetivos dizem respeito ao objeto do contrato, que deve ser lícito, possível, determinado ou determinável, nos exatos termos do Artigo 104, II, do Código Civil.


1.2.2.1 – Da Licitude de Seu Objeto

Para a validade de um negócio jurídico – contrato, é necessário que o seu objeto seja lícito, ou em outras palavras, que não seja contra a lei, a moral ou os bons costumes.


1.2.2.2 – Da Possibilidade Física ou Jurídica do Objeto

O objeto do contrato deve também ser possível, visto que a impossibilidade do objeto acarreta na invalidade do contrato.

Esta invalidade pode ser tanto física como jurídica. A impossibilidade física é aquela que emana das leis físicas ou naturais. A impossibilidade jurídica ocorre quando o objeto do contrato é expressamente proibido por lei, como por exemplo, algum bem gravado com cláusula de incomunicabilidade.


1.2.2.3 – Da Determinação de Seu Objeto

O objeto do negócio jurídico deve também ser determinado ou determinável. O objeto será determinável quando o bom puder ao menos ser indicado pelo seu gênero e pela sua quantidade, conforme o Artigo 243 do Código Civil.


1.2.3 – Dos Requisitos Formais

Os requisitos formais de validade do negócio jurídico dizem respeito à forma, que é o meio de revelação da vontade. Deve ser prescrita ou não defesa em lei. São três as espécies de formas: a) livre; b) especial ou solene; c) contratual.


1.2.3.1 – Da Forma Livre

A forma livre é a predominante no direito brasileiro e está disposta no Artigo 107 do Código Civil. É qualquer meio de manifestação da vontade, não imposto obrigatoriamente pela lei, como por exemplo a palavra escrita ou falada.


1.2.3.2 – Da Forma Especial ou Solene

É a forma exigida pela lei como requisito de validade de determinados contratos, como por exemplo a escritura pública para a validade das alienações imobiliárias.


1.2.3.3 – Da Forma Contratual

A forma contratual é aquela convencionada pelas partes, disposta no Artigo 109 do Código Civil. Os contratantes podem, portanto, mediante cláusula expressa no contrato, determinar que o instrumento público se torne necessário para a validade do negócio.


1.3 – Dos Princípios do Direito Contratual

Além do Código Civil, existem vários outros dispositivos e princípios que regem os contratos em nosso ordenamento jurídico. Entre estes princípios, se destacam cinco. São eles: o da autonomia da vontade, do consensualismo, da força obrigatória dos contratos, da relatividade e da boa-fé.


1.3.1 – Do Princípio da Autonomia da Vontade

É no princípio da autonomia da vontade que se funda a liberdade contratual dos contratantes, consistindo no poder de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica.

Ou seja, no direito contratual as partes têm liberdade para contratar ou não, adquirindo direitos e contraindo obrigações, relacionando-se com quem quiser, dispondo de seus bens como entender e até inventando contratos.


1.3.2 – Do Princípio do Consensualismo

O princípio do consensualismo nos diz que todo contrato exige acordo de vontades. O simples acordo de duas ou mais vontades basta para gerar o contrato válido. A vontade é tão importante que ela pode predominar sobre a palavra escrita, consoante Artigo 112 do Código Civil. Assim, aquilo que as partes queriam dizer é mais importante do que aquilo que as partes disseram, escreveram e assinaram.


1.3.3 – Do Princípio da Força Obrigatória

Já o princípio da força obrigatória dos contratos nos diz que os contratos fazem lei entre as partes, ou seja, um contrato válido e eficaz deve ser cumprido pelas partes. É o chamado "pacta sunt servanda".

Ademais, como tudo em Direito, este princípio não pode ser tomado de forma peremptória, ou seja, sempre haverá temperamentos que por vezes conflitam, ainda que aparentemente, com a segurança jurídica.[8]


1.3.4 – Do Princípio da Relatividade

O princípio da relatividade dos contratos funda-se no brocardo "res inter alios acta, aliis neque nocet neque potest". Ou seja, funda-se tal princípio na idéia de que os efeitos do contrato só se produzem em relação as partes, àqueles que manifestaram a sua vontade, vinculando-os ao seu conteúdo, não afetando terceiros nem seu patrimônio.[9]

Este princípio está relacionado ao objeto do contrato, pois contrato sobre objeto não pertencente às partes contratuais não afeta de forma alguma à terceiros. Porém, esta é a norma geral, podendo haver casos extraordinários onde reflexos da criação de um contrato, como bem tangível, possam afetar de forma indireta interesses de terceiros que originalmente não integraram o contrato.


1.3.5 – Do Princípio da Boa-Fé

Finalmente, o princípio da boa-fé possui tamanha amplitude que parte da doutrina considera-o gênero, onde são espécies outros princípios como, por exemplo, o do equilíbrio contratual e da função social do contrato.

Nas palavras de Miguel Reale, a boa-fé se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e leal.[10]


2 – DO CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO

2.1 – Do Conceito

Entre as principais modalidades de contratos, encontramos o Contrato de Transporte, que é o gênero da espécie Contrato de Transporte Aéreo, sendo este aquele em que o transportador se obriga a deslocar, por meio de aeronave, mediante pagamento, passageiro, bagagem, carga ou mala postal.[11]

Em sua caracterização jurídica predomina de modo manifesto a prestação a cargo do transportador, que oferece ao passageiro ou expedidor uma conjunção de forças econômicas para executar o translado de pessoas ou coisas do ponto de partida ao ponto de destino.[12]

Quanto às modalidades do transporte aéreo, conforme disposto na Portaria nº 676/GC5 da ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil, temos o transporte de pessoas, de coisas e de carga. A diferença entre espécies de contratos que interessam para o ponto de vista dos diversos sistemas jurídicos verifica-se na divisão entre o transporte aéreo doméstico do internacional. Em se tratando de transporte doméstico, está regulamentado pelas disposições legislativas do País, no caso, pelo Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/86), em especial pelos Artigos 222 e seguintes, e sua legislação complementar. Porém, no transporte internacional, não existe um regime jurídico único, sendo que a Convenção de Varsóvia regulamenta o transporte que, segundo a estipulação das partes, o ponto de partida e de destino estejam situados em território de duas altas partes contratantes, ou mesmo no de uma só, desde que haja alguma escala prevista em qualquer outro Estado, signatário da Convenção. Deve-se ter em conta que a lei internacional aplicável a determinado contrato de transporte é a lei comum convencionada pelos Estados contratantes envolvidos.[13]

Além das normas acima citadas, no que tange ao contrato de transporte aéreo doméstico, temos outros importantes dispositivos que regem esta matéria, como a Portaria 676/GC5 da ANAC, que trata sobre as condições gerais de transporte e os contratos particulares das companhias aéreas nacionais.

Ademais, por se tratar de relação de consumo, o Código de Defesa do Consumidor é perfeitamente aplicável no contrato de transporte aéreo.

O Estado é fundamental no transporte aéreo, seja com a criação de leis, portarias e medidas, seja com a manutenção do tráfego aéreo, dos aeroportos e das companhias aéreas.

Como exemplo, temos hoje o Ministério da Defesa, responsável pelo controle do tráfego aéreo nacional, a ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil, responsável por toda a administração da aviação civil no Brasil, e a INFRAERO – Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária, responsável pela criação e manutenção dos aeroportos brasileiros, todas estas estatais. Ou seja, toda a administração do transporte aéreo em nosso país está nas mãos do Estado.


2.2 – Da Classificação

O Contrato de Transporte Aéreo é classificado, segundo a classificação clássica da doutrina, como bilateral, oneroso, cumulativo, formal, principal ou acessório, típico, consensual, de adesão, autorizado, "intuitu personae" e de resultado.


2.2.1 – Da Bilateralidade

O Contrato de Transporte Aéreo é considerado pela totalidade da doutrina como bilateral, eis que gera obrigações para ambas as partes. A contratada tem como obrigação entregar o passageiro ou a carga em seu destino final com segurança e integralidade. Por outro lado, o contratante deve pagar por este serviço.


2.2.2 – Da Onerosidade

Em regra, o Contrato de Transporte Aéreo, consoante já exposto, é oneroso, eis que o contratante/passageiro deve pagar pelo serviço prestado pela companhia aérea. Porém, há alguns casos em que esta modalidade de contrato é gratuita, consoante Artigo 256, § 2º, do Código Brasileiro de Aeronáutica.


2.2.3 – Da Comulatividade

O Contrato de Transporte Aéreo é sempre comulativo, pois do contrato nascem obrigações mais ou menos equivalentes para as duas partes contratantes. A do transportador, de prestar o serviço de transporte contratado, e a do usuário/passageiro, de pagar o valor da tarifa correspondente, ou seja, o preço da passagem.


2.2.4 – Da Formalidade

Pode-se dizer que o Contrato de Transporte Aéreo é formal, pois tem suas condições expressas em lei, no bilhete de passagem ou no conhecimento aéreo.


2.2.5 – Da Principalidade e da Acessoriedade

O Contrato de Transporte Aéreo pode ser tanto principal como acessório. Pode-se dizer que é principal quando se fala do passageiro ou da carga, eis que não depende de nenhuma outra condição para existir. A acessoriedade ocorre no caso de bagagem acompanhada, eis que esta apenas reforça a existência do principal, como nos casos em que o passageiro viaja levando consigo a sua bagagem, que também se torna de responsabilidade da companhia aérea.


2.2.6 – Da Tipicidade

É um contrato típico, pois previsto em lei, ou seja, em outras palavras, os contratos típicos são aqueles em que os direitos e obrigações dos contratantes estão, em parte, pelo menos, disciplinados na lei, por normas cogentes ou supletivas. Esses direitos e obrigações, portanto, não se esgotam nas cláusulas do instrumento contratual assinado pelas partes.[14]


2.2.7 – Do Consensualismo

O Contrato de Transporte Aéreo é um contrato consensual, ou seja, pode ser celebrado por simples manifestação e aceitação da proposta, independentemente da entrega da coisa e da observância de determinada forma. São também chamados de contratos não solenes.


2.2.8 – Da Adesão

A maioria dos contratos não resulta de amplas negociações entre os sujeitos. O usual é a declaração de vontade de uma das partes limitar-se à adesão às clausulas fixadas unilateralmente pela outra.[15] É assim que ocorre no Contrato de Transporte Aéreo, aonde a contratada/companhia aérea fixa as cláusulas e o contratante/passageiro não tem como alterá-las.


2.2.9 – Da Autorização

Diz-se que o Contrato de Transporte Aéreo é autorizado, eis que tem regras especiais impostas pelo Poder Público.


2.2.10 – Do "Intuitu Personae"

Geralmente o Contrato de Transporte Aéreo é pessoal e intransferível, pois se fundamenta na exigência legal da individualização da pessoa a ser transportada.


2.2.11 – Do Resultado

O Contrato de Transporte Aéreo é uma modalidade de contrato de resultado, e não de meio, eis que a contratada/companhia aérea se obriga a alcançar um objetivo certo e determinado, qual seja, cumprir o contrato integralmente, entregando o passageiro ou a bagagem em seu destino final com segurança e integridade.

2.3 – Do Contrato de Transporte Aéreo de Coisas ou Mercadorias

Mais comumente chamado de transporte de carga, o transporte aéreo de coisas ou mercadorias é umas das principais fontes de renda das companhias aéreas, visto que a cada dia que passa, as empresas necessitam de mais agilidade na entrega de suas mercadorias, e é através do transporte aéreo que podem enviar seus produtos para qualquer canto do mundo em menos de 24 horas.

O transporte aéreo de coisas ou mercadorias está regido pelos Artigos 743 a 756 do Código Civil, bem como pelos Artigos 235 a 245 do Código Brasileiro de Aeronáutica.

Vale ressaltar que apenas bens corpóreos e materializados, com expressão econômica, poderão ser objeto desse tipo de contrato. Note-se, aliás, que o legislador, levando em conta a materialidade da coisa, através do Artigo 743 do Código Civil, exige que a mesma seja individualizada, bem como o destinatário, para evitar, com isso, a frustração da entrega.[16]

Consoante Artigo 235 do Código Brasileiro de Aeronáutica, no contrato de transporte aéreo de carga, será emitido o respectivo conhecimento, também chamado de "air way bill", ou seja, nada mais é que um bilhete contendo a descrição da mercadoria a ser transportada, bem como o seu remetente e o seu destinatário. É a materialização do contrato de transporte aéreo de carga. Vale ressaltar que, nos exatos termos do Artigo 239 do Código Brasileiro de Aeronáutica, o expedidor do conhecimento de carga responde pela exatidão das indicações e declarações constantes do conhecimento aéreo e pelo dano que, em conseqüência de suas declarações ou indicações irregulares, inexatas ou incompletas, vier a sofrer o transportador ou qualquer outra pessoa.

De acordo com o Artigo 245 do Código Brasileiro de Aeronáutica, a execução do contrato de transporte aéreo de carga inicia-se com o recebimento e persiste durante o período em que se encontra sob a responsabilidade do transportador, seja em aeródromo, a bordo da aeronave ou em qualquer outro lugar, no caso de aterrissagem forçada, até a entrega final.

2.3.1 – Dos Direitos e Deveres do Transportador de Carga

Ante a ausência de dispositivo legal neste sentido, a doutrina é bastante divergente sobre quais seriam todos os direitos e deveres do transportador aéreo de carga. O Código Civil, bem como o Código Brasileiro de Aeronáutica, elencam apenas dois direitos e deveres do transportador de carga, quais sejam, a emissão do conhecimento de transporte e a recusa de carga cujo transporte ou comercialização não sejam permitidos ou que esteja desacompanhada dos documentos exigidos por lei ou regulamentos. Todos os outros direitos e deveres, comuns a todos os tipos de transporte – aéreo, terrestre, marítimo e ferroviário, foram sendo elencados através de construção doutrinária.

Segundo Pablo Stolze Gagliano, são direitos e deveres do transportador de carga: a) receber a coisa a ser transportada, no dia, hora, local e pelo modo convencionados; b) empregar total diligência no transporte da mercadoria posta sob a sua custódia; c) seguir o itinerário ajustado, ressalvadas as hipóteses de caso fortuito e força maior; d) entregar a mercadoria ao destinatário da mesma, mediante apresentação do respectivo documento comprobatório de sua qualidade de recebedor, ou seja, o conhecimento de transporte; e) respeito às normas legais em vigor no sentido de somente expedir mercadorias de trânsito admitido no Brasil; f) desnecessidade de comunicar ao remetente a chegada da mercadoria ou de realizar a entrega em domicílio, se assim não fora convencionado.[17]


2.3.2 – Dos Direitos e Deveres do Remetente

Igualmente aos direitos e deveres do transportador de carga, os direitos e deveres do remetente também foram sendo elencados através de construção doutrinária, eis que os dispositivos legais atinentes à espécie apenas elencam os dois seguintes direitos e deveres: a) caracterizar a carga, definindo a sua natureza, valor, peso e quantidade e fornecendo as demais informações distintivas; b) entregar ao transportador, quando solicitado, relação discriminada da carga.

Ante a já citada ausência de dispositivos legais, Pablo Stolze Gagliano novamente elenca vários outros direitos e deveres, desta vez do remetente de carga, quais sejam: a) entrega da mercadoria em condições de envio; b) pagamento do preço convencionado, ressalvada a hipótese de este ser adimplido pelo destinatário; c) acondicionamento da mercadoria; d) declaração do seu valor e da sua natureza; e) recolhimento tributário pertinente, respeito às normas legais em vigor no sentido de somente expedir mercadorias de trânsito admitido no Brasil; f) até a entrega, terá o direito de desistir do transporte, pedindo de volta a coisa, ou alterar o destinatário, arcando com as despesas devidas.[18]

2.4 – Do Contrato de Transporte Aéreo de Pessoas

De Janeiro à Outubro de 2010, mais de 120 milhões de passageiros já decolaram dos aeroportos brasileiros, contra aproximadamente 104 milhões no mesmo período do ano passado, o que significa um aumento recorde de 15%.

Se levarmos em conta os dados do mesmo período – Janeiro à Outubro – do ano de 2003, quando apenas 58 milhões de passageiros decolaram dos aeroportos brasileiros, tivemos, nestes últimos 7 anos, um aumento de 106%.

Ou seja, não restam dúvidas de que a cada dia que passa o tráfego aéreo no Brasil e no mundo não para de crescer. Mais e mais passageiros decolam de todos os cantos do mundo para todos os outros cantos do mundo.

Porém, desde os anos 70, quando a aviação no Brasil e no mundo era pouquíssima utilizada, o Contrato de Transporte Aéreo já vinha se tornando usual e importante. Tanto é verdade que em 1973, Orlando Gomes já nos disse que o contrato de transporte aéreo deixou de ser simples modalidade de locação para se tornar relação contratual autônoma, sujeita a regras próprias.[19]

E de lá pra cá, o transporte aéreo, principalmente de pessoas, vem se tornando indispensável e fundamental em nosso dia-a-dia. Enquanto que, para atravessar o nosso país de norte a sul, por via terrestre, demora-se mais de 72 horas, com o transporte aéreo pode-se fazer o mesmo trajeto em menos de 5 horas.

E são por estes motivos que o transporte aéreo de pessoas merece uma atenção especial, eis que, conforme já dito, a cada dia que passa, este fantástico meio de transporte vem se tornando cada vez mais importante e usual em nossas vidas.

No transporte aéreo de pessoas, se o próprio contratante do serviço tem o interesse voltado ao deslocamento de sua pessoa, ele é chamado de passageiro. Em nada se alteram, porém, as obrigações das partes do contrato se o passageiro não for o contratante do serviço.

O transportador é necessariamente empresário – pessoa física ou jurídica. Ele deve organizar a atividade econômica de prestação de serviços de transporte para poder cumprir satisfatoriamente suas obrigações contratuais e ter meios para respeitar os direitos do outro contratante. Sem a organização empresarial que dê adequado lastro operacional e econômico ao serviço de transporte, ninguém está em condições de atender às obrigações e responsabilidades impostas por lei ao transportador.

Já o contratante do transporte aéreo tem, como principal obrigação, a de pagar o preço da passagem. Trata-se de obrigação pecuniária, sujeita às conseqüências próprias do inadimplemento contratual, como a imposição de juros moratórios, correção monetária, multa, entre outros.[20]

A grande discussão doutrinária é acerca do momento que se inicia o Contrato de Transporte Aéreo de passageiros. Grande parte da doutrina entende que, ao adquirir o bilhete de passagem, também chamado de "passenger ticket", se estaria dando início ao contrato, ou seja, o contratante, ao acessar o "website" da companhia aérea, reservando o seu vôo e efetuando o pagamento, estaria automaticamente assinando o Contrato de Transporte Aéreo. Porém, outra parte da doutrina, ressalta-se, a minoria, entende que a emissão do bilhete de passagem seria apenas um comprovante da compra da passagem, sendo que o Contrato de Transporte Aéreo só teria seu início no momento do "check-in", ou seja, quando o passageiro se apresenta no balcão da companhia aérea antes do seu vôo e a empresa lhe entrega o seu cartão de embarque.

Na mesma linha da primeira teoria, José da Silva Pacheco nos diz que o bilhete de passagem aérea é o documento expedido pelo transportador, como prova do contrato de transporte, e que habilita o passageiro a ser transportado em uma aeronave, entre os lugares e condições expressas nesse ato jurídico.[21]

O próprio Código Brasileiro de Aeronáutica diz, em seu Artigo 227, que no transporte de pessoas, o transportador é obrigado a entregar o respectivo bilhete individual ou coletivo de passagem, que deverá indicar o lugar e a data da emissão, os pontos de partida e destino, assim como o nome dos transportadores.

A execução do Contrato de Transporte Aéreo de passageiros compreende as operações de embarque e desembarque, além das efetuadas a bordo da aeronave, consoante Artigo 233 do Código Brasileiro de Aeronáutica. O mesmo artigo delimita o que seria o embarque o desembarque, sendo que se considera operação de embarque a que se realiza desde quando o passageiro, já despachado no aeroporto, transpõe o limite da área destinada ao público em geral e entra na respectiva aeronave, abrangendo o percurso feito a pé, por meios mecânicos ou com a utilização de viaturas. Já a operação de desembarque inicia-se com a saída de bordo da aeronave e termina no ponto de intersecção da área interna do aeroporto e da área aberta ao público em geral.

Encerra-se o Contrato de Transporte Aéreo de passageiros com a chegada no destino final, entregando a companhia aérea o passageiro e sua bagagem com segurança e integridade.

2.4.1 – Dos Direitos e Deveres das Companhias Aéreas

Assim como ocorre no transporte de carga, no transporte de pessoas os direitos e deveres das companhias aéreas e dos passageiros também não estão bem definidos em lei, restando à doutrina encontrar estes direitos e deveres na legislação esparsa e os elencar de forma concreta.

Carlos Roberto Gonçalves nos diz que são direitos e deveres das companhias aéreas: a) exigir o pagamento do preço ajustado; b) uma vez executado o transporte, reter a bagagem e outros objetos pessoais do passageiro, para o caso de não ter recebido o pagamento da passagem no início ou durante o percurso; c) reter 5% da importância a ser restituída ao passageiro, quando este desiste da viagem; d) estabelecer normas disciplinadoras da viagem, especificando-as no bilhete ou afixando-as à vista dos usuários; e) recusar passageiros, nos casos permitidos nos regulamentos ou em que as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem; f) alegar força maior em duas situações: para excluir a sua responsabilidade por dano às pessoas transportadas e suas bagagens e para excluir a sua responsabilidade pelo descumprimento do horário ou itinerário; g) transportar o passageiro, no tempo e no modo convencionados; h) responder objetivamente pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior; i) concluir a viagem contratada, sempre que ela se interromper por qualquer motivo alheio à sua vontade e imprevisível, em outro veículo da mesma categoria, ou por modalidade diferente se a ela anuir o passageiro, sempre à sua custa, correndo por sua conta eventuais despesas de estada e alimentação deste, durante a espera de novo transporte; j) não recusar passageiro, salvo nos casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem.[22]


2.4.2 – Dos Direitos e Deveres dos Passageiros

Da mesma forma que ocorre com os direitos e deveres das companhias aéreas, os direitos e deveres dos passageiros não possuem um rol específico, sendo que novamente é necessário recorrer à doutrina para elencar os mesmos.

Carlos Roberto Gonçalves nos traz este rol de forma bastante clara, elencando como direitos e deveres dos passageiros: a) exigir o cumprimento do contrato de transporte, mediante a apresentação do bilhete; b) rescindir o contrato quando lhe aprouver; c) ser conduzido são e salvo ao destino convencionado; d) exigir que o transportador conclua a viagem interrompida por motivo alheio à sua vontade, em outro veículo da mesma categoria, ou de modalidade diferente se houver concordância do usuário, e responda por todas as despesas provenientes desse fato; e) pagar o preço ajustado; f) sujeitar-se às normas estabelecidas pelo regulamento do transportador, abstendo-se de quaisquer atos que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço; g) não causar perturbação ou incômodo aos outros passageiros; h) comparecer ao local de partida no horário estabelecido ou avisar da desistência ou impossibilidade de realizar a viagem, com a antecedência necessária para que outra pessoa possa viajar em seu lugar.[23]

Já a Portaria 676/GC-5 da ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil apresenta, em seu Artigo 61, outro rol de deveres dos passageiros, são eles: 3,a) apresentar-se, para embarque, munido de documento legal de identificação na hora estabelecida pelo transportador no bilhete de passagem; b) estar convenientemente trajado e calçado; c) obedecer os avisos escritos a bordo ou transmitidos pela tripulação; d) abster-se de atitude que cause incômodo, desconforto ou prejuízo aos demais passageiros; e) não fumar a bordo; f) manter desligados aparelhos sonoros, eletrônicos e de telecomunicações, que possam interferir na operação da aeronave ou perturbar a tranqüilidade dos demais passageiros; g) não fazer uso de bebidas que não sejam aquelas propiciadas pelo serviço de comissária da empresa transportadora; h) não conduzir artigos perigosos na bagagem; i) não acomodar bagagem de mão em local de trânsito dos passageiros ou em locais que interfiram nas saídas de emergência; j) manter sob sua guarda e vigilância, enquanto permanecer no terminal de passageiros, toda a sua bagagem devidamente identificada; l) não transportar bagagem que não seja de sua propriedade ou que desconheça o seu conteúdo.

2.5 – Do Contrato de Transporte Aéreo de Bagagem

O Código Brasileiro de Aeronáutica, através de seu Artigo 234, e em especial a Portaria 676/CG-5 da ANAC, através de seu Artigo 37, garantem aos passageiros do transporte aéreo o direito de levar consigo a sua bagagem, devendo esta ser despachada no momento do "check-in", sendo transportada no porão da aeronave, ficando esta também sob total responsabilidade da companhia aérea.

O já citado Artigo 37 da Portaria 676/GC-5 da ANAC, garante aos passageiros, nas linhas domésticas, a levar consigo uma peça de bagagem, nas dimensões estipuladas pelo Manual de Vôo de cada aeronave, com franquia mínima de: a) trinta quilos para a primeira classe, nas aeronaves acima de 31 assentos; b) vinte e três quilos para as demais classes, nas aeronaves acima de 31 assentos; c) dezoito quilos para as aeronaves de 21 até 30 assentos; d) dez quilos para as aeronaves de até vinte assentos.

Nas linhas aéreas internacionais, o franqueamento de bagagem será feito pelo sistema de peça ou peso, segundo o critério adotado em cada área e na conformidade com a regulamentação específica. Nas linhas domésticas em conexão com linhas internacionais, quando conjugados os bilhetes de passagem, prevalecerá o sistema e o correspondente limite de franquia de bagagem, estabelecido para as viagens internacionais.

Segundo Sylvio Mário Brasil, o Contrato de Transporte Aéreo de Bagagem é o contrato no qual uma das partes se obriga a transportar, de um lugar para outro, juntamente com o passageiro, ou seja, no mesmo vôo e data, as bagagens deste, ou seja, os artigos pessoais apropriados para sua comodidade e uso durante a viagem. O contrato de transporte de bagagem é acessório, logo, deve ser sempre vinculado ao principal, de passageiro. É representado pela Nota de Bagagem, que deverá conter as indicações do lugar e data de emissão, os pontos de partida e destino, o número do bilhete de passagem respectivo, a quantidade, peso e valor declarado dos volumes, se houver. Modernamente, por iniciativa da IATA – International Air Transport Association, o bilhete de passagem e a nota de bagagem foram conjugados num único documento de transporte.[24]

Além da bagagem despachada, o Artigo 234, § 3º, do Código Brasileiro de Aeronáutica, garante aos passageiros o direito de levar consigo, dentro da cabine da aeronave, objetos de uso pessoal, que serão levados como bagagem de mão.

Consoante Artigo 32, parágrafo único, da Portaria 676/GC-5 da ANAC, a execução do Contrato de Transporte Aéreo de Bagagem se inicia com a entrega da nota de bagagem e termina com o recebimento da bagagem pelo passageiro, sem o protesto oportuno. Ademais, o recebimento da bagagem, sem protesto, faz presumir o seu bom estado, e, portanto, encerra o negócio jurídico.

2.7 – Da Responsabilidade Civil das Companhias Aéreas

A Convenção de Varsóvia, que regula o tráfego aéreo internacional, promulgada em 1929, já criou a responsabilidade por culpa presumida do transportador em caso de danos decorrentes da execução do Contrato de Transporte Aéreo.[25] Ou seja, uma vez provado o evento, o dano e o nexo causal entre os dois, o transportador é responsável, pois a sua culpa é presumida.[26]

Mesmo agindo o transportador sem dolo ou culpa, a responsabilidade deste é objetiva. Conforme nos ensina José Gabriel Assis de Almeida, o Código Brasileiro de Aeronáutica adotou um sistema de responsabilidade objetiva. O Código de Defesa do Consumidor, quando aplicado ao Contrato de Transporte Aéreo, também implica na responsabilidade objetiva do transportador.[27]

No que tange ao disposto no Código Civil, este não deixa claro se a responsabilidade civil do transportador é objetiva ou subjetiva, porém, o Artigo 927, que trata da responsabilidade civil em geral, nos diz que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Não restam dúvidas de que o transporte aéreo é uma atividade de risco. Portanto, resta claro que a responsabilidade civil do transportador aéreo é objetiva.

Nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho, o transportador tem responsabilidade objetiva pelos que a execução do contrato de transporte causar à pessoa ou coisa transportada. Mesmo que ele tenha adotado todas as cautelas e procedimentos técnicos recomendados para evitar acidentes, em vindo esses a ocorrer, a responsabilidade por indenizar os danos é do transportador. Não se livra de pagar a indenização mesmo o transportador que prove não ter agido com culpa ou dolo, porque a responsabilidade objetiva independe desse pressuposto.[28]

Porém, a responsabilidade civil da companhia aérea por ato de terceiro só existe quando este for interno. Caso o ato gerador do dano seja externo, tais como os praticados por um passageiro a bordo da aeronave, não há que se falar em indenização.

Vale ressaltar que o Artigo 734 do Código Civil, bem como o Artigo 247 do Código Brasileiro de Aeronáutica, veda completamente a elaboração de cláusula de não indenizar, ou seja, caso no Contrato de Transporte Aéreo seja criada um cláusula visando isentar a companhia aérea de qualquer indenização em caso de dano, esta cláusula será considerada inválida e não produzirá efeitos.


2.6.1 – Da Limitação da Indenização

O Código Brasileiro de Aeronáutica, bem como o Artigo 67 da Portaria 676/GC-5 da ANAC, limitam as indenizações referentes a responsabilidade civil das companhias aéreas.

Consoante Artigo 257 do Código Brasileiro de Aeronáutica, a responsabilidade do transportador, em relação a cada passageiro e tripulante, limita-se a 3.500 OTN – Obrigações do Tesouro Nacional em caso de lesão física a este. Já o Artigo 260 limita a 150 OTN a responsabilidade do transportador aéreo em caso de dano à bagagem despachada ou conservada em mãos do passageiro. No que tange ao transporte de cargas, o Artigo 262 limita a 3 OTN por quilo em caso de atraso, perda, destruição ou avaria de carga.

Note-se que a norma tarifária do Código Brasileiro de Aeronáutica, embora anterior ao Código de Defesa do Consumidor, porque tem âmbito especial, não foi revogada pela norma geral de tutela dos consumidores.[29]

2.6.2 – Da Responsabilidade por Danos em Serviços Aéreos Gratuitos

O Código Civil de 2002, em seu Artigo 736, prevê claramente a possibilidade do transporte gratuito, que, segundo o já citado artigo, não se subordina às normas do contrato de transporte.

Porém, o Artigo 267 do Código Brasileiro de Aeronáutica prevê a responsabilidade civil do transportador aéreo em certas oportunidades, quais sejam: a) no serviço aéreo privativo, o proprietário da aeronave responde por danos ao pessoal técnico a bordo, e às pessoas e bens na superfície; b) no transporte gratuito realizado por empresa de transporte aéreo público, a responsabilidade do transportador estende-se a seus tripulantes, diretores e empregados que viajarem na aeronave aonde tenha sido causado o dano, bem como aos passageiros gratuitos, que viajarem por cortesia; c) no transporte gratuito realizado pelo Correio Aéreo Nacional, não haverá indenização por danos à pessoa ou bagagem de bordo, salvo se houver comprovação de culpa ou dolo dos operadores da aeronave.

2.7 – Do Descumprimento do Contrato de Transporte Aéreo

Não é difícil se verificar no transporte aéreo o descumprimento do contrato por parte das companhias aéreas. Este descumprimento, que muitas vezes passa despercebido, ocorre principalmente com os atrasos e cancelamentos de vôos e com a ocorrência de preterição de passageiros, mais conhecida como "overbooking".

Os atrasos de vôos são tão freqüentes, que a própria ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil edita mensalmente um relatório de pontualidade dos vôos domésticos no Brasil. Mensalmente, aproximadamente 12% dos vôos que decolam no Brasil, saem com atraso igual ou superior a 30 minutos. Para um passageiro de férias, este atraso pode não significar nada. Porém, os executivos que dependem da pontualidade dos vôos para cumprir com seus compromissos podem sofrer prejuízos irreparáveis com estes pequenos atrasos.

O descumprimento do Contrato de Transporte Aéreo se tornou tão freqüente que, além de o Código Brasileiro de Aeronáutica já prever as medidas a serem tomadas nestes casos, em 09 de Março de 2010, a ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil editou a Resolução nº 141, que dispõe sobre as condições gerais de transporte aplicáveis aos atrasos e cancelamentos de vôos e às hipóteses de preterição de passageiros.


2.7.1 – Do Atraso e do Cancelamento de Vôos

Nos atrasos de até 4 horas, o Artigo 2º da Resolução nº 141 da ANAC prevê que o transportador, ao constatar que o vôo irá atrasar em relação ao horário originalmente programado, deverá somente informar ao passageiro sobre o atraso, o motivo e a previsão do horário de partida, pelos meios de comunicação disponíveis, não sendo necessário tomar nenhuma medida em relação a este.

Porém, nos atrasos de mais de 4 horas, o Artigo 3º da Resolução nº 141 da ANAC, bem como o Artigo 230 do Código Brasileiro de Aeronáutica, prevêem que o transportador deverá providenciar o embarque do passageiro em vôo que ofereça serviço equivalente para o mesmo destino, se houver, ou restituirá, de imediato, se o passageiro preferir, o valor do bilhete de passagem.

Em caso de atrasos de mais de 4 horas no aeroporto de escala ou conexão, o transportador deverá oferecer ao passageiro o endosso do bilhete aéreo, para que o mesmo possa voar para o seu destino em outra companhia aérea, ou então a imediata devolução do valor pago a título de passagem aérea, consoante Artigo 231 do Código Brasileiro de Aeronáutica e Artigo 4º da Resolução nº 141 da ANAC.

Em caso de cancelamento do vôo ou interrupção do serviço, o transportador deverá oferecer ao passageiro a reacomodação em outro vôo que ofereça serviço equivalente para o mesmo destino, na primeira oportunidade, ou então em vôo próprio a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro. Pode também optar o passageiro pelo reembolso do valor pago, sendo que neste caso a companhia aérea deverá proceder de imediato a devolução dos valores pagos a título de passagem aérea. Não sendo possível a reacomodação em outro vôo, nem mesmo querendo o passageiro a devolução do valor da passagem, deverá a companhia aérea proceder a conclusão do serviço por outra modalidade de transporte.


2.7.2 – Da Preterição de Passageiros

Mais conhecida como "overbooking", a preterição de passageiros ocorre quando a companhia aérea deixa de transportar passageiro com bilhete marcado ou reserva confirmada. Geralmente a preterição de passageiros ocorre devido a venda de bilhetes acima da capacidade da aeronave, ou seja, a companhia aérea vende mais passagens para determinado vôo do que a capacidade da aeronave.

Nos termos do Artigo 12 da Resolução nº 141 da ANAC, em caso de preterição de passageiros, a companhia aérea deverá oferecer ao passageiro a reacomodação em vôo próprio ou de terceiro que ofereça serviço equivalente para o mesmo destino, na primeira oportunidade, ou então em vôo a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiros. Preferindo o passageiro, este pode optar pelo reembolso integral do valor pago a título de passagem aérea. Assim como no caso de cancelamento de vôos, não sendo possível a companhia aérea reacomodar o passageiro em outro vôo, nem este preferindo pelo reembolso, deverá a transportadora oferecer ao passageiro a realização do serviço por outra modalidade de transporte.


2.7.3 – Da Assistência Material

Consoante Artigo 14 da Resolução nº 141 da ANAC, nos casos de atraso, cancelamento ou interrupção de vôo, bem como de preterição de passageiro, o transportador deverá assegurar ao passageiro que comparecer para embarque o direito a receber assistência material.

A assistência material consiste em satisfazer as necessidades imediatas do passageiro, gratuitamente e de modo compatível com a estimativa do tempo de espera, contados a partir do horário de partida originalmente previsto.

Em caso de atraso, cancelamento ou interrupção de vôo, bem como no caso de "overbooking", superior à 1 hora, deverá a companhia aérea providenciar ao passageiro facilidades de comunicação, tais como ligação telefônica, acesso à internet ou outros.

Sendo superior a 2 horas, deverá a companhia aérea fornecer ao passageiro, além das facilidades de comunicação, alimentação adequada.

Sendo acima de 4 horas, a companhia aérea deverá providenciar ao passageiro as facilidades de comunicação, alimentação adequada, acomodação em local adequado, translado e, quando necessário, serviço de hospedagem.

2.8 – Da Extinção do Contrato de Transporte Aéreo

Além dos meios comuns de dissolução do contrato, tais como a resolução, resilição ou rescisão, o contrato de transporte pode se extinguir, simplesmente, pela consumação da sua finalidade, ou seja, por meio da sua execução.[30]

Ou seja, tendo a companhia aérea entregue o passageiro, a sua bagagem ou a carga em seu destino final, com segurança e integridade, está extinto o Contrato de Transporte Aéreo.

E neste caso, tendo o passageiro chego ao seu destino final, se utilizando deste meio de transporte que, com toda a certeza foi uma das maiores invenções do homem, com o auxílio de Deus, este contará os dias para a sua próxima viagem, pois, nas palavras de Leonardo da Vinci, uma vez que você prove o vôo, nunca mais você caminhará sobre a terra sem olhar para os céus, pois você já esteve lá e para lá sua alma deseja voltar.


CONCLUSÃO

Por intermédio do presente trabalho, foi possível aprofundar o estudo do Direito dos Contratos, mais especificamente o Contrato de Transporte Aéreo, concluindo-se que tal modalidade contratual, pela sua relevância no contexto do exercício da liberdade de locomoção, servindo de suporte para a realização dos demais atos da vida civil, possui características próprias, essenciais para o bom funcionamento da aviação no Brasil e no mundo, igualmente, deve ser melhor compreendida pelo sistema jurídico.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria dos Contratos. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2008.


Notas

  1. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, v. 5. 34ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2003. 4/5 p.
  2. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v. 3. 7ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 21 p.
  3. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria dos Contratos. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2008. 347 p.
  4. 2 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, volume 3. São Paulo: Saraiva, 2005. 18/19 p.
  5. 3 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria dos Contratos. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2008. 353 p.
  6. DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos, v. 1. São Paulo: Saraiva, 2006. 13 p.
  7. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v. 3. 7ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 34 p.
  8. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral das Obrigações e Teoria dos Contratos. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2008. 360 p.
  9. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v. 3. 7ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 47 p.
  10. REALE, Miguel. A boa-fé objetiva. Jornal O Estado de São Paulo. Coluna Espaço Aberto. Edição de 16 de Agosto de 2003.
  11. PACHECO, José da Silva. Comentários ao Código Brasileiro de Aeronáutica. 2ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998.
  12. COSENTINO, Eduardo. Régimen Jurídico del Tranportador Aéreo. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1986.
  13. BRASIL, Sylvio Mário. Contrato de Transporte Aéreo. Revista Brasileira de Direito Aeroespacial. Edição nº 81. 2000.
  14. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005. 55 p.
  15. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005. 76 p.
  16. GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo Curso de Direito Civil, v. 4: Contratos, tomo 2: Contratos em Espécie. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 462 p.
  17. GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo Curso de Direito Civil, v. 4: Contratos, tomo 2: Contratos em Espécie. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 472 p.
  18. GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo Curso de Direito Civil, v. 4: Contratos, tomo 2: Contratos em Espécie. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 472 p.
  19. GOMES, Orlando. Contratos. 4ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1973.
  20. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005. 395 p.
  21. PACHECO, José da Silva. Comentários ao Código Brasileiro de Aeronáutica. 2ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
  22. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v. 3. 7ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 493/495 p.
  23. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, v. 3. 7ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 495/497 p.
  24. BRASIL, Sylvio Mário. Contrato de Transporte Aéreo. Revista Brasileira de Direito Aeroespacial. Edição nº 81. 2000.
  25. ESCALADA, Federico Videla N. Manual de Derecho Aeronautico. 2ª Edição. Buenos Aires: Zavalia, 1996.
  26. DE ALMEIDA, José Gabriel Assis. Contrato de Transporte Aéreo no Novo Código Civil Brasileiro. Revista Brasileira de Direito Aeroespacial. Edição nº 87. 2004.
  27. DE ALMEIDA, José Gabriel Assis. Jurisprudência Brasileira Sobre Transporte Aéreo. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
  28. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005. 407 p.
  29. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005. 408 p.
  30. GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo Curso de Direito Civil, v. 4: Contratos, tomo 2: Contratos em Espécie. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. 486 p.