Prescrição penal: o direito de punir do Estado


PorJeison- Postado em 21 setembro 2012

Autores: 
CURVELO, Hercílio Denisson Alves.

 

RESUMO: O Direito Penal evoluiu da vingança privada para a ascensão pelo Estado do monopólio da justiça punitiva. Assim, o Estado passa a exercer o direito de punir diante da prática delituosa de um infrator, sob duas formas: abstrata e concreta. Mas, esse direito de punir está atrelado a alguns fatores que caso não sejam correspondidos o torna ineficaz, proporcionando a extinção da punibilidade diante do caso concreto.  

PALAVRAS-CHAVE: Direito Penal; Estado; prescrição; justiça.


1 INTRODUÇÃO

            Em face da ineficiência do papel estatal em punir ou executar a pena, a prescrição penal constitui atualmente um dos institutos mais discutidos do Direito Penal Brasileiro.

É cediço que a prescrição, sendo matéria pública, deve ser decretada, quando reconhecida, em qualquer fase do processo, mas esta deve ser a exceção. O Estado como detentor do ius puniendi tem a obrigação de zelar pelo bem estar da sociedade, aplicando sendo que necessário as penas cabíveis a aqueles que atentem contra o disposto nas leis. Logo, a prescrição da pretensão punitiva ou executiva só surge quando ocorre o esquecimento a respeito da infração penal, ou seja, o decurso do tempo sem a aplicação devida da pena.

2 DA PRESCRIÇÃO PENAL

            O Direito Penal evoluiu da vingança privada para a ascensão pelo Estado do monopólio da justiça punitiva. O Estado como protetor e detentor da responsabilidade, da seguridade social, exerce diante o cidadão que pratica um crime, o ius puniendi, ou seja, o direito de punir a prática delituosa. Entretanto, em uma visão técnica, assim como o direito surge para o Estado, inicia-se também o prazo prescricional, de interesse estatal e particular, pois ao Estado interessa estar atento a prática do direito de punir, já ao particular, agente da prática delituosa, interessa o direito de não ser punido caso seja ultrapassado o decurso do tempo para a execução da pretensão punitiva.

O Estado exerce esse monopólio em vários momentos e de diversas maneiras. Dessa forma, entende-se porque se pode falar em direito de punir de forma abstrata e direito de punir de forma concreta. O direito de punir de forma abstrata vem a ser o direito que tem o Estado de determinar quais violações à ordem jurídica devem ser consideradas infrações penais, por afrontarem os bens jurídicos mais valiosos à sociedade. Já no exercício do direito de punir de forma abstrata, o Estado, além de definir infrações, estabelece as punições aplicáveis aos que forem por elas responsáveis.

A prescrição como causa extintiva da punibilidade veio prevista no artigo, 107, inciso IV, do Código Penal, além de ter sido regulada pelos artigos 109 a 119 do mesmo diploma legal, constituindo “o instituto jurídico mediante o qual o Estado, por não ter tido capacidade de fazer valer o seu direito de punir em determinado espaço de tempo previsto pela lei, faz com que ocorra a extinção da punibilidade.” [1]

O ius puniendi de forma concreta é o aprumado que tem o Estado de punir aquele que pratica determinada conduta prevista como criminosa pela lei penal anteriormente criada. Assim, exemplificando, se o agente exportar para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis em grande quantidade sem autorização da autoridade ambiental competente, terá cometido ação definida como crime pelo artigo 30 da Lei 9.605/1998. O Estado possui o direito de punir essa pessoa, aplicando-lhe a sanção penal prevista.

Sobre a ótica do exercício do direito de punir concreto, duas fases podem ser identificadas. Na primeira, se determina a culpa e se fixa a sanção aplicável ao infrator (fase da ação penal de conhecimento). Já na segunda, a sanção penal é executada (fase da execução penal).

Tanto o direito de punir de forma abstrata, quanto o direito de punir de forma concreta estão sujeitos a limites. O Estado não pode ser arbitrário na criação dos tipos penais, como também não pode ser arbitrário na aplicação e na execução das penas. Em todos esses momentos, se sujeita aos princípios que norteiam a seara do direito penal. Deste modo, ao exercer o direito de punir de forma abstrata, o Estado deve ressalvar os princípios do devido processo legal substantivo, da intervenção mínima e da adequação social, entre outros. Ao praticar o direito de punir de forma concreta, tanto na ação quanto na execução penal, o Estado deve observar consubstancialmente os princípios da legalidade, do devido processo penal, da culpabilidade e da individualização da pena, et al.

Logo, na análise da prescrição penal, é necessário observar que ela diz respeito exclusivamente ao direito de punir de forma concreta, mais precisamente nas suas duas fases, a da ação penal de conhecimento e a de execução penal. Dessa maneira, decorrem as duas espécies prescricionais utilizadas pelo Direito Penal Brasileiro, a pretensão punitiva e a pretensão executória, elementos intrínsecos a prescrição penal.

2 DA PUNIÇÃO AO ESQUECIMENTO

A prescrição penal existe, segundo alguns doutrinadores, para cumprir com o objetivo de trazer a paz social com a extinção da punibilidade. Reiteram que ficaria sem sentido movimentar processo, ou aplicar sanções, transcorrido o tempo que o Estado estabeleceu para fazer efetivo o seu poder de punir.

A passagem do tempo esmaece ou apaga a lembrança do fato punível, de forma a cessar com a desordem e o desequilíbrio social proporcionado pela prática da conduta criminosa.

Ao elucidar sobre o tema em um de seus eternos escritos, Francisco Afonso Jawsnicker nos diz que a justiça demasiadamente tardia:

Não pode alcançar o apoio da certeza que legítima uma condenação. E ainda mesmo que haja intervindo, sem subseqüente cumprimento, a condenação do réu, a pena, com o transcurso do tempo, acaba por perder o seu cunho de necessidade e o seu caráter finalístico: sua serôdia execução já não seria um ato de justiça profícua, mas um simples capricho da vingança. (Prescrição penal antecipada, p. 145)

A previsão e o cumprimento dos prazos processuais, tanto para os casos de réus presos como de réus soltos, constituem aspectos indissociáveis do devido processo legal, princípio constitucional instituído no interesse público e expressamente declarado como direito e garantia fundamental dos brasileiros e estrangeiros na preservação da liberdade e fundamental dos brasileiros e estrangeiros na preservação da liberdade e outros bens.

A própria Constituição Federal de 1988, inovando em relação às Cartas Políticas anteriores e ao próprio sistema penal desde a Primeira República, prevê em seu artigo 5.º, inciso XLII e XLIV, a imprescritibilidade quanto à prática de alguns crimes como o racismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado de Direito.

A evolução do instituto no Direito brasileiro revela a tendência de ampliar as hipóteses mais favoráveis à liberdade como ocorreu com a edição da Súmula 146, do Supremo Tribunal Federal que elenca a prescrição da ação penal regulada pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação.

A previsão e o cumprimento dos prazos processuais, tanto para os casos de réus presos como de réus soltos, constituem aspectos indissociáveis do devido processo legal, princípio constitucional instituído no interesse público e expressamente declarado como direito e garantia fundamental dos brasileiros e estrangeiros na preservação da liberdade e fundamental dos brasileiros e estrangeiros na preservação da liberdade e outros bens.

Destarte, incumbe ao juiz, portanto ao Estado, prover a regularidade do processo, como prevê o artigo 251 do Código de Processo Penal, de maneira a impedir que as partes ultrapassem os limites de tempo para a produção da prova e apresentação das alegações. Dentre os deveres do magistrado está o de consignar nos autos os motivos da demora quando concluir a instrução fora do prazo, valendo a regra para acusados detidos ou em liberdade. Pois, é curial que não se pode conceder, em contrapartida, um tempo proporcionalmente demasiado (em meses ou anos) para o exercício do contraditório e da ampla defesa. Contra essa tolerância arbitrária se opõem não somente o princípio do equilíbrio de armas como também o interesse público e geralmente do próprio réu em ver julgada a causa criminal dentro de um tempo razoável.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os penalistas consideram e prescrição um dos temas mais antigos e complexos do Direito Penal. De fato, tendo surgido antes do nascimento de Cristo, até hoje gera dúvidas e conflitos doutrinários e jurisprudenciais nos povos dispersos pelo mundo.        

A punibilidade nasce com a prática do crime, porque tem como consequência necessária a punição. Entretanto, é preciso observar que a ocorrência do crime nem sempre é suficiente para determinar a punibilidade respectiva.

Destarte, devemos rever o sistema legalista, que somente tem buscado a aplicação do dispositivo de modo mecânico, sem interpretações. Já que, a prescrição é isso, texto de lei. Desse modo, urge nascer uma nova concepção penalista, que não proteja o infrator e sim à sociedade, e é nesse aspecto, que se torna relevante, uma teoria que busque a justiça ainda que contra o texto expresso da lei e os exageros garantistas, terminantemente: uma justiça que prática justiça.

REFERÊNCIAS

GRECO, Rogério. Curso de direito penal parte geral. 11. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009.

JAWSNICKER, Francisco Afonso. Prescrição penal antecipada. Curitiba: Juruá, 2004.


[1] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal parte geral, p. 731.

Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.39439&seo=1