Da democracia participativa e do processo de redemocratização


PorJeison- Postado em 01 outubro 2012

Autores: 
SANDES, Hyran Ferreira.

 

RESUMO: A discussão acerca do sistema democrático de governo está presente na história política mundial desde a evolução da característica humana de nômade para a de vida em sociedade. Atualmente, em muitas nações são garantidos os princípios democráticos de Direito, no entanto apesar da democracia estar presente em muitas realidades com suas respectivas garantias, desde o surgimento da globalização hegemônica que é dominada pela lógica do capitalismo mundial e domina, hoje, os processos sociais, políticos, econômicos e culturais das sociedades, aquela realidade não continua a mesma. Assim, em razão da mudança na essência do caráter democrático no mundo moderno, várias reflexões surgem e é para tratar dessas idéias que o presente trabalho brota.

PALAVRAS-CHAVE: democracia; globalização hegemônica; economia; capitalismo; reflexões.


1 – INTRODUÇÃO

A democracia e suas extensões sempre foi debate mundial e se tornou mais forte após o fim das grandes guerras mundiais. O autoritarismo das monarquias, dos impérios, do colonialismo, do período escravasista, o regime militar, em fim, todos esses processos que aniquilavam a opinião pública, fizeram com que a população mundial desse início à discussão a respeito da paz, das condições de vida, da igualdade e principalmente sobre a participação do povo nas tomadas de decisão sobre seu futuro, o futuro do seu país.

            Essa discussão com incitação à democracia coincidiu com o período da Guerra Fria, entre os anos de 1945 e 1991, no qual além da disputa bélica de poderio, existia a disputa entre socialismo e capitalismo e é daí que começa o problema para a democratização.

2 – DA REDEMOCRATIZAÇÃO

O capitalismo aos poucos devastou as esperanças socialistas como uma onda gigante e trouxe consigo, a globalização e ideologias perversas que com o passar dos tempos fizeram com que a população mundial começasse a valorizar o poder, principalmente econômico, ou seja, o “ter” e desvalorizar o “ser”. E com essa formação ideológica individualista, tornou-se complicado a participação do povo na administração com o poder em mãos, porque a democracia traria consigo uma redistribuição de ganhos para todos, principalmente para as classes pobres que começaram a emergir com o capitalismo. Surgiu então, a idéia de uma democracia representativa, e não participativa como o modelo liberal, pois, tal modelo seria catastrófico para o capitalismo e inútil principalmente em países de grandes escalas, afinal, seriam milhares de interesses buscando cada qual apenas se satisfazer. Naquela democracia seriam escolhidos representantes do povo, que governariam para e por esse povo e foi essa a aprovada e aplicada em muitas partes do globo.  

A democracia representativa, mesmo não tendo a participação direta do povo, teria dificuldades de atender a todos os interesses, porque são milhares e distintos e, além disso, (o que não foi pensado) dar poder a um representante, ou seja, um homem tornar-se-ia um problema, pois ele não precisaria de autorização nenhuma do povo para gerir. Diante disso e da influência da globalização fica claro o que aconteceu: os únicos que conseguiam chegar ao governo eram os poderosos que aos poucos deixaram de representar os interesses populares. Todo o estímulo que impulsionou a tentativa de implantação da democracia foi caindo, e os poderosos já representavam o que queriam e crescia cada vez mais, a pobreza, as favelas, a desigualdade, o consumismo, a violência, a burocracia, e aos poucos foram fazendo parte da realidade. Com tanta desgraça começou a se falar em subdesenvolvimento e em países de primeiro mundo, mas enquanto isso, a máquina capitalista ficava mais forte e formava o processo da globalização.

Hoje, a população mundial, pelo menos em sua maioria, está abatida, com tanta desgraça e desestimulada, restando apenas a viver suas vidas medíocres e a esperar um milagre. Diferente de casos como o doMovimento Cocalero na Colômbia, em que o povo de Putomayo lutou contra o governo e contra as forças armadas revolucionárias, exigindo uma melhoria na estrutura social, econômica, política e cultural da região que era dominada pela produção e plantio ilegal da coca. Faz-se necessário lutar pela verdadeira democracia e modificar a globalização hegemônica que impede até o próprio ideal da luta.

A Globalização é o processo de integração econômica presente nas sociedades atuais. Através dela o capitalismo dispersa para todo o mundo a individualidade e a busca do poder que transforma as relações interpessoais e produz um desenvolvimento nunca igualitário, fazendo com que a linha de identificação social, econômica, política e cultural seja vertical, pois quem ta em baixo nunca sobe e quem ta encima sempre sobe.  

Essa globalização hegemônica, que domina os processos sociais, econômicos, políticos e culturais, transformou de forma tão forte o pensar do homem do século XX que implicitamente impede a vontade de liberdade, de igualdade, de progresso, de racionalidade, em fim, impede com isso, a própria idéia da luta, da não aceitação e busca pela melhoria. E é por isso que impede o ideal e aplicação da democracia, porque, forma pensamentos, e as dificuldades de romper essa barreira são tamanhas que muitos desistem antes mesmo de tentar. 

Porém, apesar de sua hegemonia, é dentro desse vazio de expectativas que começam a surgir movimentos e iniciativas que lutam contra as formas de regulação e a emancipação social. Os grupos de classes inferiores que vivem a exclusão e a pobreza começam a se manifestarem, pois, eles estão nas periferias e semiperiferias (nos países subdesenvolvidos e pobres) e conseguem sentir as consequências do processo de globalização, que não acontece com os grandes centros (países subdesenvolvidos), que já estão tão presos ao capitalismo que não conseguem enxergar a realidade mundial, se acomodam e quem sabe até condenam movimentos contra hegemônicos.

Essa união de grupos isolados da sociedade econômica, política, social e culturalmente em diversas partes do globo é uma espécie de globalização alternativa, contra hegemônica que parte de iniciativas locais para as esferas globais e da base para o topo das sociedades. A resistência à opressão traz um novo momento para a humanidade, pois, são das ações quotidianas contra problemas locais que se alcança a esfera transnacional e essa globalização alternativa que rompe as barreiras da desigualdade é o meio de se chegar a uma nova democratização da própria democracia.

Assim, trazem-se à baila exemplos importantes de movimentos contra hegemônicos que formam a globalização alternativa:

Os micro-movimentos da Índia, que lutaram e ainda lutam pelas populações economicamente marginalizadas e socialmente excluídas, buscando uma possível democracia participativa, contra a globalização relativa ao Estado indiano, mas consequentemente mundial. Eles lutaram contra sindicatos que não buscaram seus interesses, apoiando trabalhadores de setores informais da economia, não se limitando apenas aos seus salários, como também, ao direito à saúde, à educação, e o cuidado de seus descendentes e cônjuges. Os micro-movimentos ou movimentos de base envolveram diretamente as pessoas nas lutas pela democratização do desenvolvimento. Durante um período, esses grupos foram cooptados pela globalização hegemônica, mas poucos ainda continuaram a batalhar pelas suas ideologias e foram esses poucos grupos que nesse período de desestímulo fizeram com que a população que estava sentindo o impacto negativo, viesse a acreditar e a lutar contra a hegemonia da globalização. Ao estabelecer a supremacia do mercado sobre a economia, sobre a sociedade e sobre a cultura, a globalização deslegitima as instituições de governação democrática, que na perspectiva dos indianos desfaz a revolução democrática indiana. Os seus objetivos principais são os de repolitizar o desenvolvimento e reinventar a democracia participativa. Através da democracia participativa, pretendem dispersar o monopólio de poder do Estado por diferentes entidades autogovernadas e supervisionarem o sistema de governação através de corpos representativos democraticamente eleitos.

O movimento cocalero de 1996, no qual os moradores de Putomayo se destacaram pela luta do seu reconhecimento como habitantes do Estado-Nação colombiano e pela sua cidadania e direitos adstritos a essa. O presidente na época iniciou um processo de aniquilação da cultura de cultivo da coca porque os camponeses cultivadores (ao ver do governo) auxiliavam o narcotráfico, só que eles viviam daquela forma devido ao processo de colonização na Amazônia. Quando os camponeses chegaram naquela região se viram na necessidade de trabalhar e o que mais era cultivado era a folha da coca, daí que surge a cultura deles. O apoio das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) veio como uma consequência positiva para aquele povo, pois não era auxiliado pelo governo e as FARC passaram a servirem como tal, numa espécie de troca onde os camponeses cultivavam a coca e assim, “auxiliavam” o narcotráfico. Os camponeses conseguiram através de lutas, provar que aquela identidade adstrita a eles como também narcotraficantes e guerrilheiros era falsa e que a coca era apenas sua cultura de subsistência, exigiram do governo novas formas de controle da estrutura de desenvolvimento fundamentando que excluindo a cultura dos cocaleros não seria a solução de seus problemas. Os camponeses dessa forma ganharam força e conseguiram a melhoria que desejavam.

O orçamento participativo em Porto Alegre, proposta de participação do orçamento formulada nos anos 80 pela UAMPA (União das Associações de Moradores de Porto Alegre), onde o Partido dos Trabalhadores abriu mão das prerrogativas de decisão em favor das formas de participação. Foram formuladas regras complexas de participação que predeterminavam o caráter distributivo do orçamento participativo e estimulavam a participação da população de baixa renda.

Enfim, casos em se que lutaram contra a hegemonia da globalização e que conseguiram êxito em seus movimentos.

3 – CONCLUSÃO

            Dessa forma, apesar da democratização de muitos países pelo mundo, a representatividade tornou-se mais uma arma em favor da globalização hegemônica que ainda domina os processos sociais, políticos, econômicos e cultural, segundo a ideologia capitalista. A democracia foi modificada negativamente e poluída pelo individualismo, dando consequência a tantos outros problemas como a pobreza, a discriminação, a desigualdade, a violência, o consumismo e o pior de todos eles, a formação de pensamentos parados, sem perspectivas de luta. Mas, fica claro que este século será marcado por grandes movimentos, pois, apesar de ser hegemônica, essa globalização não é única, afinal agora nasce a globalização alternativa contra hegemônica, movida pela união de grupos isolados que não mudaram sua forma de pensar, não desacreditaram na possibilidade de melhoria, que incentivam a união das populações e que apliam sua experiência local para aprofundarem as redes globais. 

Diante de tais conclusões, hoje, se faz necessário, como ressalta Boaventura de Sousa Santos, democratizar a própria democracia, pois, não se defende mais os interesses de todos, ou seja, o povo não está sendo representado efetivamente e se continuar assim, a raça humana caminhará em direção a sua própria destruição. Talvez esteja mesmo, na hora de tentar por em prática uma democracia participativa que fortalecerá o direito a ter direito e deslegitimará a globalização hegemônica dominada pelo capitalismo. Hoje, deve-se lutar pelos ideais que vão à frente desse tempo, assim para impedir a destruição do sentimento humano abalado pelo processo de globalização hegemônica, é preciso lutar por uma governação baseada nos princípios democráticos de igualdade política, justiça social, diversidade cultural e de não violência e nos princípios ecológicos de sustentabilidade e manutenção da biodiversidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SANTOS, Boaventura de Sousa; AVRITZER, Leonardo. Para ampliar o cânone democrático. In: Democratizar a Democracia: os caminhos da democracia participativa. Rio de janeiro: Civilização brasileira, 2002.

 

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