As comissões de conciliação prévia e o princípio da inafastabilidade do acesso ao poder judiciário


PorJeison- Postado em 25 março 2013

Autores: 
OLIVEIRA, Claudilene Morais de.

 

1 INTRODUÇÃO

 

As Comissões de Conciliação Prévia foram instituídas no ordenamento jurídico com o objetivo de solucionar os conflitos individuais trabalhistas de forma célere, buscando a conciliação entre as partes, preservando o interesse do trabalhador, hipossuficiente na relação de emprego, oferecendo a possibilidade de composição da lide sem que os conflitantes tenham de socorrer-se ao Poder Judiciário.

 

O presente trabalho se propõe a analisar a inserção destas Comissões no ordenamento jurídico brasileiro, bem como a sua aplicabilidade nas empresas e sindicatos junto aos quais funcionem, e ainda a verificação de sua eficácia social, entendida no sentido de que efetivamente cumpram a sua função mediadora relativamente aos dissídios submetidos à sua apreciação.

 

Proporcionará a obtenção de conhecimentos acerca de toda a estrutura desses órgãos extrajudiciais de conciliação prévia, sua formação, seu funcionamento, os legitimados para a tentativa conciliatória, sua natureza, e a finalidade precípua da sua atividade

 

Será discutido e analisado o possível confronto entre essas Comissões e o princípio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário, o que resultará em um entendimento mais acurado acerca de ambos os institutos, os quais são aplicados cotidianamente, bem como, se verificará a existência de possíveis soluções, compatíveis com as condições analisadas.

 

O aspecto jurisprudencial também será objeto de estudo, tendo em vista a evolução decisória dos Tribunais quanto à matéria em exame.

 

Como hipótese, trabalha-se com o fato de estas Comissões, cuja finalidade precípua é solucionar extrajudicialmente os conflitos individuais de trabalho, não restringirem o controle jurisdicional, representando, na verdade, técnica de solução de litígio alternativa, desburocratizada, conciliatória e imediata.

 

A importância deste tema ganha contornos concretos diante da instabilidade jurídica que a observância das disposições legais referentes às Comissões de Conciliação Prévia pode provocar, sobretudo em face da previsão constitucional do acesso irrestrito ao Poder Judiciário.

 

Após decisão do Supremo Tribunal Federal, a notoriedade do assunto se mostra presente não só para os sujeitos da relação trabalhista, principais interessados nesta forma de solução extrajudicial de conflitos individuais de trabalho, mas para a sociedade em geral, pois a insegurança jurídica de qualquer dispositivo afeta as legitimas expectativas dos indivíduos quanto à prestação jurisdicional, a qual se espera ser feita da melhor maneira possível, atendendo aos fins sociais e as exigências do bem comum.

 

2 LINHAS GERAIS SOBRE AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA

 

2.1 Aspectos históricos

 

Imprescindível para a compreensão desta espécie de solução extrajudicial de conflitos individuais trabalhistas é a explicitação da forma, do lugar e do momento histórico em que se fez sentir a necessidade de sua instituição, bem como os aspectos gerais embasadores de sua evolução.

 

À época em que o Brasil figurava como Colônia portuguesa já havia a previsão para que as partes em litígio procedessem a uma tentativa de conciliação, a qual era disciplinada pelas disposições constantes nas Ordenações do Reino, que eram, segundo Martins Filho[1], “as compilações de todas as leis vigentes em Portugal, mandadas fazer por alguns de seus monarcas e que passavam a constituir a base do direito vigente.”

 

Segundo Martins (2008, p.01), as Ordenações dispunham no Livro III, Título XX, § 1º que:

 

No começo da demanda dirá o juiz a ambas as partes, que antes que façam despesas, e sigam entre elas o ódio e dissensões, se devem concordar, e não gastar suas fazendas por seguirem suas vontades, porque o vencimento da causa sempre é duvidoso. E isto, que dizemos, de reduzirem as partes a concórdia, não é de necessidade, mas somente honestidade nos casos, em que o bem puderem fazer.

 

A conciliação entre os detentores de interesses contrapostos se mostrava já para o legislador daquele período como uma melhor saída para a composição dos conflitos levados ao Poder Judiciário.

 

A primeira Constituição brasileira, outorgada em 1824, trouxe disposição expressa acerca do caráter cogente da tentativa conciliatória entre os litigantes antes do início do procedimento judicial, pois estipulava em seu art. 161[2] que não haveria a instauração de qualquer processo ante a inexistência de tentativa de conciliação.

 

O regulamento nº 737, de 25 de novembro de 1880, no seu art. 23, estabelecia a obrigatoriedade da tentativa de conciliação prévia. Entretanto, em 1890, com o Decreto nº 359, restou superada tal obrigatoriedade.

 

Com o reconhecimento e consequente tratamento específico dispensado às relações trabalhistas no Brasil, fatos que ocorreram em virtude do influxo de novas ideias sociais que provieram da Europa recém-saída do primeiro grande conflito mundial, os próprios movimentos operários e até mesmo notícias do aparecimento de um novo ramo social do direito, houve a criação de órgãos direcionados à solução dos conflitos laborais, com especial incentivo à tentativa de conciliação entre os envolvidos.

 

Assim, foram criadas por Getúlio Vargas, em 1932, as Comissões Mistas de Conciliação, que serviram de auxílio à estrutura administrativa montada para aplicar a legislação trabalhista brasileira.

 

Essas Comissões que funcionavam paralelamente às Juntas de Conciliação e Julgamento, tinham por escopo a realização de tentativas de conciliação entre as partes envolvidas em conflitos individuais e coletivos do trabalho, sendo necessário, entretanto, que o trabalhador fosse sindicalizado e a demanda possuísse cunho exclusivamente trabalhista.

 

Caso restasse frustrada a tentativa de acordo, a questão deveria ser submetida à Junta de Conciliação e Julgamento, para fins decisórios, exceto se o Ministério do Trabalho, por meio de carta avocatória, tomasse para si a atribuição de julgar o caso.

 

Com a criação da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) em 1943, a qual sistematizou e reuniu normas esparsas sobre os mais diversos assuntos trabalhistas, houve a previsão, no seu art. 621[3], sobre a possibilidade de as convenções e os acordos coletivos incluírem, entre as suas clausulas, disposições sobre a constituição e o funcionamento de comissões mistas de consulta e colaboração, dentro do âmbito da empresa.

 

Essas comissões mistas configuram uma forma de democratização e melhoria no relacionamento laboral, bem como, participação do empregado na gestão da empresa, e atualmente, podem ser amplamente instituídas, observadas as diretrizes de colaboração e consensualidade.

 

Para Martins (2006, p. 759), a instituição das comissões mistas de consulta e colaboração “seria realmente o melhor sistema, pois teria condições de melhor adaptar a co-gestão às peculiaridades de cada empresa, além de a solução ser negociada, e não imposta pela lei.”

 

A criação das Comissões de Conciliação Prévia se deu em virtude da necessidade de solucionar um problema que assolava a justiça trabalhista, qual seja, o excessivo número de demandas propostas.

 

Maior (2003) citado por Paniago[4] discorre sobre o contexto da instituição destas Comissões:

 

A criação e a implementação (sic) de modos alternativos de solução de conflitos, nos sistemas jurídicos marcados pela prevalência da via estatal, foi um resultado lógico do crescimento de demandas pela efetivação de direitos. O reforço da democracia e o exercício concreto da noção abstrata da cidadania trazem consigo o acréscimo da luta pelo direito. A ideia de intensificação dos modos alternativos foi uma resposta até certo ponto lógica a esta nova realidade, pois o aparato judicial, por mais avantajado que fosse não poderia dar vazão ao aumento da demanda.

 

Segundo Süssekind (2000, p. 1316) havia um reclamo da doutrina brasileira no sentido da “institucionalização de comissões paritárias, no âmbito da empresa ou do sindicato, como instância prévia e obrigatória ao ajuizamento de qualquer ação individual ou plúrima.”

 

À época da criação destas comissões, estatísticas do Tribunal Superior do Trabalho (TST) indicavam que a quantidade de ações propostas na Justiça do Trabalho crescia em volume assustador. Os dados apontavam que na década de 60, haviam sido propostas 3.333.214 ações; na década de 70, 4.827.884 ações; na década de 80, 9.091.374 ações e de 1990 a 1995, 8.911.179 ações[5].

 

O número demasiado de processos provocava deficiência na prestação jurisdicional ofertada pela Justiça do Trabalho, tendo em vista não se apresentar de modo rápido e eficaz, resultando na inobservância da celeridade processual, um dos princípios norteadores desta justiça especializada.

 

Diante deste contexto, se fez necessária a instituição de mecanismos de solução de conflitos trabalhistas que fossem alternativos, desburocratizados, que conduzissem as partes a uma rápida composição do litígio.

 

Segundo estatísticas apontadas pelo TST[6], em 40% (quarenta por cento), em média, das reclamações ajuizadas na Justiça do Trabalho, há realização de acordo entre as partes, isto porque, para Martins (2008, p. 5),

 

[...] os empregados preferem resolver a questão naquele momento, mesmo abrindo mão de direitos, do que ter de esperar muito tempo até a próxima audiência ou sentença. A maior parte tem baixo valor, de modo que o custo do processo é muito mais elevado do que o valor postulado pelo empregado. Daí a necessidade de mecanismos alternativos de solução de conflitos trabalhistas, como as Comissões de Conciliação Prévia.

 

Diante dessa realidade, no início do ano de 1998, foi constituída uma comissão composta pelos Ministros Vantuil Abdala, José Luciano de Castilho Pereira e João Oreste Dalazen, cuja finalidade era a elaboração e apresentação de um projeto de mudança no processo trabalhista.

 

Referido projeto previa como obrigatória a instituição das Comissões de Conciliação Previa nas empresas que possuíssem mais de 50 (cinquenta) empregados. Entretanto, essa obrigatoriedade não prosperou, sendo afastada pela Comissão do Trabalho da Câmara dos Deputados.

 

A Presidência da República enviou o projeto para a Câmara dos Deputados, por meio da mensagem nº 500, de 28 de julho de 1998, a qual resultou no projeto de lei nº 4694/98. Na Câmara dos Deputados a lei foi aprovada com 282 votos favoráveis, 90 contrários e uma abstenção, o que totalizou 373 votos[7].

 

Após a aprovação, o projeto foi convertido na Lei 9.958 de 12 de janeiro de 2000, que acresceu o Título VI-A, com os artigos 625-A a 625-H à CLT, instituindo e disciplinando as Comissões de Conciliação Prévia.

 

Foi editada a Portaria nº 264, de 05 de junho de 2002 que determinou uma série de normas para o acompanhamento e recrutamento de dados sobre o modo de proceder das Comissões de Conciliação Prévia, bem como, para fins de fiscalização do trabalho quanto ao FGTS e contribuições sociais decorrentes da conciliação.

 

Outra Portaria, a de nº 329, de 14 de agosto de 2002, estabeleceu os procedimentos necessários para fins de instalação e funcionamento das Comissões de Conciliação Prévia e Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista, estes constituídos por intermédio de Negociação Coletiva entre sindicatos pertencentes a categorias diversas.

 

Com a criação desta última portaria, houve a estipulação de certos limites a serem observados pelos componentes das Comissões, tendo em vista os abusos que estes vinham cometendo no exercício da mediação.

 

Assim, surgiu as Comissões de Conciliação Prévia, com objetivos precípuos de solucionar extrajudicialmente os conflitos trabalhistas, bem como, desafogar o Poder Judiciário do excessivo número de ações submetidas à sua apreciação.

 

2.2 Disposições da Organização Internacional do Trabalho (OIT)

 

A Convenção nº 158 da OIT, traz normas específicas a respeito do término da relação de trabalho por iniciativa do empregador (a qual deixou de vigorar no Brasil desde 20 de novembro de 1997, em virtude de denúncia feita pelo governo brasileiro àquele organismo internacional). No seu art. 8º dispõe que, considerando desarrazoada a sua dispensa, poderá o empregado recorrer deste ato perante um organismo neutro, como por exemplo, um tribunal, um tribunal do trabalho, uma junta de arbitragem ou um árbitro.

 

O dispositivo acima mencionado, embora não se refira expressamente à instituição das Comissões de Conciliação Prévia, o faz de modo indireto ou reflexo à medida que propõe a submissão do pleito do empregado à apreciação de um organismo neutro, capaz de resolver a questão.

 

As Recomendações nº 92, 94 e 130 da OIT prevêem, de um modo geral, formas de conciliação extrajudicial entre empregados e empregadores, indicando, respectivamente, a criação de organismos de conciliação voluntária dos conflitos do trabalho, a instauração de organismos de consulta e colaboração entre os sujeitos da relação trabalhista, e ainda, a solução dos dissídios de forma não vinculada dentro da empresa, respeitado o pleno acesso ao Poder Judiciário.

 

2.3 Direito comparado

 

Na Argentina, segundo a Lei 24.635/96, os conflitos individuais e coletivos do trabalho passam por “um procedimento de conciliação obrigatória realizado perante um profissional designado pelo Estado entre uma lista de especialistas, que é elaborada pelo Ministério da Justiça entre profissionais da área jurídica” (MARTINS, 2008, p. 8).

 

Na Espanha, vigente a “Lei do Procedimento Laboral” de 1990, a tentativa conciliatória, antes da apreciação da demanda no âmbito jurisdicional, possui caráter obrigatório e se configura como uma das condições da ação, sob pena, ante a sua ausência, da decretação de carência.

 

Segundo Martins (2008, p. 9), existe na Espanha o sistema de mediação, arbitragem e conciliação que pode ser realizado em órgãos indicados pelos convênios coletivos. Os acordos celebrados perante referidos órgãos possuem força executiva reconhecida pela justiça trabalhista.

 

Nos Estados Unidos, o departamento do trabalho instituiu um serviço de conciliação para o setor público em 1913. “Nesse caso, o conciliador apenas levava as partes a uma sala e pedia que se conciliassem, terminando sua responsabilidade nesse momento.” (MARTINS, 2008, p. 9).

 

Na Finlândia, de acordo com a Lei de 27-07-1926, a paralisação no trabalho somente pode ser realizada após a tentativa conciliatória realizada por um mediador nomeado pelo governo.

 

Na França, os tribunais de primeira instância exigem a tentativa de conciliação prévia antes de o conflito ser submetido à apreciação judicial. “A conciliação é realizada perante o Conselho de Prud’hommes(art. L 511-1, do Código do Trabalho). Caso não seja possível a realização de acordo, a demanda é submetida ao órgão de instrução e julgamento, pertencente ao mesmo conselho, cuja decisão, solucionando a lide, é passível de recurso dirigido ao Tribunal Comum.

 

Na Itália, a conciliação antes da propositura da ação é facultativa, podendo ser, de acordo com a Lei nº 533 de 1973, sindical ou administrativa. Querendo, o empregado pode realizar a tentativa conciliatória em órgãos previstos em acordos ou convenções coletivas de trabalho, ou em comissão constituída dentro do âmbito da empresa, com essa finalidade específica, ou ainda, perante o pretor.

 

Em Portugal, já existiram comissões de conciliação, entretanto foram extintas e atualmente a conciliação é feita no âmbito judicial (Decreto-Lei nº 272-A, de 30-09-1981).

 

Na Suíça, há um órgão especifico destinado à conciliação que é o Escritório Federal de Conciliação, que existe desde 1946.

 

Na Suécia, a conciliação e mediação são feitas por um serviço oficial autônomo e independente.

 

No Uruguai, a tentativa de conciliação antes do início da propositura da ação trabalhista é obrigatória, pois conforme o Decreto-lei nº 14.188, de 05-04-1974, não se pode dar início um processo judicial trabalhista sem uma tentativa conciliatória anterior perante o Ministério do Trabalho e da Seguridade Social.

 

2.4 Vantagens e desvantagens das Comissões

 

Diante da atuação conciliatória das Comissões, a Justiça Trabalhista é beneficiada, pois os casos mais simples e passíveis de acordo, não mais serão submetidos ao crivo do judiciário, desafogando-o.

 

A solução do conflito trabalhista na Comissão é muito mais rápida, pois há estipulação do prazo de 10 dias para realização de todo o procedimento.

 

Cumpre observar, no entanto, que nestes órgãos extrajudiciais pode haver coação para que o empregado aceite a conciliação. Quanto a este aspecto, alerta Martins (2008, p. 19): “Alguns empregados vão à Comissão, mas nem mesmo sabem o que estão ali fazendo e que tipo de órgão é aquele. Pensam que se trata da Justiça do Trabalho.”

 

3 ÂMBITO CONCEITUAL E ESTRUTURAL DAS COMISSÕES

 

3.1 Conceituação

 

O termo comissão deriva do latim commissio, de commitere, significa ação de unir, concurso, confiar, entregar(SILVA, 2005, p. 312).

 

Conciliação deriva do latim conciliatio, deconciliare(atrair, harmonizar, ajuntar), “entende-se o ato pelo qual duas ou mais pessoas, desavindas a respeito decerto negócio, ponham fim à divergência amigavelmente.” (SILVA, 2005, p. 328).

 

Para Giglio (2000), citado por Latif[8] “a conciliação tem um conceito mais amplo do que o acordo, significando entendimento, recomposição de relações desarmônicas, desarme de espírito, compreensão e ajustamento de interesses”.

 

Prévio vem do latim praevius(que vem antes, que antecede), “no sentido jurídico assim se diz de todo ato que deva ser praticado ou executado preliminarmente ou antecipadamente”(SILVA, 2005, p. 1092).

 

Pela combinação dos termos e verificação do sentido que juntos produzem chega-se à conceituação das Comissões de Conciliação Prévia. Estas são, na verdade, um órgão privado, constituído por um grupo de pessoas que buscam conciliar determinadas partes que estejam divergindo acerca de um ato ou negócio jurídico de âmbito trabalhista, antes que busquem a solução no Poder Judiciário.

 

A natureza privada das referidas Comissões pode ser verificada pelo fato de a Portaria nº 329, no seu art. 7º, dispor que estas devem se abster de utilizar, nos seus documentos, símbolos oficiais, como o selo e as armas da Republica, os quais devem ser usados exclusivamente pela Administração Pública Federal, conforme a Lei nº 5.700, de 1º de setembro de 1971.

 

Para Nascimento (2007, p. 459), essas Comissões não são órgãos judiciais. “São privados, extrajudiciais, atuam antes do inicio da fase processual perante a jurisdição, embora de criação facultativa”.

 

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) define as Comissões de Conciliação Prévia:

 

Um organismo de conciliação extrajudicial, de composição paritária, no âmbito das empresas ou grupo de empresas e no âmbito dos sindicatos, não possuindo qualquer relação administrativa ou jurisdicional com o Ministério do Trabalho e Emprego ou com a Justiça do Trabalho e não estando subordinadas a qualquer registro ou reconhecimento de órgãos públicos. (CNI, 2000 apud LATIF[9]).

 

Desse modo, as Comissões de Conciliação Prévia são percebidas como um órgão composto por representantes dos empregados e empregadores, que de maneira célere e simples procede à mediação em busca da conciliação entre as partes divergentes, prevenindo o ajuizamento de eventuais reclamações trabalhistas.

 

3.2 Natureza jurídica de mediação

 

Os conflitos sociais fazem parte da própria experiência da vida em comunidade, sendo inerentes aos grupos sociais. A sua total superação não é possível, entretanto, se mostra incansável a busca para solucioná-los de modo menos oneroso e mais eficaz para as partes conflitantes e para a sociedade em geral.

 

Variados são os métodos de solução de conflitos interindividuais e sociais, os quais podem ser enquadrados em três grandes grupos que se subdividem em: autotutela, autocomposição e heterocomposição.

 

O diferencial entre esses grupos reside nos sujeitos envolvidos e no processo de solução dos conflitos, pois na autotutela e na autocomposição os sujeitos com interesses conflitantes é que se relacionam para buscar a extinção do conflito, “o que dá origem a uma sistemática de análise e solução da controvérsia autogerida pelas próprias partes (na autotutela, na verdade, gerida por uma única parte)” (DELGADO, 2009, p. 1323), ao passo que na heterocomposição há intervenção de um agente exterior ao conflito, cuja sistemática solucionadora não é mais gerida exclusivamente pelas partes, porém transferida para o terceiro interveniente.

 

A autotutela ocorre quando o próprio sujeito impõe a sua vontade e seu interesse unilateralmente, fazendo-os prevalecer em detrimento da parte adversa e da própria comunidade que o cerca, com o uso, de certo modo, de expediente coercitivo.

 

De acordo com Nascimento (2007, p. 6), a autotutela ou autodefesa “indica o ato pelo qual alguém faz a defesa própria, por si mesmo. Supõe uma defesa pessoal. É a forma mais primitiva de solução dos conflitos.”

 

A autotutela em casos excepcionais é autorizada pelo legislador. Para Cintra, Grinover e Dinamarco (2006, p.35) duas razões permitem a conduta unilateral invasora da esfera jurídica alheia: “a impossibilidade de o Estado estar presente sempre que um direito esteja sendo violado ou prestes a sê-lo e a ausência da confiança de cada um no altruísmo alheio, inspirador de uma possível autocomposição.”

 

Na autocomposição, o conflito é solucionado por ato das próprias partes, sem imposição do interesse de uma em detrimento da pretensão da outra, mediante ajuste de vontades. “Na autocomposição, um dos litigantes ou ambos consentem no sacrifício do próprio interesse, daí a sua classificação em unilateral e bilateral. A renúncia é um exemplo da primeira e a transação da segunda” (NASCIMENTO, 2007, p. 6).

 

A Heterocomposição se classifica como forma de solução de conflitos caracterizada pela presença de um terceiro estranho à relação conflituosa, que visualiza e impõe às partes uma solução para o caso submetido à sua apreciação. “É a solução dos conflitos trabalhistas por uma fonte suprapartes, que decide com força obrigatória sobre os litigantes, que, assim, são submetidos à decisão” (NASCIMENTO, 2007, p.7)

 

São formas de heterocomposição: a mediação, a arbitragem e a tutela ou jurisdição. Dentre estas, a primeira apresenta maior relevância para o presente estudo, visto as Comissões de Conciliação Prévia se constituírem como subespécies desta forma de solução de conflitos.

 

A mediação caracteriza-se como técnica de composição dos conflitos em que se verifica a presença de um terceiro, mediador, cuja função principal é ouvir as partes e formular propostas. No entanto, as partes não ficam vinculadas a estas, havendo composição somente com a ocorrência de acordo de vontades.

 

Uma parcela da doutrina aponta uma diferença puramente acadêmica entre conciliação e mediação. Neste sentido, afirma com propriedade Nascimento (2007, p. 18) “A conciliação é judicial e em alguns casos extrajudicial. Logo, se o acordo é em juízo, o nome é conciliação. [...]. Se é fora dos tribunais e há um terceiro que o intermediou, é mediação”.

 

De modo geral, duas são as diferenças entre mediação e conciliação. Na mediação, o mediador é via de regra escolhido pelas partes, embora em alguns casos isso possa não ocorrer, como na mediação na Delegacia Regional do Trabalho, no Brasil; na conciliação nem sempre é assim, pois o conciliador pode até mesmo ser o juiz. Na conciliação geralmente atua um órgão permanente destinado a esse fim, enquanto na mediação pode surgir a figura do mediador para cada caso concreto. (NASCIMENTO, 2007, p. 18)

 

Levando-se em conta este posicionamento, as Comissões de Conciliação Prévia configuram forma de composição de conflitos cuja denominação correta seria conciliação e não mediação.

 

Essa diferença, puramente formalista, não é considerada por muitos doutrinadores. A despeito, Martins (2008, p. 16) trata as Comissões de Conciliação Prévia como espécie de mediação, pois reafirma esta como sua natureza jurídica, cujo “objetivo é de conciliar dissídios individuais entre empregado e empregador e não dizer o direito aplicável ao litígio, como ocorre na arbitragem.”

 

Destarte, o caráter mediador ou conciliatório (para quem assim o classifica) das Comissões de Conciliação Prévia, determina a participação paritária entre empregados e empregadores, os quais funcionam como terceiros estranhos à relação conflituosa, mas que possuem conhecimentos apurados sobre relações empregatícias, passíveis, portanto, de apresentar propostas adequadas para resolução dos conflitos, “fornecendo subsídios e argumentos convergentes, aparando divergências, instigando à resolução pacífica da controvérsia” (DELGADO, 2009, p. 1335), desarmando espíritos exaltados, restabelecendo a harmonia entre os discordantes.

 

3.3 Classificação

 

Considerando as disposições do art. 625-A[10] da CLT, bem como a classificação proposta por Martins (2008, p. 20), pode-se definir a existência de 05 (cinco) espécies de Comissão de Conciliação Prévia de acordo com o âmbito da sua criação:

 

As Comissões de Conciliação Prévia instituídas somente no âmbito da empresa que são denominadas de Comissões por Empresa.

 

As Comissões instituídas no âmbito de um grupo econômico, constituído por várias empresas, cuja denominação usual é Comissões por Grupo de Empresa.

 

Aquelas criadas pelo sindicato de empregados e uma ou mais empresas, por intermédio de acordo coletivo, que se dá o nome de Comissões Sindicais.

 

As criadas por sindicato de empregados e empregadores, mediante convenção coletiva, possuindo validade para toda a categoria, que são chamadas de Comissões Intersindicais.

 

E aquelas criadas por sindicatos pertencentes a categorias diversas, por meio de negociação coletiva, que recebem a denominação de Núcleos de Conciliação Intersindical.

 

Cumpre estabelecer os conceitos de negociação coletiva, acordo coletivo e convenção coletiva de trabalho para que as espécies de Comissões possam ser compreendidas adequadamente.

 

De acordo com a Convenção nº 154 da OIT, as negociações coletivas seriam aquelas negociações entre, de um lado, um empregador, um grupo de empregadores ou uma organização ou várias organizações de empregadores, e do outro lado, uma ou várias organizações de trabalhadores, cuja finalidade é estipular condições de trabalho e emprego, regular as relações entre trabalhadores e empregadores ou entre empregadores ou suas organizações e uma ou várias organizações de trabalhadores.

 

A negociação coletiva para Martins (2006, p. 779) “é uma forma de ajuste de interesses entre as partes, que acertam os diferentes entendimentos existentes, visando encontrar uma solução capaz de compor suas posições.”

 

Para ele, as negociações seriam um processo de solução de conflitos que objetiva realizar uma convenção ou acordo coletivo de trabalho, diferenciando-se destes dois institutos pelo fato destes constituírem seus resultados.

 

A negociação coletiva seria então um procedimento de discussões sobre divergências, buscando-se uma possível solução capaz de compor os conflitos apreciados e que resultaria em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

 

A Constituição Federal de 1988, no seu art. 8º, IV, determina que os sindicatos devem obrigatoriamente participar das negociações coletivas de trabalho.

 

Para Delgado (2007, p. 1263), as negociações coletivas são o gênero, cujas espécies subdividem-se em convenção e acordo coletivo de trabalho. Segundo este autor, estes seriam diplomas negociais coletivos.

 

Conceituando as convenções, temos o art. 611, caput, da CLT:

 

Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho.

 

“A convenção coletiva resulta, pois de negociações entabuladas por entidades sindicais, quer a dos empregados, quer a dos respectivos empregadores. Envolve, portanto, o âmbito da categoria, seja a profissional [...], seja a econômica.” (DELGADO, 2009, p. 1264)

 

A CLT, no seu art. 611, § 1º, traz a conceituação dos acordos coletivos de trabalho quando estabelece que:

 

É facultado aos Sindicatos representativos de categorias profissionais celebrar (sic) Acordos Coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho.

 

Delgado (2009, p. 1265) afirma que, acordo coletivo de trabalho é um pacto que possui caráter normativo, tendo de um lado um sindicato representativo de certa categoria profissional, e de outro lado, uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, o qual estipula condições de trabalho aplicáveis no âmbito das respectivas empresas, às relações individuais de trabalho.

 

Do exposto pode-se extrair uma diferença fundamental entre convenção e acordo coletivo de trabalho, a qual reside no fato daquela ter em seus pólos subjetivos, necessariamente, entidades sindicais, representativas dos empregados e dos empregadores, enquanto neste, os pólos subjetivos obrigatoriamente devem ter a presença do sindicato representativo dos trabalhadores e facultativamente do sindicato dos empregadores, já que as empresas, individualmente ou em grupo, podem figurar nos pólos sozinhas, sem a respectiva representação sindical.

 

Outra diferença entre acordo e convenção coletiva reside no âmbito de abrangência destes, visto a convenção abranger todas as empresas e empregados que estejam inseridos na respectiva categoria econômica e profissional, respeitando, em todos os casos, os limites territoriais das representações. No acordo coletivo, abrange apenas os empregados vinculados à empresa ou conjunto de empresas que tenham participado da negociação.

 

Explicitadas as conceituações imprescindíveis à compreensão da classificação das espécies de Comissões de Conciliação Prévia, dois aspectos merecem destaque neste item, o primeiro referente à facultatividade da criação destas Comissões e o segundo referente à sua duração.

 

A lei expressamente declara o caráter facultativo da criação das Comissões de Conciliação Prévia, pois determina que estas poderãoser criadas. Assim, em qualquer das classificações acima expostas, a sua instituição será sempre facultativa, a depender da vontade dos instituidores.

 

Cumpre observar a existência de uma peculiaridade para a criação de algumas espécies de Comissões, quais sejam, Comissões Sindicais, Intersindicais, e Núcleos de Conciliação Intersindical, as quais exigem, quando da sua instituição, a realização de acordo, convenção e negociação coletiva de trabalho, respectivamente. Para as Comissões por Empresa e por Grupo de Empresas não existe tal exigência.

 

Importa em nulidade, a ser declarada pela Justiça do Trabalho, o caso de inobservância das formas prescritas em lei, quais sejam, o acordo, a convenção e a negociação coletiva, para a criação das supra referidas Comissões, realizando-se o depósito destes na Delegacia Regional do Trabalho para fins de registro e arquivo, nos termos do art. 614 da CLT.

 

No que se refere à duração das Comissões empresariais (por empresa e por grupo de empresas), não há estipulação para data de sua duração, sendo possível que sejam constituídas por tempo indeterminado. Entretanto, como para o estabelecimento destas espécies não é necessária a negociação coletiva, recomenda-se a feitura de um estatuto que estipule o seu prazo de existência, bem como, outras regras importantes para fins de funcionamento.

 

Quanto à questão do prazo de duração das Comissões, Martins (2008, p. 23) afirma que “se o empregador não tem certeza da viabilidade da comissão, deve constituí-la por prazo determinado, coincidindo com a garantia de emprego dos membros da comissão dos empregados, de modo que não tenham prejuízo.”

 

As Comissões Sindicais, Intersindicais e Núcleos de Conciliação Intersindical terão a validade determinada nos acordos ou convenções coletivas de que resultarem, tendo como prazo máximo de vigência 02 (dois) anos, que é o prazo de duração destes, conforme se extrai do disposto no § 3º do art. 614 da CLT: “Não será permitido estipular duração de Convenção ou Acordo superior a dois anos”.

 

3.4 Composição

 

Conforme o disposto no já mencionado art. 625-A, caput, da CLT, as Comissões de Conciliação Prévia possuem composição paritária, com representantes dos empregados e dos empregadores cuja atribuição é tentar conciliar conflitos individuais de trabalho.

 

O art. 625-B da CLT trata de maneira específica sobre a composição das Comissões, dispondo que estas terão no mínimo 02 (dois) e no máximo 10 (dez) membros. Assim, não poderá ficar além ou aquém do número de integrantes estipulados pela lei.

 

Martins (2008, p. 24) faz uma observação quanto ao supramencionado artigo, pois afirma que nas empresas que tiverem apenas um empregado, não poderá ser instituída Comissão de Conciliação Prévia, diante da impossibilidade de atender-se ao comando legal, exceto se a Comissão for constituída pelo empregado único e por um membro qualquer indicado pelo empregador, representante dos interesses deste.

 

Impende esclarecer que a estipulação quanto ao número de integrantes das Comissões alcança apenas as Comissões de empresas e Comissões de grupo de empresas, pois nas demais espécies de Comissões, as sindicais, intersindicais e os núcleos intersindicais de conciliação, a quantidade de membros que as compõe deve ser estabelecida na norma coletiva que as instituir.

 

O art. 625-B da CLT, nos seus incisos, dispõe que metade dos membros da Comissão será indicada pelo empregador e a outra metade será eleita pelos empregados, em escrutínio secreto, com a necessária fiscalização promovida pelo sindicato da categoria profissional.

 

A lei é omissa quanto à existência de um presidente na Comissão de Conciliação Prévia. Martins (2008, p. 25) entende que “não haverá necessariamente, um presidente da comissão, mas será conveniente sua existência para dirigir os trabalhos.”

 

Na Comissão, os membros representantes dos empregados não poderão ser de fora da empresa, exteriores a esta, especialmente pelo fato de possuírem garantia de emprego, no exercício da função conciliatória.

 

Quanto aos representantes dos empregadores, nada impede que sejam empregados, pois a lei não menciona nenhuma limitação.

 

A eleição dos membros representantes dos empregados observará o escrutínio secreto, bem como, a devida fiscalização promovida pelo sindicato da categoria profissional, o qual receberá a notícia da realização da eleição por intermédio do empregador, mediante aviso de recebimento.

 

Não será necessário que a Comissão tenha representantes do sindicato, pois a função deste é de fiscalização e não de composição.

 

Não há estipulação quanto ao limite mínimo de idade para que o empregado possa ser membro de uma Comissão de Conciliação Prévia, conquanto deva ser observado o disposto no art. 7º, XXXIII[11], da Constituição Federal, o qual determina a idade de 16 anos como mínima exigida para o exercício de qualquer trabalho.

 

Para cada membro titular da Comissão haverá um suplente que deverá substituí-lo em ocasiões que restar impedido de atuar.

 

O mandato dos membros da Comissão, tanto os titulares, quanto os suplentes, é de um ano, permitida uma única recondução. Assim, existe vedação expressa a múltiplas reconduções, visando impedir possíveis distorções quanto à finalidade e à aplicação destas Comissões, o que permite aos seus membros a fruição de mandatos de no máximo 02 (dois) anos.

 

Os membros das Comissões de Conciliação Prévia, representantes dos empregados, titulares e suplentes, não podem ser dispensados até um ano após o final do mandato, exceto se cometerem falta grave, nos termos da lei. É o que se extrai do art. 625-B, § 1º, CLT.

 

O supracitado dispositivo alberga hipótese de garantia de emprego, também chamada de estabilidade provisória, a qual é definida como “o direito que o empregado tem de não ser despedido temporariamente, de acordo com certas hipóteses definidas em lei, em normas coletivas ou em outro instrumento.” (MARTINS, 2008, p.29).

 

A garantia de emprego tem a finalidade de evitar que o empregado sofra perseguições ou até mesmo represálias por ter entendimento contrário ao do empregador; que seja pressionado para decidir de encontro aos seus princípios, seus escrúpulos, suas concepções sobre o que é correto ou não, bem como, seja vítima do poderio econômico do patrão, quando este o impõe em seu detrimento, valendo-se da hipossuficiência do obreiro.

 

Repise-se que apenas os membros representantes dos empregados terão a garantia de emprego, não se aplicando tal garantia aos representantes dos empregadores, indicados por estes.

 

O início da garantia de emprego não restou evidenciado pela lei, entendendo-se que este ocorre a partir da eleição e não a partir da candidatura, como ocorre, por exemplo, com os dirigentes sindicais, em que há expressa previsão legal nesse sentido.

 

A CLT não deixa claro se essa garantia de emprego se aplica aos membros de todas as espécies de Comissão de Conciliação Prévia. No entanto, entende-se que, por ser prevista aplicação aos membros de Comissões, representantes dos empregados, sem qualquer distinção, não pode o intérprete da lei diferenciar naquilo que a própria lei não o fez.

 

A falta grave, considerada assim pela lei, cometida pelos membros representantes dos empregados, afasta a garantia de emprego.

 

Conforme art. 625-B, § 2º da CLT os membros da Comissão representantes dos empregados desenvolverão seus trabalhos normalmente na empresa, somente se afastando das atividades laborativas quando forem convocados para atuar como conciliadores, computando-se o tempo despendido neste mister como tempo efetivamente trabalhado.

 

Destarte, conta-se para todos os efeitos legais o tempo em que os representantes dos empregados atuarem nas Comissões, interrompendo-se o contrato de trabalho, já que há cessação temporária e parcial dos seus efeitos, sendo devido o pagamento de salário. Para os empregados, membros representantes do empregador, também se considera como hipótese de interrupção do contrato de trabalho, pois resta evidente que esses obreiros se encontram à disposição deste.

 

4 QUESTÕES PROCEDIMENTAIS RELACIONADAS ÀS COMISSÕES

 

4.1 Matéria sujeita à apreciação e seus principais aspectos

 

“Qualquer demanda de natureza trabalhista será submetida à Comissão de Conciliação Prévia se, na localidade da prestação de serviços, houver sido instituída a Comissão no âmbito da empresa ou do sindicato da categoria.” (art. 625-D, caput, da CLT).

 

Pelo dispositivo legal mencionado, chega-se à conclusão de que qualquer matéria de natureza trabalhista poderá ser submetida à apreciação das Comissões de Conciliação Prévia, caso as mesmas existam.

 

Assim, para fins de sujeição às Comissões, cumpre observar as matérias cuja competência para processar e julgar é da Justiça Trabalhista, as quais se encontram previstas no art. 114 da Constituição Federal de 1988, abrangendo não apenas relações empregatícias, mas também as relações trabalhistas como um todo. Desta forma, se a Justiça do Trabalho tiver competência para apreciar a matéria, as Comissões também terão.

 

É importante observar que não somente direitos patrimoniais disponíveis serão submetidos às Comissões, os indisponíveis também o serão, diante da não diferenciação legal neste aspecto.

 

De acordo com o art. 11 da Portaria nº 329 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)[12] a conciliação perante as Comissões deverá restringir-se a direitos ou parcelas controversas, até porque não haveria sentido tentar conciliar algo que não incide em dúvida perante as partes.

 

O requisito fundamental para que as demandas trabalhistas sejam submetidas às Comissões é a existência destas no âmbito da empresa ou do sindicato da categoria. Tal disposição é entendida por parcela dos doutrinadores como uma espécie de condição da ação, pois se as Comissões existirem, as demandas trabalhistas necessariamente serão submetidas a elas.

 

O enfoque da Comissão de Conciliação Prévia como condição da ação ou não, será objeto de apreciação no último capitulo do presente estudo, detendo-nos neste capítulo às explicitações sobre sua constituição formal.

 

Quanto ao custeio das Comissões, a Portaria nº 329 do MTE traz importantes considerações a esse respeito, dispondo que será regulado no ato de sua instituição, observadas a razoabilidade e a gratuidade.

 

A Comissão submete-se a custos em razão da sua atividade, que não é pública. Essas despesas deverão ser cobradas das partes discordantes, com exceção do trabalhador, hipossuficiente na relação trabalhista.

 

A Comissão não pode representar fonte de renda para as entidades sindicais (art. 10, § 1º, Portaria 329 do MTE), justamente por isto deve observar o princípio da razoabilidade na cobrança das importâncias devidas pela prestação da função conciliatória.

 

Segundo entendimento de Martins (2008, p. 55), discorrendo sobre os valores cobrados pelas Comissões:

 

Deveria ser estabelecido limite na lei para esse fim, porque há comissões que cobram R$ 600,00 e até 1.200,00 para fazer cada conciliação, o que é excessivo. O valor a ser cobrado deveria ser no máximo de R$ 200,00 por conciliação. Em Estados menos desenvolvidos ou no interior, deveria ser cobrado um valor compatível com aquela região.

 

Embora a finalidade das Comissões não seja constituir fonte de renda para seus membros ou para as entidades sindicais, parcela destas é utilizada com esse objetivo, bastando, para chegar-se a tal conclusão, observar os valores excessivos supramencionados que algumas cobram por cada conciliação.

 

4.2 Encadeamento de atos

 

Nas Comissões, a demanda será formulada por escrito ou verbalmente, caso em que haverá redução a termo por qualquer dos membros, sendo entregue cópia datada e assinada pelo membro aos interessados (art. 625-D, § 1º da CLT).

 

A lei usa a expressão interessados pelo fato de que tanto o trabalhador, que está na empresa ou que já saiu dela, quanto o empregador é legitimado para a formulação da demanda.

 

É desnecessária a presença de advogado para a tentativa de conciliação perante a Comissão, exceto se assim o quiser o interessado. O empregador poderá, inclusive, nos termos da lei, se fazer representar por preposto com poderes específicos para o fim conciliatório.

 

Demandas de qualquer valor podem ser submetidas à apreciação das Comissões de Conciliação Prévia, visto não existir restrições na lei quanto a este aspecto, o qual serve de fundamento para determinar o procedimento a ser seguido pela justiça do trabalho no que se refere à reclamação.

 

Haverá comunicação à outra parte sobre a formulação da demanda perante a Comissão, a qual poderá ser feita por qualquer meio, exceto por edital, usado apenas no âmbito da Justiça do Trabalho.

 

A parte comunicada será ouvida quanto à formulação feita, ocasião em que a Comissão tentará uma possível conciliação.

 

Caso não haja conciliação, será fornecida às partes declaração da tentativa conciliatória frustrada, com a descrição do seu objeto, assinada por todos os membros da Comissão, a qual deverá ser juntada à eventual reclamação trabalhista. É o que dispõe o art. 625-D, § 2º, da CLT.

 

Em caso de motivo relevante que torne impossível a submissão da demanda à Comissão de Conciliação Prévia existente, a circunstância deverá ser declarada na petição inicial da ação intentada perante a Justiça do Trabalho (art. 625-D, § 3º da CLT).

 

Diante da redação deste dispositivo legal, afirma Martins (2008, p. 63) que “difícil será dizer qual é o motivo relevante, que poderá ser doença do empregado, acidente que o impeça de proceder à reclamação perante a comissão [...]; não ter dinheiro para pagar o que cobram na Comissão.

 

Na hipótese de existirem na mesma localidade e para a mesma categoria, Comissão de empresa e Comissão sindical, o interessado poderá optar por propor a demanda em qualquer uma delas, sendo competente aquela que primeiro conhecer do pedido (art. 625-D, § 4º, CLT). Neste caso, a Comissão em que o interessado primeiramente formular a demanda será a preventa para realizar tentativa conciliatória.

 

Ocorrendo a conciliação, será lavrado termo assinado pelo empregado, pelo empregador ou por seu preposto e ainda pelos membros da Comissão, com a entrega das respectivas cópias às partes. É o que se extrai do art. 625-E da CLT.

 

A conciliação poderá ser realizada em relação ao objeto total da demanda, ou apenas referente a alguns pontos, permanecendo o restante inconciliável.

 

“O termo de conciliação configura-se como título executivo extrajudicial, possuindo eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas” (art. 625-E, parágrafo único, CLT).

 

Desse modo, o interessado que firmou acordo perante a Comissão, poderá ingressar na Justiça Trabalhista, especificamente na Vara do Trabalho do local da prestação do serviço do empregado (art. 651 da CLT),[13] visando à execução do disposto no termo de conciliação, descumprido pela parte contrária, sem a necessidade de uma fase prévia de conhecimento da demanda.

 

A eficácia liberatória geral se refere aos valores constantes expressamente no termo de conciliação, o que não impede a reivindicação judicial daquilo que era devido e não foi objeto de conciliação perante a Comissão. Nesse sentido, entende a jurisprudência:

 

Comissão de conciliação prévia. Acordo. Eficácia liberatória. Limitação. A eficácia liberatória geral deferida pelo art. 625-E, parágrafo único, da CLT deve ser considerada restritivamente, em face do disposto nos incisos XXXIV e XXXV do art. 5.º e XXIX do art. 7.º da Constituição Federal. Nesse norte, a quitação decorrente de ajuste firmado perante a Comissão de Conciliação Prévia deve limitar-se aos valores consignados no respectivo termo, não se podendo negar a prestação jurisdicional quando o trabalhador recorre ao Poder Judiciário para buscar a reparação a que efetivamente tem direito. Na hipótese, constatando-se que o acordo previamente firmado entre as partes não abrange as parcelas alegadas na exordial, impossível acobertar a tese de quitação plena admitida na sentença de primeiro grau. Recurso do reclamante provido, determinando-se a devolução dos autos à vara de origem para a devida apreciação do mérito da demanda (TRT 13ª Região, RO 0984/2003, Ac. 72970, Rel. Francisco de Assis Carvalho e Silva, DOE 1.5.2003, Revista Synthesis, Porto Alegre: Síntese, n.º 37/03, p. 230).

 

As Comissões tem um prazo de 10 (dez) dias para a realização da sessão de tentativa de conciliação, contados a partir da provocação do interessado (art. 625-F, caput, da CLT). Findado esse prazo sem a realização da sessão, será fornecida, no ultimo dia do prazo, a declaração referida no § 2º do art. 625-D da CLT, o qual dispõe sobre a ocorrência de motivo relevante que impossibilita a tentativa conciliatória perante a Comissão.

 

“Caso a Comissão não designe a data para a tentativa de conciliação em 10 (dez) dias, o empregado poderá ajuizar diretamente a ação perante a Justiça do Trabalho, sem ter passado pela Comissão.” (MARTINS, 2008, p. 63).

 

Da lavratura do termo de conciliação não é cabível qualquer recurso, visto não se tratar de decisão, mas de acordo formulado por ambas as partes. O meio impugnativo adequado será ação anulatória, caso se verifique a ocorrência de algum dos erros de consentimento, quais sejam, o erro, dolo, coação, simulação ou fraude; tudo de acordo com as disposições do art. 486[14] do Código de Processo Civil (MARTINS, 2008, p. 66).

 

4.3 Prazo prescricional

 

Prescrição constitui-se como perda da pretensão ao direito de ação pelo decurso de um prazo estipulado para que fosse proposta.

 

Conforme estipula o art. 625-G da CLT, a partir da provocação perante a Comissão de Conciliação Prévia, suspende-se o prazo prescricional, o qual volta a fluir, pelo tempo que lhe resta, a partir da tentativa frustrada de conciliação ou do esgotamento do prazo previsto no art. 625-F da CLT, qual seja, 10 (dez) dias para a realização da sessão de tentativa de conciliação.

 

Conforme visto, o citado artigo traz uma causa de suspensão da prescrição, ocasião em que se computa o tempo anterior já transcorrido, continuando a contagem do lapso temporal pelo prazo que restar.

 

5 A RELAÇÃO ENTRE AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA E O PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DO ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO.

 

5.1 Princípio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário

 

O princípio do acesso ao Poder Judiciário, conhecido também como princípio da inafastabilidade da jurisdição, ou ainda, inafastabilidade de acesso ao Poder Judiciário, está intimamente relacionado com o direito de ação e todas as suas implicações, trazendo a concepção de que é necessário que haja provocação para que a jurisdição atue e restaure o direito lesado ou ameaçado, sendo que esta provocação não pode sofrer qualquer restrição.

 

Dispõe a Constituição Federal de 1988, no inciso XXXV do art. 5º, que: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.” Com tal disposição, houve ampliação quanto à abrangência da aplicação do principio de inafastabilidade da jurisdição, compreendendo também a ameaça, como forma de tutela preventiva.

 

O citado artigo da Constituição Federal reafirma o direito fundamental de ação, sem a presença de condicionamentos, fato ocorrido após a proibição estatal quanto ao exercício da tutela privada, com a consequente monopolização da jurisdição.

 

Didier Jr. (2007, p. 79) expressa razoável entendimento no que se refere ao supramencionado dispositivo constitucional:

 

Quando a Constituição fala de exclusão de lesão ou ameaça de lesão do Poder Judiciário quer referir-se, na verdade, à impossibilidade de exclusão de alegação de lesão ou ameaça, tendo em vista que o direito de ação (provocar a atividade jurisdicional) não se vincula à efetiva procedência do alegado; ele existe independentemente da circunstância de ter o autor razão naquilo que pleiteia; é direito abstrato.

 

Assim, a inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário diz respeito ao direito público subjetivo que todos possuem de ver sua demanda submetida à prestação jurisdicional, independentemente de que haja acolhimento ou não.

 

A Constituição Federal expressamente declara que não há matéria que possa ser excluída da apreciação do Poder Judiciário, ressalvadas algumas raríssimas exceções por ela estipulada.

 

Com efeito, houve época em que nossa Constituição Federal excluía da apreciação do Poder Judiciário alguns atos administrativos, sem fundamentos relevantes justificadores de tal posicionamento. Nessa esteira, determinava o art. 11[15] do Ato Institucional (AI) n. 05 de 1968 a exclusão da apreciação jurisdicional de todos os atos praticados em sua conformidade, bem como seus atos complementares e respectivos efeitos.

 

Pode ser apontada como circunstância reflexa do presente princípio a situação de inexistência da exigência de esgotamento de outras instâncias, administrativas ou não, para que se tutele a prestação jurisdicional do Estado, ressalvada uma única hipótese constitucionalmente prevista, qual seja, questões referente à justiça desportiva, em que há exigência de prévio exaurimento de âmbito administrativo, nos termos do art. 217, § 1º[16] da Constituição Federal de 1988.

 

A Constituição Federal de 1967 permitia que em relação a algumas matérias se impusesse o esgotamento obrigatório das instâncias administrativas antes do ingresso no Poder Judiciário[17]. Tal permissão restou superada com o reconhecimento de que o acesso àquele Poder deve ser tutelado de forma plena e incondicionada.

 

O fato de nosso sistema jurídico adotar a jurisdição una, o que significa que o poder de decidir lides com caráter de definitividade é atribuído exclusivamente ao Poder Judiciário, explica o aspecto cogente da observância do direito de acesso à jurisdição.

 

Ao contrário do que ocorre na França, em que há Tribunais Administrativos que proferem decisões em litígios com caráter definitivo, no Brasil, ainda que existam Tribunais Administrativos, estes não poderão impor força irrecorrível às decisões que porventura venham a proferir, pois aos demandantes sempre será possibilitada a recorribilidade ao Judiciário (WATANABE, 1980, apud DIDIER JR, 2007, p. 80).

 

Pelo exposto se pode concluir que o princípio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário representa direito conferido a todas as pessoas de ver a sua pretensão submetida àquele Poder, que fará analise detalhada, prestando tutela jurisdicional qualificada, satisfazendo ou não a pretensão inicial do autor.

 

5.2 A passagem pela Comissão de Conciliação Prévia como espécie de condição da ação.

 

Segundo Montenegro Filho, (2006, p. 37), condições da ação configuram-se como matéria processual de ordem pública, de interesse do Estado, e são:

 

Requisitos mínimos, que devem ser preenchidos pelo autor, cuja presença (alem dos pressupostos processuais) garante a prolação da sentença de resolução do mérito, que defira ou indefira ao promovente o bem da vida pelo mesmo perseguido (intitulado pelo CPC de objeto).

 

Neste sentido, o supramencionado autor afirma que a ausência de uma das condições da ação provocará ao promovente um óbice processual, que resultará na prolação de uma sentença terminativa, que porá fim ao processo sem que haja resolução do mérito, produzindo apenas coisa julgada formal, situação autorizadora de uma repropositura da ação, desde que seja possível afastar o vício que determinou a primeira extinção.

 

A respeito das condições da ação, Cintra, Grinover e Dinamarco (2006, p. 274) entendem que:

 

O direito de ação pode ser submetido a condições por parte do legislador ordinário. São as denominadas condições da ação (possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir, legitimação ad causam), ou seja, condições para que legitimamente se possa exigir, na espécie, o provimento jurisdicional.

 

As condições da ação representam critérios a serem observados pela parte quando da sua propositura, visando o desenvolvimento adequado até a prolação da decisão judicial.

 

Questão tormentosa no direito diz respeito à exigência feita pelo art. 625-D da CLT que estipula que qualquer demanda trabalhista deve ser submetida à tentativa conciliatória perante as Comissões de Conciliação Prévia, caso estas existam no âmbito da empresa ou do sindicato. O § 2º do mesmo artigo determina que o empregado deverá juntar à eventual reclamação trabalhista, cópia de declaração fornecida pela Comissão da tentativa de conciliação frustrada.

 

A maior parte dos doutrinadores entende que os referidos dispositivos celetistas impuseram a observância de mais uma condição da ação, ao lado das já conhecidas. Seguindo essa linha e enfrentando o problema, Martins (2008, p. 40) afirma que “o procedimento instituído representa condição da ação para ajuizamento da reclamação trabalhista. Trata-se de interesse de agir, que abrange o interesse em conseguir o bem por obra dos órgãos públicos (Chiovenda, 1998:89)”.

 

Ainda observa o supramencionado autor que o art. 267, inciso VI do Código de Processo Civil dispõe que o processo será extinto sem resolução do mérito quando não estiver presente nenhuma das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual. A expressão “como” traria ínsita a ideia de que as condições da ação não são apenas aquelas descritas no próprio artigo, o qual se reportava a um rol meramente exemplificativo.

 

Tal ideia explica como a passagem obrigatória pelas Comissões de Conciliação Prévia se traduz em uma condição para ajuizamento da reclamação trabalhista, imposta pela lei.

 

Martins (2008, p. 42) explica o que ocorrerá caso o empregado descumpra o disposto na CLT:

 

Se o empregado não passar pela Comissão antes de ajuizar a ação, o juiz não irá devolver os autos à comissão para que esta proceda à conciliação, mas irá extinguir o processo sem julgamento de mérito (art. 267, VI, do CPC) por não atender à condição da ação estabelecida na lei (tentativa de conciliação pela comissão)

 

Para Barros[18], a passagem por estas Comissões constitui verdadeira condição da ação:

 

Ter-se-á com a instituição das comissões de conciliação prévia uma nova forma de se alcançar o mesmo resultado que seria pretendido na reclamação trabalhista, sem que haja necessidade da intervenção dos órgãos do judiciário. Assim, poder-se-á considerá-las como uma condição da ação trabalhista individual, uma vez que sem a tentativa de conciliação prévia perante aquelas, faltará o interesse processual, tendo, por conseguinte, a extinção do processo sem julgamento do mérito, sem que isto signifique o cerceamento do exercício do direito de ação no plano constitucional.

 

A tentativa conciliatória perante as Comissões, para Nascimento (2007, p. 460), se apresenta como condição da ação à medida que se faz obrigatória diante da existência de qualquer das espécies deste órgão privado no local de prestação de serviço do empregado.

 

Delgado (2009, p. 1338) reconhece que há forte linha interpretativa das regras da CLT referente às Comissões, no sentido de o disposto no art. 625-D se configurar como típica condição da ação. Entretanto, afirma este doutrinador, “tem crescido vertente que enquadra como pressuposto processual a passagem prévia pela entidade conciliatória extrajudicial”. Para tal linha hermenêutica, caso a parte não tente acordo prévio perante a Comissão, não se configura causa de nulidade absoluta e insanável, visto o magistrado, no inicio da audiência processual trabalhista, propor a conciliação.

 

Assim, a proposta de conciliação realizada pelo magistrado, quando da audiência inaugural, supriria a ausência de tentativa conciliatória perante o órgão extrajudicial, observando-se para tanto o disposto no art. 794 e art. 796, “a” da CLT, os quais afirmam que não se declarará nulidade se não houver prejuízo manifesto às partes litigantes ou se for possível suprir-lhe a falta ou repetir o ato.

 

A jurisprudência pátria também apresenta entendimentos dissonantes sobre a obrigatoriedade de submissão das demandas trabalhistas à tentativa de acordo perante as Comissões de Conciliação Prévia, como espécie de condição da ação, a qual, inobservada, resultaria em extinção do processo sem resolução do mérito.

 

O TST adotou posicionamento pela obrigatoriedade da submissão em diversos julgados, dentre os quais:

 

COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. EXISTÊNCIA NO ÂMBITO DA EMPRESA OU DO SINDICATO. OBRIGATORIEDADE DA TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO ANTES DE AJUIZAR DEMANDA. ART. 625-D DA CLT. PRESSUPOSTO PROCESSUAL. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV). EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. Na forma do art. 625-D e seus parágrafos, é obrigatória a fase prévia de conciliação, constituindo-se em pressuposto para desenvolvimento válido e regular do processo. Historicamente a conciliação é fim institucional e primeiro da Justiça do Trabalho e, dentro do espírito do art. 114 da Constituição Federal, está a extensão dessa fase pré-processual delegada a entidades paraestatais. O acesso ao Judiciário não está impedido ou obstaculizado com a atuação da Comissão Prévia de Conciliação, porque objetivamente o prazo de 10 dias para realização da tentativa de conciliação não se mostra concretamente como empecilho ao processo judicial, máxime quando a parte tem a seu favor motivo relevante para não se enquadrar na regra. Revista conhecida, mas não provida. (TST, RR - 58279-2002-900-04-00, 3ª Turma, 30-10-2002, Rel. Juíza Convocada Terezinha Célia Kineipp Oliveira, DJ, 22-11-2002).

 

RECURSO DE REVISTA. - AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO: SUBMISSÃO DA DEMANDA À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. ART. 625, D, DA CLT. A obrigatoriedade imposta no art. 625-D da Consolidação das Leis do Trabalho, inserto no Título VI-A desse diploma Legal acrescentado pela Lei n° 9.958/2000, não afronta o princípio do livre acesso ao Poder Judiciário porque não impede o ajuizamento de ação visando à satisfação das pretensões ressalvadas ou a declaração de nulidade do ajuste celebrado perante a comissão. A conciliação constitui precedente fundamental no processo do Trabalho, estando intimamente ligada à sua finalidade histórica, alçada à condição de princípio constitucional, dispondo o art. 114 da Lei Maior: Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos..., podendo ser citados outros exemplos na Consolidação das Leis do Trabalho e legislação correlata. A novidade introduzida com a mencionada legislação compatibiliza-se com a função institucional da Justiça de Trabalho, revelando-se excelente instrumento de solução rápida e mais adequada dos conflitos, porque inserido no seio de convivência das partes envolvidas, fora a grande economia processual daí advinda. Contra o argumento da vedação do acesso ao Judiciário, pode-se invocar, ainda, a disposição do art. 625-F da CLT, que fixa o prazo de 10(dez) dias para a realização da conciliação, sendo que exaurido, in albis o mesmo, o interessado poderá invocar a proteção dos §§ 2° e 3° do art. 625-D da CLT. Recurso provido. (TST, RR, 173/2001-008-17-00, Rel. Min. Barros Levenhagen, DJU 1 de 17-09-04)

 

AUSÊNCIA DE SUBMISSÃO DA DEMANDA À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO – FALTA DE PRESSUPOSTO PROCESSUAL – VIOLAÇÃO DO ARTIGO 625-D DA CLT – A submissão da demanda à Comissão de Conciliação Prévia não constitui mera faculdade da parte reclamante. Trata-se de imposição da Lei nº 9.958/2000, que incluiu o artigo 625-D na Consolidação das Leis do Trabalho, dispondo que a submissão da demanda à referida comissão representa verdadeiro pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST – RR 54323/2002-902-02-00.9 – 3ª T. – Relª Minª Maria Cristina Irigoyen Peduzzi – DJU 10.12.2004) JCLT.625D.

 

Contrariamente a este entendimento, diversos Tribunais Regionais do Trabalho decidiram pela facultatividade da submissão da demanda às Comissões:

 

Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO – DESCABIMENTO – A ausência de sujeição do pedido a comissão de conciliação prévia não enseja a extinção do feito sem exame de mérito, haja vista que tal exigência não encontra respaldo no texto constitucional. (TRT 5ª R. – RO 01109-2001-019-05-00-0 – (11.964/05) – 3ª T. – Red. Des. Fed. Alcino Felizola – J. 07.06.2005)

 

Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA – A Submissão do reclamante à Comissão de Conciliação Prévia é facultativa, posto que a Lei nº 9.958 de 12-01-2000, não teve o condão de criar novo pressuposto processual. Por outro lado, a referida Lei não prevê sanção alguma. Como se observa, o objetivo precípuo do legislador ao instituir as comissões de conciliação prévia foi o de instrumentalizar as partes, privilegiando a adoção de soluções autônomas dos conflitos trabalhistas. Irreparável a r. Sentença de origem, já que a ausência de conciliação prévia não prejudica o acesso direto à Justiça do Trabalho não se configurando sequer em violação ao contido no artigo 625-D, da CLT. (TRT 9ª R. – Proc. 00241-2003-023-09-00-4 – (16450-2005) – Rel. Juiz Sergio Murilo Rodrigues Lemos – DJPR 01.07.2005)

 

Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região. CONCILIAÇÃO PRÉVIA – REQUISITO – INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO – A não submissão do pedido a Comissão de Conciliação Prévia não é suficiente para determinar a extinção do processo, tendo em vista o princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição. Recurso ordinário conhecido e não provido. (TRT 21ª R. – RO 00369-2004-004-21-00-5 – (52.514) – Rel. Des. Eridson João Fernandes Medeiros – DJRN 17.12.2004) JCF.5 JCF.5.XXXV.

 

Ressalte-se que chegou a ser editada a seguinte Súmula pelo TRT da 2ª Região (São Paulo), válida somente para as demandas julgadas por aquele Tribunal:

 

O comparecimento perante a Comissão de Conciliação Prévia é uma faculdade assegurada ao obreiro, objetivando a obtenção de um título executivo extrajudicial, conforme previsto pelo artigo 625 - E, parágrafo único, da CLT, mas não constitui condição da ação, nem tampouco pressuposto processual na reclamatória trabalhista, diante do comando emergente do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal.

 

Por estes julgados percebe-se a dificuldade encontrada pelos Tribunais para aplicar os mencionados dispositivos celetistas, mormente a sua relação com o principio da inafastabilidade da jurisdição.

 

5.3 A inconstitucionalidade do art. 625-D da CLT

 

Muito se discute acerca da constitucionalidade do art. 625-D da CLT, o qual exige a submissão de qualquer demanda trabalhista à Comissão de Conciliação Prévia existente no âmbito da empresa ou do sindicato em que se realizar a prestação de serviço.

 

Doutrina e jurisprudência divergem sobre esse tema, parcela acreditando que se trata de visível inconstitucionalidade, outra parcela entendendo que não se pode taxá-lo de inconstitucional, pois representa forma rápida de solução de litígios, através de acordo entre as partes, possuindo um prazo mínimo para que haja todo o procedimento, qual seja, 10 dias, sendo, ademais, seguido no mundo inteiro.

 

Grinover (1996), citada por Martins (2008, p. 41) quando aborda tal assunto, afirma “não ser inconstitucional a proposta que estabelece a tentativa obrigatória da conciliação prévia, que não iria contrariar o inciso XXXV do art. 5º da CF/88, pois ‘o direito de ação não é absoluto, sujeitando-se a condições”.

 

Para Martins (2008, p. 41) “o procedimento criado pelo art. 625-D da CLT não é inconstitucional, pois as condições da ação devem ser estabelecidas em lei e não se está privando o empregado de ajuizar a ação, desde que tente a conciliação”.

 

Nascimento (2007, p. 461) afirma que, a obrigatoriedade da tentativa de conciliação prévia não afeta o principio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário, pois não se impede que a parte procure este Poder caso não prospere a conciliação perante a Comissão.

 

Almeida (2000) citado por Barros[19] entende que a tentativa de conciliação prévia nas comissões não constitui afronta ao art. 5º, inciso XXXV, da CF/88, apresentando os seguintes argumentos: que a atribuição das comissões foi limitada à tentativa de conciliação dos conflitos individuais de trabalho e não ao seu julgamento; que o empregado poderá recorrer ao Poder Judiciário sem quaisquer entraves quanto às parcelas expressamente ressalvadas, as quais, por consequência, não tem eficácia liberatória; que a prévia tentativa de conciliação é condição para a propositura da ação coletiva, conforme os arts. 616, § 4º da CLT e 114, § 2º da CF/88, e o STF não a tem como inconstitucional, então, o mesmo raciocínio aplicar-se-ia às ações individuais.

 

Ao lado desta parcela da doutrina que entende ser constitucional a obrigatoriedade de prévia submissão da demanda à Comissão, existe outra parte que afirma a inconstitucionalidade do dispositivo celetista, pois, segundo estes, haveria o cerceamento do direito de ação, com a consequente inobservância do principio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário.

 

Oliva[20] afirma que da forma como foi aprovado, o texto da Lei nº 9.958/2000 (art. 625-D da CLT) estabelece condição para ajuizamento da ação na Justiça do Trabalho, qual seja, a submissão do litígio às Comissões de Conciliação Prévia, onde estas existirem. Assim, segundo esse autor, instituiu-se a denominada jurisdição condicionada ou instância administrativa de curso forçado, afrontando-se o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, insculpido sem restrições no art. 5º, XXXV da CF/88 (a não ser aquela imposta no próprio texto constitucional, referente à justiça desportiva). 

 

No entendimento de Maior (2000) citado por Oliva[21], o principio que garante o acesso ao Poder Judiciário teria sua aplicabilidade obstada pelas disposições do art. 625-D da CLT, afirmando que o que se conseguirá com a obrigatoriedade de submissão dos litígios anteriormente às Comissões é “apenas uma instância a mais a ser percorrida pelos empregados em busca de seus direitos, aumentando ainda mais a injustiça de que são vítimas”

 

Diante desta indesejável situação de insegurança jurídica, a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Comércio (CNTC), bem como, quatro partidos políticos, quais sejam, Partido Comunista do Brasil (PC do B), Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Democrático Trabalhista (PDT) e Partido Socialista Brasileiro (PSB) ajuizaram a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2.160 e ADI de nº 2.139, respectivamente, ambas questionando a constitucionalidade do artigo 625-D da CLT.

 

As referidas Ações Diretas de Inconstitucionalidade argumentavam, com base no art. 5º, XXXV, da CF/88, afronta ao direito público subjetivo do cidadão de submeter à apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito decorrente da relação de emprego.

 

As Ações Diretas de Inconstitucionalidade foram ajuizadas alguns meses após a entrada em vigor da Lei 9.958, no ano de 2000. Entretanto, apenas este ano, dia 13 de maio, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se sobre o tema.

 

Os ministros Sepúlveda Pertence, Cármem Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Marco Aurélio, Joaquim Barbosa e Carlos Ayres de Brito deferiram pedido de liminar feito nas duas ADIs acima referidas para dar interpretação conforme a Constituição Federal vigente ao art. 625-D da CLT:

 

Decisão: Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Senhor Ministro Marco Aurélio, que redigirá o acórdão, deferiu parcialmente a cautelar para dar interpretação conforme a Constituição Federal relativamente ao art. 625-D, introduzido pelo art. 1º da Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, vencidos os Senhores Ministros Relator e Cezar Peluso. Não participaram da votação o Senhor Ministro Menezes Direito e a Senhora Ministra Ellen Gracie por sucederem aos Senhores Ministros Sepúlveda Pertence e Octavio Gallotti. Ausentes o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente), em representação do Tribunal no exterior, e o Senhor Ministro Celso de Mello, licenciado (art. 72, inciso II, da Lei Complementar nº 35/1979 – LOMAN). Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Cezar Peluso (Vice-Presidente). Plenário, 13.05.2009.

 

Barbosa entende que, manter a regra do 625-D da CLT sem interpretação conforme a Constituição representaria uma "séria restrição do direito de acesso à Justiça para os trabalhadores".

 

Para Britto, a solução dada pelo Plenário “estimula a conciliação e mantém uma tradição da Justiça Trabalhista de tentar a conciliação, sem sacrificar o direito universal de acesso à jurisdição.” Ele se lembrou do voto do ministro Marco Aurélio no sentido de que, quando a Constituição quer excluir uma demanda do campo de apreciação do Judiciário, ela o faz de forma expressa, como ocorre, por exemplo, na área desportiva. Nesse caso, o ingresso no Judiciário somente pode ocorrer após se esgotarem as instâncias da Justiça Desportiva.

 

O último a se pronunciar sobre a matéria foi o Ministro Cezar Peluso que afirmou que a decisão do STF está na "contramão na história". Segundo ele, o dispositivo da CLT não representa bloqueio, impedimento ou exclusão do recurso à universalidade da jurisdição, sendo aplicado plenamente em diversos países:

 

Eu acho que, com o devido respeito, a postura da Corte, restringindo a possibilidade da tentativa obrigatória de conciliação, está na contramão da história, porque em vários outros países hoje há obrigatoriedade do recurso às chamadas vias alternativas de resolução de conflitos, até porque o Poder Judiciário não tem dado conta suficiente da carga de processos.

 

Em virtude desta decisão, independentemente de as Comissões de Conciliação Prévia existirem no âmbito da empresa ou do sindicato do local da prestação do serviço, o reclamante poderá ingressar com a ação no Poder Judiciário.

 

As discussões sobre a obrigatoriedade de submissão prévia do conflito àquele órgão extrajudicial de conciliação foram temporariamente afastadas, não sendo mais necessário ao obreiro submeter inicialmente sua demanda às Comissões.

 

Ressalte-se que a decisão proferida em sede de liminar influenciou o TST, que passou a adotar o entendimento do STF quanto a essa questão:

 

RECURSO DE REVISTA - CARÊNCIA DE AÇÃO - SUBMISSÃO DA DEMANDA À COMISSÃO INTERSINDICAL DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA - INEXIGIBILIDADE 1. O Excelso Supremo Tribunal Federal, no recente julgamento de medidas cautelares nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nos 2.139-DF e 2.160-DF, decidiu que a ausência de submissão prévia da demanda à Comissão de Conciliação Prévia não impede o ajuizamento da Reclamação Trabalhista, por força do princípio do livre acesso ao Poder Judiciário, insculpido no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República (Informativo nº 546 do STF, 11 a 15 de maio de 2009). 2. Precedentes da C. SBDI-1, no mesmo sentido. CARÊNCIA DE AÇÃO - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM No caso concreto, o Autor narra que, contratado pela primeira Ré, prestou serviços em favor da segunda. Daí exsurge a legitimidade passiva da Recorrente. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Não há falar em negativa de prestação jurisdicional, porquanto a Corte a quo procedeu ao completo e fundamentado desate da lide. CONTRIBUIÇÕES ASSISTENCIAIS Recurso de Revista que não satisfaz os requisitos do art. 896 da CLT. HORAS EXTRAS - ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA EXTRAORDINÁRIA - SÚMULA Nº 85 DO TST Diante do quadro fático apresentado pelo Eg. TRT, não há certeza sequer da existência de compensação. Recurso de Revista não conhecido.(Processo: RR - 765/2005-018-02-00.0 Data de Julgamento: 11/11/2009, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 13/11/2009).

 

RECURSO DE REVISTA - SUBMISSÃO DA DEMANDA À COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA - INEXIGIBILIDADE 1. O E. Supremo Tribunal Federal, no recente julgamento de medidas cautelares nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nos 2.139-DF e 2.160-DF, decidiu que a ausência de submissão da demanda à Comissão de Conciliação Prévia não impede o ajuizamento da Reclamação Trabalhista, por força do princípio do livre acesso ao Poder Judiciário, insculpido no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República (Informativo nº 546 do STF, 11 a 15 de maio de 2009). 2. Precedentes da C. SBDI-1, no mesmo sentido. HORAS EXTRAS - COMPENSAÇÃO ANUAL - NECESSIDADE DE ACORDO COLETIVO Não tem eficácia acordo individual estipulando compensação de extensão anual, questão afeta exclusivamente a ajuste coletivo, por configurar a hipótese de banco de horas. Precedentes. MULTA CONVENCIONAL Não há interesse recursal quanto ao pedido de não-incidência das normas coletivas já extintas, porque foi deferida apenas a multa convencional estipulada no último instrumento normativo em vigor. Recurso de Revista não conhecido.

 

Processo: RR - 692/2007-096-09-00.5 Data de Julgamento: 11/11/2009, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 13/11/2009.

 

Cumpre observar, no entanto, que esta decisão foi proferida em sede de liminar, restando aguardar a decisão definitiva a ser proferida pelo STF, confirmando ou não a anterior.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

As Comissões de Conciliação Prévia representam institutos de conciliação extrajudicial dos conflitos individuais de trabalho, criados no âmbito da empresa ou do sindicato do local da prestação de serviço.

 

A sua principal finalidade consiste em reduzir o número de ações que são submetidas à apreciação da Justiça do Trabalho, tendo em vista as estatísticas do TST apontarem para a presença da conciliação em 40%, em média, das demandas submetidas à justiça laboral.

 

Em virtude de o texto legal impor caráter obrigatório à tentativa conciliatória perante as Comissões existentes, passou-se a questionar a constitucionalidade deste dispositivo, pois representaria a instituição de uma espécie de condição da ação para o ingresso na Justiça Trabalhista.

 

Parcela da doutrina e jurisprudência se posicionou pela inconstitucionalidade do dispositivo celetista, outra parcela, contrariamente, entendeu ser constitucional a exigência de previa submissão da demanda à Comissão de Conciliação Prévia.

 

O STF proferiu decisão relativa a pedido liminar feito em 02 ADIs, conferindo interpretação conforme a Constituição Federal ao art. 625-D da CLT, que trazia a imposição das demandas àqueles órgãos extrajudiciais de conciliação prévia, estipulando que independentemente desses órgãos existirem ou não, os conflitantes podem socorrer-se diretamente ao Poder Judiciário, sendo facultativa a passagem pelas Comissões de Conciliação Prévia.

 

O que se verifica é que as discussões acerca deste órgão conciliatório perderam em parte a sua razão de ser, pois desde entrada em vigor da lei que instituiu as Comissões de Conciliação Prévia se aguarda um posicionamento do STF sobre o tema.

 

O próprio TST posicionava-se pela obrigatoriedade de submissão das demandas às Comissões, caso estas existissem. Entretanto, com a referida decisão do STF sobre o assunto, este redirecionou sua interpretação, acatando o entendimento da Suprema Corte.

 

Destarte, as Comissões mantêm a mesma natureza jurídica e estrutura disciplinadas pelas regras legais. A mudança reside na interpretação dada ao dispositivo celetista supramencionado, pois com a decisão do STF, fixou-se o caráter facultativo destes órgãos de conciliação prévia.

 

Assim, desejando, poderão os interessados formular demandas perante as Comissões, buscando a conciliação com a parte adversa. Frustrada a conciliação, poderão buscar subsidiariamente a Justiça do Trabalho. Ou ainda, caso queiram, podem ingressar com ação diretamente em juízo, pleiteando a tutela jurisdicional, mais uma vez reafirmada como inafastável.

 

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Notas:

[1] MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. O Ordenamento Jurídico Brasileiro. Revista Jurídica Virtual, Brasília, vol. 1, n. 3, julho 1999. Disponível em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_03/remedio.htm>. Acesso em: 30.07.2009.

[2] “Art. 161. Sem se fazer constar se tem intentado o meio de reconciliação, não se começará processo algum”.

[3]Art. 621. “As Convenções e os Acordos poderão incluir, entre cláusulas, disposição sobre a constituição e funcionamento de comissões mistas de consulta e colaboração, no plano da empresa e sobre participação nos lucros. Estas disposições mencionarão a forma de constituição, o modo de funcionamento e as atribuições das comissões, assim como o plano de participação, quando for o caso.” 

[4] PANIAGO, Izidoro Oliveira. Do Exame de Constitucionalidade da Lei nº 9.958/2000 em Face às Garantias Constitucionais do Processo. Revista LTr. 67-04/442. Vol. 67, nº 04, Abril de 2003.

[5]  Disponível em < http://www.tst.gov.br/Sseest/JT1941/JT1941/JT1941.htm> Acesso em 09.10.09

[6] Disponível em: < http://www.tst.gov.br/tst/iframe.php?url=http://www.ts t.jus.br/Sseest/VT/VTconcilia .pdf> Acesso em: 09.10.09

[7] Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=41075> Acesso em: 11.10.09

[8] LATIF, Omar Aref Abdul. Comissão de Conciliação Prévia. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 42, 30/06/2007. Disponívelem <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1909>Acesso em 12.11.2009.

[9] LATIF, Omar Aref Abdul. Comissão de Conciliação Prévia. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 42, 30/06/2007. Disponívelem <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1909> Acesso em 12.11.2009.

[10] Art. 625-A. As empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia, de composição paritária, com representantes dos empregados e dos empregadores, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais do trabalho.

Parágrafo único. As Comissões referidas no caput deste artigo poderão ser constituídas por grupos de empresa ou ter caráter intersindical.

[11] Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;

[12] Art. 11. A conciliação deverá cingir-se a conciliar direitos ou parcelas controversas.

Parágrafo único. Não pode ser objeto de transação o percentual devido a título de FGTS, inclusive a multa de 40¢ sobre todos os depósitos devidos durante a vigência do contrato de trabalho, nos termos da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990.

[13] Art. 651. A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.

[14]  Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.

[15] Art. 11. Excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos.

[16] Art. 217, § 1º, CF/1988: “O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instancias da justiça desportiva, reguladas em lei.”

[17] Art. 153, § 4º, CF/1967, com redação dada pela EC nº 07/1977: “A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual. O ingresso em juízo poderá ser condicionado a que se exauram previamente as vias administrativas, desde que não exigida garantia de instância, nem ultrapassado o prazo de 180 dias para a decisão sobre o pedido.” 

[18] BARROS, Verônica Altef. As Comissões de Conciliação Prévia e o Acesso ao Judiciário. Disponível em <http://www.redebrasil.inf.br/0artigos/conciliacao.htm> Acesso em: 25.06.2009.

[19] BARROS, Verônica Altef. As Comissões de Conciliação Prévia e o Acesso ao Judiciário. Disponível em <http://www.redebrasil.inf.br/0artigos/conciliacao.htm> Acesso em: 25.06.2009.

[20] OLIVA, José Roberto Dantas. Submissão Obrigatória Afronta o Princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional. Disponível em:<http://posseidon.tst.gov.br/cgi-bin/nph-brs?sl=(269289.nia)&u=/Brs/it 01.html & p=1&1=1&d=it01&f=g&r=1>. Acesso em 15.07.2009.