Agricultura e meio ambiente na mesa de negociações da organização mundial do comércio: os novos instrumentos jurídicos para manutenção das desigualdades


PoreGov- Postado em 03 março 2011

Autores: 
SILVA, Lígia Dutra

As negociações comerciais ocorridas no âmbito da Organização Mundial do Comércio
(OMC) visam diminuir as barreiras existentes para a livre circulação das mercadorias em
todo o mundo. Os tratados firmados em Marraqueche, em 1994, impulsionaram um
processo de grande transformação econômica, que acarretou no aumento do comércio
internacional a partir da diminuição das tarifas consolidadas e praticadas pelos paísesmembros
da OMC. Os ganhos comerciais, no entanto, não foram iguais entre todos os
países porque os produtos mais beneficiados pelas reduções tarifárias foram aqueles
produzidos pelos países centrais. Todos os países-membros são obrigados a assumir
compromissos recíprocos de redução tarifária, mas isto não quer dizer que todos são
beneficiados igualmente, porque ao se reduzirem as tarifas de produtos em que os países
centrais têm o domínio tecnológico da produção estes concentram as vantagens econômicas
do sistema. Isto significa que os acordos da OMC legitimam um sistema comercial injusto
porque a sua regulamentação jurídica permite que os países centrais mantenham seus
mercados fechados para os produtos sensíveis a concorrência externa e, ao mesmo tempo,
obrigam os países periféricos a aceitarem a competição internacional, ainda que ocasione
uma deterioração das condições sociais internas. A discrepância entre as vantagens
auferidas por países centrais e periféricos com o sistema multilateral do comércio é tão
evidente que muitos negociadores da OMC estão se esforçando para demonstrar que o
intercâmbio comercial também pode ser bom para os países mais pobres e que pode gerar
desenvolvimento. Por essa razão, a atual rodada de negociações comerciais da OMC,
lançada em Doha, foi intitulada a Rodada do Milênio para o Desenvolvimento, dentre os
temas discutidos, toma grande atenção o da liberalização do comércio agrícola, exatamente
por ser o de maior interesse dos países periféricos. A rodada de negociações está
caminhando a passos lentos porque os países periféricos não aceitam fazer nenhuma
concessão comercial enquanto os países centrais não se dispuserem a reduzir suas barreiras
aos produtos agrícolas. Muitas organizações não governamentais sediadas nos países
centrais encamparam a defesa de políticas que favoreçam um sistema comercial mais justo,
pressionando os seus governos a diminuírem as barreiras aos produtos agrícolas. Neste
contexto, os países centrais conseguiram incluir novos temas à pauta de negociações, visto
que, ante o impasse criado pelos países periféricos, procuram diversificar as justificativas à
continuidade do processo de liberalização. A proteção do meio ambiente está sendo
oferecida como moeda de troca para a abertura dos mercados agrícolas. Pode-se perceber
que a inclusão de preocupações ambientais na OMC está diretamente relacionada com a
crise ambiental atravessada pelo planeta, em que não existem recursos naturais suficientes
para garantir os elevados padrões de consumo das sociedades modernas. Assim como o
comércio dentro do sistema centro periferia está baseado em uma dinâmica interna de
favorecimento das sociedades centrais, a apropriação e o consumo dos recursos naturais
seguem a mesma lógica de benefício contínuo das populações mais ricas. Desta forma,
percebe-se que o sistema jurídico que legitima o comércio internacional existe apenas para
favorecer os grupos hegemônicos.

AnexoTamanho
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