Voto dos policiais militares X voto dos presos provisórios. Quem tem mais direito?


Porvinicius.pj- Postado em 01 novembro 2011

Autores: 
JÚNIOR, Milton Córdova

Nobres policiais militares,

O voto eleitoral é o momento em que cada eleitor é convocado e tem o poder de exercer sua cidadania. Nesse momento cada cidadão precisa saber usar esse poder, com liberdade e consciência, pois voto além de ser direito, é direito humano fundamental para o exercício da cidadania. É por isso que participar do processo eleitoral se torna exercício de cidadania a partir do momento em que cada cidadão quer seja civil ou policial militar reconheça, com responsabilidade política e social, que o voto é um dos instrumentos que pode influenciar o destino do Brasil e conseqüentemente melhorar a qualidade de vida de todos nós. É nesse contexto que se destaca e justifica a importância do serviço policial durante o pleito eleitoral, pois a defesa do interesse coletivo dos cidadãos enquanto eleitores se converte em dever para os cidadãos policiais militares, principalmente, daqueles que se encontram de serviço no dia do pleito eleitoral e, geralmente, acabam por sacrificar o seu direito de voto em favor do interesse da sociedade.


Esse é o inicio da apresentação do excelente Manual do Policial Militar do Estado de Mato Grosso (elaborado para o Pleito Eleitoral de 2008).

Certamente uma expressiva parcela da sociedade desconhece o fato de que no dia das eleições, grande parte dos cidadãos policiais militares não consegue exercer o principal dos direitos políticos e de cidadania: o voto. Isso acontece porque nesse dia eles estão à disposição da própria Justiça Eleitoral, protegendo e assegurando o direito de voto da sociedade, em sacrifício de seu próprio direito. Não que não possam votar, mas nesse dia, desde muito cedo, na calada da madrugada e enquanto todos dormem, os policiais militares estão alertas, de prontidão, em deslocamento ou preparando-se para o inicio de seus trabalhos que, com raras exceções, ocorre longe de sua seção eleitoral.

Assim, milhares de cidadãos policiais militares não votam – e ninguém liga para isso. Afinal de contas, é “obrigação” e “dever” deles proteger a sociedade. Essa defesa da sociedade tem um custo e o custo tem os efeitos uma suspensão (inconstitucional) de seus direitos políticos, no dia das eleições.

A Justiça Eleitoral, que tem a obrigação de viabilizar o voto para todos, ignora-os solenemente. As diversas instituições de classe, de categorias, ou de direitos “disso ou daquilo”, silenciam a respeito.   

Enquanto isso, o mesmo não acontece com a defesa intransigente com os direitos dos presos provisórios, cidadãos que, em sua maior parte, violaram a lei e foram apreendidos por cidadãos policiais militares, em cumprimento da lei. Vale dizer que no dia das eleições o policial militar tem seu direito ao voto sacrificado justamente por conta da existência de cidadãos que não sabem conviver em harmonia com a sociedade, praticam ações em descumprimento da lei e, muitas vezes, transformam-se em “presos provisórios”.

Não se trata de dizer quem tem mais ou quem tem menos direitos, se presos provisórios ou cidadãos policiais militares, pois todos têm o mesmo direito. A questão não é esta e qualquer afirmação nesse sentido seria desvirtuar e apequenar o debate. Ocorre que a questão trata-se, portanto e inequivocamente, de uma questão de bom senso, de razoabilidade.

Enquanto que os direitos políticos de boa parte dos policiais militares são sacrificados no dia das eleições, porque existem cidadãos que violam a lei, inúmeras instituições – bem intencionadas, registre-se – defendem, com tenacidade, o voto presos provisórios, cidadãos que violaram a lei.

Assim, notícias  (http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2038474/comissao-avaliara-formas-de-viabilizar-exercicio-do-voto-por-presos-provisorios) informam que o TSE, zelosamente,  instituiu Comissão para avaliar formas do exercício do voto para os presos provisórios, que somariam algo em torno de 207 mil (entre presos provisórios e “menores infratores”.   O ministro Arnaldo Versiani afirmou que pretende “instituir a partir das eleições de 2010 uma experiência piloto em termos do exercício do voto do preso provisório e que essa eventual obrigatoriedade se estenda a todos os estados do Brasil". Versiani lembrou que a Constituição só veda o exercício do voto ao preso já com sentença de condenação transitada em julgado.  Prosseguindo, o Ministro Versiani disse que “o preso provisório está na condição de um eleitor comum. Cabe à Justiça Eleitoral, não só em relação a ele, mas também ao adolescente que está cumprindo internação, fazer com que possam exercer o direito do voto, porque não há impedimento. E isso realmente estimula o processo de cidadania".

Não sei se o preso provisório é um “eleitor comum”, considerando as várias nuances interpretativas que se pode dar ao caso. Ele pode ser um eleitor comum, do ponto de vista jurídico, mas certamente é um “eleitor incomum”, sob os mais diversos aspectos. A começar que esses “eleitores comuns” são eleitores que violaram a lei e optaram, boa parte deles, por transitar à margem da sociedade, gerando problemas e custos para essa mesma sociedade. 

Mas os cidadãos policiais militares são mais que eleitores comuns. São eleitores especiais que, contudo, não votarão no dia das eleições, justamente porque existem eleitores “comuns incomuns”.  Estes têm os seus direitos de cidadania (embora atentassem contra ela) soberbamente defendidos por representantes do CNJ, do TSE, da Associação Juízes para a Democracia, da Associação dos Magistrados Brasileiros, do Conselho Nacional do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Instituto de Acesso à Justiça, da Pastoral Carcerária Nacional da CNBB e do Conselho Nacional de Secretários de Justiça.   Não me lembro de qualquer manifestação dessas entidades em favor dos policiais militares que, no dia das eleições, caberá, tão somente, defender os diretos dos outros – até dos presos provisórios.

O voto dos presos foi debate até mesmo em seminário “Cidadania e Voto” (http://www.conjur.com.br/2009-set-30/seminario-rio-discute-direito-voto-presos-provisorios) no Rio de Janeiro, promovido pela que a Associação Juízes pela Democracia, em Outubro, com a participação de representantes da Justiça eleitoral, do Ministério Público e da sociedade civil, com a intenção de “procurar sensibilizar magistrados, promotores, procuradores e defensores públicos que atuam na área de Direito Eleitoral, Penal, Execução Criminal, Infância e Juventude e Direitos Humanos para a defesa do direito ao voto dos presos”.

Mas...e os direitos políticos e de cidadania dos policiais militares? A quem “sensibilizar”? Quem os defende? Nessa direção, parece que se descortinou uma luz, por meio da ASPRA-RN (Associação dos Praças da Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Norte), que ingressou com um “Amicus Curiae” no STF, em defesa do voto para os policiais militares que estão em serviço, no dia das eleições, e demais cidadãos “em trânsito”.

Para compreender o caso, uma breve contextualização. Em 28 de agosto o Supremo Tribunal Federal recebeu o Mandado de Injunção 1767 (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=112546&caixaBusca=N) , cujo objeto é garantir o voto para o eleitor que está em trânsito, no dia das eleições, uma vez que o voto é direito constitucional essencial para todos (sufrágio universal), de eficácia plena (é de aplicabilidade imediata) e ainda, é obrigatório.  O MI 1767 aponta a omissão inconstitucional do TSE ante a matéria, em grave violação dos direitos dos cidadãos eleitores.  O Ministro Marco Aurélio é o Relator desse Mandado de Injunção.

Atenta e conectada aos acontecimentos, em 29.12.2009 a ASPRA/RN (Associação dos Praças da Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Norte) ingressou com um AMICUS CURIAE, em defesa do MI 1767, alegando, principalmente, a questão do impedimento do voto para os policiais militares, que no dia das eleições, estão “em trânsito”. A ASPRA/RN defende o direito do voto para todos os policiais militares que, no dia das eleições, estão “em trânsito”, a serviço da Justiça Eleitoral, uma vez que o sufrágio é universal. 

Desse modo, parece que é possível inaugurar-se um novo tempo para os cidadãos policiais militares que, no dia das eleições, sacrificaram o seu direito ao voto em favor do interesse da sociedade;  até mesmo, em defesa dos direitos dos presos provisórios.

Caberá ao Supremo Tribunal Federal, como Guardião da Constituição, dar a devida eficácia aos direitos políticos e de cidadania, tantos dos cidadãos policiais militares, como dos demais cidadãos.