A união homoafetiva é uma garantia da carta cidadã de 1988


PorJeison- Postado em 08 outubro 2012

Autores: 
LELES, José Sólon.

 

 

RESUMO: O Livro O Cortiço de Aloízio de Azevedo proporciona ao leitor analisar um romance de época, mas que traz várias reflexões bem além do seu tempo. A proposta deste artigo é analisar a homossexualidade e a união homoafetiva como garantia prevista na Carta Cidadã de 1988. Ora, a Carta Magna brasileira prevê a dignidade da pessoa humana bem como o respeito à livre expressão e escola dos seus cidadãos, desde que não seja maculado direito alheio. Contudo, se expressar sexualmente diferente é uma das garantias mais comezinhas do direito.

PALABRA- CHAVE: Dignidade da pessoa humana; Respeito ao diferente; Legalidade.


 

1- INTRODUÇÃO   

A mais de 200 (duzentos) anos da Declaração de Direitos de 1789: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, a mais de 50 (cinquenta) anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), e a mais de 20 (vinte) anos da Constituição Cidadã de 1988 no Brasil que prima pela dignidade da pessoa humana; várias minorias como indígenas, portadores de necessidades especiais, homossexuais... Ainda sofrem problemas sociais: preconceitos de toda sorte, desrespeito a sua integridade moral, física e de direitos é uma constante.

O que se evidencia é uma crescente fragilidade das minorias pela falta de políticas públicas voltadas a sua integridade, dentre elas uma das mais prejudicadas são os homossexuais.

O aumento da escalada da violência contra homossexuais, que a casa dia se torna maior e mais perversa, faz- nos refletir e questionar o nível de “civilidade” alcançado pela humanidade. Apesar de tamanhos avanços nas ciências, tecnologias e no pensamento algumas parcelas parece deter níveis de “incivilidade”.

2-      SÓ FALTA A EFETIVAÇÃO!

A Homossexualidade acompanha a história da humanidade desde que o mundo é mundo, sendo diversamente interpretada e explicada, sem que, entretanto, jamais fosse ignorada. Na Grécia antiga, o livre exercício da sexualidade era privilégio dos bem nascidos e fazia parte do cotidiano dos deuses, reis e heróis. A mitologia grega retratou famosos casais homossexuais como Zeus e Gamimede e Aquiles e Patroclo. Para a sociedade grega, a heterossexualidade era tida como uma necessidade natural, digna de ambientes cultos; uma legítima manifestação da libido. Outro claro sinal das tendências homossexuais da civilização grega eram as representações teatrais, em que os papéis femininos eram sempre desempenhados por homens travestidos. O preconceito contra a homossexualidade advém das religiões, em especial das tradições judaico-cristã. Do vínculo religioso-cultural nasceu a censura aos chamados pecados da carne.

Foi na Idade Média que a homossexualidade sofreu as maiores perseguições promovida pelos tribunais da “Santa Inquisição”, eram eles penalizados com a morte. Mesmo no período das luzes o Concílio de Latrão de 1779, ainda considerava o homossexualismo crime.

Isto posto, é necessário reconhecer: em pleno século XXI, no século das liberdades a sociedade brasileira ainda guarda ranços de um passado longínquo, onde um dos direitos mais naturais do ser humano ainda continua sem reconhecimento.

Com a promulgação da Constituição Brasileira de 1988, um grande passo foi dado na valorização e respeito ao cidadão, independente de qualquer distinção quanto à cor, sexo e ideologias, como bem determina a Magna Carta em seu Título II- Dos Direitos e Garantias Fundamentais.

A evolução da sociedade através dos tempos, carreada pelo avanço das ciências que proporcionam conforto e modernidade, não faria sentido sem que o Direito, uma ciência dinâmica e evolutiva, não acompanhasse tal progresso. É nesse sentido que se proliferam o debate jurídico, científico e acadêmico, visando uma melhor adaptação das leis às necessidades atuais, onde se inclui a parcela social que milita incansavelmente pelo reconhecimento dos direitos do homossexual.

O certo é que a Carta Democrática de 1988 exclui qualquer tipo de preconceito, desrespeito e perseguição; no artigo 5° da Constituição da República Federativa do Brasil, senão vejamos: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...” e, “são invioláveis e intimidade, a vida, a honra e a imagem das pessoas...” (inciso X do art. 5° da CF/88), e mais ainda, a luz do inciso IV do Artigo 3° da CF, deparamo-nos com mais uma abordagem aos direitos e garantias fundamentais do cidadão:

 “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e qualquer outra forma de discriminação” (grifos nosso),

Portanto, deparamo-nos com um caminho já sedimentado para a construção e reconhecimento da união entre homossexuais, legalmente tutelado pela constituição Federal. Esta perspectiva civil-constitucional, centrada no valor da dignidade humana, deverá possibilitar o reconhecimento das uniões homossexuais enquanto entidades familiares. Depreende-se daí que é somente uma questão de tempo.

Países como a Suécia, Noruega, Holanda já reconhecem a união homoafetiva, e, recente um pais da América Latina a Argentina garantiu esse direito.

O certo é que não há uma lei no Brasil que proíba a união homoafetiva. O pensamento Kelseniano afirma; “Tudo o que não está explicitamente proibido, está, implicitamente, permitido”, ideia amplamente protegida pela Constituição Federal, ao afirmar: “Ninguém será obrigado afazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (Art. 5°, inciso II CF/88).

Em respeito a tal posicionamento, Fabio Ulhoa Coelho afirma:

Como todas  as  normas  são  reduzidas  á  estrutura  de um  imperativo sancionador,  para  o  pensamento kelseriano,  aquele Juiz  que  enxerga lacunas no Direito está, na verdade, pretendendo aplicar sanções a  uma conduta   não-sancionada  ou   deixar  de  aplicar   sanções  a   condutas sancionadas. Ou seja, ele pretende inverter o sentido da  norma [...]  em Kelsen o julgador só considera  que há  lacunas no ordenamento quando não o satisfaz a solução oferecida. (ULHOA COELHO, p. 128, 1997).

 

Em sede de análise, é valido salientar a mutabilidade que caracteriza o Direito e as leis. Assim como o fator temporal e a mudança nos costumes são costumes são elementos que influenciam os valores presentes em cada civilização, o Direito deve acompanhar as transmutações ocorridas e, em favor delas, afastar o preconceito e criar leis em nível de compatibilidade com os reais anseios da sociedade.

Necessário então é a garantia legal a todos os homoafetivos, o direito à propriedade, herança e sucessão de bens acumulados no decorrer de uma união homoafetiva, o direito do companheiro homoafetivo aos benefícios proporcionados pela previdência, etc..., são tratados ainda pelo código civil brasileiro da forma tradicional e arcaica. Há muito que se realizar efetivamente para que os preconceitos constitucionais inibidores ou preventivos de situações discriminatórias sejam superados. Outro anseio resultante da união homoafetiva reside na necessidade de adoção, como forma de sedimentação deste relacionamento.

No estatuto da criança e do Adolescente não há qualquer restrição à possibilidade de adoção por homossexuais. Na verdade, o Estatuto sequer faz menção à orientação sexual do adolescente. O enunciado do artigo 42 desse diploma legal limita-se a prescrever que “podem adotar os maiores de 21 anos, independentemente do estado civil”. Assim, a faculdade de adotar é concedida a homens e mulheres, em conjunto ou isoladamente, bastando que sejam preenchidos os requisitos do artigo 39 e seguintes de referido Estatuto.

Sob o prisma constitucional, não é possível excluir o direito individual de guarda, tutelar e adoção, garantindo a todo cidadão, face de sua preferência sexual, sob pena de infringir- se o respeito à dignidade humana, o princípio da igualdade e a vedação de tratamento discriminatório de qualquer ordem.

Contudo, o próprio Rousseau alerta que: “...o bem maior de todos, que tais princípios devem ser o fim de todo o sistema de legislação, achá-lo-ei resumido nestes dois objetos principais, a liberdade e a igualdade”. (ROUSSEAU, 1998. P, 191).

3-      CONCLUSÃO

Se o fim do Estado é, conforme a constituição Federal a realização do bem comum, com a criação de uma sociedade justa e solidária, sem distinção de qualquer natureza, a efetivação da garantia desse direito deve ser respeitado, acolhendo-se a união entre pessoas do mesmo sexo, sob pena de quebra do contato social firmado pela Carta Cidadã e Democrática de 1988.

REFERENCIAS

AZEVEDO, Aloisio. O Cortiço. 3ª edição. São Paulo: FTD, 1998.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. Ed. Atlas S.A. São Paulo. 2002.

DIAS, Maria Berenice. União Homoafetiva. Disponível na Internet, em http://www.gontijofamilia.adv.br

GOMES, Orlando. Direito de Família. Ed. Forense, 12ª Edição. Rio de Janeiro, 2000.

COELHO, Fabio Ulhoa. Manuel de Direito Comercial. 20ª Edição. São Paulo, 2009.

ROUSSEAU, Jean-Jacques: O Contrato Social (Título original Le Contrat Social revisado por Antonio Carlos Marquês) trad, Pietro Nasseti 20° ed. São Paulo- SP Martin Claret, 2001.

 

Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.39877