PT 4 - Novas luzes sobre o procedimento administrativo disciplinar no âmbito da execução criminal


PorJefter Gerson- Postado em 24 outubro 2019

Autores: 
Everton Hertzog Castilhos

8 CONCLUSÃO

 

Em função de tudo o que foi exposto, não restam dúvidas que o Poder Judiciário – junto com os demais atores judiciais – vem historicamente adentrando no mérito de atos administrativos, muito embora não tenha tido a intenção de fazê-lo. Ao permitir que se possa oficiar órgãos administrativos da forma como se faz hoje (ordenando a instauração de procedimentos disciplinares) e ao enfrentar o mérito dos atos administrativos (relegando o administrador prisional a um segundo plano, como se suas decisões não tivessem validade), o Poder Judiciário causa inúmeros transtornos e injustiças – muito embora, repita-se, não tenha sido essa jamais a sua intenção.

 

 

O acompanhamento da jurisprudência reiterada, assim como do dia-a-dia das Varas de Execuções Criminais, permite afirmar com absoluto grau de convicção que os Juízes (e os demais atores judiciais) dão tudo de si para fazer o sistema funcionar. Os agentes e serventuários envolvidos são verdadeiros guerreiros dentro do sistema público. Afinal, diferentemente de outras varas com competências mais glamorosas, a execução criminal não recebe a atenção que mereceria receber, até para implementar todas as políticas públicas que seriam necessárias. E a imagem junto à sociedade não é das melhores, pois quem atua perante a área prisional recebe olhares “duvidosos”, tendo em vista que lida com “bandidos” (fato que tem se agravado com as recentes questões envolvendo o agravamento da crise da Segurança Pública).

 

Nesse sentido, olha-se com parcimônia e afirma-se que, muito embora bem-intencionados, os agentes envolvidos acabaram por colaborar com uma injustiça gritante ao longo de anos de decisões “reiteradas”, sem jamais questionar os fundamentos e motivos dessas decisões. Nem mesmo Defensores, Promotores e Advogados passaram ilesos em relação a isso. A responsabilidade, decididamente, não é exclusiva do Poder Judiciário. O problema é que cabe a este a última palavra, o que acaba por deixá-lo mais em evidência, apenas isso. Mas devemos lembrar que a Magistratura decide a partir daquilo que lhe é apresentado.

 

Nesse passo, é importante que se dê a devida atenção aos problemas levantados neste estudo. É preciso sair daquela atuação “no automático” que o dia-a-dia impõe, para que se possa questionar o Processo de Execução Criminal com a profundidade que ele merece.

 

Assim, depois de tudo o que restou apresentado, algumas conclusões podem ser extraídas:

 

  • a competência para instaurar, conduzir a instrução do PAD, reconhecer a prática de uma falta grave e aplicar sanções administrativas é do Diretor do estabelecimento prisional

  • o Juízo da VEC não tem competência para determinar a instauração de PADs

  • o Juízo da VEC, igualmente, não tem competência para reconhecer ou deixar de reconhecer faltas graves

  • a competência do Juízo da VEC está restrita a aplicar (ou não) um ou alguns dos chamados “consectários legais” (que não são de aplicação obrigatória em qualquer caso)

  • se provocado, poderá o Judiciário exercer o controle de legalidade/constitucionalidade dos atos administrativos

  • Na ausência de provocação determinará (ou não) a regressão de regime, a alteração da data-base e a perda da remição (mas não poderá se imiscuir na competência do Diretor do Presídio, reconhecendo ou não a suposta falta grave).

  • a audiência de justificação é prescindível

  • diante da omissão na LEP, a prescrição de faltas disciplinares será aquela regrada nas legislações estaduais, quando houver essa previsão.

Diante desse quadro de conclusões que o estudo impõe, e até para otimizar a atuação processual penal nos feitos atinentes à execução criminal, poder-se-ia sugerir inclusive a seguinte forma de agir, quando do aporte nos autos da notícia do reconhecimento administrativo de uma falta grave:

 

  • vista dos documentos para o Ministério Público e a Defesa (constituída ou Pública) para analisarem o procedimento e formularem as alegações pertinentes (se as entenderem necessárias);

  • na ausência de requerimentos, o Juiz apreciará se é o caso de aplicação (ou não) de uma, todas ou apenas algumas das consequências que entender cabíveis (regressão de regime, alteração de data-base e/ou perda da remição);

  • no caso de haver alegações, poderá então (agora devidamente provocado) declarar a ilegalidade/inconstitucionalidade, se entender que estas existem; ou, na hipótese de entender não haver nenhum vício, apreciar se é o caso de aplicação dos efeitos referidos no item anterior.

 

Proceder dessa maneira parece atender de forma conciliadora e integral a todos os princípios processuais mencionados acima, tanto os constitucionais como os legais. Da mesma forma, haveria um grande incremento de agilidade na procedimentalização dos PADS e na sua apreciação judicial (que inclusive dispensaria audiências desnecessárias). De outra banda, o apenado veria o seu direito apreciado com agilidade, fato que teria como efeito direto a própria pacificação das casas prisionais (hoje superlotadas, algumas à beira de um colapso).

 

Pode-se inclusive dizer que é semelhante a uma negociação do tipo “ganha-ganha” (do inglês “win-win negotiation”), pois: de um lado, ganha o apenado em justiça e celeridade; ao mesmo tempo, do outro lado, ganha o Poder Judiciário que, ao não precisar realizar audiências a esmo, pode direcionar o foco do seu trabalho para questões mais práticas, como a própria fiscalização prisional ou mesmo a análise dos pedidos formulados pelos jurisdicionados. Ainda, uma consequência feliz e inesperada da solução apresentada: ganha também o Poder Executivo, pois, não havendo mais necessidade de audiências de justificação, também não há mais a necessidade de transporte de presos, o que gera uma grande economia de recursos para o Estado.

 


9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BARROS, Wellington Pacheco. Curso de processo administrativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005

 

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 3ª edição, revisada e atualizada, de acordo com a Emenda Constitucional n. 56/2007. São Paulo: Saraiva, 2009

 

FREITAS, Juarez. Controle dos Atos Administrativos e os Princípios Fundamentais. 3ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004

 

JESUS, Damásio de. Prescrição Penal. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001

 

JULIOTTI, PEDRO de JESUS. Lei de Execução Penal anotada. São Paulo: Editora Verbatim, 2011

 

LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012

 

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 21ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996

 

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007

 

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal – parte geral – parte especial. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007

 

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007

 

NOVAS LUZES SOBRE O PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR NO ÂMBITO DA EXECUÇÃO CRIMINAL. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/60500/novas-luzes-sobre-o-procedimento-administrativo-disciplinar-no-ambito-da-execucao-criminal/4>. Acesso em: 24 out. 2019.