Prescrição da aplicação de penalidade em processo administrativo disciplinar e/ou sindicâncias


PorJeison- Postado em 25 fevereiro 2013

Autores: 
MORELO, Ludimila Carvalho Bitar.

 

I – INTRODUÇÃO.

 

O presente artigo trata da análise da prescrição da penalidade a ser imposta em sindicância e/ou processo administrativo disciplinar.

 

II – DESENVOLVIMENTO.

 

Inicialmente observa que a Controladoria-Geral da União (CGU) elaborou uma Apostila de Treinamento sobre Processo Administrativo Disciplinar (PAD), em maio de 2010, que expõe sobre a prescrição na página 524:

 

“De imediato, antes de adentrar na análise do tema, assevera-se que, no regime administrativo disciplinar, o instituto da prescrição acarreta a extinção da punibilidade. Ou seja, se refere à aplicação da pena, que é matéria da autoridade julgadora, não devendo, a princípio, ser objeto de análise da comissão. Todavia, se na defesa o acusado provocar a discussão do assunto, a comissão pode abordá-lo no relatório apenas de forma condicional, reservando a decisão à autoridade julgadora. Ainda, convém à comissão alertar a autoridade acerca da possibilidade de ocorrência da prescrição em data futura próxima”.

 

Assim, em um caso imaginário, tem-se um despacho da autoridade competente orientando o responsável na condução da apuração dos fatos a instaurar uma sindicância punitiva para apurar responsabilidade de servidor público em virtude de um suposto não cumprimento de ordem judicial.

 

Pois bem. Desse modo, a Lei nº 8.112/90 trouxe as disposições gerais a respeito da sindicância e o art. 145 dispõe sobre os possíveis resultados dela, que são: arquivamento do processo; aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias; e, instauração de processo disciplinar, vejamos:

 

Art. 145.  Da sindicância poderá resultar:  

 

I - arquivamento do processo;  

 

II - aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias;

 

III - instauração de processo disciplinar.

 

Parágrafo único.  O prazo para conclusão da sindicância não excederá 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado por igual período, a critério da autoridade superior.

 

Relativamente à advertência, deve-se observar a previsão do art. 142, inciso III, da Lei do Servidor Público que diz que a ação disciplinar prescreve em 180 (cento e oitenta) dias para os fatos em que cabe esta penalidade. Sendo que este prazo prescricional começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido (art. 142, § 1º, da mesma lei).

 

Caso a penalidade a ser imposta ao servidor público seja suspensão de até 30 (trinta) dias, o mesmo art. 142, inciso II, da citada lei, prevê que a pena prescreverá em 2 (dois) anos, sendo que o termoa quo desta contagem é idêntico ao item anterior.

 

Caso a sindicância punitiva conclua pela necessidade de instaurar processo disciplinar propriamente dito, a prescrição correrá da data da instauração desta nova fase.

 

Assim está disposto na Lei nº 8.112/90:

 

Art. 142.  A ação disciplinar prescreverá:

 

        I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

 

        II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

 

        III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto á advertência.

 

        § 1o  O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

 

        § 2o  Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.

 

        § 3o  A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.

 

        § 4o  Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção.

 

A CGU naquela já aludida apostila trouxe uma exposição completa de qual é prazo a quo para a contagem da prescrição, na página 526:

 

“Tomando-se em conjunto a interpretação sistemática da Lei nº 8.112, de 11/12/90, e a leitura vinculante do citado Parecer-AGU, tem-se, de imediato, que não é o conhecimento de qualquer autoridade inserida na via hierárquica entre o representado e o dirigente máximo do órgão ou unidade que configura o termo inicial da prescrição. Ao contrário, embora limitado à via hierárquica (pois assim determina a Lei), este momento tem configuração restrita, concentrado nas mãos especificamente do superior que detém a competência de instaurar o processo administrativo disciplinar (pois assim, em complemento à Lei, interpreta o Parecer- AGU).

 

Parecer-AGU nº GQ-55, vinculante: “19. A inércia da administração somente é suscetível de se configurar em tendo conhecimento da falta disciplinar a autoridade administrativa competente para instaurar o processo.”

 

Como no caso imaginário a autoridade competente tomou conhecimento da suposta falta funcional do servidor público em agosto de 2008, é a partir desta data que o prazo prescricional para aplicar a penalidade começou a correr e só seriainterrompido com a abertura do processo de sindicância ou a instauração de processo disciplinar, nos termos do já transcrito parágrafo 3º do aludido art. 142 da Lei nº 8.112/90.

 

A citada abertura de sindicância se deu em junho de 2010, por meio deato normativopróprio, ou seja, mais de 21 meses após o conhecimento dos fatos. Nestes termos, qualquer cogitação de aplicação da penalidade de advertênciaao servidor público tornou-se inócua, tendo em vista a ocorrência da prescrição legal.

 

Não obstante tudo isto, a simples título de argumentação, a outra improvável medida que pode resultar nesta sindicância punitiva, seria a suspensão de até 30 (trinta) dias. Neste caso, a prescrição acontece em 2 (dois) anos.

 

Este prazo de fato não ocorreu, no entanto a própria Lei nº 8.112/90 trouxe um rol taxativo de condutas que, se praticadas por servidor público, ocasionam a penalidade de advertência e de demissão. Com relação à suspensão, aquela lei prevê, no art. 130:

 

Art. 130.  A suspensão será aplicada em caso de reincidência das faltas punidas com advertência e de violação das demais proibições que não tipifiquem infração sujeita a penalidade de demissão, não podendo exceder de 90 (noventa) dias.

 

        § 1o  Será punido com suspensão de até 15 (quinze) dias o servidor que, injustificadamente, recusar-se a ser submetido a inspeção médica determinada pela autoridade competente, cessando os efeitos da penalidade uma vez cumprida a determinação.

 

       § 2o  Quando houver conveniência para o serviço, a penalidade de suspensão poderá ser convertida em multa, na base de 50% (cinqüenta por cento) por dia de vencimento ou remuneração, ficando o servidor obrigado a permanecer em serviço.

 

O mencionado servidor público, no imaginário processo administrativo, nunca praticou nenhuma conduta que desabonasse seu mérito nem tem nenhuma ocorrência registrada em sua ficha funcional. Assim sendo, a primeira hipótese do art. 130 daquela lei está descartado.

 

Resta, portanto, a análise da segunda parte do referido artigo, quando indiretamente cita os incisos XVII e XVIII do art. 117 da Lei nº 8.112/90 como as outras condutas possíveis de receberem a suspensão como penalidade, porque será punido com advertência as condutas arrolados nos incisos I a VIII e XIX do art. 117 e, punido com demissão as condutas previstas nos incisos IX a XVI do art. 117.

 

Os incisos XVII e XVIII do art. 117, por sua vez, não relacionam em nada com o objeto da apuração em análise, uma vez que não houve delegação de atribuição a pessoas estranhas ao cargo nem exercício incompatível com a função.

 

Além de tudo isto, o art. 129, caput, da mesma lei, traz as hipóteses de aplicação de advertência e na parte final prevê a possibilidade das mesmas condutas receberem penas mais graves, justificadamente. Como a conduta deste servidor público parece não ser digna nem de advertência, jamais seria agravada para suspensão. Assim, dispensam-se comentários.

 

Ao que percebe, a demora na conclusão da mencionada sindicância é injustificada, posto que poderiam resolver esta pendência com o simples reconhecimento da prescrição da possibilidade de punir um servidor público, ou mesmo, julgar o mérito, inocentar o servidor e finalizar os trabalhos, o que seria o mais apropriado em virtude da moral profissional do servidor público, que está abalada desde a instauração da sindicância.

 

Vale transcrever mais um trecho da Apostila da CGU neste mesmo sentido:

 

“Se a prescrição extinguisse a apuração, se configuraria pré-julgamento de culpa, como se o processo somente se justificasse como instrumento para aplicação de pena. Ademais, é direito e interesse do bom servidor a conclusão da apuração que declare sua inocência.” (página 544).

 

III – CONCLUSÃO.

 

Em virtude do exposto, considerando que a penalidade de advertência prescreve em 180 (cento e oitenta) dias, se entre a tomada de conhecimento pela autoridade competente da suposta falta funcional praticada por um servidor público e a instauração do processo disciplinar, via sindicância punitiva, transcorrer lapso temporal superior a 6 (seis) meses, não resta outra alternativa ao ente público que não reconhecer tal prescrição.

 

IV – REFERÊNCIAS.

 

Apostila de Treinamento sobre Processo Administrativo Disciplinar (PAD), daControladoria-Geral da União (CGU), de 2010.

 

Lei nº 8.112/90.

 

Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.42164&seo=1>