Os acordos de cooperação técnica internacional celebrados entre entidades públicas federais e organismos internacionais


Porrayanesantos- Postado em 02 maio 2013

Autores: 
FERREIRA, Fernando Mesquita

 

1. Introdução 

 

                  O presente artigo pretende analisar os requisitos legais para a celebração de acordos de cooperação técnica internacional entre entidades públicas federais, seja da administração direta ou indireta, e organismos internacionais, como é o caso da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – UNESCO, com o objetivo de fortalecer políticas públicas do Governo Federal, e sobretudo, promover o incremento da cidadania e do desenvolvimento social no país. 

 

                  Tais projetos decorrem em grande parte da insuficiência de estrutura e know-all das entidades públicas federais responsáveis por colocar em prática determinadas políticas públicas, seja por falta de pessoal especializado, seja diante da necessidade de contratação de terceiros externos ao órgão para realização de estudos prévios específicos, seja para o devido acompanhamento e fiscalização das atividades desenvolvidas.

 

                  O assunto desperta a atenção dos órgãos externos de controle na medida em que tais instrumentos viabilizam o repasse de recursos públicos nacionais a diversos organismos internacionais, que executam variadas contratações para atender o escopo do projeto de cooperação, em especial, de pessoal técnico especializado. 

 

2. Da legislação de regência: Decreto nº 5.151/2004 e Portaria MRE nº 717/2006    

 

                    Além dos princípios gerais da Administração Pública que regem toda e qualquer atividade administrativa, e dos diversos julgados e orientações dos órgãos externos de controle, os projetos de cooperação técnica internacional devem se guiar pelos seguintes atos normativos:

 

 1) Decreto nº 5.151/2004, que “dispõe sobre os procedimentos a serem observados pelos órgãos e pelas entidades da Administração Pública Federal direta e indireta, para fins de celebração de atos complementares de cooperação técnica recebida de organismos internacionais e da aprovação e gestão de projetos vinculados aos referidos instrumentos”;

 

2) Portaria nº 717/2006 do Ministério das Relações Exteriores, “que aprova normas complementares aos procedimentos a serem observados pelos órgãos e pelas entidades da Administração Pública Federal direta e indireta, para fins de celebração de Atos Complementares de cooperação técnica recebida, decorrentes de Acordos Básicos firmados entre o Governo brasileiro e organismos internacionais, e da aprovação e gestão de projetos vinculados aos referidos instrumentos.”

 

                          Da análise da legislação em comento, pode-se constatar que, caso o projeto de cooperação internacional seja custeado totalmente com recursos orçamentários da entidade pública federal, a participação do organismo internacional deve se dar mediante prestação de assessoria técnica ou transferência de conhecimentos, na forma do art. 2º, § 5º do Decreto nº 5.151/2004.

 

                          Neste sentido, o Tribunal de Contas da União já se pronunciou, conforme trecho do voto do Ministro Relator José Jorge, no Acórdão TCU nº 1.339/2009 – Plenário:

 

 [...] os propósitos dos projetos de cooperação técnica estão restritos às hipóteses nas quais haja transferência de conhecimentos ou exista assessoria técnica, a qual, por seu turno, deve compreender atividades de treinamento, consultoria, bem como a aquisição de bens e contratação de serviços, desde que estes estejam vinculados ao desenvolvimento das ações contidas no acordo básico de cooperação e que não possam ser executadas pelo próprio órgão pertencente à administração pública federal.

 

                        Para a gestão de projetos de cooperação técnica internacional, a condução e direção de suas atividades estarão a cargo de instituições brasileiras, e o acompanhamento será realizado pela Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores, ainda que os recursos orçamentários estejam sob a guarda do organismo internacional cooperante, conforme dispõe o art. 2º, §§ 1º e 2º do Decreto nº 5.151/2004.

 

            Note-se que a contraparte externa não pode desempenhar atividades que sejam inerentes ao quadro técnico da entidade pública federal, sendo imprescindível a transferência de conhecimentos entre as instituições cooperantes. Neste sentido, vale transcrever mais um trecho do Acórdão TCU nº 1339/2009 – Plenário (grifos nossos):

 

Representação. Estudo dos parâmetros utilizados em acordos de cooperação técnica internacional, financiados exclusivamente com recursos nacionais. Identificação de Acordos de Cooperação Internacional destinados ao exercício de atividades meramente administrativas. Determinações. Considerações.

 

1. os acordos básicos de cooperação técnica internacional prestada ao Brasil não autorizam que a contraparte externa efetue, no interesse da Administração demandante, o desempenho de atribuições próprias dos órgãos públicos, nas quais não haverá transferência de conhecimento por parte do organismo internacional executor ou em que a assessoria técnica de um ente externo é dispensável, por se tratar de temas e práticas já de domínio público, demandados rotineiramente pela Administração, a exemplo da contração de bens e serviços de natureza comum, usualmente disponíveis no mercado;

 

2. ainda que o projeto de cooperação internacional contemple, em sua globalidade, tanto atividades de efetiva assistência técnica como ações complementares, de caráter instrumental, apenas aquelas podem ser assumidas pelo organismo internacional cooperante, devendo as de caráter ordinário ser integradas ao projeto pela Administração Pública, valendo-se dos mecanismos institucionais próprios do regime jurídico administrativo;

 

3. no que se refere ao "Acordo Básico de Assistência Técnica com a Organização das Nações Unidas, suas Agências Especializadas e a Agência Internacional de Energia Atômica", aprovado pelo Decreto Legislativo 11/1966 e promulgado pelo Decreto 59.308/1966, é da Administração o encargo de fornecer os recursos humanos e materiais de caráter instrumental necessários à execução dos projetos pactuados, devendo as hipóteses de cooperação previstas no art. I.3 desse acordo serem interpretadas em conjunto com as regras contidas em seus arts. IV.1 e IV.3;

 

                          Em outras palavras, os Acordos de Cooperação Técnica Internacional não podem ser instrumentos para viabilizar a contratação de serviços que possam ser executados por seus próprios servidores, na forma do art. 4º, § 6º do Decreto nº 5.151/2004.

 

                            Ainda do Acórdão citado, constata-se a orientação de que as atribuições de caráter ordinário sejam integradas ao projeto pela Administração Pública, já que pressupõem a execução de serviços, através de quadro de pessoal permanente, com relação de subordinação jurídica[1].

 

                            Já os consultores que serão contratados no âmbito do Acordo de Cooperação deverão desempenhar suas atividades de forma temporária e sem relação de subordinação, conforme prevê o art. 4º, § 9º do Decreto nº 5.151/2004.

 

                    Segundo a orientação da Controladoria Geral da União (grifos nossos):

 

Para a gestão/execução do projeto o órgão executor nacional deve alocar servidores públicos (efetivos, em comissão ou temporários) que tenham competência para contribuir com os objetivos do projeto de forma continuada. Já as atividades de natureza especializada, pontual e específica em relação aos objetivos do projeto, que resultem em um produto claramente definido, requerem sua realização por consultores externos, especialistas em sua área de atuação e sem vínculo empregatício com o projeto.

 

Dessa forma, entende-se que a contratação de pessoal por intermédio de contratos de prestação de serviços de consultoria para o desenvolvimento de atividades rotineiras do projeto ou típicas do órgão ou entidade executora, com a existência de subordinação jurídica a este, consiste em falha grave, na medida em que se constitui em ato não permitido pela legislação vigente, o que, inclusive, já foi objeto de apreciação judicial, que deu origem ao Termo de Ajustamento de Conduta entre a União e o Ministério Público do Trabalho em decorrência da Ação Civil Pública nº 1044/2001[2].

 

Ainda segundo a Controladoria Geral da União:

 

A disposição do Decreto de que previamente à contratação seja providenciada acomprovação prévia de que os serviços pretendidos não podem ser desempenhados pelos próprios servidores do órgão visa garantir que os serviços de consultoria não se constituam em uma mero provimento de força de trabalho para atender as necessidades cotidianas de pessoal no âmbito do órgão executor do projeto.

 

Trata-se, portanto, de uma exigência essencialmente conectada com os princípios da cooperação técnica e a abordagem de “consultoria produto”.

 

Em primeiro lugar, a noção de que um serviço “não pode ser desempenhado” pelos quadros próprios do órgão pode estar relacionada a três aspectos distintos: a)inexistência de competências que são essenciais para os trabalhos; b) falta de disponibilidade de competências para realizar o trabalho (ainda que existam), em virtude de alocação dos servidores (que detêm a competência) a outras atividades prioritárias e; c) necessidade intrínseca do “olhar externo” ao órgão, para execução das atividades e entrega do produto pretendido. Nestas três situações, o órgão executor deve munir-se dos argumentos e evidências suficientes para a contratação pretendida. Uma boa práticaque pode ser extremamente útil é a realização de consultas a um “Banco de Competências” organizado e consolidado pela área de Recursos Humanos, por meio do qual será possível identificar a existência e disponibilidade (ou não) de pessoas no próprio órgão que poderiam realizar os trabalhos. Para motivar a contratação da consultoria com amparo na necessidade de um “olhar externo”, o gestor do projeto deve evidenciar claramente a necessidade da consultoria externa, como um requisito para o trabalho. Assim, por exemplo, é razoável vislumbrar que para conduzir um trabalho de redesenho organizacional, como parte da modernização institucional do órgão, seja requerido um olhar com uma percepção que não esteja enviesada pela cultura organizacional vigente.

 

Em qualquer das hipóteses mencionadas, importa que o gestor do projeto detenha o máximo de informações sobre seu órgão, que subsidiem e sustentem a sua convicção quanto à necessidade da consultoria.

 

3.    Da aplicabilidade da Lei nº 8.666/93

 

                          Ainda segundo o Acórdão acima mencionado, é exigível a aplicação da Lei 8.666/93 aos referidos acordos de cooperação técnica internacional, já que os recursos envolvidos são próprios nacionais. Assim, vejamos:

 

Não se trata aqui, como dito alhures, de discussão acerca da aplicabilidade ou não do estatuto das licitações nas contratações efetuadas pelas agências internacionais de cooperação, porquanto tal tema já foi discorrido amiúde por este Tribunal ao tempo da Decisão 178/2001, Plenário. Na oportunidade, o Tribunal firmou entendimento sobre o assunto ao consignar “que a faculdade prevista no art. 42, § 5º, da Lei nº 8.666/1993 não se aplica às despesas realizadas, em sede de acordo ou projeto de cooperação, com recursos próprios nacionais, ainda que tais recursos sejam previamente repassados a agências oficiais estrangeiras ou organismos financeiros multilaterais”. Isto é, entendeu-se que em projetos de cooperação da espécie é necessária a aplicação do disposto na Lei 8.666, de 21 de junho de 1993[3].

 

                            Com isso, registre-se que, quando da operacionalização do instrumento, os procedimentos não deverão afrontar as disposições da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, conforme reiterada jurisprudência do Tribunal de Contas da União – TCU – a exemplo dos Acórdãos nº 547/2003 - Plenário, 601/2003 - Plenário e 1.514/2003- 2ª Câmara, os quais culminaram no Manual de Convergência das Normas Licitatórias disponibilizado por aquele Tribunal.[4]

 

                        Veja ainda que a legislação exige um determinado perfil do produto a ser entregue pelo consultor contratado no âmbito dos Acordos de Cooperação Técnica Internacional. Mais uma vez deve-se reportar a orientação da Controladoria Geral da União:

 

Assim, um projeto de cooperação técnica internacional deve estar focado no acesso, transferência e geração de conhecimentos e novas tecnologias para que o órgão beneficiário possa melhor cumprir sua missão institucional. O artigo 13 da Portaria 717/2006 - MRE, quando dá margem a que a Administração se valha de projetos de cooperação técnica para aquisição de bens e contratação de serviços, deixa clara a necessidade de vinculação dessas atividades aos termos do documento de projeto e, ainda, quando da impossibilidade de execução pelo próprio órgão ou entidade executora no âmbito de suas atribuições. É mais razoável vislumbrar que a impossibilidade de execução aventada no artigo 13 refere-se à especificidade da ação e não às deficiências estruturais do órgão ou entidade executora nacional.[5]

 

                        E, a respeito das contratações, assim se manifesta a Controladoria Geral da União ao interpretar os atos normativos aplicáveis a espécie.

 

Ao regular o decreto, a portaria não apenas reforçou a necessidade de critérios objetivos, mas também a sua prévia publicação, por meio de um termo de referência que deve estar claramente elaborado, contendo o produto esperadoas etapas para a confecção desse produto e os valores estimados.

 

Com esses normativos, ficam estabelecidos dois marcos importantes: a garantia de competitividade no processo de seleção, necessária à identificação do melhor candidato que atenda aos critérios definidos e a mitigação do risco de possíveis demandas judiciais de candidatos que se sintam prejudicados pelo aparente ou real direcionamento na seleção de determinado(s) consultor(es).

 

Critérios objetivos devem atender a três exigências: a) devem ter relação direta com as competências necessárias para a confecção do produto que se deseja da consultoria; b)devem ser passíveis de comprovação pelo candidato, preferencialmente por prova materiale; c) devem ser avaliados/aferidos em um processo devidamente autuado.

 

Alguns exemplos de critérios são: anos de experiência profissional específica, comprovados por documentos da entidade empregadora; formação acadêmica em áreas desejadas, comprovada por diploma ou certificado, proficiência em idioma - escrita ou oral, comprovada por certificado, diploma ou prova escrita e oral, etc.

 

Além de serem clara e objetivamente definidos, os critérios devem ainda ser classificados de acordo com seus efeitos sobre a avaliação: se eliminatórios (quando não atendidos eliminam automaticamente o candidato) ou classificatórios (resultam em atribuição de uma pontuação para efeito da avaliação final). Devem ainda ser definidas as ponderações (pesos) aplicáveis a cada critério para efeito de avaliação do candidato[6]

 

                        Assim, a entidade pública federal deve levar em conta tais sugestões, elaborando o termo de referência com os produtos esperados, bem como o edital de seleção dos futuros prestadores de serviço, que deve atender aos princípios da Administração Pública.

 

                        Chama a atenção também a preocupação da Controladoria Geral da União a respeito da utilização da entrevista como fase do processo seletivo, procedimento rotineiro nas seleções públicas realizadas através de tais projetos, a saber:

 

À luz desses dispositivos, entende-se que a entrevista pode ser utilizada, mas com alguns cuidados para evitar que seu resultado seja determinante na conclusão do processo seletivo. Como exemplo, cumpre mencionar a Portaria MMA nº 441, de 11 de novembro de 2011, que incorpora esse instrumento de avaliação “Observa-se que a entrevista será realizada quando houver empate entre os candidatos, ou a critério da área demandante”.

 

Ao decidir pelo uso de entrevista, o gestor do projeto deve avaliar qual a relação entre as habilidades que se deseja aferir por meio da entrevista e o produto esperado com a consultoria a ser prestada.

 

Assim, por exemplo, deve estar claramente demonstrada a importância de habilidades de comunicação verbal ou relacionamento interpessoal para a confecção do produto desejado. Nesse exemplo, a forma e conteúdo da entrevista devem garantir a avaliação das referidas características. A entrevista não deve ser conduzida como uma espécie de prova oral para comprovar conhecimentos técnicos, sendo mais adequado para este fim, se necessário, que se utilize a prova escrita.

 

Uma vez identificada a necessidade de aferir habilidades por meio da entrevista, importa adotar alguns cuidados para minimizar a subjetividade do processo, tais como:

 

• Publicar os critérios que serão avaliados por entrevista;

 

• Definir roteiro padrão para a entrevista com todas perguntas a serem formuladas para cada candidato e as notas que serão atribuídas para as possíveis respostas, contemplando questões associadas a cada habilidade que se deseja verificar por meio da reação do entrevistado em suas palavras e comportamento;

 

• Buscar propor situações-problema similares durante a entrevista de cada candidato, evitando situações que possam prejudicar a participação de qualquer candidato em particular e aplicar o roteiro na mesma ordem para todos os candidatos;

 

• Constituir comissão de 3 entrevistadores isentos para realização de cada entrevista, mantendo devidamente autuadas em processo as avaliações individuais dos componentes da comissão para cada candidato;

 

• Após cada entrevista, reservar o tempo para que os avaliadores atribuam suas notas de forma individual em formulário contendo os nomes do avaliador e do avaliado, data e hora da entrevista e valor atribuído para cada tópico ou questão. Para cada nota, justificar resumidamente (em uma sentença) o valor atribuído de forma que possa ser entendido posteriormente por outras pessoas que venham a revisar ou examinar o processo. Adotar como nota final a soma ou média das notas individuais, atribuídas por cada componente da comissão;

 

• Documentar o processo com todas as avaliações realizadas pelos componentes da comissão[7].

 

Como se vê, utilização da entrevista como critério de seleção dos prestadores de serviço no âmbito dos projetos de cooperação técnica internacional deve igualmente observar os princípios da Administração Pública, tais como o da isonomia e da impessoalidade, devendo ser expostos os pontos que serão avaliados, e ainda justificada a necessidade de avaliação de determinadas habilidades verbais dos candidatos.

 

4. Da impossibilidade de contratação de servidores públicos ativos da Administração Pública Direta ou Indireta, bem como de empregados das suas subsidiárias e controladas

 

                        O Decreto 5.151, de 22 de julho de 2004, no seu art. 7º, veda a contratação de servidores públicos da Administração Pública Federal, Estadual, do Distrito Federal ou Municipal, direta ou indireta, bem como de empregados de suas subsidiárias e controladas, no âmbito dos projetos de cooperação técnica internacional.

 

                        Tal entendimento vem ao encontro da vedação prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2013, Lei nº 12.078, de 17 de agosto de 2012, excetuando-se as hipóteses do § 1º, VI e § 3º do art. 18, in verbis:    

 

Art. 18. Não poderão ser destinados recursos para atender a despesas com:  

 

VIII - pagamento, a qualquer título, a agente público da ativa por serviços prestados, inclusive consultoria, assistência técnica ou assemelhados, à conta de quaisquer fontes de recursos;

 

§ 1o Desde que o gasto seja discriminado em categoria de programação específica ou elemento de despesa específico, excluem-se das vedações previstas:  

 

VI - no inciso VIII do caput, o pagamento pela prestação de serviços técnicos profissionais especializados por tempo determinado, quando os contratados se encontrem submetidos a regime de trabalho que comporte o exercício de outra atividade e haja declaração do chefe imediato e do dirigente máximo do órgão de origem da inexistência de incompatibilidade de horários e de comprometimento das atividades atribuídas, desde que:

 

a) esteja previsto em legislação específica; ou

 

b) refira-se à realização de pesquisas e estudos de excelência:

 

1. com recursos repassados às organizações sociais, nos termos dos respectivos contratos de gestão; ou

 

2. realizados por professores universitários na situação prevista na alínea “b” do inciso XVI do art. 37 da Constituição, desde que os projetos de pesquisas e os estudos tenham sido devidamente aprovados pelo dirigente máximo do órgão ou da entidade ao qual esteja vinculado o respectivo professor;

 

§ 2o A contratação de serviços de consultoria, inclusive aquela realizada no âmbito de acordos de cooperação técnica com organismos e entidades internacionais, somente será autorizada para execução de atividades que, comprovadamente, não possam ser desempenhadas por servidores ou empregados da administração pública federal, no âmbito do respectivo órgão ou entidade, publicando-se no Diário Oficial da União, além do extrato do contrato, a justificativa e a autorização da contratação, na qual constarão, necessariamente, a identificação do responsável pela execução do contrato, a descrição completa do objeto do contrato, o quantitativo médio de consultores, o custo total e a especificação dos serviços e o prazo de conclusão.

 

§ 3o A restrição prevista no inciso VIII do caput não se aplica ao servidor que se encontre em licença sem remuneração para tratar de interesse particular.

 

§ 4o O disposto nos incisos VIII e XII do caput aplica-se também aos pagamentos à conta de recursos provenientes de convênios, acordos, ajustes ou instrumentos congêneres, firmados com órgãos ou entidades de direito público.

 

                        Desta forma, é altamente recomendável que a Administração zele para que os editais de seleção dos futuros prestadores de serviço no âmbito dos protocolos de cooperação internacional, contenham expressa vedação de participação de agentes públicos da ativa, ressalvadas as exceções legais.

 

                        Além das cautelas relacionadas à contratação de consultores, há também recomendações da CGU voltadas para a correta entrega e avaliação do produto a ser entregue pelos mesmos:

 

Para mitigar o risco de que o projeto não receba os produtos contratados com a qualidade e nos prazos estabelecidos, as seguintes práticas podem ser consideradas:

 

• Detalhamento no Termo de Referência. Além das características necessárias do produto, das condições mínimas a serem observadas para sua aceitação e consequente pagamento, podem ainda ser consideradas as restrições à aceitação de mera reprodução de conteúdos da internet ou livros de outros autores sem os créditos devidos ou sem que tais conteúdos sejam minimamente tratados/analisados pelo consultor. O Produto deve representar uma efetiva agregação de conhecimento, como reflexo da atuação e qualificação do consultor contratado. Assim,mesmo que o produto reproduza textos de terceiros, deve ficar caracterizada minimamente a análise crítica ou releitura do conteúdo pesquisado.

 

• Garantia de que a execução do contrato esteja sob o acompanhamento contínuo de um membro da equipe com a capacidade técnica necessária e suficiente. Esse acompanhamento deve ocorrer em momentos formalmente definidos e devidamente documentados, nos quais sejam registrados o andamento dos trabalhos e as decisões tomadas.

 

• Estabelecimento de “pontos de controle” dos trabalhos do consultor, com aapresentação de “subprodutos” que permitam ao projeto acompanhar, avaliar e criticar a atuação do consultor, quanto à sua aderência em relação às necessidades do projeto.

 

Esses “momentos” de avaliação podem também ocorrer no formato de seminários nos quais as atividades em andamento recebam a apreciação de pessoas de diferentes áreas ou formações que possam contribuir de forma mais consistente para a efetividade do produto.

 

• Estabelecimento de rito concernente à análise e aceitação do produto, de sorte que a não aceitação deve basear-se no não cumprimento das exigências previamente definidas no termo de referência e envolver quando possível mais de um avaliador, e ser formalizada em pareceres técnicos que apresentem de forma objetiva a justificativa para a não aceitação. Também pode contribuir para o posicionamento do projeto a emissão de parecer do Organismo Internacional envolvido na Cooperação Técnica, tendo em vista sua atribuição de assessoria técnica ao órgão executor nacional.

 

• No caso de contratação de Pessoa Jurídica, adoção de mecanismos de verificação sobre a efetiva atuação da equipe que tenha sido informada pela empresa contratada e previsão de mecanismos para garantir que as substituições de membros da equipe de consultores sejam comunicadas tempestivamente à gestão do projeto[8].

 

                        Além das preocupações acima, recomenda-se ainda à Administração que as despesas previstas no projeto não sejam voltadas para o atendimento de necessidades típicas da Administração.

 

                        Deve-se registrar, por exemplo, a determinação contida no Acórdão do TCU acima narrado, dirigida à Secretaria de Educação Básica do Ministério de Educação, mas que deve servir de orientação às demais entidades públicas federais:

 

9.3. Determinar à Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação que:

 

9.3.1. faça cessar as demandas (expressas em termos de referência, pedidos de compra ou qualquer outro instrumento requisitório) que tenham por objeto o atendimento de necessidades típicas da Administração, a exemplo da produção, impressão e distribuição de material para treinamentos; da organização de eventos, inclusive quanto ao fornecimento de transporte aéreo, hospedagem e alimentação para os participantes; da execução de serviços comuns, como revisão ortográfica e gramatical de textos e serviços gráficos; da aquisição de materiais de expediente e equipamentos de informática, entre outros fornecimentos intermediados pelo PNUD e pela UNESCO na execução dos acordos BRA/03/004 e 914BRA1095;

 

9.3.2. promova, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a adequação da estimativa de recursos dos projetos de cooperação internacional financiados pelo orçamento da União, em especial dos acordos BRA/03/004 e 914BRA1095, requisitando a devolução dos valores já transferidos aos organismos pactuantes mas ainda não utilizados e que seriam destinados a operações que, a exemplo das mencionadas no item anterior, devem ser realizadas pela própria unidade demandante, por se referirem a necessidades administrativas típicas, de fornecimento usual no mercado.

 

9.4. Determinar à Agência Brasileira de Cooperação, do Ministério das Relações Exteriores, que observe os entendimentos firmados no item I, retro, ao celebrar, acompanhar e promover a revisão de projetos de cooperação técnica internacional financiados exclusivamente com recursos orçamentários;

 

                        Neste ponto, é compreensível que os serviços técnicos de consultoria de pessoa física ou jurídica para implementação dos projetos de cooperação técnica internacional sejam realizados exclusivamente na modalidade produto, conforme determina o art. 4º do Decreto nº 5.151/2004.

 

                        Nos termos do § 6º do art. 2º do Decreto nº 5.151/2004, os produtos decorrentes da assessoria técnica ou transferência de conhecimentos deverão estar explicitados no documento do Projeto de Cooperação Técnica Internacional.

 

5.    Das providências complementares

 

                        Como providência complementar, a área responsável deve apresentar pronunciamento, aprovado pela autoridade competente, informando que a ação, objeto do instrumento a ser firmado, está inserida na legislação de regência (Acordos Legais vigentes que amparam a cooperação técnica), bem como que o projeto encontra-se vinculado às prioridades nacionais de desenvolvimento, definidas no PPA ou na LDO (art. 8º da Portaria/MRE nº 717/2006), além de atender às recomendações contidas no Acórdão nº 1.339/2009 – TCU, conforme acima citado. 

 

                        No que concerne à previsão orçamentária e financeira para cobertura da despesa, na forma do art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal, os autos devem ser instruídos com manifestação da área de orçamento e finanças, demonstrando que os recursos serão aplicados em consonância com a Lei Orçamentária, indicando, inclusive, a programação orçamentária com o título do projeto e a indicação de que a ação está prevista no Plano Plurianual, com respectiva declaração do ordenador de despesas.

 

                        Vale alertar que a duração do projeto será de até 05 anos, prorrogável, mediante fundamentação, desde que sua vigência não ultrapasse o total de 10 anos, na forma do art. 11 da Portaria MRE nº 717/2006. Verifica-se, portanto, que tais projetos normalmente ultrapassam o exercício financeiro.

 

                          Vale ainda destacar que, no Parecer nº 01/2012/GT359/DEPCONSU/PGF/AGU, decorrente do projeto institucionalizado no âmbito da Procuradoria-Geral Federal que, por intermédio da Portaria/PGF nº 359, de 27 de abril de 2012, criou Grupo de Trabalho que tem por objetivo promover a discussão das questões jurídicas identificadas, buscando solucioná-las e uniformizar o entendimento a ser seguido pelos Órgãos de Execução da PGF, consta a seguinte orientação:

 

[...] caso a Administração Pública não tenha informado a classificação da ação por tipo e os documentos e estudo previstos no art. 16, inciso I e II, da LRF não tenham sido produzidos e acostados ao processo administrativo, a Consultoria deve condicionar a aprovação da minuta à verificação, pelo ente administrativo, se a ação que ampara a despesa foi classificada como projeto ou atividade na Lei Orçamentária Anual.

 

            Ademais, deve-se atentar que, de acordo com o art. 1º, § único do Decreto nº 5.151/2004, a taxa de administração a ser fixada junto aos organismos internacionais cooperantes fica limitada em até 5% dos recursos aportados pelos projetos a serem implementados.

 

6.    Da Conclusão

 

                        Como visto, o presente trabalho abordou os principais aspectos jurídicos para a celebração de acordos de cooperação técnica internacional entre entidades públicas federais e organismos internacionais, com o objetivo de proporcionar a execução de políticas públicas de forma mais eficiente.

 

                        Considerando-se a existência de repasse de recursos públicos nacionais a tais organismos internacionais, além de inúmeras decisões dos órgãos de controle a respeito da aplicabilidade da Lei nº 8.666/93, existem atos normativos infralegais regulamentando a questão, tais como o Decreto nº 5.151/2004 e Portaria MRE nº 717/2006.

 

                        De acordo com tais normativos, os objetivos dos acordos custeados com recursos públicos nacionais devem restringir-se às hipóteses de transferência de conhecimentos entre as instituições, ou de assistência técnica, tais como as atividades de treinamento ou consultoria, não podendo servir como instrumento para execução de atividades típicas da Administração Pública, nem aquelas consideradas corriqueiras ou comuns, restritas aos servidores públicos da entidade federal envolvida.

 

                        Não por outro motivo, o Decreto nº 5.151/2004 prevê que os serviços técnicos de consultoria de pessoa física ou jurídica para implementação dos projetos de cooperação técnica internacional sejam realizados exclusivamente na modalidade produto.

 

                        A própria contratação dos consultores deve observar os princípios da Administração Pública, de modo a garantir a isonomia e a imparcialidade no processo seletivo, em busca de uma prestação de serviço de qualidade.

 

                        Por fim, constata-se que cabe à entidade federal cooperante, juntamente com o acompanhamento da Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores, atentar para que sejam observados os requisitos legais pelo organismo internacional envolvido, garantindo a transparência na gestão dos recursos públicos, que deve ser dar ainda mediante prestação de contas à sociedade do resultado concreto obtido em termos de política pública.

 

 

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