A Organização dos Estados Americanos


Porwilliammoura- Postado em 27 março 2012

Autores: 
SEGALIN, Gabriele Rigo
SEGALA, Guilherme de Oliveira
A Organização dos Estados Americanos

Gabriele Rigo Segalin e Guilherme de Oliveira Segala

Acadêmicos do Curso de Direito da UFSM


 

 

Sumário: 1. Delimitação do tema. 2. Origens do Sistema Interamericano. 3. Objetivos e Princípios 4. Estrutura Institucional. 5. Perspectivas. 6. Referências Bibliográficas 

  

 

1. - DELIMITAÇÃO DO TEMA

 

O objetivo do presente estudo consiste na análise da Organização dos Estados Americanos (OEA), sendo que, por questões didáticas, entendeu-se conveniente dividir o tema em cinco capítulos.

No primeiro tópico serão abordadas as origens do Sistema Interamericano, desde a sua primeira manifestação, em 1826, com o Congresso do Panamá até o surgimento da OEA, em 13 de dezembro de 1951.

No segundo capítulo será trazido à baila o elenco dos objetivos e princípios elencados na Carta da Organização dos Estados Americanos, nos artigos 2º e 3º, respectivamente, dando especial enfoque à defesa da democracia representativa, à busca pelo desenvolvimento integral e a solução pacífica de controvérsias nos Estados-membros da Organização.

No terceiro capítulo abordar-se-á a estrutura institucional da OEA, enumerando-se os órgãos que a compõe, bem como as atribuições e composição de cada um deles.

No quarto tópico será feita uma análise do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, firmado com o objetivo de preservar a paz entre os Estados americanos; estabelecer mecanismos de cooperação mútua em caso de ataque externo e, ainda, propor soluções pacíficas para o caso de conflitos surgidos no âmbito do continente.

Por fim, no último capítulo, serão trazidas algumas perspectivas, considerando as atividades desenvolvidas pela Organização ao longo de sua existência, bem como analisando sua eficácia na busca dos objetivos a que se propõe.

 

2.- ORIGENS DO SISTEMA INTERAMERICANO

2.1.DO CONGRESSO DO PANAMÁ À NONA CONFERÊNCIA INTERNACIONAL AMERICANA

Antes do abordar-se a respeito do surgimento da Organização dos Estados Americanos (OEA), necessário se faz tecer alguns comentários acerca das origens da integração interamericana, a qual ocorreu a partir do final do século XIX.

Com efeito, muito antes da criação da OEA, verificou-se no continente americano um movimento objetivando a integração dos países nas mais diversas áreas, tais como segurança coletiva, cooperação econômica, relações políticas e questões culturais e ideológicas.

A primeira manifestação da integração intercontinental verificou-se durante o governo de Simón Bolivar. Em 15 de julho de 1826, realizou-se o Congresso do Panamá objetivando a criação de uma confederação entre os Estados americanos para que pudessem sustentar a recente independência conquistada, bem como para a manutenção da paz entres os países criados.

Neste Congresso compareceram apenas representantes da América Latina, sendo assinado o Tratado de União, Liga e Confederação Perpétua, o qual estabeleceu regras a respeito da defesa e assistência recíprocas entre as nações americanas, porém não chegou a entrar em vigor.

Por outro lado, na América do Norte, o ideal de integração manifestou-se pela primeira vez em 1823, quando o presidente norte-americano lançou uma declaração unilateral que ficou conhecida como a Doutrina Monroe, visando garantir a independência do país. Mais tarde, contudo, tal instrumento veio a ser utilizado como instrumento para justificar a intervenção dos Estados Unidos nos países da América Central nas primeiras décadas do século XX.

Porém, foi somente em 1889, com a Primeira Conferência Internacional Americana, realizada em Washington, que se pode falar no surgimento de um verdadeiro Sistema Interamericano. De fato, esta foi a primeira vez que os países da região se reuniram na busca de um ideário comum, qual seja, a de que o continente americano se tornasse pacífico e buscasse um maior desenvolvimento.

Nessa reunião foram discutidos temas como a busca de meios pacíficos para a solução de controvérsias e a cooperação econômica entre os Estados americanos. Em suma, fixou-se nessa ocasião as bases do pan-americanismo, ou seja, as metas que até hoje são buscadas pelos Estados-membros da OEA.

Posteriormente, foram realizadas mais sete Conferências — a Segunda Conferência, no México, em 1901; a Terceira Conferência, no Rio de Janeiro, no ano de 1906; a Quarta Conferência, em Buenos Aires, em 1910; a Quinta Conferência, em Santiago do Chile em 1913; a Sexta Conferência, em Havana, em 1928 e a Oitava Conferência, em Lima, em 1938.

Cabe ressaltar que nesta última foi prevista a convocação de Reuniões Extraordinárias dos Ministros das Relações Exteriores em razão da iminência de uma guerra mundial para que, em caso de ataques estrangeiros, a resposta fosse uma ação coletiva e solidária de todos os Estados americanos.

A mais relevante destas Reuniões ocorreu em 1945, no México e recebeu o nome de Conferência Interamericana sobre Problemas da Guerra e da Paz, na qual foi confeccionada a Ata de Chapultepec. Nessa reunião objetivou-se a reorganização, consolidação e fortalecimento do Sistema Interamericano no pós-guerra.

Finalmente, em 1948, ocorre a criação da OEA, na NonaConferência Internacional Americana, realizada na cidade de Bogotá, da qual participaram 21 países americanos[1], tendo como escopo readequar o Sistema Interamericano à criação da Organização das Nações Unidas (ONU), ocorrida em 25 de junho de 1945.

Na ocasião, foram adotados os seguintes documentos: a Carta da Organização dos Estados Americanos (Carta de Bogotá); o Pacto de Bogotá e a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, que entraram em vigor em 13 de dezembro de 1951. Vale lembrar que a Carta da OEA foi introduzida em nosso ordenamento jurídico pelo Decreto nº 30.544, de 14 de fevereiro de 1952.

 

2.2. AS ALTERAÇÕES NA CARTA DA OEA

Desde sua entrada em vigor até hoje, a Carta da OEA sofreu quatro alterações — em 1967 (Protocolo de Buenos Aires); em 1985 (Protocolo de Cartagena de Índias); em 1992 (Protocolo de Washington) e em 1993 (Protocolo de Manágua).

A primeira reforma alterou a estrutura organizacional da OEA; a segunda ampliou a competência do Conselho Permanente e do Secretário-geral; a terceira trouxe mecanismos de proteção da democracia representativa e a última elaborou regras a respeito do desenvolvimento integral da região.

Oportuno ressaltar que nem todas as alterações foram ratificadas por todos os países-membros, pois isso temos hoje várias cartas em vigor[2].

 

3.- OBJETIVOS E PRINCÍPIOS

3.1. OBJETIVOS

A Organização dos Estados Americanos abarcou objetivos muito amplos, que abrangem setores bastante diversos, tais como cultural, econômico, jurídico e social.

Contudo, um dos propósitos primordiais da OEA é, sem dúvida, a busca pela paz e justiça no continente, implementando-se a solidariedade, a colaboração e a defesa da soberania dos países americanos, bem como sua integridade territorial e independência, conforme dispõe o artigo 1º da Carta de Bogotá.

Estes objetivos estão elencados no artigo 2º da Carta, verbis:

 

“Para realizar os princípios em que se baseia e para cumprir com suas obrigações regionais, de acordo com a Carta das Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos estabelece como propósitos essenciais os seguintes:

a.Garantir a paz e a segurança continentais;

b.Promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da não-intervenção;

c.Prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica das controvérsias que surjam entre seus membros;

d.Organizar a ação solidária destes em caso de agressão;

e.Procurar a solução dos problemas políticos, jurídicos e econômicos que surgirem entre os Estados membros;

f.Promover, por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e cultural;

g.Erradicar a pobreza crítica, que constitui um obstáculo ao pleno desenvolvimento democrático dos povos do Hemisfério; e

h.Alcançar uma efetiva limitação de armamentos convencionais que permita dedicar a maior soma de recursos ao desenvolvimento econômico-social dos Estados membros”.

 

Tendo em vista sua relevância, contudo, far-se-á uma análise mais apurada de três destes objetivos, quais sejam, a defesa da democracia representativa nos Estados-membros, a busca pelo desenvolvimento integral e a solução pacífica dos conflitos.

 

3.1.1. DEMOCRACIA REPRESENTATIVA

Primeiramente, é importante conceituar o Regime Democrático Representativo, o qual foi estabelecido a partir da Quinta Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores em Santiago no Chile, em 1959.

De acordo com o entendimento firmado naquela ocasião, as características deste regime são as seguintes:

 

* Independência dos poderes e fiscalização dos atos do Governo;

* Eleições livres;

* Exercício do poder com prazo determinado;

* Regime de liberdade individual e respeito aos direitos humanos;

* Liberdade de expressão e informação;

* Cooperação entre os Estados Americanos.

 

A democracia representativa é prevista pela Carta de Bogotá no artigo 3º, "d", sendo um de seus objetivos essenciais. Porém, a democracia representativa nem sempre foi uma realidade no continente americano, como ocorreu, verbia grantia, durante as sangrentas ditaduras vividas na América Latina nas décadas  de 60 a 80, o que importou em evidente inobservância de um dos objetivos propostos pela aludida Carta.

Assim, foi somente nos anos 90 que a OEA buscou instrumentos jurídicos e institucionais adequados para garantir a democracia, criando pela primeira vez a possibilidade de aplicação de sanções aos Estados-membros, pela interrupção democrática, sem que isso fosse considerado uma violação ao princípio da não-intervenção.

Em Santiago do Chile, no ano de 1991, foram adotadas duas resoluções de suma importância — o Compromisso de Santiago com a Democracia, que reafirmou a necessidade de defender e promover a democracia representativa e a Resolução nº 1.080, que autorizou a criação de mecanismos regionais no caso de rompimento do regime democrático de um Estado-membro.

Na Resolução nº 1.080 fica claro o papel da OEA quanto à possibilidade de convocação imediata do Conselho Permanente da Organização a fim de examinar a situação, decidir e convocar uma reunião de Ministros das Relações Exteriores nos casos de interrupção irregular de processo político institucional democrático ou interrupção do legítimo exercício do poder de um governo democraticamente eleito.

Após essa ocasião, teve início um processo destinado a sanar algumas falhas presentes na Carta da OEA, que culminou com a elaboração do Protocolo de Washington, em 1992, o qual entrou em vigor em 1997, embora seja um tratado que somente obriga os países que o ratificaram. De forma geral, esse protocolo determina a suspensão ao Estado-membro do direito de participar das atividades da OEA, conforme dispõe o art. 9º:

 

"Um membro da Organização, cujo governo democraticamente constituído seja deposto pela força, poderá ser suspenso do exercício do direito de participação nas sessões da Assembléia-geral, da Reunião de Consulta, dos Conselhos da Organização e das Conferências Especializadas, bem como das comissões, grupos de trabalho e demais órgãos que tenham sido criados".

 

Cabe salientar, por oportuno, o aparente conflito entre o art. 9º da Carta de Bogotá e a Resolução nº 1.080, uma vez que ambos os instrumentos prevêem a possibilidade de sanção aos Estados em caso de descumprimento do objetivo em comento.

Na verdade, como mencionado, não existe divergência entre os dispositivos, eis que a Resolução nº 1.080 é mais ampla na aplicação das penalidades possíveis. Tratam-se, pois, de disposições que, embora de hierarquia e natureza jurídica diferentes, são perfeitamente compatíveis e complementares[3].

De outra banda, após intensas negociações, adotou-se em Lima, durante sessão extraordinária da Assembléia-geral da OEA, a Carta Democrática Interamericana, que define situações nas quais é possível o funcionamento da Organização para preservar a democracia de um Estado-membro, seja fazendo visitas aos países, seja prestando assistência para o fortalecimento e preservação da democracia.

Diante disso, resta claro que hoje todos Estados Americanos estão comprometidos com a defesa da democracia representativa, aceitando que a defesa seja feita por mecanismos regionais, sem que isso implique em violação ao princípio da não-intervenção.

 

3.1.2. DESENVOLVIMENTO INTEGRAL

Outro objetivo elencado na Carta da OEA consiste na busca pelo desenvolvimento integral da região. Com efeito, desde seu surgimento, a Organização busca estreitar os vínculos econômicos entre os Estados-membros, visando seu desenvolvimento.

Contudo, apesar de a Organização sempre ter tido papel importante no campo da cooperação para o desenvolvimento, a criação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e os recursos de outras instituições mundiais e sub-regionais, fizeram com que seu papel diminuísse nesse campo.

Em 1958, o presidente brasileiro Juscelino Kubitschek lançou a Operação Pan-americana, pretendendo lutar contra o subdesenvolvimento na região, com ações conjuntas dos Estados-membros. O aceleramento do desenvolvimento econômico, individual e coletivo destes países foi alcançado com a adoção do Convênio Constitutivo do BID, que destinava capital próprio e obtinha recursos captados no mercado financeiro.

Essas ações, entretanto, não trouxeram resultados concretos de desenvolvimento para os Estados, mas consolidaram o conceito de desenvolvimento integral, que foi incorporado à Carta da OEA em 1985, pelo Protocolo de Reformas de Cartagena de Índias.

Posteriormente, em 1993, visando dar maior efetividade à persecução desde objetivo, foi elaborado o Protocolo de Manágua, que alterou a estrutura institucional da OEA, introduzindo o Conselho Interamericano para o Desenvolvimento Integral, substituindo os anteriores Conselhos Interamericanos Econômico e Social e para a Educação, a Ciência e a Cultura.

 

3.1.3. SOLUÇÃO PACÍFICA DE CONFLITOS

Desde a sua criação, a OEA se preocupa com a solução de conflitos de forma pacífica. De fato, o artigo 3º da Carta de Bogotá, estipula que os conflitos entre dois ou mais Estados Americanos devem ser resolvidos de maneira pacífica. Já o artigo 27 do mesmo diploma indica que os meios adequados para tal mister serão objeto de um tratado especial, qual seja, o Tratado Americano de Soluções Conflitos Pacíficos – Pacto de Bogotá, delegando a este a atribuição de definir as medidas coercitivas em caso de ameaça à paz na região[4].

O Pacto de Bogotá elaborado quando da criação da OEA e está em vigor desde 13 de dezembro de 1951, sendo ratificado por apenas quatorze Estados americanos. O Pacto em comento traz um rol completo dos meios de solução pacífica de conflitos, definindo, inclusive, suas regras processuais, mas somente obriga os países que o ratificaram. Os procedimentos previstos são os bons ofícios, a mediação, a investigação e conciliação, o procedimento judicial e a arbitragem.

No entanto, o Pacto de Bogotá foi raras vezes invocado, em razão do diminuto quorum de Estados formadores e, outrossim, porque muitos conflitos que deveriam ter seguido suas disposições foram encaminhados para a solução pelo Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (Tiar), por ser este mais flexível e de fácil execução.

O Tiar, elaborado durante a Conferência Interamericana para a Manutenção da Paz e da Segurança no Continente, realizado em 1947, na cidade do Rio de Janeiro, não só mereceu um número maior de ratificações —23 Estados — como previu modalidades de ação conjunta e efetiva entre os Estados participantes.

Existem três hipóteses em que o Tiar é invocável, sendo duas delas referentes à conflitos envolvendo Estado(s) americano(s) e Estado(s) alienígena(s), consoante os artigos 3º e 6º do diploma; e uma relativa a conflitos entre dois ou mais estados do continente, conforme o artigo 7º.

O Tratado Interamericano de Assistência Recíproca já foi aplicado diversas vezes e com bastante freqüência até 1982, sendo novamente invocado em face dos ataques terroristas ocorridos em 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos.

 

3.2. PRINCÍPIOS

Além dos objetivos analisados no tópico anterior, a Carta da OEA elenca os princípios que devem reger a Organização para alcançar esses propósitos. Tais princípios encontram-se previstos no artigo 3º da Carta, verbis:

 

“Os Estados americanos reafirmam os seguintes princípios:

a.O direito internacional é a norma de conduta dos Estados em suas relações recíprocas;

b.A ordem internacional é constituída essencialmente pelo respeito à personalidade, soberania e independência dos Estados e pelo cumprimento fiel das obrigações emanadas dos tratados e de outras fontes do direito internacional;

c.A boa-fé deve reger as relações dos Estados entre si;

d.A solidariedade dos Estados americanos e os altos fins a que ela visa requerem a organização política dos mesmos, com base no exercício efetivo da democracia representativa;

e.Todo Estado tem o direito de escolher, sem ingerências externas, seu sistema político, econômico e social, bem como de organizar-se da maneira que mais lhe convenha, e tem o dever de não intervir nos assuntos de outro Estado. Sujeitos ao acima disposto, os Estados americanos cooperarão amplamente entre si, independentemente da natureza de seus sistemas políticos, econômicos e sociais;

f.A eliminação da pobreza crítica é parte essencial da promoção e consolidação da democracia representativa e constitui responsabilidade comum e compartilhada dos Estados americanos;

g.Os Estados americanos condenam a guerra de agressão: a vitória não dá direitos;

h.A agressão a um Estado americano constitui uma agressão a todos os demais Estados americanos;

i.As controvérsias de caráter internacional, que surgirem entre dois ou mais Estados americanos, deverão ser resolvidas por meio de processos pacíficos;

j.A justiça e a segurança sociais são bases de uma paz duradoura;

k.A cooperação econômica é essencial para o bem-estar e para a prosperidade comuns dos povos do Continente;

l.Os Estados americanos proclamam os direitos fundamentais da pessoa humana, sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo;

m.A unidade espiritual do Continente baseia-se no respeito à personalidade cultural dos países americanos e exige a sua estreita colaboração para as altas finalidades da cultura humana;

n.A educação dos povos deve orientar-se para a justiça, a liberdade e a paz.

 

4.- ESTRUTURA INSTITUCIONAL

4.1.OS MEMBROS DA OEA

A OEA é uma organização internacional governamental de alcance regional[5], criada por um ato internacional, sendo, pois, sujeito do direito internacional.

Como referido anteriormente, 21 países participaram da elaboração da Carta da OEA, sendo que os demais Estados puderam ingressar na Organização após seguirem o rito previsto nos artigos 6º e 7º da Carta.

De acordo com os dispositivos, o país interessado deverá enviar uma nota dirigida ao Secretário-Geral da Organização, declarando que está disposto a aceitar todas as obrigações inerentes à condição de membro, em especial as referentes à segurança coletiva. Depois disso, a Assembléia-geral, após recomendação do Conselho Permanente, determinará se é possível a admissão do Estado solicitante, o que requer a aprovação de dois terços dos Estados-membros.

Cumpre ressaltar que, hodiernamente, todos os 35 Estados americanos compõe a OEA, pois todos eles ratificaram a Carta de Bogotá.

Além disso, de acordo com o já citado artigo 9º da Carta, todos os Estados-membros são juridicamente iguais, exercendo os mesmos direitos e deveres, o que denota que a experiência americana pôs em condições de igualdade jurídica todos os países que integram a OEA, diferentemente do que ocorre com outros organismos internacionais que não prevêem essa democratização.

Ademais, faz-se necessário esclarecer a situação de Cuba perante a Organização. Ao contrário do que se possa supor, o país continua sendo membro da OEA, mas o governo cubano foi excluído das atividades de todo o Sistema Interamericano por uma disposição do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (Tiar). O afastamento de sua participação ocorreu em virtude de sua identificação com o regime comunista, o qual se mostra incompatível com os princípios e objetivos do pan-americanismo.

De outra banda, é lícito, ainda, que um país requeira a sua retirada da Organização, sendo este procedimento previsto no artigo 143 da Carta da OEA, o qual trata da denúncia por qualquer de seus integrantes[6], o que até hoje não se verificou, nem mesmo na situação de Cuba.

Ademais, é permitida a participação de Estados extra-regionais e outras organizações internacionais nas atividades desenvolvidas pela OEA, sendo que os primeiros podem colaborar na condição de observadores permanentes, devendo sua inclusão ser aprovada pelo Conselho Permanente da OEA. Hoje, quase cinqüenta Estados gozam dessa prerrogativa.

 

4.2.OS ÓRGÃOS

Ab initio, cumpre observar que neste tópico nos limitaremos a expor a atual estrutura organizacional da OEA, a qual entrou em vigor a partir das profundas modificações introduzidas pelo Protocolo de Buenos Aires, em 1967 e, posteriormente, pelas alterações verificadas com o Protocolo de Manágua, em 1993.

 

4.2.1.A ASSEMBLÉIA-GERAL

É o órgão máximo da Organização, composto por representantes de todos os Estados-membros, na pessoa do Ministro das Relações Exteriores, sendo que cada país tem direito a um voto nas decisões a serem tomadas.

A Assembléia-geral reúne-se anualmente e cada sessão é realizada em um Estado diferente (no último ano, em 2003, foi realizada em Santiago do Chile). Além disso, são previstas sessões extraordinárias para solução de problemas específicos, como ocorreu em 2002, data do mais recente período extraordinário, que foi convocado em razão da situação política vivida pela Venezuela naquela oportunidade.

As atribuições do órgão estão previstas no art. 54 da Carta da OEA e abarcam questões acerca da política geral da OEA, orçamento, bem como estrutura e funcionamento dos demais órgãos que a compõe.

As decisões no âmbito da Assembléia-geral são tomadas pela maioria absoluta dos votos dos Estados-membros, exceto quando a Carta ou a própria Assembléia determine que a aprovação conte com dois terços de votos afirmativos, como ocorre, por exemplo, quanto às decisões sobre assuntos orçamentários.

Essas decisões podem ser resoluções recomendatórias, quando dirigidas aos Estados-membros ou resoluções obrigatórias, quando destinadas aos órgãos da OEA, tendo em vista que estes estão subordinados ao órgão supremo, devendo acatar suas decisões.

 

4.2.2.A REUNIÃO DE CONSULTA DE MINISTROS DAS RELAÇÕES EXTERIORES

Este órgão somente é convocado em hipóteses excepcionais e que coloquem em risco a paz continental. Funciona também como órgão de consulta no âmbito do Tiar ou no contexto da Carta da OEA, como ocorreu no dia 21 de setembro de 2001, após os ataques terroristas ocorridos nos Estados Unidos.

Quando surgirem problemas envolvendo colaboração militar ou problemas relacionados com a defesa contra uma agressão sofrida por qualquer país-membro, o órgão utilizar-se-á de uma Comissão Consultiva de Defesa, formada pelas mais altas autoridades militares dos Estados americanos que participem da Reunião de Consulta.

 

4.2.3.O CONSELHO PERMANENTE

De acordo com o art. 84 da Carta da OEA, o Conselho Permanente é o órgão responsável por velar pela manutenção das relações de amizade entre os Estados-membros e ajudá-los de maneira efetiva na solução pacífica de controvérsias.

Formado por um representante de cada Estado com a categoria de embaixador, o Conselho Permanente será presidido de forma rotativa, conforme a ordem alfabética em espanhol dos nomes dos países-membros. O mandato é exercido por um período máximo de seis meses.

O Conselho tem duas sessões ordinárias por mês, as quais são públicas e podem ser captadas na internet através do site da OEA.

Tendo em vista a amplitude de suas atribuições, poderá instituir comissões ad hoc, como a comissão permanente para os assuntos relacionados com a segurança hemisférica, criada em virtude dos possíveis ataques estrangeiros contra a região.

O Conselho atua, outrossim, como comissão preparatória da Assembléia-geral, sendo responsável pela elaboração dos temas a serem discutidos na sessão seguinte. São realizadas duas sessões ordinárias por mês.

 

4.2.4.CONSELHO INTERAMERICANO PARA O DESENVOLVIMENTO INTEGRAL

 Este órgão foi recentemente criado pelo Protocolo de Manágua, em substituição aos Conselhos Interamericanos Econômico e Social e de Educação, Ciência e Cultura, tendo sido concebido para promover a cooperação entre os Estados americanos, mormente no que diz respeito ao desenvolvimento integral da região, o que contribui para a eliminação da pobreza crítica. Para tanto, deverá reunir-se ao menos uma vez por ano.

 

4.2.5.SECRETARIA-GERAL

 A primeira expressão da Secretaria-geral surgiu na Primeira Conferência Internacional Americana como União Internacional das Repúblicas Americanas. Já na Segunda Conferência, contudo, o órgão mudou de nome, passando a ser chamado de Escritório Internacional das Repúblicas Americanas. Na Quarta Conferência, alterou-se novamente a designação para União Pan-americana. Somente com o advento do Protocolo de Buenos Aires o órgão passou a ser chamado de Secretaria-geral.

É o órgão central e permanente da OEA, no qual trabalham funcionários dos diferentes Estados-membros e tem como sede a cidade de Washington.

De acordo com o art. 111 da Carta de Bogotá, tem a função de promover as relações econômicas sociais, jurídicas, educacionais e científicas e culturais entre os Estados da região. Além disso, é depositária dos tratados e acordos celebrados no âmbito do continente.

À frente do órgão está o Secretário-geral, o qual é eleito pela Assembléia-geral para um mandato de cinco anos, podendo ser reeleito uma só vez e sendo vedada sua sucessão por pessoa de mesma nacionalidade.

O mesmo vale para o Secretário-geral Adjunto, o qual desempenha as funções do primeiro em caso de impedimento ou ausência temporária. O Secretário-geral Adjunto é também secretário do Conselho Permanente, nos termos do artigo 115 da Carta.

O Secretário-geral e o Secretário-geral Adjunto deverão, necessariamente, ter nacionalidades distintas, sendo eleitos em diferentes sessões da Assembléia-geral, a fim de se evitar a vacância dos cargos em caso de falecimento ou renúncia.

 

4.2.6.COMISSÃO JURÍDICA INTERAMERICANA

 É o órgão responsável pela promoção do desenvolvimento do direito internacional, mormente o direito interamericano, incluindo sua codificação. Ademais, realiza estudos para solucionar os problemas jurídicos relativos à integração dos países americanos, buscando uniformizar as legislações quando for possível e conveniente. É, portanto, um órgão de consulta para assuntos jurídicos da OEA.

A Comissão é composta por onze juristas de diferentes nacionalidades, não podendo haver mais do que um de cada país-membro, os quais são eleitos levando-se em conta uma rotatividade eqüitativa, por um período de quatro anos, não havendo limites quanto à reeleição. Tem sede no Rio de Janeiro, onde se realizam duas sessões por ano.

 

4.2.7.COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS[7]

 É um órgão consultivo que visa a proteção dos direitos humanos no âmbito continental, colocando à disposição dos Estados-membros a Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica. Neste instrumento está delineada sua composição — sete membros oriundos dos diversos países da região, eleitos pela Assembléia-geral para um mandato de quatro anos, podendo ser reeleitos uma única vez.

Sua sede encontra-se na cidade de São José da Costa Rica.

Vale lembrar que a Corte Interamericana de Direitos Humanos não faz parte da Organização dos Estados Americanos, mas sim, da supracitada Convenção, razão pela qual foge do alcance que se pretende dar a esse estudo.

 

4.2.8.CONFERÊNCIAS ESPECIALIZADAS

 As Conferências Especializadas são, em verdade, reuniões em que comparecem os representantes dos países-membros e destinam-se a "tratar de assuntos técnicos especiais ou a desenvolver aspectos específicos da cooperação interamericana" (artigo 112 da Carta da OEA).

Como exemplo dessas Conferências podemos citar o Comitê Interamericano contra o Terrorismo (Cicte).

 

4.2.9.OS ORGANISMOS ESPECIALIZADOS

 São instituições especializadas em determinados assuntos, visando, assim, uma atuação mais eficiente da Organização, sendo estabelecidos por acordos multilaterais entre os Estados do continente e gozam de autonomia técnica, já que podem estabelecer relações com outros organismos internacionais de caráter análogo.

São eles: Organização Pan-americana da Saúde; Instituto Interamericano da Criança; Comissão Interamericana de Mulheres; Instituto Pan-americano de Geografia e História; Instituto Indigenista Interamericano e Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura.

Recentemente, a Assembléia-geral criou duas comissões que também são organismos especializados — a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas (Cicad) e a Comissão Interamericana de Telecomunicações (Citel).

 

4. - PERSPECTIVAS

 Cumpre observar, por fim, que inobstante tenha sido de grande valia a criação da Organização dos Estados Americanos como mecanismo para proporcionar a integração entre os países da região, é forçoso reconhecer que muito pouco foi feito nesses mais de cinqüenta anos de existência.

De fato, a OEA foi instituída visando atingir objetivos por demais amplos, incluindo, dentre outros, assegurar a segurança coletiva, a manutenção da paz, a defesa da democracia representativa, a cooperação econômica e o desenvolvimento integral do continente, incluindo a erradicação da pobreza crítica, o que constitui verdadeiro óbice para a consecução de seus propósitos.

Deve-se ressaltar, ainda, que a atuação da OEA sempre esteve condicionada aos interesses dos países mais poderosos do continente, mormete dos Estados Unidos, como se pode concluir diante sua omissão em face da suspensão de Cuba junto ao Sistema Interamericano, verificada em 1962, bem como das ditaduras militares na América Latina durante os anos de 1960 a 1980.

Como se não bastasse, há que se considerar que a simples enumeração dos objetivos a que se propõe a Organização não tem o condão de ensejar a sua aplicação na prática, pois para tanto, seria necessário que fossem previstos mecanismos jurídicos que permitissem sua pronta execução.

Porém, em que pesem essas inúmeras dificuldades enfrentadas pela Organização, devemos acreditar que sua permanência como instrumento para fomentar a integração entre as nações do continente não só é possível como necessária, pois certamente a manutenção da OEA ainda é a maneira mais viável para a promoção do ideário defendido por Simón Bolivar em fins do século XIX.  

 

 5. - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 ACCIOLY, Hildebrando e SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Manual de Direito Internacional Público. 14ª ed. — São Paulo: Saraiva, 2000;

ARRIGHI, Jean Michel. Organização dos Estados Americanos. São Paulo: Manoele, 2004;

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 2º volume. 11ª ed. — Rio de Janeiro: Renovar, 1997;

REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 7ª ed. rev. — São Paulo: Saraiva, 1998;

SEITENFUS, Ricardo. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003;

__________. Textos fundamentais do Direito das Relações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002;

___________ e VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. 3ª ed. rev. ampl. — Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003;

http:// www.oas.org

http:// www.mre.gov.br

 

NOTAS DE FIM

[1] Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, República Dominicana, Equador, El Salvador, Estados Unidos, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela.

[2] De acordo com os artigos 140 e 142 da Carta da OEA, as reformas empreendidas no documento somente entrarão em vigor quando dois terços dos Estados-membros as ratificarem, sendo que somente obrigam os países que completaram o processo de ratificação.

[3] ARRIGHI, Jean Michel. Organização dos Estados Americanos. São Paulo: Manoele, 2004.

[4] Cabe ressaltar essa é uma particularidade da OEA, a qual não é verificada em outras organizações internacionais. No entanto, consoante salientam Seitenfus e Ventura (in Introdução ao Direito Internacional Público. 3ª ed. rev. ampl. — Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, pág. 95), "estes Tratados especiais são documentos formalizadores de alianças militares defensivas e não podem ser assimilados a tratados constitutivos de uma organização internacional de caráter regional. Em conseqüência, do ponto de vista jurídico, não se configura na OEA o traço coercitivo ou de ingerência que se tenta identificar nas organizações internacionais".

[5] "Uma organização possui caráter regional quando possuir restrições no que se refere ao caráter geográfico, cultural, econômico ou outro” (REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 7ª ed. rev. — São Paulo: Saraiva, 1998) (Grifamos).

[6] Art. 143 - Esta Carta vigorará indefinidamente, mas poderá ser denunciada por qualquer dos Estados membros, mediante uma notificação escrita à Secretaria-Geral, a qual comunicará em cada caso a todos os outros Estados as notificações de denúncia que receber. Transcorridos dois anos a partir da data em que a Secretaria-Geral receber uma notificação de denúncia, a presente Carta cessará seus efeitos em relação ao dito Estado denunciante e este ficará desligado da Organização, depois de ter cumprido as obrigações oriundas da presente Carta.

[7] A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, além de ser um órgão integrante da estrutura da OEA, também é órgão da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Esta Convenção foi elaborada durante a Conferência Especializada Americana sobre Direitos Humanos, realizada em 1969, na cidade de San José da Costa Rica e entrou em vigor no ano de 1978.