O Ministério Público e o CADE em defesa da Ordem Econômica na Lei 12.529/11


Porbarbara_montibeller- Postado em 20 junho 2012

Autores: 
BELIZARIO, Deryck Miranda.

Resumo: O artigo aborda como o Ministério Público em parceria com o CADE atua na defesa da ordem econômica, mais especificamente de acordo com a lei 12.529/11. Neste artigo será estudado a relação entre MPF e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), coibindo os crimes contra a ordem econômica.

Palavras Chave: Ministério Público Federal. CADE. Ordem Econômica. Lei 12.529/11.


1.      Introdução

1.1  Lei 8.884/94 e Lei 12.529/11 no que diz respeito ao MPF

            No dia 30 de maio de 2012 entrou em vigor a lei 12.529 de 30 de novembro de 2011 que instituiu o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e dispôs sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica.

            Esta nova lei criou o chamado “Super Cade”, lhe conferindo demais poderes não conferidos pela antiga Lei 8.884/94 revogada expressamente pela 12.529/11.

            Contudo, o objeto do presente artigo se resume a atuação do Ministério Público Federal juntamente ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) na defesa da ordem econômica. Se não fosse a retirada do parágrafo único do artigo 12 da lei 8.884/94, a parte que trata do Ministério Público Federal perante o CADE ficaria quase que inalterada, porém o referido parágrafo foi retirado da atual legislação.

            Importante transcrever como era e como ficou:

Art. 12 da lei 8.884/94: O Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior, designará membro do Ministério Público Federal para, nesta qualidade, oficiar nos processos sujeitos à apreciação do CADE.

Parágrafo único: O CADE poderá requerer ao Ministério Público Federal que promova a execução de seus julgados ou do compromisso de cessação, bem como a adoção de medidas judiciais, no exercício da atribuição estabelecida pela alínea b do inciso XIV do art. 6º da Lei Complementar n. 75, de 26 de maio de 1993.

                Com a lei 12.529/11, assim ficou a redação conferida ao MPF perante o CADE:

            Art. 20: O Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior,             designará membro do Ministério Público Federal para, nesta qualidade, emitir       parecer, nos processos administrativos para imposição de sanções    administrativas por infrações à ordem econômica, de ofício ou a         requerimento do Conselheiro-Relator.

                Percebe-se que com relação ao MPF quase nada mudou, vez que o sentido das palavras “oficiar” e “emitir parecer” é o mesmo, pois objetivam a mesma coisa, qual seja a participação do MPF no processo. A retirada do parágrafo único não significou muita coisa, uma vez que dispõe o art. 9º, XVIII da nova lei que, compete ao plenário do tribunal administrativo de defesa econômica do CADE “requisitar informações de quaisquer pessoas, órgãos, autoridades e entidades públicas ou privadas, respeitando e mantendo o sigilo legal quando for o caso, bem como determinar as diligências que se fizerem necessárias ao exercício das suas funções”.

            Importante destacar que as palavras requisitar eprincipalmente determinar devem aqui ser vistas com um olhar crítico, pois o MP possui independência e autonomia funcional, não estando adstrito a nenhuma requisição e muito menos determinação de órgãos administrativos como o CADE.

2.      A legitimidade do Ministério Público na defesa da ordem econômica

            A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prescreve em seu artigo 127 que incumbe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, e sem dúvida a ordem econômica é de suma importância para a sociedade, sendo interesse social. Tal entendimento é também o da Lei 12.529/11 que estabelece no parágrafo único do art. 1º que a coletividade é a titular dos bens jurídicos protegidos por esta lei.

            “A coletividade tal como colocada no art. 1° daquele diploma legal denota a existência de um interesse geral que transcende os limites das estruturas do mercado, comum na tutela antitruste, abrangendo agentes econômicos de diferentes portes: consumidores, trabalhadores, população do entorno dos estabelecimentos empresariais e toda a sociedade” (FREIRE, Marusa Vasconcelos. A atuação do MPF junto ao CADE, in Revista de Direito Econômico, V. 24, Brasília, 1996, p. 118).            Prescreve ainda a CF/88 que compete ao MP “exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas” (art. 129, IX).

            A Lei Complementar 75/93 preceitua que o Ministério Público da União é a instituição incumbida da defesa da ordem jurídica, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis (art. 1°) e possui dentre outras funções institucionais a de zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos à ordem econômica (art. 5°, II, c), competindo-lhe, para isso, promover ações necessárias ao exercício das suas funções institucionais, especialmente quanto à ordem econômica e financeira (art. 6°, XIV, b).

            Diante do exposto, fica cabalmente demonstrada a legitimidade do Ministério Público para intervir nos procedimentos sujeitos à apreciação do CADE, pois neles funciona como defensor da coletividade, titular dos bens jurídicos protegidos pela lei 12.529/11, bem como custos legis, por expressa previsão de aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (art. 115 da lei 12.529/11).

3.      A atuação do MPF junto ao CADE nos ditames da Lei 12.529/11

            Como já dito no item 1.1, a lei 12.529/11 disciplinou a atuação do MPF no artigo 20, disciplinando que terá membro designado pelo Procurador-Geral da República depois de ouvido o Conselho Superior do órgão ministerial, para emitir parecer, de ofício ou a requerimento do Conselheiro-Relator do CADE, nos processos administrativos para imposição de sanções administrativas por infrações a ordem econômica.

            Portanto, tem-se como novidade trazida pela legislação acima mencionada que o MPF pode, agora, emitir parecer, tanto de ofício como a requerimento do Conselheiro-Relator do CADE, o que não era disciplinado pela lei 8.884/94, nessa antiga lei não estava previsto a atuação de ofício do membro do MPF.

            A atuação do órgão ministerial nos procedimentos sujeitos a apreciação do CADE é de importância ímpar, seja para efetivar as decisões do CADE que têm força de título executivo extrajudicial conforme preceitua o art. 93 da lei 12.529/11, dando maior eficácia e legitimidade às decisões do CADE, e principalmente para fiscalizar a aplicação da Constituição.

            Importante é o ensinamento do Procurador da República Waldir Alves:

“Enfim, a atuação do Ministério Público Federal deve dar-se para fiscalizar a aplicação da Constituição, no que se refere ao seu Título VII (Da ordem econômica e financeira), o respeito e a defesa do consumidor, cuja garantia foi elevada à categoria fundamental (...) Tudo para dar maior eficácia às decisões do CADE, elevando ainda mais o prestígio e a imprescindibilidade da atuação do Órgão de Proteção da Ordem Econômica” (ALVES, Waldir. Ministério Público e a Ordem Social Justa. Atuação do Ministério Público Federal junto ao CADE e nos processos cíveis e penais de infração contra a ordem econômica e as relações de consumo, p. 292).

            Dispõe o art. 118 da Lei 12.529/11 que “nos processos judiciais em que se discuta a aplicação desta Lei, o CADE deverá ser intimado para, querendo, intervir no feito na qualidade de assistente”. Infere-se do citado artigo que o Ministério Público, desde que munidos de documentos comprobatórios, seja por requerimento de interessado, seja de ofício, poderá instaurar ação civil pública ou ação judicial com a finalidade de recompor os danos morais e patrimoniais (art. 1º, V da Lei 7.347/85), bem como, para proteger a ordem econômica, os consumidores, os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (art. 6º, XV, LC 75/93).

            Assim sendo, ao ajuizar qualquer ação judicial que tenha por objeto a repressão ou prevenção de infrações contra a ordem econômica, seja ação civil pública ou não, o CADE deve ser intimado e funcionará como assistente técnico do MPF, e suas opiniões devem ser observadas pelo juiz, pois é o órgão que possui conhecimentos técnicos específicos sobre o assunto.

            O artigo 15, III da legislação supracitada, prescreve que compete à Procuradoria Federal (que não se confunde com Ministério Público) que atua junto ao CADE promover a execução judicial das decisões e julgados deste órgão. Por este motivo é que entende Waldir Alves que o MPF atua subsidiariamente à Procuradoria do CADE, ou seja, “promoverá apenas no caso de recusa ou omissão desta e para a defesa da ordem econômica, do consumidor e do patrimônio público, a execução de seus julgados ou do compromisso de cessação” (ALVES, Waldir. Ministério Público e a Ordem Social Justa. Atuação do Ministério Público Federal junto ao CADE e nos processos cíveis e penais de infração contra a ordem econômica e as relações de consumo, p. 300).  Entende ainda, o doutrinador, que o parecer do MP melhor se daria após a apresentação do parecer da Procuradoria do CADE, antes da sessão de julgamento.

            Importante ainda destacar a importância no que diz respeito a ação do Ministério Público Federal na fiscalização da atuação dos membros do CADE, como nos casos de perda de mandato, devendo assim o MPF ser acionado em virtude de sua condição de garantidor da legalidade.

4.      Conclusão

            Após demonstrado a legitimidade do Ministério Público Federal para atuar junto ao CADE, pela função de defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, zelar pela observância dos princípios relativos a ordem econômica, promovendo assim ações necessárias ao exercício das suas funções institucionais, especialmente quanto à ordem econômica e financeira.

            Levando em consideração que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça, pode haver interferência políticas em seu ofício, o que não ocorre com o Ministério Público, vez que não está ligada a nenhum dos três poderes, não sofrendo influência de nenhuma forma, pois possui independência e autonomia funcional, prerrogativas estas, resguardas pela Constituição da República de 1988.

            Além disso, a autuação do MP é necessária para garantir o cumprimento da Constituição e a proteção da coletividade, haja vista que a ordem econômica afeta a sociedade como um todo. A atuação do órgão ministerial é de suma importância, pois além das razões expostas, evita a nulidade dos procedimentos, pois este órgão é o garantidor da ordem jurídica, retirando assim do alcance dos infratores essa alegação na busca de se safarem das sanções cominadas à ilicitude de seu ato.

            Contudo, sabe-se que a atuação do MP na maioria dos casos não é suficiente para dar efetividade às decisões. Sendo assim, é necessária uma maior correlação, uma sinergia, entre MPF e CADE, pois só assim teremos um salto quantitativo e qualitativo nos resultados de aplicação da Lei 12.529/11.

Referências:

ALVES, Waldir. Atuação do Ministério Público Federal junto ao CADE e nos processos cíveis e penais de infração contra a ordem econômica e as relações de consumo, in JÚNIOR, Flávio Paixão de Moura (org.), ROCHA, João Carlos de Carvalho (org.), DOBROWOLSKI, Samantha Chantal (org.), SOUZA, Zani Tobias: Ministério Público e a Ordem Social Justa. Dez anos da Lei Complementar n.75/93. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 283 -301.

BRASIL, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos jurídicos. Lei 12.529/2011. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm > Acesso em 07/06/2012.

BRASIL, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos jurídicos. Lei Complementar 75/93. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp75.htm > Acesso em 07/06/2012.

BRASIL, Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos jurídicos. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > Acesso em 07/06/2012.

FONSECA, Antônio. O papel do Ministério Público na política da concorrência, in Revista de Direito Econômico, V. 25, Brasília, jan/ jul 1997. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx?43e324ec33d152e87fc3 > Acesso em 07/06/12.

FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Lei de Proteção da Concorrência: Comentários à Legislação Antitruste. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

FREIRE, Marusa Vasconcelos. A atuação do MPF junto ao CADE, in Revista de Direito Econômico, V. 24, Brasília, 1996, p. 117. Disponível em http://www.cade.gov.br/Default.aspx?43e324ec33d152e87fc3 > Acesso em 07/06/12.