O instituto da recuperação de empresas e sua função social


Porbarbara_montibeller- Postado em 17 maio 2012

Autores: 
MACEDO, Gabriela Silva.

Sumário: 1. Introdução; 2. O conceito de sistema de Direito: 2.1. O Direito como sistema fechado; 2.2. A transição para um sistema aberto; 3. A função social: 3.1. Função social da propriedade; 3.2. Função social na legislação brasileira; 3.3. Função social da empresa; 4. O princípio da preservação da empresa; 5. A função social da empresa e o princípio da preservação da empresa como fundamentos jurídicos da alteração do instituto da concordata pelo instituto da Recuperação de Empresas: 5.1 As principais alterações do novo instituto e seus fundamentos: 5.1.1 O requisito da viabilidade jurídica da atividade econômica; 5.1.2. Os meios de recuperação; 5.1.3 A separação dos conceitos de empresa e empresário; 5.1.4. Os efeitos em relação a todos os credores; 5.1.5. A decisão conjunta entre credores e devedor; 5.1.6. Possibilidade de convocação extrajudicial de credores. 5.2 Perspectivas em torno da nova lei. 6. Conclusão. Referências bibliográficas.

Resumo: A empresa é tida hoje como a instituição de maior significado da sociedade contemporânea e não pode mais estar voltada apenas a satisfação dos interesses individuais de seus titulares, devendo atender também a uma função social. Diante disso, o foco do legislador falimentar voltou-se ao acentuado interesse social que a manutenção da empresa guarda, trazendo à baila a Lei n. 11.101/05 e o instituto da recuperação de empresas. Como a real reforma no Direito Falimentar não depende tão-só da alteração legislativa advinda com a nova Lei, mas também, e, principalmente, da devida interpretação que se faça dos seus novos institutos, vem a lume a importância de se investigar os fundamentos jurídicos da alteração dos institutos falimentares: a função social e o princípio da preservação da empresa.

Palavras-chave: Reforma do Direito Falimentar. Recuperação de empresas. Função Social da empresa. Princípio da manutenção da empresa.


1 INTRODUÇÃO

A Lei n. 11.101/05, denominada Lei de Falência e Recuperação de Empresas, entrou em vigor para substituir a Lei de Falência e Concordata, o Decreto-Lei n. 7.661 de 1945, que, produzido nos estertores do período ditatorial de Getúlio Vargas, já não se coadunava com os novos paradigmas jurídicos nem com a realidade sócio-econômica do país.

Com efeito, a Constituição Federal de 1988 instaurou uma nova ordem jurídica focada na dignidade da pessoa humana, no valor social do trabalho, na função social da propriedade e na livre iniciativa. Seguindo essa linha, o legislador infraconstitucional trouxe à baila também uma nova concepção do direito privado, lastreado em princípios como o da boa-fé objetiva e da função social. Assistiu-se, enfim, a uma crescente unificação do direito privado, a interpenetração do direito público e a uma transmigração do individual ao coletivo, operando-se uma verdadeira revolução legislativa no país, cujas balizas não admitiam mais que interesses de uma coletividade restassem prejudicados em razão de posturas egoísticas e solitárias.

Sob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/45, nosso Direito Concursal tinha à sua disposição um instituto de eficácia duvidosa: a concordata. Instituto esse que apresentava diversos inconvenientes: era excessivamente formal, previa prazos intransigentes, não contemplava todos os credores, não atacando, assim, os verdadeiros focos de crise da empresa. Aliados a esses aspectos, a complacência de muitos magistrados e o não acompanhamento do processo pelos credores – que tinham um papel ínfimo no instituto – relaxaram as suas malhas, tornando-o um campo fértil para fraudes e perfídias, um instrumento a serviço de empresários inescrupulosos.

Diante das deficiências acima destacadas, não era mais admissível se conceder um benefício de larga repercussão econômica e social como esse, plantado apenas em discutíveis pressupostos formais, sem a mínima preocupação com a viabilidade da empresa e com o caminho a ser adotado para a persecução de seus fins. Por essa razão, o foco do legislador falimentar deslocou-se do empresário para a própria empresa, é dizer, para o acentuado interesse que sua manutenção guarda, surgindo, assim, com a Lei n. 11.101/05, o Instituto da Recuperação de Empresas.

O objetivo deste artigo é demonstrar que a função social e o princípio da preservação da empresa são os fundamentos jurídicos da substituição do instituto da Concordata pelo instituto da Recuperação de Empresa, isto é, da reforma do Direito Falimentar, cuja concretização depende, em grande monta, do papel fundamental desempenhado pelos operadores do direito. Estes, sem dúvida, terão que equacionar os interesses conflituosos do devedor em crise e os dos credores em instâncias até então subutilizadas no Direito Brasileiro, como a assembléia de credores e terão que manejar instrumentos jurídicos inéditos, como o plano de reorganização, sempre tendo como parâmetro aqueles que aqui serão estudados.

 Mais do que uma simples escolha de um tema, o enfrentamento da questão ora proposta fascina por contemplar pesquisas não só teóricas, mas também de aplicação prática acerca de um novo instituto que, sem dúvidas, repercutirá diretamente na vida da empresa, ícone da sociedade contemporânea.


2 O CONCEITO DE SISTEMA DE DIREITO

 Analisar o conceito de sistema de direito, perpassando por suas duas fases – o Direito como sistema fechado e a evolução para um sistema aberto –, é pressuposto indispensável para se alcançar a definição contemporânea de função social. Isso porque, como está posta hoje, a expressão função social exige uma técnica legislativa que somente é possível em um sistema aberto de direito.

 Etimologicamente, a palavra sistema[1] possui diversas acepções, destacando-se, dentre elas, a acepção jurídica – que será o foco do estudo a ser desenvolvido neste ponto. Analisado sob tal espectro, o termo consigna as noções de ordem, conjunto, coerência e unidade, o que leva Carin Prediger[2] a afirmar que a Ciência do Direito é sistemática, pois as suas normas estão conectadas entre si, facilitando a aplicação dos seus princípios, conceitos e regras gerais, e assegurando uma certa previsibilidade dos seus efeitos jurídicos.

2.1 O DIREITO COMO UM SISTEMA FECHADO

 A idéia de sistema no âmbito jurídico surge na Europa por volta no século XVIII. Até então, na Idade Média, coexistiam direitos provenientes de diversas fontes, cada qual aplicado a um determinado grupo, em virtude das desigualdades que eles guardavam entre si. Como decorrência desse modelo, a justiça terminava sendo particularizada, de modo que os juízes tratavam situações iguais de forma distinta, concedendo privilégios para uns em detrimento de outros. Não havia, por isso, qualquer parâmetro de justiça, o que era ainda acentuado pela intervenção constante da aristocracia e da Igreja nas querelas jurídicas. [3]

 Diante desse quadro de desigualdade, a burguesia, classe então emergente, passou a lutar pela criação de um modelo que proporcionasse maior segurança jurídica nas decisões judiciais. Para tanto, era necessário desenvolver uma técnica legislativa que dispensasse as valorações dos aplicadores do direito, de modo a tornar o juiz, como bem expressou Montesquieu, a “boca da lei”. Com o surgimento do Estado Moderno e a conquista do poder pela burguesia, tal intento foi concretizado, e os ideais burgueses foram levados à codificação, em um sistema completo e harmônico, cuja relevância das normas era ponderada com base em critérios meramente formais, sem atenção específica ao seu conteúdo implícito[4].

 A codificação que surgia nesse período era dominada por uma pretensão de plenitude lógica e de completude legislativa, excludente de tudo o mais que nela não estivesse contido. Tratava-se, nas palavras de Judith Martins-Costa[5], de um fenômeno típico da modernidade oitocentista chamado “códigos totais”, totalizadores e totalitários, que, pela conexão sistemática de regras casuísticas, aspiravam cobrir a plenitude dos atos possíveis na esfera privada, prevendo todas as soluções necessárias às mais variadas questões da vida civil. Era, pois, um sistema fechado, exatamente porque, visando a alcançar essa regularização totalitária, utilizava-se de uma linguagem que não permitia uma efetiva comunicação com a realidade, sendo irrelevantes, por isso, quaisquer discussões acerca de postulados e de valores extrajurídicos. Tratava-se de um modelo completamente fechado de Direito.

2.2 A TRANSIÇÃO PARA UM SISTEMA ABERTO

 A complexidade da vida moderna, contudo, mostrou que os “códigos totais” não estavam aptos para regular todos os problemas da vida civil, tornando constante a necessidade de intervenção legislativa para suprir as lacunas que começavam a aparecer no sistema. Por esta razão, surgiram diversas leis extravagantes para regular as novas relações que despontavam na sociedade[6], o que terminou por desmitificar a idéia de que o Código poderia cobrir todas as situações da vida. Este quadro fez “esmorecer a noção do Código Civil enquanto expressão de um sistema único, em face da pluralidade de sistemas ora surgida, a neutralizar a centralidade antes existente, representada pela Codificação Civil”[7].

 Retratando o dilema que pôs em cheque as premissas do sistema fechado de direito, Leandro Martins[8] assevera:

A ciência do direito vê-se às voltas com um permanente dilema, sem o qual ela nem mesmo existiria na forma como a entendemos hoje: o de encontrar a solução justa em cada caso concreto.

 Com isso, o estudo dos sistemas jurídicos passou a ser orientado pelos sistemas sociais, reconhecendo-se, finalmente, o Direito como uma ciência humana. O caráter estático do positivismo jurídico foi, então, substituído pela complexidade inerente às relações sociais[9].

 Desponta, assim, o sistema aberto do direito civil, o qual, em virtude da linguagem que emprega – conceitos cujos termos têm significados intencionalmente vagos e abertos, chamados “conceitos jurídicos indeterminados” –, permite uma constante incorporação de novos problemas. O juiz passa a assumir uma função integralizadora diante do caso concreto, e o legislador é progressivamente chamado a complementar o sistema com a criação de novas leis. Se, por um lado, foi reconhecida a incompletude do sistema, por outro, foi consolidada a sua capacidade de evoluir, admitindo modificações, eis que “um Código não totalitário tem janelas abertas para a mobilidade da vida, pontes que o ligam a outros corpos normativos – mesmo os extrajurídicos – e avenidas, bem trilhadas, que o vinculam, dialeticamente, aos princípios e regras constitucionais”[10].

 Essas “janelas” – que possibilitam uma constante adaptação do direito à realidade – são constituídas por cláusulas gerais, partes móveis que compõem o sistema, complementando e acomodando as previsões normativas rígidas[11]. Segundo leciona Judith Martins-Costa[12], tais cláusulas podem ser definidas como uma técnica legislativa que conforma o meio hábil para permitir o ingresso, no ordenamento jurídico codificado, de princípios, valores, standards, de direitos e deveres configurados de acordo com diretivas econômicas, sociais e políticas, “viabilizando a sua sistematização e permanente ressistematização no ordenamento positivo”. Destarte, por também contemplar as cláusulas abertas, incorporando valores e princípios ao ordenamento jurídico[13], que o sistema aberto – e apenas ele – torna possível a definição contemporânea da fórmula “função social”.


3. A FUNÇÃO SOCIAL

 O termo função[14], quando aplicado juridicamente, significa “a finalidade de um modelo jurídico, certo modo de operar um instituto, ou seja, o papel a ser cumprido por determinado ordenamento jurídico”[15]. Segundo José Diniz de Morais[16], o termo função pode ser definido como a satisfação de uma necessidade e se, assim é, a função social será a satisfação das necessidades sociais ou da sociedade. Dizer que algo tem ou é função social significa que algo é ou desenvolve suas atividades visando ao social.

 O conceito de função social aplicado aos institutos jurídicos impõe que o ordenamento somente reconheça um direito subjetivo individual se ele se coadunar com as necessidades sociais, é dizer, se ele for útil para a sociedade. Não se admite mais, portanto, que os interesses de uma coletividade restem prejudicados em razão de posturas solitárias. E mais: o ordenamento não só inadmite o exercício de direitos individuais quando choquem com interesses coletivos, como também estimula condutas que resultem em um benefício para a coletividade. Atua, pois, a função social, na lição de Cristiano Chaves[17], como um instrumento de mão dupla: de um lado, incentiva atuações coletivamente úteis; de outro, inibe condutas individualistas que não atendem as necessidades sociais. Nesse ponto, merece ser transcrita a lição do autor:

[...] ao cogitarmos da função social, introduzimos no conceito de direito subjetivo a noção de que o ordenamento jurídico apenas concederá merecimento a persecução de um interesse individual, se este for compatível com os anseios sociais que com ele se relacionam.

 O que propriamente significa o atendimento dessas necessidades sociais – ou quais são essas necessidades que carecem de atendimento – deve ser perquirido em cada época histórica. Daí porque, o legislador pátrio estabelece a função social como uma cláusula genérica, revestida da necessária elasticidade que possibilita transferir para a lei as variações da realidade social.[18]

3.1 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

 A instituição jurídica da propriedade surgiu para responder à necessidade de se afetar certas riquezas a fins individuais ou coletivos. Inicialmente, a propriedade foi regulada por princípios individualistas, razão pela qual caracterizava um direito absoluto voltado apenas à satisfação de interesses individuais – refletia, assim, um ideário regido pela autonomia da vontade e pela soberania do indivíduo[19]. Segundo Leon Duguit[20], “consistía en dar al poseedor de la cosa um derecho subjetivo absoluto: absoluto em su duracción, absoluto em sus efectos”[21].

 Na etapa inicial da evolução do capitalismo, a felicidade traduzia-se na concepção de ampla liberdade para que qualquer cidadão pudesse atuar em prol dos seus interesses pessoais[22]. Por isso, da mesma forma que o proprietário tinha o direito de gozar, usar e fruir da sua propriedade, ele tinha o direito de não utilizá-la, de não produzir, de ficar inerte diante dela. Por ser um direito absoluto seu, o proprietário poderia manejá-lo como quisesse e, se ao fazê-lo causasse danos a terceiro, não seria responsável por isso, porquanto apenas estaria exercitando o seu direito[23].

 Aos poucos, contudo, percebeu-se que o indivíduo tinha o dever de cumprir uma certa função na sociedade, em razão do lugar que nela ocupa, devendo, para tanto, empregar o seu esforço físico ou intelectual em prol do desenvolvimento dessa coletividade. Não havia, pois, interesse em se proteger o indivíduo como um fim em si mesmo, mas pelo proveito que ele agrega à sociedade. Retratando essa nova concepção sobre o papel do indivíduo na sociedade, León Duguit[24]-[25] revela:

Ahora bien, hoy en día tenemos la clara conciencia de que el individuo no es un fin, sino un medio; que el individuo no es más que una rueda de la vasta máquina que constituye el cuerpo social; que cada uno de nosotros no tiene razón de ser en el mundo más que por la labor que realiza en la obra social. Así, pues, el sistema individualista está en flagrante contradicción con ese estado de la conciencia moderna.[26]

 Pela mesma razão que o indivíduo tinha o dever de cumprir uma função social, o possuidor de riqueza também tinha o dever de utilizá-la para aumentar a riqueza geral da sociedade. O seu bem só seria protegido socialmente na medida em que fosse utilizado como instrumento de multiplicação da riqueza geral. Assim, a propriedade deixava de ser um direito subjetivo do indivíduo para se tornar uma propriedade-função[27]. Nesse sentido, Guillermo Benavides Melo[28]:

En otras palabras, la propiedad que no resulte dirigida, orientada, hacia el servicio de la sociedad, no es una propiedad deficiente, o a la cual haga falta un atributo, falta que la situaría en condición de inferioridad frente a otras propiedades que si satisfagan ese requerimiento constitucional. O como solemos decir en el lenguaje común los colombianos, no es que la propiedad con función social sea de “mejor familia” que aquella huérfana de tal función. No. Para el derecho colombiano, la función social condiciona la existencia misma del derecho, lo que equivale a afirmar categóricamente que la propiedad privada que no cumple función social, sencillamente no es propiedad privada.[29]

 Tendo surgido para atender a uma necessidade econômica, o instituto jurídico da propriedade, então, evoluiu de acordo com as novas formas que essas necessidades foram adquirindo. Se a necessidade econômica que ensejou o surgimento da instituição se transformava, por consectário lógico, a concepção jurídica da propriedade também tinha que se transformar[30], para atender também a interesses coletivos. Isso, todavia, não implicava na coletivização da propriedade, eis que o proprietário não só tem o poder-dever de utilizar sua coisa para a satisfação de necessidades comuns, como também deve buscar a satisfação de necessidades individuais[31]. Afinal, a intensidade da divisão do trabalho é diretamente proporcional à atividade que é individualmente realizada[32].

 Como bem afirma José Diniz de Morais[33], a idéia de função social não é de inspiração socialista, como muitos sustentam. Ao contrário, serve para legitimar o negócio do empresário e do proprietário produtor de riquezas como sendo uma atividade de interesse geral, o que termina por legitimar o próprio lucro, fortalecendo e embelezando o sistema capitalista. Hoje, sem dúvida, a fórmula função social reveste-se de um conceito técnico-jurídico que, além de reconhecer a propriedade privada dos bens, veio à baila para tornar tal instituto ainda mais consolidado, configurando-se, assim, como uma característica peculiar do modelo jurídico capitalista. Nesse ponto, é interessante conhecer as lições do autor[34]:

Não se pode, a partir desse fato, concluir que a propriedade torna-se social, que o direito se socializa, uma vez que, como base estrutural do ordenamento jurídico, a noção de propriedade privada imprime ao direito cunho individualista e a fórmula função social, muito mais do que negá-la, confirma-a. “Tem” ou “é” função social a propriedade privada porque é propriedade privada, porque se não o fosse seria propriedade pública ou social e, portanto, função pública ou função social.

 Atualmente, a função social tem sido definida como sendo uma série de encargos, ônus e estímulos que formam um complexo de recursos que remetem o proprietário a direcionar o bem às finalidades comuns. Daí a razão de ser da propriedade, comumente chamada de poder-dever ou de direito-função[35]. Como forma de rechaço das concepções individualistas, a função social da propriedade foi positivada em diversas cartas constitucionais do século XX[36], no bojo das quais se exaltaram direitos extrapatrimoniais e valores como a dignidade da pessoa humana e a solidariedade – “o indivíduo solitário, isolado em sua atividade econômica, é convertido na pessoa solidária que convive em sociedade e encontra nas necessidades do outro um claro limite à sua liberdade de atuação”[37].

3.2 FUNÇÃO SOCIAL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

 A Constituição Federal de 1988, ao tratar do direito de propriedade, vinculou o exercício de tal direito ao atendimento de uma função social[38]. Com isso, o constituinte deixou transparecer a sua intenção de tutelar a propriedade, não pelo aspecto formal de quem a titulariza, mas sim pelo seu caráter instrumental[39], que permite ao proprietário a realização de interesses sociais, sem privá-lo, em contrapartida, do exercício de prerrogativas inerentes a este mesmo direito – até porque é bastante razoável que se entenda a função social como um quinto elemento do direito de propriedade[40]. O direito fundamental de acesso à propriedade traz em si um dever social. Acerca do tema, ensina, com precisão, Fredie Didier Jr.[41]:

A propriedade privada e a sua função social são dois dos princípios que regem a ordem econômica, previstos no art. 170 da Constituição da República, que estruturam a regulação da chamada iniciativa privada. Princípios que, em análise apressada, poderiam ser entendidos como antitéticos, na verdade se complementam, sendo a função social, atualmente, vista como parte integrante do próprio conteúdo do direito de propriedade, seu outro lado — só há direito de propriedade se este for exercido de acordo com a sua função social.

Trata-se este princípio que atribui à propriedade conteúdo específico, dando-lhe novo conceito. A positivação constitucional destes princípios demonstra uma tentativa de unir dois extremos da história jurídica: o clássico direito de propriedade e a sua nova feição, caracterizada pelo desenvolvimento teórico de sua função social.

 Não se descuidando dessa premissa, o legislador infraconstitucional trouxe à baila, com o Código Civil de 2002, uma nova concepção de Direito Civil. Um direito lastreado na tutela do ser humano e da sua dignidade, erigido por princípios como o da boa-fé objetiva, da função social e por teorias como a do risco e a conseguinte objetivação do dever de indenizar.

 A par disso, outras legislações também trouxeram a lume disposições relativas à função social. A título meramente ilustrativo, cita-se a Lei n. 6.404/1976, a qual traz diversos dispositivos que conferem às companhias uma função social, além de prever que o acionista controlador deve estar atento, no exercício de suas atividades[42], ao atendimento de uma função social; e a Lei n. 11.101/2005, que prevê a recuperação judicial de empresas como forma de preservar a função social da empresa.

3.3 FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA.

 A empresa é a instituição de maior significado na sociedade contemporânea e, por isso, não pode mais ser tida como mero instrumento de satisfação dos interesses particulares dos empresários. Ela também deve focar-se na realização de fins sociais[43], o que não quer dizer que a persecução de objetivos do empresário, como o lucro, deva ser descartada, e que a sua atuação tenha que se voltar exclusivamente à satisfação de interesses que não são seus. Afinal, é a perspectiva de ganhos[44] que atrai o empreendedor para a assunção dos riscos inerentes à atividade empresarial; sem tal perspectiva, a empresa se desnaturaria. O que ocorre é que esse proveito não pode mais ser considerado como o centro da atividade empresarial, um dever supremo da empresa, razão única do seu existir. Acerca do tema, afirma Fábio Konder Comparato[45]:

O lucro não entra, na organização do sistema econômico, com as características de um oportere, de um dever supremo, ou então de uma liberdade fundamental do homem. É um simples licere, uma liceidade sem conteúdo impositivo, o que demonstra a sua não inclusão na esfera do social, dos interesses comuns do povo, e sua pertinência ao campo dos interesses particulares, hierarquicamente inferiores àquele.

 Para conciliar os diversos interesses que despontam em torno da empresa, torna-se fundamental estabelecer um parâmetro orientador do seu comportamento, quando ganha relevo o princípio da função social da empresa. Malgrado este princípio não esteja expressamente disposto na Constituição Federal de 1988, a doutrina[46] vem entendendo que ele encontra amparo naquele diploma supremo, primeiro porque decorre diretamente da função social da propriedade – esta, sim, prevista na Carta Constitucional[47]; segundo, em razão da necessária releitura dos institutos privados face às novas diretrizes trazidas pela própria Carta Constitucional; terceiro, por causa da superação da clássica dicotomia entre os direitos públicos e privados[48]-[49].

 O Código Civil de 2002 também não previu expressamente a função social da empresa, limitando-se a estabelecer, no §2º do art. 966, que o exercício da atividade de empresário, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, observará os limites impostos pelo seu fim econômico e social. Tecendo crítica acerca da omissão perpetrada pelo legislador, Eduardo Tomasevicius Filho[50] afirma que “não faz sentido imaginar que uma empresa não está obrigada a cumprir com os deveres positivos e negativos decorrentes da função social da sua atividade por inexistência de dispositivo legal expresso”. O autor, todavia, não nega que a previsão legal do instituto em um diploma como o Código Civil tornaria mais fácil exigir a sua obediência[51].

 A Lei das Sociedades por Ações[52], por sua vez, tratou expressamente da função social da empresa, estabelecendo, no art. 116, parágrafo único, que o acionista controlador deve usar o poder de controle com o fim de fazer a companhia realizar seu objeto e cumprir sua função social. No art. 154 desse mesmo diploma, ainda dispõe que o administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e os interesses da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa. A Lei n. 11.101/05 também prevê expressamente a função social da empresa, dispondo que a recuperação judicial tem por objetivo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

 Contemporaneamente, a fórmula função social está alicerçada no binômio direito subjetivo- dever jurídico, de forma que o titular de um direito deve sempre ponderar o exercício de suas prerrogativas com interesses alheios à sua vontade[53]. Seguindo essa linha, Eduardo Tomasevicius Filho[54] define a função social da empresa como “o poder-dever de o empresário e os administradores da empresa harmonizarem as atividades da empresa, segundo o interesse da sociedade, mediante a obediência de determinados deveres positivos e negativos”.

 O problema, no que toca ao conceito de função social da empresa, é a excessiva dose de abstração que lhe acompanha. Tentando resolver esse impasse, a doutrina definiu o conteúdo da expressão função social da empresa com base nos valores gerais estabelecidos como diretrizes do ordenamento jurídico brasileiro[55]. Nessa tarefa, a Constituição Federal deu uma efetiva contribuição, ao prever, em seu art. 170[56], parâmetros objetivos para a construção dos deveres inerentes à função social, tais como a valorização do trabalho humano, a defesa do consumidor e a defesa do meio ambiente.

  Buscando não apenas conceituar a fórmula função social, mas também estabelecer o seu conteúdo, Guilherme Gama[57] divide o condicionamento do exercício da empresa em duas espécies, uma endógena e outra exógena[58], sendo a primeira relacionada aos agentes internos da instituição, e a segunda ligada aos grupos de interesses externos à sua estrutura.

 Com efeito, o caráter endógeno se refere às relações trabalhistas desenvolvidas no âmbito da empresa, em conformidade com os arts. 7º e 170, VIII, da CF/88, e à criação de um ambiente de trabalho seguro e salutar[59]. Outro interesse também classificado como endógeno é aquele dos sócios em relação ao administrador, bem assim como os interesses dos sócios minoritários em relação ao sócio controlador[60]. Isso porque é imprescindível para os sócios que o administrador aja com lisura e transparência, observando as normas legais e contratuais pertinentes e buscando dar cumprimento com eficiência aos interesses da sociedade. Igualmente, é importante para os sócios minoritários que o controlador paute sua conduta não apenas de acordo com seus próprios interesses, mas também observando aos interesses da sociedade.

 As limitações exógenas são subdivididas em três subgrupos de interesses distintos: dos concorrentes, dos consumidores e do meio ambiente. No que concerne ao primeiro grupo, o art. 170, IV, da CF/88 estabelece a livre concorrência como princípio balizador da ordem econômica[61], “o que significa que a atividade empresarial não pode atentar contra esse princípio, porque este é um valor instrumental para a consecução de diversos objetivos econômicos [...]”[62]. A livre concorrência garante a abertura do mercado a novas iniciativas particulares, estimulando-se, em conseqüência, a competitividade em benefício do mercado e da própria comunidade.

 No que se refere aos interesses dos consumidores, “a atividade empresarial tem que ser exercida de modo a não causar dano ao consumidor, não apenas por deveres de abstenção, mas também de ação, a exemplo dos deveres positivos anexos da boa-fé objetiva de informação, de proteção e de lealdade”[63]. Agora, os empresários devem desenvolver serviços de maior qualidade e segurança para a sociedade, evitando a desenfreada e inconseqüente busca por lucro. Os interesses dos consumidores, portanto, são um dos principais focos de atenção no correto exercício da empresa, tendo, inclusive, diploma próprio, a lei 8.078/90, fundamental no estudo deste viés da função social.

 Por fim, no tocante ao meio ambiente, os recursos não podem ser usados de forma irresponsável, colocando-se como prioridade a busca do desenvolvimento econômico. Devem tais recursos ser utilizados de forma sustentável, compatibilizando-se desenvolvimento econômico com equilíbrio ecológico[64]. Nessa linha, a Constituição Federal e diversas normas infraconstitucionais estabelecem critérios para a utilização do meio ambiente, impondo, com isso, um limite a liberdade de empresa. Assim, cumprirá sua função social a empresa que utilizar os recursos naturais de forma justa e reduzir ao mínimo o impacto de suas atividades no meio ambiente.

 Cabe frisar também que a função social da empresa não se confunde nem com a responsabilidade social, nem com a função econômica dessa instituição. Enquanto a responsabilidade social[65] “corresponde a uma recente etapa de maior conscientização do empresariado no que diz respeito aos problemas sociais e ao seu potencial papel na resolução dos mesmos, principalmente em virtude da crescente falta de capacidade e de credibilidade do Estado na busca da eliminação daqueles”[66], a função social da empresa não só incide sobre a atividade empresarial de modo cogente, como também seu raio de aplicação limita-se às atividades que constituem os elementos da empresa, as quais geralmente coincidem com o objeto social da sociedade empresária.

 Para cumprir sua função econômica, por outro lado, é suficiente que a empresa seja um centro produtor de riquezas, congregando capital e trabalho – concepção esta que se adéqua perfeitamente aos valores individualistas e liberais[67]. Basta, portanto, que a empresa esteja funcionando para que atenda à sua função econômica. A função social, por sua vez, é muito mais ampla, compreendendo uma gama de deveres positivos e negativos impostos ao empresário que visam a atender aos interesses gerais da sociedade.

 Esses deveres impostos pela função social, todavia, não se esgotam nas previsões normativas, sejam do texto constitucional, sejam das leis ordinárias. Em que pese a doutrina, em regra, não tratar da função social como incentivo ao exercício da empresa, como forma de geração de empregos, de renda para o Estado, de concorrência positiva no mercado e de riqueza geral da sociedade, parece razoável conceber tais diretrizes como um espectro da função social latu sensu[68]. É bem verdade que o ordenamento jurídico não obriga nenhum indivíduo a criar postos de emprego, a gerar receita para o Estado e a aumentar a riqueza geral da sociedade, mas, a partir do momento em que esse sujeito se propõe a exercer uma atividade empresarial, ele tem que gerar tais benefícios. É uma decorrência lógica do exercício da atividade economicamente viável e, mais do que isso, um dever moral do empreendedor.

 Discordando desse posicionamento, Eduardo Tomasevicius Filho[69] sustenta que esta função da empresa (de geração de renda, empregos) é, em verdade, uma função econômica que traduz apenas o papel social do instituto jurídico. Não parece razoável, contudo, fazer distinções entre papel social e função social da empresa, sob pena de enveredar-se por formalismos inúteis. Tratar-se-ia de uma distinção sem qualquer razão de ser, já que, de fato, o que o autor chama de papel social da empresa nada mais é do que uma decorrência da função social da empresa. É que ao cumprir sua função social a empresa, por consectário lógico, exerceria o que o autor chama de papel social.

 A função social da empresa, portanto, pode ser analisada sob duas acepções: em sentido estrito, como sendo o poder-dever dos empresários e administradores da empresa de harmonizarem sua atividade com os interesses sociais, através de deveres positivos e negativos legal ou constitucionalmente impostos; e, em sentido amplo, como sendo o dever do empreendedor de, ao realizar uma atividade empresarial, gerar empregos, arrecadação para o Estado e desenvolvimento econômico em geral

 

4. O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA

 O direito privado brasileiro passou por importantes transformações nos últimos anos, que impuseram uma releitura das suas instituições, abandonando-se a ótica individualista para assumir um posicionamento de defesa da coletividade[70]. Essa nova visão do direito privado também refletiu sobre o tratamento dispensado à empresa, que, conforme restou assentado no ponto anterior, deixou de ser vista como mero instrumento de satisfação dos seus empresários para se tornar uma instituição que deve realizar interesses de toda a sociedade.

 A empresa representa hoje um dos principais pilares da economia moderna, sendo uma grande fonte de postos de trabalho, de rendas tributárias, de fornecimento de produtos e serviços em geral e de preservação da livre concorrência. Acerca da importância econômica e social da empresa, Waldo Fazzio Júnior[71] expõe que “insolvente ou não, a empresa é uma unidade econômica que interage no mercado, compondo uma labiríntica teia de relações jurídicas com extraordinária repercussão social”, razão porque o seu desaparecimento pode causar seqüelas irrecuperáveis para o mercado e para a sociedade. Sobre o papel da empresa, é importante conhecer as lições de João Glicério Oliveira Filho[72]:

O instituto da empresa assume papel de extrema relevância na sociedade. Por meio de sua atividade dinâmica, a empresa transforma-se em grande fomentador da circulação de riquezas na sociedade. Em razão de sua atuação, verifica-se uma imensa rede de interação entre empresário e agentes assalariados e não assalariados, o que faz reduzir o índice de desemprego no país. Outrossim, a atividade empresarial permite a circulação de bens e serviços no mercado de consumo, além de fornecer receitas significativas ao Estado, por meio da arrecadação de impostos [...] vê-se que a empresa exerce papel fundamental na conformação de valores no seio da sociedade, sobretudo os valores sociais constitucionalmente protegidos.

 Diante desse papel de extrema importância que a empresa assumiu na sociedade, notadamente quando cumpre a sua função social, despontou o princípio da preservação da empresa, que, na lição de Gladston Mamede[73], consagra, sempre que possível, o prosseguimento da atividade empresarial, reconhecendo os efeitos deletérios da extinção da empresa como fator prejudicial não só para o empresário, mas também para trabalhadores, fornecedores, consumidores, parceiros negociais e para o Estado. Por isso, tal princípio deve orientar a interpretação dos dispositivos legais do Direito Empresarial, bem como deve ser utilizado no preenchimento de lacunas da lei[74]-[75]. Lançadas essas premissas, cumpre analisar o tema central deste estudo.


5 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA E O PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA COMO FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA ALTERAÇÃO DO INSTITUTO DA CONCORDATA PELO INSTITUTO DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS.

 A nova Lei de Falências, a Lei n. 11.101, de 09.02.2005 despontou de um cenário empresarial marcado por grandes e modernas empresas corporativas, ao invés das empresas individuais e familiares que inspiraram a antiga legislação concursal, o Decreto-Lei n. 7.661/45. Seus institutos – tanto da falência quanto da concordata – não eram mais suficientes para satisfazer aos interesses envolvidos nessas grandes instituições modernas. É que a concordata havia se tornado obsoleta, dando ensejo a diversas fraudes e não evitando mais a derrocada da empresa em crise, de modo que a reforma do Direito Falimentar, mais do que um mero aprimoramento jurídico do Direito Empresarial, havia se tornado um imperativo da sociedade brasileira. Nesse ponto, são categóricas as palavras de José Cretela Neto[76]:

Imposta a mais de seis décadas, nos estertores do período ditatorial de Getúlio Vargas, a legislação anterior limitava-se a oferecer regras para o fechamento de empresas com dificuldades financeiras e critérios para que os credores pudessem ressarcir-se de seus prejuízos. [...] frequentemente o comerciante decretado falido deslocava as suas atividades para, em nome de terceiros, continuar no mercado, sem sofrer qualquer espécie de punição, ainda que a falência fosse fraudulenta. Enfim, punia-se, em regra, os bons comerciantes – que ficavam a ver navios com seus créditos esfumaçando-se no decorrer do processo – e deixava-se impunes os mal intencionados.

 Tradicionalmente, a falência foi instituída para eliminar do mercado as empresas deficitárias, os empresários “mal intencionados”, mediante a liquidação judicial dos seus ativos para a satisfação dos credores, resultando no encerramento de suas atividades e na conseqüente dispensa de seus empregados. Consagrou-se, assim, o mito de que o comerciante falia por má-fé, por ter o intuito de lesar os seus credores[77], o que não é verdade.

 Os empresários considerados de boa-fé, por sua vez, contavam com a concordata – um favor legal concedido, independentemente da vontade dos credores, ao devedor comerciante honesto e infeliz que preenchesse determinados requisitos formais taxativamente previstos em lei. Esse favor poderia consistir na prorrogação do prazo para pagamento da dívida, na redução do seu valor ou na reunião de ambos os benefícios.

 Hoje, em face dos riscos que a atividade empresarial apresenta, tão suscetível a sofrer abalos decorrentes das crises políticas, das tensões externas e dos colapsos de outros setores da economia, não há dúvidas de que a maioria dos empresários vai à falência por circunstâncias alheias à sua vontade – ou até mesmo por exercer uma má administração – e não exatamente por má-fé.

 Uma nova visão do Direito Falimentar vem, então, sendo construída, afastando a idéia de falência e voltando-se cada vez mais para a criação de mecanismos de reorganização da empresa. Uma unidade empresarial pode representar um elo insubstituível na cadeia produtiva, razão pela qual a sua derrocada causaria graves danos para a economia e para a sociedade como um todo. Comprometeria gravemente o funcionamento de outras empresas; o Estado perderia divisas, já que deixaria de arrecadar seus tributos; postos de trabalho seriam extintos; consumidores não seriam mais beneficiados com o fornecimento de certos serviços ou produtos, além de que seriam também prejudicados com a redução da concorrência naquele setor. Daí porque o Direito Falimentar passa a se preocupar de forma efetiva com a preservação da empresa e não apenas com a sua liquidação judicial. Com precisão, ressalta Waldo Fazzio Junior[78]:

[...] mediante procedimentos de soerguimento da empresa em crise, os credores têm melhores perspectivas de realização de seus haveres, os fornecedores não perdem o cliente, os empregados mantêm seus empregos e o mercado sofre menos (impossível não sofrer) os impactos e as repercussões da insolvência empresarial.

 A empresa que cumpre a sua função social – naquela acepção aqui chamada de lato sensu e também na stricto sensu – exerce um papel importantíssimo na sociedade e, por isso, deve ser preservada. Primeiro, porque cria uma extensa rede de interação e de interdependência entre agentes econômicos assalariados e não assalariados que gravitam em torno dos empreendimentos empresariais. Segundo, porque produz grande parcela de bens e presta a maioria dos serviços que atendem as necessidades da população. Terceiro, porque é uma importante fonte de arrecadação fiscal para o Estado[79]. Daí porque se invocam, neste artigo, a função social e o princípio da preservação da empresa como fundamentos jurídicos da substituição do instituto da concordata pelo instituto da recuperação de empresas, isto é, dessa nova visão do Direito Falimentar[80].

 Enquanto a empresa era tida como mero instrumento de satisfação dos interesses particulares de seus empresários, tendo como função única gerar dividendos para eles e para os investidores – note que aqui não havia que se falar em função social da empresa, mas apenas em função econômica –, a concordata e a falência atendiam bem aos interesses envolvidos na empresa, ao menos em tese. O fato de ser exigido o requisito da boa-fé para a concessão do benefício, por si só, já era indicativo da impossibilidade de se desassociar a empresa, de seus proprietários. A concordata, portanto, estava voltada para o empresário, para a satisfação de seus interesses e não para a realização de uma utilidade social.

 Tanto era assim que esse instituto estava concebido na Lei n. 7.661/45 como um favor legal, concedido pelo juiz independentemente da aquiescência dos credores, sem levar em consideração até mesmo a viabilidade de recuperação daquela empresa e a função que ela exercia na sociedade – se tal função era merecedora do esforço a ser feito pela sociedade em prol da sua recuperação (o que pressupunha um estudo efetivo de viabilidade da empresa). Desconsiderava-se, assim, o próprio funcionamento do mercado, o que terminava transferindo o risco da atividade empresarial do empresário para os seus credores e, conseqüentemente, para a própria sociedade. Tratando da ineficácia da concordata na tarefa de soerguimento da empresa e apontando tal instituto como instrumento voltado tão somente para os interesses dos empresários devedores, afirma mais uma vez com precisão José Cretela Neto[81]:

as concordatas fraudulentas passaram a ser corriqueiras [...] e representavam uma janela de oportunidades ímpar para que, durante até dois anos (o prazo da concordata) fosse elaborado um planejamento astuto para burlar o Fisco, os empregados, os fornecedores e a própria sociedade.

 Quando começa a se delinear essa concepção de função social, a empresa passa a assumir um papel muito mais relevante na sociedade. O poder-dever do empresário, dos controladores e dos administradores[82] da empresa de harmonizarem as suas atividades conforme os interesses da sociedade – quer seja como fonte geradora de empregos, renda, tributos, riquezas em geral (função social lato sensu), quer seja por meio de deveres positivos e negativos previstos nas leis e na Constituição Federal (função social stricto sensu) – trouxe uma nova visão da empresa também para o Direito Falimentar, que passou a ter como foco primordial a reestruturação da empresa em crise[83]. Foi, portanto, essa a concepção que embalou o legislador falimentar de 2005 na criação do instituto da recuperação judicial e extrajudicial de empresas[84].

 A função social da empresa, como visto, foi elemento indispensável para que a empresa assumisse a importância que revela hoje na sociedade – não apenas como unidade de produção capitalista, mas também como fonte de riquezas em geral para a sociedade. Em face dessa importância, o foco do legislador falimentar voltou-se primordialmente para a recuperação da empresa em crise. Por isso, pode-se afirmar que a função social, em ambas as acepções aqui defendidas, e o princípio da preservação da empresa representam os fundamentos jurídicos da alteração dos institutos falimentares.

5.1 AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO NOVO INSTITUTO E SEUS FUNDAMENTOS

 Delineados os aspectos jurídicos que apontam a função social e o princípio da preservação da empresa como fundamentos da alteração dos institutos falimentares, resta comprovar que tal premissa encontra respaldo na própria Lei n. 11.101/05. Para tanto, faz-se necessário analisar as principais mudanças trazidas pelo instituto da recuperação de empresas, buscando, em cada uma delas, o seu fundamento.

5.1.1 O requisito da viabilidade jurídica da atividade econômica

 O primeiro pressuposto exigido pela Nova Lei de Falências para que uma empresa ou um empresário obtenha o benefício da recuperação de empresas é a sua viabilidade[85], ou seja, que a mesma tenha potencial para soerguer-se. Malgrado em um primeiro momento defenda-se que a falência deve ser evitada a qualquer custo, na verdade, nem toda falência é prejudicial para sociedade. É que caso as empresas tecnologicamente atrasadas, descapitalizadas ou que possuam uma organização administrativa precária não sejam encerradas, o custo da sua recuperação – que nunca irá ocorrer – será suportado pelos credores, e estes irão repassá-lo à sociedade [86].

 Por se tratar de um tema que repercute sobre os interesses de toda a sociedade brasileira, a distinção entre empresas viáveis, portanto, passíveis de se beneficiar do instituto, e inviáveis deve ser feita pelo Poder Judiciário[87]. De todo modo, a empresa viável será sempre aquela que tem condições de devolver à sociedade brasileira, pelo menos em parte, o sacrifício feito para salvá-la. Nesse mister, quem melhor sistematizou o exame da viabilidade, a ser feito pelo Judiciário, foi Fábio Ulhoa Coelho[88], no terceiro volume do seu Curso de Direito Comercial, apontando os seguintes critérios como balizas: importância social da empresa; mão de obra e tecnologias empregadas, volume do ativo e passivo, tempo de funcionamento e porte econômico.

 Na vigência do Decreto-Lei n. 7.661, por seu turno, não era exigido um projeto que demonstrasse a viabilidade do cumprimento da concordata impetrada. A lei exigia “apenas uma vaga demonstração da potencialidade da empresa, deduzida de um balanço de determinação, nas mais das vezes montado de ‘encomenda’ ”[89]. Não havia, portanto, uma preocupação efetiva com o fato de a empresa ter ou não potencial para se recuperar, merecer ou não os esforços que seriam despendidos pela sua recuperação e, ainda, se traria alguma utilidade para o grupo social ao ser reestruturada. O foco do instituto, pois, não estava na empresa, mas sim no empresário, em dar uma segunda chance para aquele sujeito honesto e de boa-fé que fora mal sucedido em seus negócios.

 Com a nova lei, o foco volta-se para a empresa, não mais para o empresário. Porque a empresa cumpre uma função social, agrega uma utilidade para o meio em que se insere, gerando empregos e boas condições de trabalho, riqueza, tributos, ela deve ser recuperada. Note, porém, que apenas as empresas viáveis, ou seja, que cumprem uma função social lato sensu, devem ser beneficiadas pelo instituto. Tal viabilidade deve ser analisada, como antecipado, de acordo com a importância social, a mão de obra e tecnologias empregadas, a idade da empresa e o seu porte econômico[90], que são fatores indicativos também do atendimento de uma maior ou menor função social.

 Vê, portanto, que o cumprimento da função social, em sentido amplo e restrito, passa a ser parâmetro balizador da concessão do benefício da recuperação judicial e extrajudicial de empresa, deixando extreme de dúvidas a assertiva de ser ela um dos fundamentos jurídicos da alteração dos institutos falimentares.

5.1.2. Os meios de recuperação.

 No âmbito do Decreto-Lei n. 7.611/45, os meios de recuperação da empresa se restringiam à prorrogação do prazo para pagamento da dívida[91], à redução do seu valor[92] ou à reunião de ambos os benefícios[93]. Malgrado a concordata suspensiva também objetivasse a recuperação do negócio do devedor, o instituto possuía uma amplitude muito restrita. Com precisão, leciona Luiz Fernando Valente de Paiva[94]sobre o tema:

[...] o devedor que impetrasse concordata preventiva via-se, em muitos casos, obrigado a pagar débitos já vencidos nas mesmas condições de débitos que somente se venceriam anos após, como também via-se impedido de pagar fornecedores com créditos de pequena monta, que algumas vezes não chegavam sequer a 1% do valor dos créditos sujeitos à moratória. A proibição de pagamento desses pequenos fornecedores não produzia nenhum efeito em termos de adequação do fluxo de caixa do devedor.

 Diante dessa realidade, a Lei n. 11.101/05 trouxe a lume um fértil elenco de meios capazes de proporcionar a recuperação empresarial, possibilitando ao devedor a propositura de um plano moldado às suas reais condições e que tivesse efetivamente o condão de soerguer a atividade empresarial, permitindo a remoção das causas da crise. Além dos meios previstos na concordata, a recuperação judicial e extrajudicial de empresas contempla ainda diversos outros meios como a fusão ou cessão de empresas; a alteração ou substituição do bloco de controle social e de administradores, aumento do capital social; arrendamento; constituição de garantias reais ou pessoais e condições especiais de pagamentos[95]. Sobre o assunto, convém transcrever a lição de Waldo Fazzio Junior[96]:

Com a oportunidade da necessária reforma da legislação falimentar, vem a não menos necessária reformulação dos propósitos justificadores de soluções para as crises econômico-financeiras das empresas nacionais. Essas soluções não estão mais ancoradas, simplesmente, à proteção dos fornecedores do devedor, mas amarram-se à tutela de créditos sociais e públicos. Percebeu-se que de nada adianta a concessão de perdões e moratórias para a preservação da atividade empresarial, se a empresa endividada e descapitalizada não cumpre sua função social e acaba constituindo num estorvo para o mercado.

 O mais importante, contudo, é que o plano seja econômica e financeiramente viável, o que é vital para o sucesso da empreitada. Raquel Sztajn[97] leciona que os planos pouco viáveis, além de manter a situação de crise, podem – e é provável que assim ocorra – agravá-la, gerando efeito oposto ao que foi pretendido pela lei. Nesse ponto, fazem-se categóricas as palavras da autora:

Aprovar planos mal formulados a pretexto de que a ‘função social da empresa’ se superpõe aos interesses dos credores pode resultar em aprofundamento da crise, envolvimento de maior número de credores quando a falência vier a ser a única solução para a crise da tal empresa.

 O que se extrai dessa opção legislativa é que o legislador está efetivamente preocupado com o soerguimento da empresa e não apenas com o atendimento dos interesses de empresários e credores. Esses, por óbvio, também serão beneficiados com a recuperação, mas tal benefício é um mero consectário lógico da recuperação da empresa. O que o legislador deseja criar, em verdade, são mecanismos para viabilizar reestruturação da atividade empresarial, ainda que para tanto seja necessário reestruturar o poder de controle, a administração da empresa e até mesmo afastar o seu proprietário. Mais uma vez, foi a função social da empresa a mola propulsora das escolhas do legislador rumo à criação de mecanismos mais efetivos para viabilizar a recuperação da sociedade empresária.

5.1.3 A separação dos conceitos de empresa e empresário.

 A complexidade crescente das empresas contemporâneas tornou insustentável a atribuição do poder de controle aos proprietários, como decorrência natural do direito de propriedade. Igualmente, os conceitos de empresa e empresário tornaram-se cada vez mais distintos e autônomos, uma vez que a atividade da empresa tendeu a se destacar, necessariamente, do regime de propriedade. Assim, se o empresário detém o poder de controle da empresa e realiza uma má administração, é ele quem deve ser punido. Diante da nova realidade empresarial, não interessa mais punir a empresa, e sim, o mau empresário. A empresa, quando viável e útil para a sociedade, deve ser preservada, porquanto ela realize uma função social.

 A função social da empresa não é mais um poder-dever do proprietário (ou apenas do proprietário), mas do controlador[98]. O conceito de poder de controle não se confunde com o de propriedade – enquanto o primeiro é um poder de organização e direção, envolvendo pessoas e coisas; o segundo é um direito real que incide sobre a coisa. O que se busca, atualmente, não é apenas a plena realização do proprietário da empresa no exercício de seus direitos, mas também a satisfação de interesses sociais que a empresa deve atender. Acerca do tema, é imprescindível conhecer as lições de Fábio Konder Comparato[99]:

O reconhecimento claro e conseqüente de que o controle empresarial não é propriedade implica uma verdadeira revolução copernicana no estatuto da empresa, que passa de objeto a sujeito de direito. Com essa substituição do centro de gravidade, é o empresário que deve servir a empresa e não o contrário.

 Como foi analisado no ponto anterior, a Lei n. 11.101/05 trouxe, em seu art. 50, diversos meios de recuperação da empresa, destacando-se, dentre eles, a reestruturação do poder de controle e da administração empresarial. Essas novas propostas de solução para a crise da empresa só se tornaram possíveis porque o legislador percebeu que o conceito de empresa não se confunde com o de empresário e que deve ser a empresa – e não o empresário – o objeto de preocupação da lei.

 Na vigência da concordata, não era assim. O foco da lei estava no empresário devedor, que, em hipótese alguma, seria separado da sua propriedade, é dizer, da sua empresa. Se o devedor sucumbisse em seu intuito de recuperar-se, a empresa falecia junto. Tanto era assim que a empresa só seria beneficiada pelo instituto se o seu empresário estivesse de boa-fé. Hoje, não. A luta da sociedade está voltada para salvar a empresa; esta sim, fonte de empregos, de rendas, de arrecadação para o Estado[100]; esta sim, protagonista de um importante papel na sociedade e merecedora, por isso, do esforço a ser despendido na sua recuperação.

5.5.4. Os efeitos em relação a todos os credores

 A concordata, como estava prevista no Decreto-Lei n. 7.661/45, apenas contemplava os credores quirografários, de modo que os credores com garantia real, privilégio especial ou geral não eram atingidos pelo instituto[101]. “Na verdade, deixava de fora os débitos fiscais, os encargos trabalhistas e as dívidas bancárias garantidas por direito real, para abranger tão somente o pagamento dos créditos dos fornecedores. Em outras palavras, os verdadeiros problemas da empresa em crise não eram alcançados pela concordata preventiva.”[102]. Aqueles credores não alcançados pelo benefício poderiam acionar desde logo o devedor insolvente e requerer, inclusive, a sua falência, comprometendo, assim, a eficácia do instituto.

 Buscando resolver esse impasse, a Lei n. 11.101/05 estabeleceu que a recuperação judicial de empresas sujeita todos os credores existentes ao tempo da impetração do benefício, inclusive aqueles titulares de privilégios ou preferência. As únicas limitações trazidas pela lei são relativas aos pagamentos das dívidas trabalhistas, que devem ocorrer em no máximo um ano, e aos débitos fiscais, cujo adimplemento (ou, ao menos, o parcelamento) tem de ser realizado antes da concessão do benefício[103]. Ao contemplar um elenco maior de credores, o novo instituto reduziu o risco de o devedor ter a sua falência decretada, tornando-se, por consectário lógico, um instrumento mais eficaz de recuperação de empresa. Sedimenta-se, com mais essa alteração, o entendimento de que o instituto da recuperação de empresas tem como fundamento a função social e o princípio da preservação da empresa.

5.5.5. A decisão conjunta entre credores e devedor.

 Na vigência do Decreto-Lei n. 7.661/45, era a sociedade devedora quem decidia, de forma unilateral, qual o benefício mais adequado à sua situação. Não havia qualquer participação do credor na escolha da estratégia para superação da crise da empresa, eis que, uma vez preenchidos os requisitos legais da concordata, o juiz era obrigado a concedê-la nos termos em que fora requerida pelo devedor[104]. A aprovação da concordata, portanto, não dependia da aprovação dos credores a elas submetidos, sendo que a única limitação existente dizia respeito à proposta de dividendos mínimos, prevista no art. 156, §1º, da referida lei[105]. Nesse aspecto, é imprescindível conhecer as palavras de Rubens Requião[106]:

Não cabe ao juiz apreciar o quantum percentual da proposta formalmente correta, apresentada pelo concordatário. Não lhe é dado examinar de sua conveniência ou não, se o concordatário agiu de conformidade, ou não, com o potencial econômico e financeiro da empresa. Cabe-lhes, apenas, examinar os elementos formais, para ver se a proposta se compatibiliza ou não com a lei.

 Com o advento da Lei n. 11.101/05, essa situação foi alterada. Agora, o credor exerce um papel essencial na escolha do caminho para reestruturar a empresa, aprovando, através da assembléia de credores, o seu plano de recuperação. De mero figurante do procedimento, passa a protagonista das decisões, manifestando seus interesses, participando das deliberações e decidindo, enfim, pela continuidade ou não da instituição. O legislador falimentar de 2005, portanto, fez ressurgir, com toda a força, a assembléia geral de credores como órgão responsável pelas mais importantes deliberações da atividade empresarial[107].

 Ao fazer uma análise comparativa dos institutos da concordata e da recuperação de empresas, levando em consideração o papel que o credor passa a assumir com a nova lei, sintetiza Fábio Ulhoa Coelho[108] com precisão:

[...] o sacrifício imposto aos credores, na concordata já vem definido na lei (dividendo mínimo) e é da unilateral escolha do devedor, ao passo que, na recuperação judicial, o sacrifício imposto, se houver, deve ser delimitado no plano de recuperação, sem qualquer limitação legal, e deve ser aprovado por todas as classes de credores.

 Parece bastante razoável a postura adotada pela Lei n. 11.101/05, e assim o fez o legislador por diversos motivos, a saber: i) é o credor quem, inicialmente, arca com os ônus da recuperação; ii) dessa forma haverá um maior controle de que apenas aquelas empresas que realmente merecem o sacrifício despendido pela sua recuperação (porquanto cumprem a sua função social lato sensu e stricto sensu e são potencialmente viáveis) serão beneficiadas pelo instituto; iii) uma maior participação dos credores nas decisões implica, em contrapartida, em uma maior fiscalização sobre a atividade exercida pelo devedor, evitando fraudes e beneficiando tanto aos empresários quanto à sociedade como um todo. Sob esse prisma, pondera Manoel Justino Bezerra Filho[109]:

Evidentemente a assembléia, constituída por credores diretamente interessados no bom andamento da recuperação, deverá levar sempre ao juiz as melhores deliberações, que atendam de forma mais eficiente ao interesse das partes envolvidas na recuperação, tanto devedor quanto credor [...]

 Não restam dúvidas de que foi louvável a iniciativa do legislador de trazer, para um procedimento até então estático e unilateral, um elemento novo, de equilíbrio entre as relações empresariais e as necessidades do mercado[110], qual seja, a participação dos credores[111]. Atende-se, assim, ao princípio da preservação da empresa, sem torná-lo, contudo, um princípio absoluto e incondicionado, já que, em regra, aquelas empresas que melhor atendam à sua função social e que sejam mais interessantes para o mercado contarão com um maior apoio dos credores. Em contrapartida, as menos interessantes sofrerão um crivo maior da assembléia, competindo ao empresário, portanto, demonstrar que a viabilidade e o papel do seu negócio na sociedade merecem o esforço a ser feito por ele.

5.5.6. Possibilidade de convocação extrajudicial de credores

 Uma das maiores inovações trazidas à baila pela Lei n. 11.101/05 foi o instituto da recuperação extrajudicial de empresas. Há muitos anos, a doutrina já criticava o Decreto-Lei n. 7.661/45, por classificar a convocação de credores fora do juízo como ato de falência[112], afastando-se, assim, das soluções de mercado e desvirtuando-se da nova tendência de pacificação de conflitos baseada em saídas amigáveis. Sobre o assunto, convém transcrever a lição de Luis Fernando Valente Paiva[113]:

De fato, o Decreto-Lei 7.661/45 não amparava essa forma de composição e ainda classificava a convocação de credores pelo devedor para apresentação de propostas de dilação, remissão de créditos ou cessão de bens como “atos de falência”, impedindo soluções de mercado. Há muitos anos a doutrina criticava essa opção legislativa e indicava a necessidade de reformulação do sistema, de forma a garantir a aplicação de soluções de mercado.

 Sucede que, de forma gradativa, as próprias cortes brasileiras já começavam a admitir, ainda que contra legem, formas alternativas de composição para as empresas em crise sujeitas à concordata[114]. Essas decisões, contudo, não conferiam a necessária segurança jurídica ao sistema falimentar brasileiro, sendo necessário que a legislação viesse também ao encontro dessa realidade. Daí porque os integrantes da comissão legislativa da nova Lei de Falências, em meados de 2002, incluíram o instituto da recuperação extrajudicial de empresas no projeto de Lei 4.376/93, que foi convertido, em seguida, na Lei 11.101/05.

 Com efeito, a recuperação extrajudicial de empresas “consiste na possibilidade de homologação judicial de acordo pelo devedor com seus credores e tem por finalidade oferecer um meio, que seja de um lado eficaz e rápido, e de outro, menos custoso, complexo e traumático, para o devedor reorganizar suas dívidas”[115] Nessa senda, o papel do Estado-juiz restringe-se a homologação do acordo, aferindo apenas se estão presentes os seus requisitos legais.

 O instituto da recuperação extrajudicial tem duas modalidades, uma meramente homologatória e outra impositiva[116]. A primeira consiste na possibilidade de o devedor levar à homologação judicial um acordo no qual haja adesão voluntária de todos os credores sujeitos ao plano de recuperação extrajudicial, obrigando, tão somente, a essas partes signatárias[117]. Tal modalidade pressupõe a concordância expressa e prévia da totalidade dos credores sujeitos ao plano[118], podendo o devedor negociar livremente com os credores que escolher.

 Há, todavia, algumas restrições a essa modalidade de recuperação extrajudicial. É que seu plano não poderá prever o pagamento antecipado de dívidas, nem o tratamento desfavorável aos credores a ele não estejam sujeitos – credores estes que poderão exercer seus direitos regularmente como se a recuperação extrajudicial não existisse, sendo-lhe facultado, inclusive, pleitear, e obter, a decretação de falência do devedor. Esses limites impostos pelo legislador têm por desiderato a defesa de princípios expressamente abraçados pela Nova Lei como os da universalidade e o da pars conditio creditorio[119].

 A recuperação judicial impositiva, por seu turno, é aquela que exige a assinatura de pelo menos três quintos dos credores de cada espécie[120] ou grupo de credores sujeita ao plano que, após ser homologado, obrigará todos os credores a ele sujeitos, ainda que não tenham concordado com o plano. Esse é um dos maiores avanços da Nova Lei Falimentar. Consoante ensina Fábio Ulhoa[121], com essa inovação, a lei impede que uma pequena minoria, resistindo em aderir ao plano de recuperação, obste a oportunidade de reerguimento da empresa. A propósito, Eduardo Spinola e Castro[122] afirma afirmam que a partir dessa regra, tornam-se inócuas estratégias de credores minoritários que pretendam obter vantagens sob a ameaça de não aprovação do plano.

 Em que pese a louvável iniciativa da comissão reformadora da legislação falimentar de vincular o plano não só aos credores que com ele anuíssem como também àqueles que se opusessem, quando tal comportamento fosse de encontro ao interesse da maioria, era necessário criar mecanismos para impedir que esses credores recebessem tratamento desfavorável em relação aos demais e ainda assim, fossem coercitivamente vinculados ao plano. A solução encontrada pelo legislador foi a exigência de que, ao elaborar o plano, o devedor contemplasse uma ou mais espécies de credores, ou abarcasse um grupo de credores de mesma natureza e sujeito a semelhantes condições de pagamento, não se permitindo, desse modo, um arbítrio na definição de quais sejam, ou não, os créditos incluídos para alcançar o percentual de três quintos de adesão.

 Uma vez homologado o plano, seja na modalidade meramente homologatória, seja na impositiva, os credores não poderão desistir da adesão, salvo com a expressa anuência dos demais,[123] “regra que impede que uma minoria descontente possa embaraçar o regular cumprimento do plano”[124]. A adoção dessa regra recebeu unanimemente os aplausos da doutrina, uma vez que, permitir a um ou mais credores a retratação, após já terem sido postos os termos do acordo, “abriria flanco para tais manobras que redundariam em insegurança.”[125] O objetivo da lei, portanto, foi o de evitar que qualquer credor utilizasse “seu ‘arrependimento’ como forma de obter vantagens adicionais, sob ameaça de retirar a sua concordância, levando ao rompimento do acordo celebrado.”[126].

 Tendo em vista que a atividade da empresa está sujeita ao atendimento de uma função social, o legislador buscou os mais diversos caminhos para consagrar o princípio da preservação da empresa, sendo a recuperação extrajudicial um dos mais eficientes desses mecanismos, pois, ao mesmo tempo em que concede aos credores e ao devedor a oportunidade de elaborar, em conjunto, um plano para solucionar a crise da empresa, evita que o devedor arque com todos os custos e riscos inerentes a uma recuperação judicial. Tem-se, aqui, mais um indício de que o legislador deseja, a todo custo, salvar aquelas instituições viáveis e que podem ser bastante úteis para a sociedade, gerando empregos, renda, riqueza para os credores (que na falência não possuem grandes perspectivas de reaverem seus créditos) e para o próprio devedor.

5.2 PERSPECTIVAS EM TORNO DA NOVA LEI.

 São naturais e sadias as tensões, expectativas e até frustrações em torno das propostas inovadoras, “especialmente quando se pensa em inovar substancialmente na ordem jurídica e no modo de ser das coisas da justiça”[127]. Toda reforma legislativa traz uma série de interrogações que só poderão ser respondidas após algum tempo de vigência da lei, quando se tornar possível ver os seus reflexos na realidade e a forma pela qual ela vem sendo aplicada pelos tribunais. Isso porque “a norma é produzida, pelo intérprete, não apenas a partir de elementos que se desprendem do texto (mundo do dever-ser), mas também a partir de elementos do caso ao qual será ela aplicada, isto é, a partir de elementos da realidade (mundo do ser)”[128].

 Após três anos de vigência da Lei n. 11.101/05, já se pode observar alguns de seus reflexos na realidade. Conforme levantamento realizado pelo Serasa, em 2006, já houve uma queda dos pedidos de falência em 56,1%; redução do número de falências decretadas de 31,3%; e, em contrapartida, a aplicação do novo instituto tem aumentado, pois foram registrados 252 pedidos de recuperação judicial e dois pedidos de recuperação extrajudicial naquele mesmo ano, sendo 156 deferidos; em 2005, haviam sido contabilizados apenas 110 requerimentos de recuperação judicial, e 53 foram deferidos[129]. Tais dados mostram que a nova lei, na prática, já tem produzido efeitos, exaltando o princípio da conservação da empresa.

 No que toca à aplicação prática do novo instituto, a recuperação judicial da Varig é o caso paradigma da Lei n. 11.101/05. Com dívida estimada em 7,9 milhões de reais, a empresa já vinha enfrentando, por diversos motivos, sérias dificuldades há muitos anos, beirando, por isso, o estado de falência. Sem dúvidas, a Varig realizou um profícuo trabalho na aviação brasileira – com mais de 80 anos de existência, possuía 17.800 empregados, cinco milhões de titulares de cartões smiles, 13,8 milhões de pessoas transportadas por ano –, razão pela qual a sua falência geraria danos inestimáveis para toda sociedade[130]. A função social em sentido lato que essa instituição exerce é, portanto, indiscutível, fato que impunha a sua preservação.

 Sob a égide do art. 187 do Código da Aeronáutica[131], as empresas que, por seus atos constitutivos, tivessem por objeto a exploração de serviços aéreos de qualquer natureza ou de infraestrutura aeronáutica, não podiam impetrar concordata. Com a nova Lei de Falências, as empresas do setor aéreo também foram contempladas pelo instituto da recuperação de empresas, passando a ter a prerrogativa de recorrer ao benefício para escapar da falência. Assim que, beneficiando-se dessa prerrogativa, a empresa Varig requereu em juízo o benefício da recuperação de empresa, o qual foi deferido, nos autos da ação n. 2005.001.072.887-7, pelo magistrado Alexander dos Santos Macedo, nos seguintes termos:

A ausência de lei especial disciplinadora do parcelamento de créditos tributários de quem esteja em processo de recuperação, exige tratamento que for mais benéfico ao contribuinte, sendo inaplicável a norma do art. 191-A do CTN, enquanto não se dê cumprimento ao disposto no § 3o, do art. 155-A daquele diploma legal.

[...] Assim, considerando o interesse público revelado pelo princípio da preservação da empresa, inserto no art. 47 da Lei 11.101/2005; considerando a suspensão de parte dos débitos tributários da 1a requerente; considerando que a 1a requerente é potencial credora da União da importância aproximada de R$ 4 bilhões; considerando a ausência de lei disciplinadora do parcelamento de débitos tributários de empresas em recuperação, não faz sentido impedir a possibilidade das requerentes de se reorganizarem por falta de certidão negativa de débitos fiscais.

Isso posto, nos termos do art. 58 da Lei 11.101/2005, consideramos cumpridas as exigências legais e concedemos a recuperação judicial das devedoras, cujo plano foi aprovado na assembléia de credores realizada no dia 19/12/2005.

 Como se depreende da leitura do supracitado dispositivo sentencial, em uma atitude de extrema coerência, o juiz Alexander afastou, no caso, o requisito do art. 57 da Lei n. 11.101/05 – que exige a apresentação pela sociedade devedora de certidões negativas de débito tributário –, priorizando a preservação da empresa Varig e de sua função social. De fato, esse é o papel do magistrado que, ao interpretar o texto legal, deve analisar, diante de cada caso concreto, quais os valores irão prevalecer, orientando-se sempre pelo princípio da razoabilidade.

 Nesse ponto, a razoabilidade é utilizada como diretriz que “exige harmonização da norma geral com o caso individual”[132], quer seja para mostrar sob qual perspectiva a norma deve ser aplicada, quer seja para indicar em quais hipóteses o caso individual, em virtude de suas especificidades, deixa de enquadrar-se na norma geral. Deveras, não seria razoável – e até mesmo justo para a sociedade – que uma empresa como a Varig, cuja função social salta aos olhos, sucumbisse para que a lei fosse aplicada em todos os seus termos – o não significa, por outro lado, que a dicção legal deva ser sempre afastada. A aplicação da lei geral é a regra, a qual só deve ser excepcionada em casos extremos, quando o fim a que se deseja alcançar justifique o seu afastamento. Caso contrário, cair-se-ia em um casuísmo desmedido, tornando inútil o papel do legislador.

 Com efeito, a inexistência de lei prevendo o parcelamento das dívidas fiscais de empresas em recuperação judicial pode ser considerada como um dos grandes obstáculos para o acerto de contas entre o fisco e as empresas em crise. Essa situação, frise-se, tem sido também um desestímulo para pedidos de recuperação judicial, diante da exigência legal de que o devedor apresente certidões negativas de débitos após a aprovação do plano de recuperação pela assembléia-geral[133]. Como a interpretação da lei pode ser ampla, existe a dúvida acerca do comportamento que será adotado pelos juízes: irão homologar os planos sem a apresentação de dita certidão; extinguir os processos sem julgá-los; ou, até mesmo, determinar a quebra das empresas?

 Fábio Ulhoa Coelho[134], nesse ponto, entende que, enquanto não for editada a norma prevista no art. 155-A do Código Tributário Nacional, para dispor sobre o parcelamento do crédito fiscal da empresa que deseje obter o benefício da recuperação judicial, este instituto não importará nenhuma mudança no perfil do passivo fiscal da empresa requerente. Esse, contudo, não parece ser o entendimento mais razoável, tendo em vista que uma empresa em crise dificilmente estará cumprindo pontualmente as suas obrigações tributárias, razão pela qual esta exigência destituiria por completo o instituto de eficácia. Assim, uma vez inexistindo norma específica para tratar do tema, deve ser aplicado o tratamento mais benéfico ao contribuinte.

 Diante das críticas que militam em desfavor do instituto da recuperação de empresas, torna-se ainda mais relevante o papel do magistrado na concretização do instituto. Ele deve buscar, no caso concreto, a solução mais adequada para cada situação, tendo como foco os fundamentos jurídicos que ensejaram a alteração dos institutos falimentares, quais sejam, a função social e o princípio da preservação da empresa. Esses, entretanto, não são valores absolutos, podendo ser afastados quando, por exemplo, a reestruturação da empresa não for viável ou quando o plano de recuperação judicial não se mostrar idôneo para alcançar os fins do instituto. Afinal, aprovar planos mal elaborados ou conceder benefícios para empresas inviáveis, a pretexto de que a função social da empresa se sobrepõe aos interesses dos credores, pode resultar em aprofundamento da crise, não produzindo qualquer benefício para a sociedade, que arcará com o ônus de uma inócua tentativa de recuperação.

 Acerca do papel do magistrado na construção da nova Dogmática Concursal, convém transcrever as lições de Manoel Alonso[135]:

[...] a futura lei não irá resolver todos os males e crises que, de um tempo a esta parte, enfrentam os empresários do país. Nossa convicção decorre do fato de que na sociedade capitalista moderna, de livre iniciativa e concorrência entre as empresas, nenhum diploma legal tem o condão de eliminar a Teoria do risco. Mas o novo diploma brasileiro ajudará e, em muito, a evitar danos maiores. Alguns ajustes e acertos de que o texto necessita por certo serão introduzidos pelos dd. Juízes que irão atuar nos feitos, dentro do que lhes é facultado pelo art. 5º da L.I.CC., pelos srs. Administradores Judiciais, pelos operadores do direito e, em especial, pelos srs. Credores, os grandes balizadores nas decisões da efetividade da recuperação da empresa.

 Para efetivar a reforma do Direito Concursal, contudo, os juízes – que, aqui, assumem um papel fundamental – terão de equacionar os interesses conflituosos que envolvem a empresa, valendo-se sempre de princípios como o da razoabilidade e da ponderação de interesses. Tal operador do direito deve ter em vista que o texto normativo não pode ser interpretado em tiras, “um texto de direito isolado, destacado, desprendido do sistema jurídico, não expressa significado normativo algum”[136]. Disto se alcança a importância de investigar quais são os fundamentos jurídicos que embalaram o legislador na criação do novo instituto falimentar, para, valendo-se desses fundamentos, aplicar o melhor direito ao caso concreto.

 

6 CONCLUSÃO

 Diante de tudo o que foi exposto no presente trabalho, pode-se extrair as seguintes considerações finais:

a)                  A complexidade da vida moderna mostrou que os “códigos totais” não estavam aptos para regular todos os problemas da vida civil, tornando constante a necessidade de intervenção legislativa para suprir as lacunas que começavam a aparecer no sistema. Desponta, assim, o sistema aberto do direito privado, que, em virtude da linguagem que emprega – conceitos cujos termos têm significado intencionalmente vagos e abertos, chamados “conceitos jurídicos indeterminados” –, permite uma constante incorporação de novos problemas e a previsão de princípios gerais e cláusulas abertas como é o caso da função social.

b)                  O conceito de função social aplicada aos institutos jurídicos impõe que o ordenamento somente reconheça um direito subjetivo individual se ele se coadunar com as necessidades sociais, é dizer, se ele for útil para a sociedade. A função social da propriedade, por outro lado, consiste em uma série de encargos, ônus e estímulos que formam um complexo de recursos que remetem o proprietário a direcionar o bem às finalidades comuns. A Constituição Federal de 1988, ao tratar do direito de propriedade, vinculou o exercício de tal direito ao atendimento de uma função social.

c)                  A empresa é a instituição de maior significado na sociedade contemporânea e, por isso, não pode mais ser tida como mero instrumento de satisfação dos interesses particulares dos empresários. Ela também deve focar-se na realização de fins sociais, tornando-se fundamental estabelecer um parâmetro orientador do seu comportamento, ganhando relevo, nesse ponto, o princípio da função social da empresa. Malgrado este princípio não esteja expressamente disposto no texto Constitucional de 1988, a doutrina vem entendendo que, por diversos fatores (previsão da função social da propriedade, releitura dos institutos privados, superação da dicotomia entre os direitos públicos e privados), ele encontra amparo constitucional.

d)                 A função social da empresa pode ser analisada sob duas acepções: em sentido estrito, como sendo o poder-dever dos empresários e administradores da empresa de harmonizarem sua atividade com os interesses sociais, por meio de deveres positivos e negativos legal ou constitucionalmente impostos (defesa do consumidor, defesa do meio ambiente, busca do pleno emprego, redução das desigualdades regionais); e, em sentido amplo, como sendo o dever moral do empreendedor de gerar empregos, tributos e desenvolvimento econômico em geral (o que é também uma decorrência lógica da atividade economicamente viável, mas que não é tratado pela doutrina).

e)                  A fórmula função social da empresa, como visto, foi elemento indispensável para que a empresa assumisse a importância que revela hoje na sociedade – não apenas como unidade de produção capitalista, mas também como fonte de empregos e de riqueza geral para a sociedade. Em face dessa importância, o foco do legislador falimentar voltou-se primordialmente a recuperação da empresa em crise. Por isso, pode-se afirmar que a função social, em ambas as acepções aqui defendidas, e o princípio da preservação da empresa são os fundamentos jurídicos da alteração dos institutos falimentares.

f)                   As principais alterações trazidas pela Lei n. 11.101/05 confirmam a tese de que a preocupação do legislador está voltada para a função social da empresa e para sua preservação. São elas: a separação do conceito de empresa e empresário (o que permite cogitar-se do afastamento do empresário inapto, em prol da manutenção da atividade geradora de empregos e renda); a previsão de que apenas a empresa viável terá acesso ao benefício; a ampliação do elenco de mecanismos legais de recuperação; a extensão dos efeitos da recuperação judicial a todos os credores (não apenas aos quirografários); o novo papel dado credor na aprovação do plano de recuperação (enquanto a concordata era um mero favor legal, a recuperação depende da aprovação dos credores); a possibilidade de convocação extrajudicial de credores (na Lei n. 7.661/45 tal convocação era tida como ato de falência).

g)                  O alcance dos objetivos da reforma do direito falimentar depende principalmente da atuação dos juízes que terão de analisar em cada caso qual interesse deve prevalecer, despontando daí a importância de se investigar quais os fundamentos jurídicos que embalaram o legislador na criação do novo instituto falimentar.


REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUIAR, Adriana. Lei de recuperação diminui pedidos de falência em 56%. Disponível em:<www.administradores.com.br/noticias/lei_de_recuperacao_diminui_pedidos_de_falencia_em_56/9090/>. Publicado em: 12 jan. 2007. Acesso em: 10. jun. 2008.

ALONSO, Manoel. Meios de Recuperação Judicial da Empresa em crise financeira no PLC n. 71/2003, que se transformou na atual Lei n. 11.101 de 09 de fevereiro de 2005. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.). Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 2. ed. São Paulo, Malheiros, 2003.

BARTHOLO, Bruno Paiva. GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da Gama. Função Social da empresa. In: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função Social no Direito Civil.

BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada. SP: RT, 3ª edição, 2005.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

COMPARATO, Fábio Konder. Direito empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990.

COMPARATO, Fábio Konder.. Estado, empresa e função social. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 732, 1996 .

COSTA, Judith Martins. BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002.

CRETELLA NETO, José. Nova Lei de falências e recuperação de empresas: Lei n° 11.101, de 09.02.2005. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

DIDIER JR., Fredie. A função social da propriedade e a tutela processual da posse. Disponível em: http://www.frediedidier.com.br/main/artigos/default.jsp?OId=null. Acesso em: 07 jan. 09.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A nova era do Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Código de Napoleon. 2 ed. Madrid: Francisco Beltran, 1920.

FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007.

TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 42)

GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 2 ed. São Paulo: Malheiros editores, 2003.

MAMEDE, Glasdston. Direito Empresarial brasileiro, vol. 4: falência e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2006.

MORAIS, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 2002.

MELO, Guillermo Bonavides. -- La funcion social de la propiedad en la Constitucion y en la Ley. Derecho y Reforma Agraria. Merida. n.18, 1988.

NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Recuperação judicial das concessionárias de serviços aéreos e uma análise do processo da empresa Varig. Disponível em: <www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp> Publicado em: 07 jul. 2005 Acesso em: 10 jul. 2008.

OLIVEIRA FILHO, João Glicério de. Fundamentos Jurídicos da Função Social da Empresa. 2008. Dissertação.

PAIVA, Luiz Fernando Valente de. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) –Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005.

PREDIGER, Carin. A noção de sistema no direito Privado e o Código Civil como eixo central. In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar: volume 2. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995

SIMÃO FILHO, Adalberto. A nova empresarialidade. São Paulo: Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, v.9, n.18, 2006.

SZTAJN, Rachel. Comentário a recuperação extrajudicial de empresas. In: TOLEDO, Paulo F. C. Salles de, ABRÃO, Carlos Henrique. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência/ coordenadores. – 2. Ed ver. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2007.

TEPEDINO, Gustavo. A tutela da propriedade privada na ordem constitucional. Rio de Janeiro: Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado. v.1, n.1, 1993.

WILGES, Fernando dos Santos. A recuperação judicial da empresa e a possibilidade de verificação da inconstitucionalidade do art. 57 da Lei n. 11.101/05 pela via do controle difuso. Disponível em: <http://http://jus.com.br/revista/texto/8836">

 

ZANITELLI, Leandro Martins. Tópica e pensamento sistemático: convergência ou ruptura? In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.


Notas

[1] Em grego, a palavra “sistema” significa construído, composto.

[2] PREDIGER, Carin. A noção de sistema no direito Privado e o Código Civil como eixo central. In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.p. 150.

[3] PREDIGER, Carin. A noção de sistema no direito Privado e o Código Civil como eixo central. In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 151.

[4] OLIVEIRA FILHO, João Glicério de. Fundamentos Jurídicos da Função Social da Empresa. 2008. Dissertação. f. 35.

[5] COSTA, Judith Martins. BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 116.

[6] As relações consumeristas, a proteção ao meio ambiente, os avanços tecnológicos, dentre outros.

[7] PREDIGER, Carin. A noção de sistema no direito Privado e o Código Civil como eixo central. In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 148.

[8] ZANITELLI, Leandro Martins. Tópica e pensamento sistemático: convergência ou ruptura? In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 126.

[9] OLIVEIRA FILHO, João Glicério de. Fundamentos Jurídicos da Função Social da Empresa. 2008. Dissertação. f. 37.

[10] COSTA, Judith Martins. BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 118.

[11] PREDIGER, Carin. A noção de sistema no direito Privado e o Código Civil como eixo central. In: COSTA, Judith Martins. A reconstrução do direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 160.

[12] COSTA, Judith Martins. BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 118.

[13] Nesse sentido, são valiosas as palavras de Fredie Didier Jr. quando afirma que “o conteúdo de todo princípio é ilimitado, como, aliás, devem ser, exatamente para permitir a “abertura” do sistema jurídico, com soluções mais consentâneas com as peculiaridades do caso concreto submetido à apreciação do Poder Judiciário” (DIDIER JR., Fredie. A função social da propriedade e a tutela processual da posse. Disponível em: <http://www.frediedidier.com.br/main/artigos/default.jsp?OId=null>. Acesso em: 2009).

[14] A expressão função procede do latim functio, cujo significado é de cumprir algo ou de desempenhar um dever ou uma atividade.

[15] FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 200.

[16] MORAIS, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 40.

[17] FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 200. p. 201.

[18] Por isso, o termo função não se confunde com o conceito de “fim”, pois, enquanto este se volta para a destinação de determinada tarefa (previamente fixada e estática), a função responde a uma dinâmica histórica e concreta, pertencendo à própria estrutura que visa a modelar.

[19] Nesse primeiro momento, destaca-se o Código de Napoleão, diploma nitidamente individualista que dispunha, em seus arts. 544 e 545, que a propriedade era o direito de gozar e de dispor das coisas da maneira mais absoluta.

[20] DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Código de Napoleon. 2 ed. Madrid: Francisco Beltran, 1920. p. 237.

[21] Em tradução livre: consistia em dar ao possuidor da coisa um direito subjetivo absoluto: absoluto em sua duração, absoluto em seus efeitos.

[22] FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 199.

[23] DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Código de Napoleon. 2 ed. Madrid: Francisco Beltran, 1920. p 238.

[24] A semente da idéia de função social, malgrado tenha sido lançada por Gierke, veio a frutificar na França, inicialmente, com Duguit, que foi o responsável pela popularização da fórmula “função social da propriedade”. O autor realizou diversas conferências em Buenos Aires, em 1911, publicadas no ano seguinte na França. A partir daí, as idéias do autor foram disseminadas por todo o mundo.

[25]DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Código de Napoleon. 2 ed. Madrid: Francisco Beltran, 1920. p. 239.

[26] Em tradução livre: Agora bem, hoje em dia temos a clara consciência de que o indivíduo não é um fim em si mesmo, mas sim um meio; que o indivíduo não é mais que uma roda da vasta máquina que constitui o corpo social; que cada um de nós não tem maior razão de ser no mundo do que o trabalho que realiza socialmente. Assim, pois, o sistema individualista está em flagrante contradição com esse estado da consciência moderna.

[27] Função e estrutura são elementos que compõem o direito subjetivo. Porém, enquanto a estrutura do modelo jurídico trata da sua forma, a função serve para definir a maneira concreta de operar de um instituto jurídico. No caso da propriedade, a maneira concreta de operar se verifica quando em determinada propriedade existe função social. Segundo as lições de Cristiano Chaves (FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 200), a estrutura do modelo é captada quando se pergunta “como é?”; já a função se segue à pergunta “para que serve?”.

[28] MELO, Guillermo Bonavides. -- La funcion social de la propiedad en la Constitucion y en la Ley. Derecho y Reforma Agraria. Merida. n.18, 1988. p. 102.

[29] Em livre tradução: Em outras palavras, a propriedade que não resulte dirigida, orientada, a serviço da sociedade, não é uma propriedade deficiente, ou a qual falte um atributo, falta esta que a colocaria em condição de inferioridade em relação a outras propriedades que satisfaçam esse requerimento constitucional. Ou como costumamos dizer, em linguagem comum dos colombianos, não é que a propriedade com função social seja de melhor família que aquela órfã de tal função. Não. Para o direito colombiano, a função social condiciona a existência mesmo do direito, o que equivale afirmar categoricamente que a propriedade privada que não cumpre sua função social simplesmente não é propriedade privada.

[30] DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Código de Napoleon. 2 ed. Madrid: Francisco Beltran, 1920. p. 238.

[31] Para os socialistas autênticos, é uma hipocrisia assentar a função social no regime socialista.

[32] DUGUIT, León. Las transformaciones generales del Derecho privado desde el Código de Napoleon. 2 ed. Madrid: Francisco Beltran, 1920. p. 243.

[33] MORAIS, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 105.

[34] MORAIS, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 92.

[35] MORAIS, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 208.

[36] Como bem ensina Fredie Didier Jr. em artigo sobre o tema, “no campo constitucional, o prestígio do instituto da função social da propriedade está ligado à Constituição de Weimar , largamente imitada pelos outros povos, inclusive pela nossa Constituição de 1934. Trata-se de imposição de um dever positivo, dever de dar ao objeto da propriedade fim específico, que, no caso, corresponde ao interesse coletivo e não ao interesse do próprio dono — embora nada impeça que possam conviver harmonicamente . Não se confunde com as restrições ao uso e gozo de bens próprios, típicas de normas de vizinhança ou administrativas, as quais se coadunam, respectivamente, com os interesses do proprietário/indivíduo ou do Poder Público, sem uma preocupação mais efetiva com o interesse público. (DIDIER JR., Fredie. A função social da propriedade e a tutela processual da posse. Disponível em: <http://www.frediedidier.com.br/main/artigos/default.jsp?OId=null>. Acesso em: 2009).

[37] FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 199.

[38] É o que se extrai da leitura do art. 5º, XXIII da Constituição Federal, in litteris: “A propriedade atenderá a sua função social.”

[39] Isso se torna ainda mais evidente quando se observa que a função social da propriedade também foi incluída no rol dos direito fundamentais da Constituição Federal.

[40] A função social penetra na própria estrutura e substância do direito subjetivo.

[41] DIDIER JR., Fredie. A função social da propriedade e a tutela processual da posse. Disponível em: <http://www.frediedidier.com.br/main/artigos/default.jsp?OId=null>. Acesso em: 2009).

[42] Fábio Konder Comparato (Direito empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 36) entende que essas disposições legais são inócuas, pois falta a elas um aparelho sancionador efetivo.

[43] A empresa reúne diversos interesses, por vezes, conflitantes até com os interesses de seus empresários, mas que também devem ser atendidos.

[44] Para Adalberto Simão Filho (A nova empresarialidade. São Paulo: Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, v.9, n.18, 2006, p. 24), o lucro constitui índice de vitalidade e condição de eficiência da empresa.

[45] COMPARATO, Fábio Konder. Direito empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 11.

[46] Nesse sentido destaca-se Adalberto Simão Filho (A nova empresarialidade. São Paulo: Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, v.9, n.18, 2006, p. 7) segundo o qual tanto o empresário quanto a sociedade empresarial deve “se pautar pela busca da função social quando em trabalho de perseguição de seu objeto social”.

[47] OLIVEIRA FILHO, João Glicério de. Fundamentos Jurídicos da Função Social da Empresa. 2008. Dissertação. f. 59.

[48] A empresa não é mais considerada um ente alheio ao interesse público e restrito ao âmbito particular, já que o público e o privado se confundem, de modo que também em torno da empresa passa a gravitar um interesse público, coletivo, social.

[49] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007. p. 13.

[50] Tomasevicius Filho, Eduardo. A função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 41.

[51] Também nessa linha, o enunciado n. 53, aprovado nas Jornadas de Direito Civil, promovidas pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal, estabeleceu que, embora o novo Código Civil não mencione a função social da empresa, isto não significa que ela não existe.

[52] Lei n. 6.404 de 15.12.1976.

[53] COMPARATO, Fábio Konder.. Estado, empresa e função social. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 732, 1996. p 41.

[54] TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 40.

[55] Nesse sentido, Eduardo Tomasevicius Filho (A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 42) e Guilherme Gama (Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007, p. 22).

[56] “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”

[57] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007. p. 23.

[58] Corroborando o entendimento de Guilherme Gama, mas utilizando-se de expressões distintas, Fábio Konder Comparato (Estado, empresa e função social. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 732, 1996, p. 44) afirma que a própria lei reconhece a existência de interesses externos e internos no que toca ao exercício da atividade empresarial. Esses interesses, pois, estariam relacionados não apenas com os interesses das pessoas que proporcionam o direto funcionamento da empresa, mas também com a sociedade em que se insere.

[59] O autor ressalta que o condicionamento relativo à busca do pleno emprego deve ser compatibilizado com outros interesses, como a absorção de determinada tecnologia que pode ensejar a diminuição dos postos de trabalho.

[60] No que concerne aos sócios minoritários, o Código Civil estabeleceu medidas para resguardar seus interesses, como aumento do quorum necessário para a aprovação de determinadas matérias.

[61] Ver também art. 173 § 4º da CF: “ A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”.

[62] TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 43. Segundo leciona o autor, são objetivos econômicos alcançados através da livre concorrência: a eficiência alocativa, que consiste na utilização dos recursos sociais nas atividades que os consumidores mais necessitam; e a eficácia produtiva, que é a utilização da menor quantidade de recursos sociais possíveis na produção de bens de consumo.

[63] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007. p. 25.

[64] TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 44.

[65] Segundo explica Eduardo Tomasevicius (A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 47), na responsabilidade social, a empresa responde perante a sociedade pela inércia estatal em cumprir com seus deveres de proporcionar aos cidadãos uma existência digna. A empresa, então, passa a atuar em setores que, tradicionalmente, são de competência estatal, sob o fundamento de que o seu poder econômico não pode ser exercido exclusivamente de forma a atender aos interesses do titular desse poder. Diante dessas afirmações, o autor interroga se a responsabilidade social seria uma nova função social da empresa.

[66] BARTHOLO, Bruno Paiva. GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da Gama. Função Social da empresa. In: GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função Social no Direito Civil. p. 104.

[67] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007. p. 16.

[68] Sentido amplo.

[69] TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 42.

[70] A Constituição Federal de 1988 teve, sem dúvida, grande influência nessa nova concepção que se delineou no Direito Privado, especialmente em razão do conteúdo valorativo trazido em seu bojo, cuja influência no campo das relações privadas é notável.

[71] FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006. P. 35.

[72] OLIVEIRA FILHO, João Glicério de. Fundamentos Jurídicos da Função Social da Empresa. 2008. Dissertação. f. 102.

[73] MAMEDE, Glasdston. Direito Empresarial brasileiro, vol. 4: falência e recuperação de empresas. São Paulo: Atlas, 2006. p. 417.

[74] OLIVEIRA FILHO, João Glicério de. Fundamentos Jurídicos da Função Social da Empresa. 2008. Dissertação. f. 100.

[75] O princípio da preservação da atividade empresarial já encontra aplicabilidade em institutos de direito societário, como ocorre no caso da preservação da sociedade que tenha apenas um sócio, por determinado período, no intuito de que a mesma recomponha o requisito da pluralidade. O princípio em análise também tem aplicabilidade no direito tributário e, agora, com o instituto da recuperação de empresas, no Direito Falimentar. Este último será melhor analisado no ponto seguinte.

[76] CRETELLA NETO, José. Nova Lei de falências e recuperação de empresas: Lei n° 11.101, de 09.02.2005. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 10.

[77] TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 45.

[78] FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 20.

[79] GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Função social da empresa. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 857, 2007. p. 12. Fábio Konder Comparato (Direito empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 3) ainda traz uma quarta justificativa para que a empresa seja considerada a instituição mais importante da sociedade contemporânea: a influência que exerce sobre outras instituições e grupos sociais. Nesse ponto, faz-se interessante conhecer as palavras do autor: “decisiva é hoje, também, sua influência na fixação do comportamento de outras instituições e grupos sociais que, no passado ainda recente, viviam fora do alcance da vida empresarial. Tanto as escolas quanto as universidades, os hospitais e os centros de pesquisa médica, as associações artísticas e os clubes desportivos, os profissionais liberais e as forças armadas, todo esse mundo tradicionalmente avesso aos negócios viu-se englobado na vasta área da atuação da empresa. A constelação típica do mundo empresarial – o utilitarismo, a eficiência técnica, a inovação permanente, a economicidade de meios – acabou por avassalar todos os espíritos, homogeneizando atitudes e aspirações.”

[80] Em sentido diverso, Eduardo Tomasevicius Filho (A função social da empresa, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 810, 2003, p. 45): “Essa nova visão do Direito Falimentar, que procura manter a empresa funcionando, não visa atender exatamente à função social da empresa, mas sim o papel social da empresa na economia e na sociedade.” Como dito no ponto 5.3.5, não é razoável investir na distinção entre papel da empresa e função social da empresa, razão pela qual essa tese não se sustenta.

[81] CRETELLA NETO, José. Nova Lei de falências e recuperação de empresas: Lei n° 11.101, de 09.02.2005. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 11.

[82] Art. 116 da Lei n. 6.404/76, Lei das Sociedades por Ações.

[83] A empresa não ficaria mais submetida à conduta do empresário, como se entre eles houvesse uma relação dominial. Isso será melhor analisado no ponto 5.3.1.1.

[84] Note-se que não se trata de preservar, a qualquer custo, toda sorte de empresas, mas de lutar pela manutenção daquelas que, apesar do estado de crise, mostrem-se viáveis economicamente e, conseqüentemente, capazes de representar benefícios à coletividade. Desta feita, abandona-se o ideal de defesa exclusiva dos interesses dos credores e do devedor, como ocorria sob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/19945, adotando-se o intuito de atender, no máximo possível, aos interesses de toda a sociedade.

[85] “Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter: [...] II – demonstração de sua viabilidade econômica [...]”

[86] Isso porque o crédito bancário e os produtos e serviços oferecidos ficarão mais caros para que os efeitos da recuperação da empresa sejam socializados, já que tal recuperação envolve um encadeamento complexo de relações econômicas e sociais.

[87] O Poder Judiciário deve ser bastante criterioso no exame da viabilidade da empresa.

[88] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 383-385.

[89] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar: volume 2. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 82.

[90] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 383.

[91] Nesse caso, era chamada de concordata dilatória.

[92] Quando consistia na redução do valor da dívida, era chamada concordata remissória.

[93] Concordata mista.

[94] PAIVA, Luiz Fernando Valente de. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) –Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 582.

[95] Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros: I – concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas; II – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente; III – alteração do controle societário; IV – substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos; V – concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar; VI – aumento de capital social; VII – trespasse ou rendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados; VIII – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva; IX – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro; X – constituição de sociedade de credores; XI – venda parcial dos bens; XII – equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica; XIII – usufruto da empresa; XIV – administração compartilhada; XV – emissão de valores mobiliários; XVI – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor. § 1º Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia. § 2º Nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial.

[96] FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 105.

[97] SZTAJN, Rachel. Comentário a recuperação extrajudicial de empresas. In: TOLEDO, Paulo F. C. Salles de, ABRÃO, Carlos Henrique. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência/ coordenadores. – 2. Ed ver. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2007. p. 473.

[98] Ratificando esse entendimento, o art. 116 da Lei de Sociedades por Ações dispõe: “o acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.”

[99] COMPARATO, Fábio Konder. .Direito empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 21.

[100] Note que, aqui, mais uma vez, tem-se como premissa o cumprimento da função social pela empresa. É, pois, a empresa que cumpre a sua função social a merecedora do esforço a ser despendido pela sociedade na sua recuperação.

[101] Art. 147 do Decreto-Lei n. 7.661/45: “A concordata concedida obriga a todos os credores quirografários, comerciais ou civis, residentes no País ou fora dele, ausentes ou embargantes”.

[102] FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova Lei de Falência e recuperação de empresas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

[103] Essa exigência do novo instituto jurídico será objeto de crítica no tópico dedicado a tratar das perspectivas em torno da nova lei, ponto 6 deste artigo.

[104] Se, por exemplo, o devedor decidisse pagar seus débitos à vista, com 50% (cinqüenta por cento) de desconto, e preenchesse todos os requisitos para a obtenção da concordata, o credor era obrigado a aceitar.

[105] “Art. 156. O devedor pode evitar a declaração da falência, requerendo ao juiz que seria competente para decretá-la, lhe seja concedida concordata preventiva. § 1° O devedor, no seu pedido, deve oferecer aos credores quirografários, por saldo de seus créditos, o pagamento mínimo de: I - 50%, se fôr à vista; II - 60%, 75%, 90% ou 100%, se a prazo, respectivamente, de 6 (seis), 12 (doze), 18 (dezoito), ou 24 (vinte e quatro) meses, devendo ser pagos, pelo menos, 2/5 (dois quintos) no primeiro ano, nas duas últimas hipóteses.”

[106] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar: volume 2. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 208.

[107] Fez ressurgir porque tal órgão já existia no ordenamento jurídico brasileiro, sendo extinto apenas com o Decreto-Lei n. 7.661/45.

[108] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 1.

[109] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada. SP: RT, 3ª edição, 2005. p. 111.

[110] É que a participação dos credores na aprovação do plano aproxima a solução para a crise da empresa das soluções de mercado. Se a empresa, apesar de seu estado crítico, for uma alternativa de investimento atraente, os credores estarão dispostos a fazer mais concessões (e se submeter a maiores sacrifícios) em prol da sua reestruturação.

[111] Note, por outro lado, que o legislador também não deixou a decisão de recuperar ou não a empresa exclusivamente nas mãos do credor, tendo o juiz, em alguns casos, a discricionariedade para aprovar ou não o plano que quase tenha alcançado o quorum qualificado previsto na lei. Trata-se do plano que recebeu, cumulativamente, na Assembléia: a) o voto favorável de mais da metade do total dos créditos presentes, independentemente da classe de seus titulares; b) a aprovação pela maioria das classes (ou, se apenas duas votarem, por uma delas); e c) a aprovação de mais de 1/3 dos votos no âmbito da instância classista que a rejeitou (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 423).

[112] “Art. 2º. Caracteriza-se, também, a falência, se o comerciante: [...] III – convoca credores e lhes propõe dilação, remissão de créditos ou cessão de bens [...]” Era como se o empresário reconhecesse que devia, mas que não tinha como pagar, o que significava confessar que havia falido.

[113] PAIVA, Luiz Fernando Valente de. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) –Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 562.

[114] “CONCORDATA PREVENTIVA. Insurgência contra a decisão que homologou o plano de pagamento das dívidas apresentado pela concordatâria. Inadmissibilidade. Proposta que é a única solução viável para a demanda. Recurso improvido. [...] A homologação do plano ofertado pela Concordatária, com a prévia anuência da Comissária (maior credora) e do órgão do "Parquet", é a única solução viável para a presente espécie. Com efeito, além das ponderáveis razões expostas na contraminuta, deve-se convir que, se não está a agravante, juntamente com outros nove discordantes, obrigada a assinar um acordo, muito menos estão os outros quatrocentos credores pactuantes obrigados a não fazê-lo, por causa da dissidência de apenas dez. Então, a razão impõe que se conceda a

vitória à esmagadora maioria, pelo menos até que, ao final do corrente ano, a Concordatária cumpra com a primeira parte do aludido plano. Isto posto, nega-se provimento ao recurso.” (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento n. 311.043-4/3-00. Segunda Câmara de Direito Privado. Rel. Dês. Boris Kauffman e Morato Andrade, j. 25.5.2004.)

[115] PAIVA, Luiz Fernando Valente de. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) –Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 568.

[116] Essa classificação é trazida por Luiz Fernando Valente de Paiva (Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) –Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 569.). Como a lei não prevê uma denominação específica para cada uma das espécies, o autor sugeriu uma classificação simples e auto explicativa. Ao que parece, é a mais adequada ao tema. Outros autores, todavia, sugeriram denominações distintas a exemplo de Gladston Mamede que intitula a recuperação extrajudicial meramente homologatória de ordinária e a impositiva de extraordinária; de Fábio Ulhoa Coelho que classifica as duas modalidades do instituto como homologação facultativa e homologação obrigatória; e de Ricardo Negrão que chama a primeira modalidade de recuperação extrajudicial individualizado e a segunda de plano de recuperação judicial por classe de credores.

[117] Para que essa modalidade de acordo fosse mais eficaz seria interessante, contudo, que ela fosse protegida contra eventuais ações revocatórias[117] ou declaração de ineficácia de atos contemplados no plano homologado pelo juízo. Isso porque um dos óbices a sua realização está no temor dos credores de que os bens dados em garantia pelos devedores sejam objeto de futuras ações como estas (PAIVA, Luiz Fernando Valente de. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) – Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 571).

[118] A prova do cumprimento desse requisito deve ser feita com a juntada aos autos de plano contendo a assinatura de todos os credores que a ele estejam sujeitos.

[119] NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 203. Para Luiz Fernando Paiva (Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) – Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 585) essa seria uma forma de evitar conluios entre devedor e um grupo de credores, trazendo a título ilustrativo como hipótese de conluio a dação em pagamento de estabelecimento empresarial do devedor, não lhe restando bens suficientes para pagamento dos demais credores.

[120] Por “espécie” de crédito deve-se entender as seguintes classes de crédito previstos no art. 83, da Lei n. 11.101/05: a) crédito com garantia real (inc. II); b) crédito com privilégio especial (inc. IV); c) crédito com privilégio geral (inc. V); d) crédito quirografário (inc. VI); e) crédito subordinado (inc. VII).

[121] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 437.

[122] CASTRO, Eduardo Spinola e. A arbitragem e a Nova Lei de Falência. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de e ARAGÃO, Leandro Santos de (coord.). Direito Societário e a Nova Lei de Falências e Recuperação de empresas. São Paulo, Latin, 2006, p. 137.

[123] Art. 161, §5º da Lei n. 11.101/05.

[124] CASTRO, Eduardo Spinola e. A arbitragem e a Nova Lei de Falência. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de e ARAGÃO, Leandro Santos de (coord.). Direito Societário e a Nova Lei de Falências e Recuperação de empresas. São Paulo, Latin, 2006, p. 137.

[125] SZTAJN, Rachel. Comentário a recuperação extrajudicial de empresas. In: TOLEDO, Paulo F. C. Salles de, ABRÃO, Carlos Henrique. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência/ coordenadores. – 2. Ed ver. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2007, p. 467.

[126] PAIVA, Luiz Fernando Valente de. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) – Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 586.

[127] DINAMARCO, Cândido Rangel. A nova era do Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 16.

[128] GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 2 ed. São Paulo: Malheiros editores, 2003. p. 28.

[129] AGUIAR, Adriana. Lei de recuperação diminui pedidos de falência em 56%. Disponível em: <www.administradores.com.br/noticias/lei_de_recuperacao_diminui_pedidos_de_falencia_em_56/9090/>.Publicado em: 12 jan. 2007. Acesso em: 10. jun. 2008.

[130] OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Recuperação judicial das concessionárias de serviços aéreos e uma análise do processo da empresa Varig. Disponível em: www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp> Publicado em: 07 jul. 2005b Acesso em: 10 jul. 2008.

[131] Foi revogado pela nova norma falimentar.

[132] ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 2. ed. São Paulo, Malheiros, 2003. p. 95.

[133] WILGES, Fernando dos Santos. A recuperação judicial da empresa e a possibilidade de verificação da inconstitucionalidade do art. 57 da Lei n. 11.101/05 pela via do controle difuso. Disponível em: <http://http://jus.com.br/revista/texto/8836">

Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/21530/o-instituto-da-recuperacao-de-empresas-e-sua-funcao-social/3#ixzz1v9bBIz00

 

[134] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: volume 3: direito de empresa. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 420.

[135] ALONSO, Manoel. Da recuperação extrajudicial. In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.) –Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas – São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 303.

[136] GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 2 ed. São Paulo: Malheiros editores, 2003. p. 40.


Abstract: The company is considered, now-a-days, as a mayjor meaning of the contemporary society and could not be turned only to the individual interest satisfactions of its bearers, having to take care of a social function. From this time on, the bankrupt legislator focus turned to the accented social interest that company maintenance keeps, bringing up the Law n. 11.101/05 and the company institute recovery. A real Law Bankrupt Reform, however, do not depend only from the legislative alteration that comes along with the new low, but also, and, mainly, from its interpretation that could be made its new justinian codes, a fact that brings an insight to the importance to investigate all the legal beddings from the justinian codes to bankrupt alterations: company social function and principles of the company maintenance.

Key-words: Bankrupt law reformation .Companies recovery. Company social function. Principles of the company maintenance.