A nova configuração jurídica do sistema de proteção ao programa nuclear brasileiro


PorJeison- Postado em 10 dezembro 2012

Autores: 
RIEFFEL, Luiz Reimer Rodrigues.

 

1. INTRODUÇÃO.

 

Recentemente, em 22 de novembro de 2012, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei nº 12.731, de 21 de novembro de 2012, que conferiu nova disciplina legislativa ao Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro – SIPRON, revogando o Decreto-Lei nº 1.809, de 7 de outubro de 1980.

 

2.  OBJETIVOS E ORGANIZAÇÃO DO SIPRON.

 

O SIPRON tem por escopo principal desenvolver atividades, supervisionar e coordenar ações que busquem manter, em caráter intermitente, a capacidade para uma célere resposta pública e privada a situações que constituam emergência nuclear no território nacional, bem como a proteção dos materiais e conhecimentos considerados de natureza sensível que estejam relacionados aos programas e projetos de natureza nuclear em desenvolvimento.

 

Nesse sentido, desde a sua criação, o SIPRON foi o responsável por implementar, no âmbito da energia nuclear, uma organização sistêmica que permitisse:

 

1)      o planejamento integrado,

 

2)      a ação conjunta, e

 

3)      a execução continuada de providências a fim de atender às necessidades de segurança de todo o Programa Nuclear Brasileiro e das pessoas envolvidas nele, sem olvidar da população e do meio ambiente com ele relacionados.[1]

 

De acordo com o art. 2º, I, do Decreto nº 85.565, de 18 de dezembro de 1980, "Programa Nuclear Brasileiro" deveria ser entendido como o conjunto dos projetos e atividades relacionados com a utilização, para fins pacíficos, da energia nuclear segundo orientação, controle e supervisão do Governo Federal.

 

O Decreto-Lei nº 1.809, de 7 de outubro de 1980, foi regulamentado pelo acima mencionado Decreto nº 85.565, que configurou o SIPRON como um conjunto entidades de natureza pública em todos os níveis federativos e de caráter privado. Naquela oportunidade, o órgão central era a Secretaria-Geral do Conselho de Segurança Nacional da Presidência da República, nos termos do art. 3º do referido Decreto:

 

CAPÍTULO II

 

Do Órgão Central

 

Art. 3º. A Secretaria-Geral do Conselho de Segurança Nacional - SG/CSN, como Órgão Central, é responsável pela orientação superior, supervisão e fiscalização do SIPRON.

 

3. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA COERÊNCIA REGULAMENTAR DO SISTEMA.

 

Com o passar dos anos, em razão de inúmeras alterações realizadas na estrutura e no funcionamento de órgãos da administração pública federal, parece natural que surgisse a necessidade de modificações normativas com o intuito de manter uma coerência regulamentar no sistema. Nesta ótica, foram expedidos os Decretos nº 89.225, de 22 de dezembro de 1983, nº 96.775, de 27 de setembro de 1988, nº 623, de 4 de agosto de 1992, e nº 2.210, de 22 de abril de 1997.

 

Através da expedição do Decreto nº 2.210, que revogou o então vigente Decreto nº 623, de 4 de agosto de 1992, temos a mais recente regulamentação do SIPRON. De qualquer forma, neste Decreto percebe-se o descompasso com o agora revogado Decreto-Lei nº 1.809/80 ao atribuir à já extinta Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República a responsabilidade como Órgão Central do Sistema:

 

DECRETO Nº 2.210, DE 22 DE ABRIL DE 1997.

 

Art 3º Integram o SIPRON:

 

I - Órgão Central:

 

Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República; 

 

Isso porque o Decreto-Lei nº 1.809/80, confere essa atribuição à, também extinta, Secretaria-Geral do Conselho de Segurança Nacional:

 

Art 3º O SIPRON compreende:

 

I - Órgão Central:

 

- a Secretaria-Geral do Conselho de Segurança Nacional;

 

Cabe ressaltar que, em virtude da competência atribuída ao Ministério da Ciência e Tecnologia, pela Medida Provisória nº 2.216-37, de 31 de agosto de 2001, este obteve o exercício da função de Órgão Central do SIPRON até a edição do Decreto nº 6.931, de 11 de agosto de 2009, oportunidade em que foi atribuída essa atribuição ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República[2]:

 

MEDIDA PROVISÓRIA No 2.216-37, DE 31 DE AGOSTO DE 2001.

 

Art. 1º A Lei no 9.649, de 27 de maio de 1998, passa a vigorar com as seguintes alterações:

 

(...)

 

"Art. 14.  Os assuntos que constituem área de competência de cada Ministério são os seguintes:

 

II - Ministério da Ciência e Tecnologia:

 

a) política nacional de pesquisa científica e tecnológica;

 

b) planejamento, coordenação, supervisão e controle das atividades da ciência e tecnologia;

 

c) política de desenvolvimento de informática e automação;

 

d) política nacional de biossegurança;

 

e) política espacial;

 

f) política nuclear;

 

g) controle da exportação de bens e serviços sensíveis;

 

DECRETO Nº 6.931, DE 11 DE AGOSTO DE 2009. Anexo I.

 

Art. 1º O Gabinete de Segurança Institucional, órgão essencial da Presidência da República, tem como área de competência os seguintes assuntos:

 

(...)

 

§ 1º Compete, ainda, ao Gabinete de Segurança Institucional:

 

(...)

 

V - exercer as atividades de Órgão Central do Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro - SIPRON.

 

Constituem responsabilidades do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, na qualidade de Órgão Central do SIPRON:

 

1) a sua orientação superior,

 

2) sua coordenação-geral, mediante o seu controle e supervisão.

 

Por fim, deve-se acrescentar que, para executar esta última tarefa, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República conta com o assessoramento da Comissão de Coordenação da Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro - COPRON, constituída por representantes de diversos órgãos da administração pública federal direta e indireta[3]:

 

Órgãos de Coordenação Setorial:

 

- Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), do Ministério da Ciência e Tecnologia

 

- Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego

 

- Secretaria Nacional de Defesa Civil do Ministério da Integração Nacional (SEDEC/MI)

 

- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA)

 

- Agência Brasileira de Inteligência do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (ABIN/GSIPR)

 

Órgãos de Execução Seccional:

 

- Indústrias Nucleares do Brasil S.A. (INB), do Ministério da Ciência e Tecnologia

 

- Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (ELETROBRÁS)

 

- Eletrobrás Termonuclear S.A. (ELETRONUCLEAR)

 

- Entidades de ensino e pesquisa científicas [federais, estaduais ou privadas] que participem em projeto ou atividade nuclear ou, ainda, que possuam instalação nuclear no país.

 

Órgãos de Apoio:

 

- Ministério da Justiça

 

- Ministério da Defesa

 

- Ministério das Relações Exteriores

 

- Ministério da Fazenda

 

- Ministério dos Transportes

 

- Ministério da Saúde

 

- Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

 

- Ministério das Comunicações

 

- Governos Estaduais e Municipais, em cujos territórios se desenvolvam projetos ou atividades do Programa Nuclear Brasileiro

 

- Empresas ou entidades do setor privado que, por contrato ou outro documento hábil, prestam serviços relacionados com a segurança de projetos e atividades do Programa Nuclear Brasileiro.[4]

 

4.      NOVA DISCIPLINA LEGISLATIVA DO SIPRON.

 

Com o advento da Lei nº 12.731, de 21 de novembro de 2012, o SIPRON, instituído pelo Decreto-Lei nº 1.809, de 7 de outubro de 1980, passou a reger-se pelo disposto nesta Lei.

 

A referida Lei dispõe que o SIPRON será coordenado por órgão do Poder Executivo federal e terá as seguintes atribuições:

 

I - coordenar as ações para atender permanentemente as necessidades de proteção e segurança do Programa Nuclear Brasileiro;

 

II - coordenar as ações para proteger os conhecimentos e a tecnologia detidos por órgãos, entidades, empresas, instituições de pesquisa e demais organizações públicas ou privadas que executem atividades para o Programa Nuclear Brasileiro;

 

III - planejar e coordenar as ações, em situações de emergência nuclear, que tenham como objetivo proteger:

 

a) as pessoas envolvidas na operação das instalações nucleares e na guarda, manuseio e transporte dos materiais nucleares;

 

b) a população e o meio ambiente situados nas proximidades das instalações nucleares; e

 

c) as instalações e materiais nucleares.

 

De acordo com a nova legislação, integram o SIPRON (1) os órgãos, instituições, entidades e empresas federais e estaduais responsáveis pela proteção e segurança do Programa Nuclear Brasileiro com o objetivo de executar ações para garantir a integridade, a invulnerabilidade e a proteção dos materiais, das instalações, do conhecimento e da tecnologia nucleares, na forma do regulamento; e (2) os órgãos, instituições, entidades e empresas federais, estaduais e municipais responsáveis por situações de emergência nuclear com o objetivo de executar ações em caso de emergência nuclear, na forma do futuro regulamento a ser ainda editado.

 

A Lei dispõe também que, em situações de emergência nuclear, caso ocorra a indisponibilidade de meios para atuar por parte dos órgãos, instituições, entidades e empresas federais, estaduais e municipais responsáveis por situações de emergência nuclear, o Governo Federal, em colaboração com os governos estaduais, distrital e municipais dos locais onde haja instalações nucleares, executará as ações necessárias para suprir eventuais deficiências.

 

No que diz respeito à estrutura organizacional do SIPRON, a nova Lei federal determina que as atribuições dos órgãos, instituições e empresas que o compõem e demais disposições necessárias ao seu cumprimento do disposto, ficarão a cargo de decreto de natureza regulamentar.

 

5.      CONCLUSÃO.

 

O acidente na Central Nuclear de Fukushima I, no Japão, em consequência dos danos causados pelo terremoto e tsunami, ocorridos em 11 de março de 2011, despertaram ao redor do mundo um crescente debate sobre a segurança da energia nuclear, bem como os seus custos (econômicos, sociais e ambientais) e seus benefícios.

 

Investimentos em segurança estão tornando as usinas nucleares cada vez mais caras de serem construídas e mantidas. Da mesma forma, novas regulamentações mais severas sobre a matéria estão sendo desenvolvidas. De acordo com a publicação britânica The Economist, tendo como exemplo a China:

 

“Depois de Fukushima, o conselho de estado chinês parou de aprovar novas usinas e determinou reavaliações dos riscos sísmicos e pluviométricos das unidades já construídas e daquelas com construção em andamento. Uma nova lei esperada para até o fim do ano tirará da competência da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, órgão oficial de planejamento industrial, a regulação nuclear e passará para o Ministério do Meio Ambiente chinês.”[5]

 

No Brasil, desde 1997, podem-se destacar as seguintes Normas Gerais sobre segurança nuclear:

 

a)      NG-05 - Norma Geral para o Estabelecimento das Campanhas de Esclarecimento Prévio e de Informações ao Público para uma Situação de Emergência;

 

b)      NG-06 - Norma Geral para Instalação e Funcionamento dos Centros Encarregados da Resposta a uma Situação de Emergência Nuclear;

 

c)      NG-07 - Norma Geral para o Planejamento das Comunicações do Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro - SIPRON; e

 

d)     NG-08 - Norma Geral para o Planejamento e a Execução da Proteção ao Conhecimento Sigiloso.

 

Neste contexto, a inciativa de instituir o Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro – SIPRON e revogar o Decreto-lei nº 1.809, de 07/10/1980, é louvável, na medida em que atualiza juridicamente o que vem sendo praticado em termos de Planejamento de Emergência das instalações nucleares no Brasil, permitindo uma melhor reflexão do gestor público acerca dos custos e benefícios da energia nuclear em nosso país.

 

6.      Bibliografia.

 

BRASIL. Lei Federal 12.731, de 21 de novembro de 2012. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L12731.htm. Acesso em 2.12.2012.

 

BRASIL. Lei Federal nº 9.649, de 27 de maio de 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9649cons.htm. Acesso em 2.12.2012.

 

BRASIL. Decreto-Lei nº 1.809, de 7 de outubro de 1980. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del1809.htm. Acesso em 2.12.2012.

 

BRASIL. Decreto nº 85.565, de 18 de dezembro de 1980. Disponível em: http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaNormas.action?numero=85565&tip.... Acesso em 2.12.2012.

 

BRASIL. Decreto nº 2.210, de 22 de abril de 1997. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1997/d2210.htm. Acesso em 2.12.2012.

 

BRASIL. Decreto nº 6.931, de 11 de agosto de 2009. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/D6931.htm. Acesso em 2.12.2012.

 

BRASIL. Portal SIPRON. Disponível em: http://sipron.gsi.gov.br. Acesso em: 2 dez. 2012.

 

Vários autores. “Bandwagons and busts. Nuclear plants are getting ever more expensive.” In The Economist, 10 de março de 2012. Disponível em: http://www.economist.com/node/21549094. Acesso em: 2 dez. 2012.

 

Notas:

[1] SIPRON - Histórico. Disponível em: <http://sipron.gsi.gov.br/historico>. Acesso em: 2 dez. 2012.

[2] Idem.

[3] Ibidem.

[4] SIPRON - Histórico. Disponível em: <http://sipron.gsi.gov.br/estrutura>. Acesso em: 2 dez. 2012.

[5] “Bandwagons and busts. Nuclear plants are getting ever more expensive.” In The Economist, 10 de março de 2012. Disponível em: http://www.economist.com/node/21549094. Acesso em: 2 dez. 2012.

 

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