A modalidade de intervenção de terceiros prevista no art. 1698 do Código Civil


PorFernanda dos Passos- Postado em 16 novembro 2011

Autores: 
NUNES, Franciene Rodrigues
AMARAL, Fernando

Resumo: Este artigo trata sobre pensionamento alimentício no Código Civil e a existência de uma norma com visível caráter processual na regulamentação sobre a matéria, que é o seu artigo 1698. Em um primeiro momento abordou-se sobre os alimentos, em um sentido amplo para fins de esclarecimento inicial. Num segundo momento tratou-se sobre a responsabilização subsidiária no pagamento do pensionamento alimentício. A seguir, por estar presente na Legislação Civil  uma possibilidade de intervenção de terceiros cuja aplicação ainda não está pacificada, foram apresentadas diversas posições doutrinárias e jurisprudenciais sobre a aplicabilidade do artigo 1698 e sua classificação como forma de intervenção de terceiros.

Palavras-Chave: alimentos - alimentante – alimentando – obrigação alimentar

Sumário: Introdução; 2. Conceito e natureza jurídica dos alimentos; 3. A inexistência de responsabilidade solidária nos alimentos; 4. A  modalidade de intervenção de terceiros prevista no artigo 1698 do Código Civil; Conclusão; Referências Bibliográficas.

1. Introdução

O novo Código Civil trouxe várias inovações ao direito de família brasileiro, porém, não tratou somente de questões de direito material, trazendo dispositivos com visíveis traços de direito processual.

Um dos dispositivos que possui característica processual trazido pelo novo Código Civil é o art. 1698, que instituiu uma nova intervenção de terceiros. Fala-se em nova porque o instituto parece não se enquadrar em nenhuma modalidade de intervenção de terceiros prevista na norma processual civil.

Frente a tal situação, o presente trabalho visa trazer os mais diversos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais quanto à modalidade de instituto processual que se enquadraria o instituto previsto na parte final do art. 1698 do novo Código Civil.

2. Conceitos e Natureza Jurídica dos Alimentos

O Código Civil dispõe acerca dos Alimentos no Subtítulo III, do Título II do Livro IV, que dispõe sobre Direito de Família. Assim, os artigos 1694 a 1710 são destinados especificamente a tratar sobre os alimentos.

Sabe-se que nas relações familiares deve haver tanto a assistência material, financeira, para fins de saúde, educação, vestuário, alimentação, como a imaterial, de afeto, carinho, amor, atenção.

Alimentos, na definição de ORLANDO GOMES apud GONÇALVES, são “prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si. Têm por finalidade fornecer a um parente, cônjuge ou companheiro o necessário à sua subsistência”.

Para GONÇALVES:

“O vocábulo “alimentos” tem, todavia, conotação muito mais ampla do que na linguagem comum, não se limitando ao necessário para o sustento de uma pessoa. Nele não se compreende só a obrigação de prestá-los, como também o conteúdo da obrigação a ser prestada. [...] Quanto ao conteúdo, os alimentos abrangem, assim, o indispensável ao sustento, vestuário, habitação, assistência médica, instrução e educação (CC, arts. 1694 e 1920).”

Assim dispõe o artigo 1694 do Código Civil: “podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”.

Segundo DINIZ (2005, p. 534)

“... o fundamento desta obrigação de prestar alimentos é o princípio da preservação da dignidade da pessoa humana (CF., art. 1, III) e o da solidariedade familiar, pois vem a ser um dever personalíssimo, devido pelo alimentante, em razão de parentesco, vínculo conjugal ou convivencial que o liga ao alimentado.”

O artigo 1694 do Código Civil acima mencionado dispõe que a obrigação de prestar alimentos engloba parentes, cônjuges ou companheiros, estendendo sua aplicação a todos eles.

A obrigação de pagar alimentos aos parentes advém da existência de vínculo de sangue (parentesco natural) ou adoção (parentesco civil), quanto então se torna possível a obrigação subsidiária.

Quanto aos alimentos devidos entre cônjuges ou companheiros, estes somente poderão exigir entre si o pensionamento em razão do vínculo do matrimônio ou união estável, não sendo possível a obrigação subsidiária dos parentes na falta do cônjuge, uma vez que a obrigação alimentar advém do matrimônio ou união estável, e não do parentesco.

Saliente-se que existe o pensionamento alimentício oriundo de uma liberalidade e ainda o que advém da responsabilidade civil, como por exemplo, um acidente em que alguém restou definitivamente incapacitado para o trabalho, e que poderá acionar o culpado a fim de postular alimentos.

Sabe-se ainda que os alimentos devem ser fixados de acordo com a necessidade do alimentando e a possibilidade econômica do alimentante.

Segundo DINIZ (p. 539), a possibilidade econômica do alimentante existe quando este cumpre seu dever, pagando o pensionamento, sem que haja desfalque do seu sustento.

Já, quando fala de necessidade do alimentando DINIZ (p. 538), informa que

“O estado de penúria da pessoa que necessita alimentos autoriza-a a impetrá-los, ficando ao arbítrio do magistrado a verificação das justificativas do seu pedido, levando em conta, para apurar a indigência do alimentário, suas condições sociais, sua idade, sua saúde e outros fatos espécio-temporais que influem na própria medida.”

Assim, para uma fixação justa de pensionamento alimentício, deve haver uma proporcionalidade entre a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante.

3. A inexistência de responsabilidade solidária nos alimentos

Os artigos 1696 e 1697 do CC assim dispõem:

“Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Art. 1697. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais.”

Do conteúdo dos mesmos, verifica-se que, quando se trata de obrigação alimentícia advinda de parentesco, existem quatro classes de pessoas obrigadas ao pagamento do pensionamento, através de uma ordem hierárquica:

1. pais e filhos reciprocamente

2. ascendentes

3. descendentes

4. irmãos germanos ou unilaterais

O art. 1696 do CC cita expressamente o termo “uns em falta de outros”, deixando claro se tratar de uma ordem hierárquica, e, somente no caso de falta ou impossibilidade financeira do anterior é que se pleiteará contra o parente em local posterior na escala hierárquica.

Dessa forma, são chamados a prestar alimentos, em primeiro lugar, os parentes em linha reta, os mais próximos, excluindo os mais distantes. Se o pai puder pagar o pensionamento, o avô não será acionado. Se não existirem parentes em linha reta, ou estão estes impossibilitados de pensionar,serão chamados então, os irmãos, tanto unilaterais como os germanos.

Existe assim um escalonamento de obrigações, que é determinado pela própria lei civil, ou seja, o alimentando deve ajuizar primeiramente a ação contra seus parentes mais próximos (pai e mãe), e somente poderá chamar os seguintes caso esteja comprovado que os anteriores não têm condições de pagar (possibilidade) a importância que o alimentando necessita.

Vale salientar que somente os irmãos estão obrigados a prestar alimentos na linha colateral, estando os demais parentes e também os afins excluídos da obrigação alimentar pela própria norma civil.

Trata-se a obrigação alimentar de uma obrigação divisível entre vários parentes, sendo que cada um poderá contribuir com um certo valor para os alimentos em favor do alimentando, de acordo com a sua capacidade econômica (possibilidade).

Frise-se que não há responsabilidade solidária eis que, o prestacionamento será fixado de acordo com as possibilidades de cada um, e, em momento algum será possível pleitear restituição de valor pago a título de alimentos em face de outro coobrigado.

Ademais, o Código Civil, em seu artigo 265, prescreve que “A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes”, e, no caso de obrigação alimentar, a lei não a prevê como solidária.

Portanto, em um caso em que o filho, sob a guarda da mãe, ajuíza ação de alimentos exclusivamente contra seu pai, e comprovado que este não tem condições de arcar com o valor que necessita, poderá o autor da ação direcionar sua pretensão contra seus avós.

Vale salientar que MARIA BERENICE DIAS citada no acórdão nº 70017251562 do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS contraria a posição majoritária da doutrina, entendendo que a obrigação alimentar é solidária. Parte do referido acórdão é adiante mencionada.

Assim, abordado o tema da complementaridade da obrigação alimentar, posição dominante na doutrina e jurisprudência, torna-se relevante trazer a discussão acerca da regra do art. 1698 do CC que instituiu uma nova intervenção de terceiros.

4. A modalidade de intervenção de terceiros prevista no artigo 1698 do Código Civil

O artigo 1698 do novo Código Civil, por sua vez, veio aclarar dúvidas que existiam acerca da solidariedade ou subsidiariedade do dever de prestar alimentos, mas também trouxe uma nova modalidade de intervenção de terceiros, portando assim um nítido traço de norma processual.

Assim dispõe:

“Art. 1698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.”

O dispositivo acima deixa clara a divisibilidade da obrigação alimentícia, permitindo que no mesmo processo, sejam outros alimentantes chamados para integrar a lide.

São chamados a prestar alimentos os mais próximos, excluindo-se os mais remotos em linha, primeiro pais ou filhos, depois avôs ou netos, e estando estes impossibilitados é que então se buscará a obrigação pelos colaterais.

Assim, analisando a primeira parte do artigo 1698, nota-se que está clara a obrigação complementar do encargo alimentar.

Dessa forma, para que um menor sob a guarda da mãe possa ajuizar uma ação de alimentos em face dos avós, torna-se necessário primeiramente, que o pai do menor tenha sido acionado, e comprovada integralmente a ausência ou mesmo os parcos recursos financeiros do mesmo, e que os valores que pode pagar são ínfimos para a sobrevivência da criança, aí então se torna possível dirigir a pretensão contra os avós.

No entanto, a celeuma se dá com relação à última parte do artigo 1698, quando diz: “... sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide”.

A uma primeira análise da parte do artigo acima citado, parece que sendo citado o réu, e existirem outros responsáveis na mesma classe, conforme previsto nos arts. 1696 e 1697, o réu poderá chamar a integrar a lide, aqueles que são responsáveis no mesmo nível hierárquico.

Aí surgem posicionamentos, bem como questionamentos: É do autor ou do réu a legitimidade para chamar a lide os demais coobrigados? Qual o momento oportuno? Como efetivar esse chamamento à lide? A qual intervenção de terceiros prevista no CPC, se enquadra aquela constante no artigo 1698 do Código Civil?

São estas questões processuais que a norma processual ainda não traçou dispositivos a fim de tornar efetivo o uso do art. 1698, e ainda, sequer a nomenclatura para o referido instituto está pacificada, sendo o referido dispositivo objeto de muita discussão entre juristas e doutrinadores.

Alguns doutrinadores e juristas entendem que a última parte do art. 1698 trata do instituto “chamamento ao processo”, enquadrando-se especificamente no art. 77, III do CPC, que prescreve:

“Art. 77. É admissível o chamamento ao processo:

...

III - de todos os devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns deles, parcial ou totalmente, a dívida comum;”

Esta é a posição de BUENO, que entende que o dispositivo enquadra-se no “chamamento ao processo”, nos termo do art. 77, III, embora reconheça que, na previsão do artigo 1698 não exista solidariedade.

A mesma posição possui THEODORO JR. quando afirma que a intervenção de terceiros do art. 1698 assemelha-se ao chamamento ao processo, reconhecendo também que não existe solidariedade na obrigação alimentar.

Assim afirma o referido autor:

“O art. 1.698 do Código Civil de 2.002 é, em matéria de prestação de alimentos entre parentes, mais um exemplo de norma heterotópica, porque cogita de um caso de chamamento ao processo, a par daqueles arrolados no art. 77 do CPC. A hipótese se aproxima da solidariedade prevista no inciso III do dispositivo processual, mas que não chega a subsumir-se nela.”

MARIA BERENICE DIAS citada no acórdão n 70017251562 por LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS entende que

“Como a obrigação alimentar é solidária, essa intervenção poderia ser chamamento ao processo, devendo aquele que pretender chamar outros ao processo comprovar as possibilidades destes atenderem ao encargo e, mais, que estão a se omitir da prestação de auxílio ao alimentado.”

Quanto à denunciação da lide, prevista no artigo 70 e seguintes do CPC., a maior parte da doutrina entende que a nova intervenção de terceiros não se enquadra em tal hipótese por não haver direito de regresso entre as partes.

SILMARA CHINELATO apud SILVA afirma que

“Cada devedor pagará por dever próprio, não podendo ressarcir-se do que pagou, diante do outro devedor. A solidariedade, não configurada nos art. 1698 do Código Civil, permite o direito de regresso.”

No mesmo sentido é a posição de RUI PORTANOVA, ao proferir decisão no acórdão n. 70006390629 no TJRS, quando diz:

“A redação do art. 1698 do novo Código Civil, em sua parte final, tem gerado uma certa discussão na doutrina. Discute-se qual seria a espécie de intervenção de terceiros ali prevista, pois o legislador refere que “intentada a ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide”.

Pelo que se pode ver dos termos do art. 70 do CPC, a denunciação da lide é cabível em casos de ação de regresso. Ora, o caso presente, em hipótese alguma se afeiçoa a uma ação desta natureza. Assim, não se tratando de ação de regresso, certamente não se haverá de falar em denunciação da lide. Por igual, não se trata de chamamento ao processo. A obrigação alimentícia não é solidária, mas sim divisível.”

No acórdão n 70017251562, o Relator LUIZ ARI AZAMBUJA RAMOS  traz ainda posicionamento de BELMIRO PEDRO WELTER que entende que a intervenção de terceiros do artigo 1698 do CC é caso de

“Litisconsórcio passivo obrigatório simples: passivo, porque a pensão deve ser paga somente pelo demandado ou pelos demais parentes; obrigatório, porque o legislador optou pelos princípios da celeridade e da economia processual, com a concessão dos alimentos em um único processo; simples, porque a verba alimentar será distribuída entre os parentes de acordo com as suas possibilidades financeiras.”

DIDIER JR. , entende que essa nova intervenção de terceiros se trata de um litisconsórcio facultativo passivo ulterior simples, porém, por provocação exclusiva do autor da demanda, face à previsão legal de que é possível que demais obrigados não arrolados na exordial sejam chamados a integrar a lide.

Em acórdão proferido no Recurso Especial n 658.139 – RS, afirmam os julgadores (MINISTRO FERNANDO GONÇALVES – Relator, MIN. BARROS MONTEIRO, MIN. CÉSAR ASFOR ROCHA) que em primeira análise, parece que o artigo 1698 concede uma faculdade ao autor da ação de alimentos de trazer para o pólo passivo os avós paternos ou maternos, à sua escolha, no entanto, fundamentando seus posicionamentos na doutrina de BELMIRO PEDRO WELTER, afirmam, no acórdão, haver litisconsórcio obrigatório simples, nos seguintes termos:

“Significa dizer que o demandado terá o dever, e não só o direito, de chamar ao processo os co-responsáveis da obrigação alimentar, caso ele não consiga suportar sozinho esse encargo, porque o credor tem o direito de receber a integralidade dos alimentos, que deverão ser fixados nesse processo...

Como se vê, o Código Civil de 2002 contrariou a doutrina e a jurisprudência vigentes, porquanto exige, e não apenas faculta, a convocação de todos os co-obrigados para, no processo pendente, ser distribuída a pensão alimentícia, de acordo com a necessidade do alimentando e as possibilidades de todos os co-responsáveis. E isso significa que o litisconsórcio não é mais facultativo, e sim litisconsórcio passivo obrigatório simples: passivo, porque a pensão deve ser paga somente pelo demandado ou pelos demais parentes; obrigatório, porque o legislador optou pelos princípios da celeridade e da economia processual, com a concessão dos alimentos em um único processo; simples, porque a verba alimentar será distribuída entre os parentes de acordo com as suas possibilidades financeiras.”

Trazidos à baila diversos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais acerca da intervenção de terceiros prevista no art. 1698 do CC. que tem causado diversas discussões, pelo fato do Código Civil dispor de uma norma processual, esclarece-se à seguir a nossa posição a por entendermos a mais adequada à situação, respeitando os mais diversos posicionamentos a respeito da matéria.

Para tanto, imprescindível trazer à tona a posição de CAHALI citado por SILVA, no sentido de que se trata o instituto de um litisconsórcio passivo facultativo simples, em que pode ser instaurado pelo Autor na petição inicial, ou pelo devedor único demandado, em caso de inércia do autor.

Ora, visivelmente não se trata de chamamento ao processo ou denunciação da lide, no momento em que a obrigação alimentar não é solidária.

Dessa forma, verifica-se também não existir litisconsórcio passivo necessário, eis que, a lei é clara ao utilizar o termo “poderão” quando diz “intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide”.

Assim, não existe obrigatoridade de chamar os demais a integrar a lide.

Nesse sentido também é a tese esposada por RUI PORTANOVA no acórdão n 70013839709, discordando do entendimento do STJ no Recurso Especial 366.837/RJ de que se trata de litisconsórcio obrigatório simples, quando em seu voto assim diz:

“Vale a pena lembrar, por primeiro, que o artigo que trata da questão – artigo 1698 do CCB – faz referência expressa a possibilidade, e não a obrigatoriedade, de chamamento dos avós não originalmente demandados.”

Entendemos haver, no caso da parte final do art. 1698, uma liberalidade, ou seja, a lei abre uma possibilidade ao réu a chamar os concorrentes no mesmo grau para o processo de alimentos.

No momento em que a lei expõe possibilidade, e não, obrigatoriedade, não existe dúvida tratar-se de uma atividade facultativa do réu, cujo momento oportuno para tanto é na contestação.

Ademais, tal faculdade cumpre apenas ao réu, conforme bem expressa CAHALI, eis que o Autor na petição inicial, ajuizará a ação contra quem bem entender, no entanto, o réu, tendo ciência da ação, bem como de outros obrigados no mesmo nível de parentesco, poderá chamá-los para integrar a lide.

Frise-se que, a lei concede essa possibilidade, mas não obriga pelo fato de que a mesma lei também determina que os alimentos sejam fixados de acordo com a possibilidade do alimentante e necessidade do alimentando, ou seja, ainda que o réu não chame os concorrentes no mesmo grau de parentesco ao processo, os alimentos deverão ser fixados conforme suas possibilidades, e nem sempre estarão de acordo com o pensionamento alimentício postulado pelo demandante.

Portanto, trata-se de um instituto que pode ser utilizado exclusivamente pelo réu, ainda que também tenha como objetivo proteger o autor, pois, conforme já dito, podem haver casos em que a possibilidade financeira do réu não seja suficiente para suprir as necessidades do autor, e, tendo o réu chamado os demais concorrentes para integrar a lide, cada um contribuirá conforme suas possibilidades, e, conforme for o caso, será mais benéfico ao autor da demanda.

Assim, verifica-se que os demais parentes ingressariam nos autos como litisconsortes daquele que já estava como réu na demanda, tratando-se portanto de um litisconsórcio facultativo ulterior simples, por iniciativa do réu.

Facultativo porque ao réu caberá escolher se vai chamar ou não os demais parentes à demanda. No entanto, uma vez postulado o chamamento, preenchidos os requisitos legais, deverá o julgador deferi-lo, conforme previsão do art. 1698. Ulterior pelo fato do litisconsórcio formar-se após o ajuizamento da ação, ou seja, após a contestação. Simples pelo fato de que o julgador vai analisar a possibilidade financeira de cada litisconsorte passivo, impondo obrigações de variados valores, e, conforme for a situação, poderá algum não ser obrigado a qualquer pagamento.

CAHALI citado por SANTOS afirma ainda que

“...o litisconsórcio que surgiria da existência de mais de um dos co-obrigados no pólo passivo seria de natureza simples, pois a natureza da obrigação conjunta, ou seja, suportada por várias pessoas, existe em benefício do credor dos alimentos, não dos devedores.  Sendo assim, a decisão poderá ser distinta em relação a cada um dos devedores, pois a dívida não é comum e perante o credor a responsabilidade de cada devedor, existindo mais de um, é autônoma. Cahali entende que o litisconsórcio pode ser formado pelo réu, embora reconheça que o instituto foi criado para beneficiar o credor dos alimentos.”

Ademais, por se tratar de uma faculdade do réu, em chamar os demais a integrar a lide, não é necessária a concordância da parte autora para ingresso de outro parente no pólo passivo da demanda, pois se o chamamento previsto no art. 1698 existe em benefício do demandado, somente este tem possibilidade de trazer ou não terceiros à lide, vez que o momento oportuno do autor já passara, qual seja, a petição inicial.

Cumpre salientar que, no momento em que o demandado utilizar da possibilidade que lhe confere a lei, de chamar os demais para integrar a lide, não poderá o juiz indeferir, pois se trata de um benefício previsto na lei.

Sendo analisado um caso concreto, por exemplo, de 01 (um) irmão, que estando necessitado de pensão alimentícia, demanda contra outro irmão, sendo que possuem mais 03 (três) irmãos. Pelo art. 1698 parece que o irmão demandado “pode” se assim entender necessário, chamar os demais irmãos a integrar a lide.

No caso do litisconsórcio passivo em obrigação alimentar, conforme diz CAHALI citado por CARVALHO, “não existe uma só obrigação divisível entre eles (que induziria solidariedade), mas tantas obrigações distintas quantas sejam as pessoas a que possam ser demandados”.

No entanto, caso não o faça, ou seja, não chame os demais colaterais para integrar a lide, os alimentos serão fixados, da mesma forma, dentro de suas possibilidades.

O autor da sua ação, por sua vez, ao ajuizar a petição inicial, e este é o momento oportuno, demandará contra quem ele bem entender, podendo ou não configurar um litisconsórcio passivo.

Já, o demandado na ação, conforme lhe permite a lei, poderá chamar ao processo, formando um litisconsórcio, aqueles que têm responsabilidade no mesmo grau de parentesco.

Portanto, verifica-se que a formação de litisconsórcio passivo não é obrigatória, e caso o autor opte a ajuizar a ação somente contra um dos coobrigados, no mesmo nível de parentesco e este opte por não chamar os demais, poderá o pensionamento não ser fixado de acordo com suas plenas necessidades, e sim, de acordo com as possibilidades do réu.

Apenas à título de esclarecimento, deve ser trazido à tona o dispositivo previsto no Estatuto do Idoso (Lei Federal n. 10741), que é lei posterior ao Código Civil, e prevê, em seu art. 12 que a obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores.

Portanto, o Estatuto do Idoso faz uma exceção à regra geral, mitigando a característica de divisibilidade da obrigação alimentar, transformando a obrigação alimentar em favor do idoso em solidária.

Dessa forma, ante a solidariedade prevista na lei, o idoso poderá ajuizar a demanda contra um dos coobrigados, e este, por sua vez, responde por toda a dívida alimentícia, podendo, no entanto, postular o direito de regresso contra os demais coobrigados.

5. CONCLUSÃO

Diante a análise do art. 1698 do Código Civil que instituiu uma norma com traços de direito processual, verifica-se que a intervenção de terceiros foi criada em favor do réu, que, na peça contestacional, poderá chamar ao processo aqueles que fazem parte do mesmo nível de parentesco, para fim de pagamento de pensionamento alimentício ao autor.

Esta modalidade de intervenção de terceiros assemelha-se, conforme acima exposto, a um litisconsórcio passivo facultativo simples ulterior, pelo fato de ser formado no pólo passivo, por não ser obrigatório, pois é uma possibilidade concedida pela lei ao réu, por ser a obrigação de valor diverso para cada litisconsorte passivo, e ainda, o litisconsórcio será ulterior porque se formará depois do ajuizamento da demanda. Frise-se, no entanto, ser de iniciativa exclusiva do réu o chamamento dos demais.

O momento para o chamamento dos demais obrigados, é na peça contestacional, e por ser uma previsão legal, que concede uma possibilidade ao réu, no momento em que o réu postular, não poderá o juiz indeferir.

Assim, não há dúvida tratar-se de uma obrigação divisível, que não gera responsabilidade solidária, e, diante disso, não existe denunciação da lide ou chamamento ao processo.

Porém, quando o alimentando trata-se de um idoso, conforme previsão expressa no Estatuto do Idoso, no art. 12, o autor idoso poderá demandar contra o qualquer coobrigado, e este por sua vez, terá que responder pela dívida, podendo, posteriormente exercer seu direito de regresso contra os demais coobrigados.

Tal regra, no sentido de que o demandado pagará o débito e depois poderá entrar com pedido de regresso, visa proteger o idoso de qualquer desgaste emocional em face de sua avançada idade, evitando-se assim, tornar mais lendo o andamento do processo com a utilização de vários incidentes processuais.

Diante de tal previsão expressa no art. 12 do Estatuto do Idoso, ao ser observado o art. 1698 do Código Civil, há então o verdadeiro “chamamento ao processo” previsto no artigo 77, III do Diploma Processual Civil, em razão da obrigação solidária e o direito de regresso.

 

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