Limites à requisição de servidores pela Defensoria Pública da União


Porrayanesantos- Postado em 02 julho 2013

Autores: 
GIRÃO, Ingrid Pequeno Sá

I – Introdução

 

                        A requisição é um instituto jurídico bastante discutido na atualidade haja vista a escassez de servidores em diversos órgãos e entidades que compõem à Administração Pública Federal.

 

                        É também um tema muito controverso porque se de um lado existe a premente necessidade da Defensoria Pública da União – DPU se estruturar, do outro lado encontram-se inúmeras instituições públicas com seu quadro de agentes públicos igualmente deficitários.

 

                        Destaca-se, no entanto, que o Decreto nº 4.050, de 12 de dezembro de 2011, conceitua a requisição como sendo um ato irrecusável e não é por outro motivo que deverão ser observados todas as exigências dispostas na legislação para que a mesma possa a vim se efetivar.

 

                        Destarte, diante dos graves efeitos que a saída de um servidor de um órgão ou entidade, cujo ingresso foi antecedido de rigorosa seleção pública, o instituto da requisição merece ser analisado com extrema cautela.

 

                        Buscar-se-á no presente estudo examinar a requisição de servidores pela DPU. Em especial, pretende-se analisar a legislação que a autoriza, bem como se o Quadro de Permanente de Pessoal de apoio da DPU já foi devidamente constituído,  a fim de verificar se, nos dias atuais, essa modalidade de requisição ainda subsiste e as limitações que deverão ser observadas.  

 

                        II  - Análise crítica das requisições de servidores pela DPU

 

                        De início, antes de se adentrar na investigação do tema específico proposto, vale destacar que o afastamento de servidores civis da União para desempenharem atribuições em outros órgãos ou entidades públicas foi disciplinado no Estatuto dos Servidores Federais – Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que assim previu:

 

Art. 93. O servidor poderá ser cedido para ter exercício em outro órgão ou entidade dos Poderes da União, dos Estados, ou do Distrito Federal e dos Municípios, nas seguintes hipóteses:

 

I - para exercício de cargo em comissão ou função de confiança;

 

II - em casos previstos em leis específicas.

 

(...) 

 

                        Com se vê, a cessão de servidores é modalidade de afastamento que poderá se aperfeiçoar diante de duas hipóteses: a) quando a cessão for para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança; ou b) em outras hipóteses previstas em leis específicas.

 

                        Vale esclarecer que o termo “cessão” pode ser compreendido em dois sentidos: um mais restrito(stricto sensu), que compreende exclusivamente as hipóteses de afastamento previstas no art. 93 da Lei nº 8.112/1990, cujo atendimento está sujeito a um juízo de oportunidade e conveniência; e outro mais amplo  (lato sensu), que compreende tanto as cessões stricto sensu, quanto às requisições, que são de atendimento obrigatório.

 

                        A cessão stricto sensu de servidor é, regra geral, ato discricionário. Significa dizer, pois, que cabe ao administrador avaliar a conveniência e oportunidade da liberação de um agente público para prestar serviços em outro órgão. Seu conceito está estampado no Decreto Federal n.º 4.050, de 12 de dezembro de 2001, que regulamenta o art. 93 da Lei 8.112/1990, verbis:

 

Art. 1º Para fins deste Decreto considera-se:

 

(...)

 

II - cessão: ato autorizativo para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança, ou para atender situações previstas em leis específicas, em outro órgão ou entidade dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, sem alteração da lotação no órgão de origem; [Destacou-se] 

 

                        Por outro lado, as requisições de servidores, regra geral, encontram amparo no art. 93, II, da Lei nº 8.112/1990 e serão admitidas para atender situações previstas em leis específicas. Ademais, diferentemente das cessões stricto sensu, as requisições, em tese, não se sujeitam ao interesse do órgão cedente, haja vista que são compreendidas como sendo um ato irrecusável, consoante se depreende de seu conceito, trazido pelo já mencionado Decreto n.º 4.050/2001, confira-se:

 

Art. 1º Para fins deste Decreto considera-se:

 

I - requisição: ato irrecusável, que implica a transferência do exercício do servidor ou empregado, sem alteração da lotação no órgão de origem e sem prejuízo da remuneração ou salário permanentes, inclusive encargos sociais, abono pecuniário, gratificação natalina, férias e adicional de um terço;

 

(...) [Destacou-se]

 

                        No que toca especialmente as requisições feitas pela DPU, cumpre historiar que a Defensoria Pública da União, criada pela Constituição da República de 1988 e organizada pela Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, teve, quando da sua estruturação, dificuldades atinentes à instituição do seu Quadro Permanente de Pessoal de Apoio. Por tal razão, a Lei nº 9.020, de 30 de março de 1995, que dispôs sobre a implantação da DPU, previu, em seu art. 4º, a possibilidade de requisição de servidores de órgãos e entidades da Administração Federal, nos seguintes termos:

 

Art. 4º O Defensor Público-Geral da União poderá requisitar servidores de órgãos e entidades da Administração Federal, assegurados ao requisitado todos os direitos e vantagens a que faz jus no órgão de origem, inclusive promoção.

 

Parágrafo único. A requisição de que trata este artigo é irrecusável e cessará até noventa diasapós a constituição do Quadro Permanente de Pessoal de apoio da Defensoria Pública da União. [Destacou-se]

 

                        Desde a edição da Lei nº 9.020/1995 a Defensoria Pública da União vem requisitando servidores para realizar a sua estruturação emergencial. Certamente, decorridos mais de vinte anos desde a criação desse eminente órgão, e passados cerca de dezoito anos de sua estruturação, restou descaracterizado o caráter emergencial mencionado na legislação. No entanto, como a lei não trouxe um prazo certo para a chamada estruturação, as requisições continuam ocorrendo até os dias atuais.

 

                        Sobre a estruturação da carreira em referência, cumpre enfatizar que por meio do Edital nº 1 – DPU, de 29 de março de 2010[1], com base na autorização concedida pelo Ministério do Planejamento, por meio da Portaria nº 467, de 16 de dezembro de 2009, foi realizado concurso público para provimento naquele órgão de vagas em cargo de nível superior e de nível médio do Plano Geral de Cargos do Poder Executivo – PGPE.

 

                        Segundo informações extraídas da Nota Técnica nº 66/2011[2] da Coordenação-Geral de Elaboração, Sistematização e Aplicação das Normas do Ministério do Planejamento, atual Secretaria de Gestão Pública – SEGEP, os candidatos selecionados no referido concurso foram nomeados e estão em exercício nas respectivas unidades da Defensoria Pública Geral da União. Além disso, na referida manifestação, evidenciou-se que, em pesquisa realizada no SIAPE,  verificou-se que a Defensoria Pública Geral da União possui código próprio no sistema sob o nº 37000, com um total de 403 cargos vagos e 777 cargos ocupados.

 

                        A questão do Quadro de Apoio da Defensoria Pública da União foi também objeto de análise na Nota Técnica nº 623/2010/SEGES/MP, de 06 de setembro de 2010, cuja conclusão, por sua importância, merece destaque:

 

(...)18. Assim, ainda que incipiente, podemos admitir que “Quadro Permanente de Apoio”, entendido como conjunto de cargos que integram, de forma definitiva a DPU, com atribuições associadas às atividades de cunho administrativo, de gestão de recursos humanos, de recursos logísticos, patrimoniais, documentais, de compras, contratos e licitações e de atendimento não especializado ao público já está em formação. Em breve, como se disse, será ampliado em função do ingresso dos concursados.

 

19. É mister ressaltar que não há determinação legal de que o “Quadro permanente de Apoio” seja regulado em diploma específico de Plano de Cargos e Salários para o órgão em comento, tanto é que tramita neste Ministério solicitação recente da DPU, mediante processo 03100.001132/2010-07, de redistribuição imediata de 500(quinhentos) cargos do PGPE para provimento, em caráter adicional do concurso vigente, bem como pedido de autorização para nomeação de candidatos aprovados em até 50% a mais do que o estabelecido no Edital nº 01, de 30 de março de 2010, com base no art. 11 do Decreto nº 6.944, de 2009.

 

20. Diante do exposto, entende-se que a realização do concurso público para os 311 (trezentos e onze) cargos do PGPE, previstos no Edital nº 01, de 30 de março de 2010; a solicitação de redistribuição de 500 (quinhentos) cargos do PGPE para DPU e, o pedido de nomeação dos candidatos aprovados e não convocados em até 50% do quantitativo original de vagas do concurso vigente iniciam a constituição do Quadro Permanente de Apoio, previsto no art. 4º da Lei nº 9.020, de 1995, uma vez que com essas medidas assegura-se a integração dos servidores admitidos e em vias de admissão ao Quadro de Pessoal da DPU. Os novos concursados passam a integrar, assim, a área administrativa do órgão. [Destacou-se]

 

                        Evidencia-se, assim, que já possui a Defensoria Pública da União quadro estruturado para atender às suas necessidades, inexistindo, neste momento, supedâneo jurídico a assegurar o direito à requisição de servidores de outros órgãos.

 

                        Cumpre ressaltar que quadro insuficiente não significa quadro inexistente. Da mesma forma da DPU, diversos órgãos e entidades públicas contam hoje com quadro de servidores que não atende de forma suficiente sua demanda e, muito menos, a perspectiva de cobertura projetada para os anos seguintes. 

 

                        Não bastasse isso, alguns órgãos públicos que tem sido “alvo” de requisições da DPU, como por exemplo, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, contraditoriamente tem sido demandado pela própria DPU, em diversas Ações Civis Públicas[3], cobrando agilidade e melhoria do atendimento prestado.

 

                        Verifica-se, portanto, que eventuais dificuldades da DPU quanto ao número às vezes ínfimo de servidores em determinadas localidades podem muito bem ser compartilhadas com diversos órgãos e entidades da Administração Federal, que ainda possuem estrutura muito aquém às suas necessidades, deixando, em muitos momentos, de realizar à contento seus fins institucionais em razão de exígua estrutura de pessoal.

 

                        De outra banda, sob a luz do princípio constitucional da obrigatoriedade de provimento de cargos por concurso público, não mais se mostra compatível com o sistema constitucional vigente a solicitação NOMINAL de servidor para exercício em atividade estranha a de seu concurso. É justamente neste sentido que vem sendo feitas as críticas do Supremo Tribunal Federal - STF, o qual, em sua composição plenária, ao apreciar a questão das requisições da Justiça Eleitoral, alertou para a evidente inconstitucionalidade da continuidade da prática deste tipo de requisições. Verifique-se in verbis o teor do Acórdão plenário do Pretório Excelso acerca da questão ora aventada:

 

É sabença que, durante um longo período, a Justiça Eleitoral valeu-se de mão-de-obra emprestada. A situação sempre se mostrou excepcional. Já agora, tem-se que, mediante lei, foram criados cargos nos diversos tribunais eleitorais e o que se nota é a resistência no preenchimento respectivo, deixando-se mesmo, em postura nada harmônica com os princípios constitucionais, de convocar os aprovados, projetando-se, com isso, as requisições. [...]

 

Na Justiça Eleitoral, é hora de se preencher os cargos criados por lei, convocando-se candidatos aprovados em concurso público e, com isso, observando-se o fundamento da República, concernentes à dignidade do homem. Cumpre abandonar a velha prática das requisições, no que viabilizam, até mesmo, procedimentos contrários aos parâmetros que devem reinar no serviço público.

 

(STF, Plenário, MS 25.198, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ 26.08.2005)[4]

 

                        Evidencie-se, ainda, que as citadas requisições devem, como todo ato administrativo, observar os princípios constitucionais aplicáveis à Administração Pública, em especial o da impessoalidade, cuja observância se demonstra imprescindível à regularidade da requisição. Nesse sentido, já se manifestou o Ministério do Planejamento (Nota Técnica nº 66/2011/ CGNOR/DENOP/SRH/MP[5]):

 

          Assim, ao analisar as requisições oriundas da Defensoria Pública Geral da União necessário se faz a observação da regularidade do ato e da sua adequação aos princípios administrativos, especialmente o da impessoalidade, e ainda, se a autorização não prejudicará as atividades finalísticas do órgão cedente.

 

          Neste sentido, importante destacar, também, a recente decisão exarada pelo Tribunal de Contas da União no Acórdão 199/2011 – Plenário, verbis:

 

(...) 9.1. determinar aos Tribunais Regionais Eleitorais do Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins que:

 

9.1.1. encaminhem a este TCU, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, plano de ação que contemple a devolução aos órgãos de origem dos servidores cujas requisições contrariem os arts. 2º, 3º, e 4º da Lei n. 6.999/1982, bem como a adequação do percentual de serventuários requisitados ou cedidos de outros órgãos às disposições do art. 3º da Resolução do Conselho Nacional de Justiça n. 88/2009;

 

9.1.2. façam constar dos processos de requisição de pessoal justificativa acerca das necessidades enfrentadas pelo cartório eleitoral, bem como a relação entre as atividades desenvolvidas pelo servidor no órgão de origem e aquelas a serem desempenhadas no serviço eleitoral, assim como o período necessário para realizar a atividade, caso ainda não o façam;

 

9.1.3. adotem medidas no sentido de que as requisições de servidores para atuarem nos cartórios eleitorais e nas secretarias dos Tribunais Regionais Eleitorais sejam feitas em caráter temporário, com prazo previamente determinado e sem identificação nominal do servidor, em  observância aos princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade, deixando a cargo do órgão ou entidade cedente a escolha, entre aqueles que atendam os requisitos para o desempenho das atividades pretendidas pelo requisitante, do servidor a ser cedido à Justiça Eleitoral;

 

9.1.4. abstenham-se de designar servidores requisitados para ocupar a função de chefe de cartório eleitoral, seja na condição de efetivo ou substituto;

 

9.1.5. somente requisitem ou prorroguem a requisição de pessoas com vínculo efetivo com a administração pública, caso ainda não o façam;

 

9.2. determinar ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo - TRE/SP que se abstenha de requisitar servidores para a limpeza de zonas eleitorais do interior e da capital;

 

9.3. recomendar ao TSE que adote providências tendentes a suprir a Justiça Eleitoral de quadro de pessoal efetivo, de modo que o instituto da requisição passe a ser utilizado tão-somente no atendimento do interesse público específico e pontual que motivou a requisição, deixando de servir como forma de preenchimento permanente dos quadros funcionais do órgão requisitante, cujos cargos devem ser providos por meio de concurso público;

 

9.4. determinar às Secretarias de Controle Interno do TSE e dos TREs que façam constar do próximo relatório das contas anuais informações sobre o cumprimento das determinações resultantes deste relatório;

 

9.5. dar ciência deste Acórdão, acompanhado dos respectivos Relatório e Proposta de Deliberação, à Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço

 

Público da Câmara dos Deputados, ao Conselho Nacional de Justiça e ao Tribunal Superior Eleitoral.

 

          Deste modo, em face da similitude entre as requisições da Defensoria Pública Geral da União e da Justiça Eleitoral, por óbvio, respeitadas as respectivas especificidades, entende-se adequada a aplicação das orientações emanadas por aquele órgão de controle quando da análise dos processos de servidores requisitados, com fundamento no art.4º, da Lei nº 9.020, de 1995.

 

          Assim, ratifica-se o posicionamento exarado por esta Coordenação-Geral, no sentido de que o órgão requisitado não está obrigado a reconhecer como irrecusável a requisição de servidor previamente indicado pela Defensoria Pública da União, quando justificadamente venha a ter as suas atividades finalísticas prejudicadas, podendo a requisição ser atendida com o oferecimento de outro servidor que não seja imprescindível para as suas atividades finalísticas, ou por outros órgãos/entidades da Administração Federal. [Destacou-se]

 

                        Face o até então exposto, constata-se que, existindo outras formas da Defensoria Pública da União ampliar seu “Quadro Permanente de Pessoal de Apoio”, não se tem como coerente que a mesma opte por requisitar servidores dos quadros de órgãos ou entidades públicas que já se encontram deficitários.

 

                        De outra banda, vale destacar que a Consultoria Jurídica do MPOG pronunciou-se sobre as requisições oriundas da Defensoria Pública Geral da União, por meio do PARECER/MP/CONJUR/ICN/Nº 0999-3.17/2010, de 25 de agosto de 2010, do qual transcreve-se:

 

(...) 34. Destarte, embora a Administração não possa recusar a requisição de servidores realizada pelo Defensor Público-Geral da União, com base no art. 4º, da Lei nº 9.020, de 1995, é necessário que o órgão cedente analise a regularidade do ato, assim entendida como a sua adequação com os requisitos necessários à formação do ato administrativo, bem como sua conformação aos princípios que regem a atividade da Administração Pública, em especial, os de índole constitucional, da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, a qual não restou evidenciada na presente requisição, em vista das razões expostas na manifestação.

 

5. Assim, ao analisar as requisições oriundas da Defensoria Pública Geral da União necessário se faz a observação da regularidade do ato e da sua adequação aos princípios administrativos, especialmente o da impessoalidade, e ainda, se a autorização não prejudicará as atividades finalísticas do órgão cedente.

 

                        Partindo-se da premissa aqui já evidenciada, de que o Quadro Permanente de Pessoal de Apoio da DPU foi constituído e, em consequência, a autorização legal (p.u. do art. 4º da Lei nº 9.020/1995) que permite à Defensoria requisitar servidores não mais subsiste, entende-se que os insistentes pedidos de requisição da DPU devem ser examinados como pleitos de cessão stricto sensu, sujeitos à discricionariedade do órgão cedente.

 

                        Com efeito, antes de ser irrecusável, a requisição ora tratada é um ato administrativo sujeito aos princípios constitucionais regedores da Administração Pública (art. 37, caput, da CRFB), podendo, em tese, ser impugnado e, eventualmente, invalidado.

 

                        Além destas, outra questão deve ser destacada: as cessões reiteradas de servidores integrantes de outros órgãos pela DPU poderão tem implicações diretas na qualidade do serviço prestado ao cidadão, podendo inclusive prejudicar a gestão e o atingimento da meta institucional traçada, maculando, assim, o Princípio da eficiência, exigido pela Carta Magna de 1988. Sobre o ponto, por pertinência, transcreve-se, abaixo, trecho da Nota Técnica nº 236/2011/DPES/CGMADM/PFE-INSS/PGF-AGU, exarada pela Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS – PFE/INSS, que analisou as requisições de peritos médicos do INSS, verbis:

 

         Ao que se vê a situação foge à razoabilidade e enseja uma inversão de prioridades. O serviço público prestado pelo INSS ampara o indivíduo nos principais momentos de sua vida: nascimento, doença incapacitante, invalidez, morte etc. Ao invés de colaborar para o atendimento direto pelo Estado das pessoas nessas situações, a Defensoria desfalca a força de trabalho médico-pericial do INSS, requisitando sua força de trabalho mais qualificada e que atua diretamente na concessão de benefícios, para que esses mesmos serviços sejam fornecidos por meio do Poder Judiciário, em ação judicial por ela promovida. Seria até prescindível destacar que como é o órgão requisitante que prejudica a prestação do serviço previdenciário, acaba se tornando fomentadora das demandas judiciais, além de utilizar os servidores do INSS para subsidiar as ações que serão intentadas contra a própria autarquia.

 

Forma-se aí um círculo vicioso. Com cada requisição, menos eficiente se tornar a atuação do INSS, o que gera mais demandas a serem ajuizadas pela Defensoria, o que gera a necessidade de mais profissionais médicos serem requisitados, o que enseja novo prejuízo na força de trabalho do INSS, o que, por sua vez, torna menos eficiente ainda a atuação do INSS... e nesse ciclo maléfico se pode seguir infinitamente.

 

(...)

 

Ademais, não condiz com a moralidade administrativa a requisição que retira um servidor da atividade finalística de uma entidade, desfalcando-a, para colocá-lo examinando a atuação de seus pares, numa espécie de controle externo, com o intuito de chancelá-la ou, caso contrário, subsidiar o ajuizamento de ações contra o próprio órgão de onde o servidor foi requisitado”.

 

                        Ainda quanto ao princípio da impessoalidade, cumpre ressaltar que a própria Defensoria Pública da União acordou, por meio do Termo de Reunião CCAF-CGU-AGU nº 064/2011 GHR, de 28 de março de 2011, os critérios que deveriam nortear as suas requisições, dentre os quais se destaca a necessidade dos pedidos serem realizados de forma impessoal.

 

                        Por derradeiro, entende-se que não é possível o atendimento das requisições/ cessões da DPU que se limitam a indicar o nome do servidor. Com efeito, devem os pedidos de requisição conter, no mínimo, os seguintes parâmetros gerais, de modo que o Gestor do órgão cedente possa avaliar a melhor forma de vir a atender o pleito: indicação da localidade em que o servidor será lotado; do perfil do profissional necessário para o exercício das atribuições (nível de escolaridade, experiência profissional e outros) e indicação das funções e atividades que serão desenvolvidas.

 

                        III - CONCLUSÃO:

 

                        Com base nas razões expostas, baseadas quer na já existência de Quadro de Apoio estruturado da DPU, quer na afronta aos princípios da obrigatoriedade de provimento de cargos por concurso público – ao se solicitar servidor para exercer atividade estranha a de seu concurso -, da impessoalidade – sob a ótica da necessidade de ser realizada a requisição sem identificação do servidor –, da moralidade – diante do fato de exercer o servidor do INSS requisitado função de combate aos seus próprios pares – e da razoabilidade – ao se retirar servidor da função de atendimento aos cidadãos para colocá-lo no auxílio às demandas judiciais, conclui-se que: 

 

- a previsão contida no art. 4º da Lei nº 9.020, de 1995, deve ser interpretada dentro do sistema jurídico vigente. Não se mostra, assim, compatível uma aplicação radical do poder de requisição a ponto de vulnerar os cânones constitucionais acima indicados;

 

- antes de ser irrecusável, a requisição ora tratada é um ato administrativo sujeito aos princípios constitucionais regedores da Administração Pública (art. 37, caput, da CRFB). Desta feita, não tendo sido adotado os procedimentos que devem reinar no serviço público, o pedido deve ser indeferido;

 

- cumpre ao dirigente da entidade solicitada o dever de valorar o pleito quanto à sua conveniência e oportunidade, em face da situação do próprio quadro de pessoal e das atividades finalísticas, sob pena de comprometimento do serviço público prestado;

 

- a recusa de atendimento do pedido se justifica quando restar demonstrado que a autorização prejudicará as atividades finalísticas do órgão requisitado;

 

- existindo outras formas da DPU ampliar seu “Quadro Permanente de Pessoal de Apoio”, não se tem como coerente que a mesma opte por requisitar servidores dos quadros de um órgão ou entidade que já se encontram deficitários; e

 

- caso o gestor, no caso concreto, analisando a requisição como sendo uma cessão stricto sensu, entenda que pode temporariamente atender o pedido da DPU, sob o fundamento de que a saída de um dado agente público não causará prejuízo para os serviços prestados pela unidade, poderá atender a demanda com a cessão de outro servidor com perfil adequado às necessidades, que não o originariamente nominado.

 

Notas:

[1] Disponível em: http://www.dpu.gov.br/concursos/2010/Concurso%20Administrativo%20PGPE/ED.... Acesso em 18 de junho de 2013.

[2] Disponível em: https://conlegis.planejamento.gov.br/conlegis/legislacao/atoNormativoDet.... Acesso em 18 de junho de 2013. 

[3] Como exemplo de tal comportamento, a Defensoria Pública da União ajuizou, no Rio Grande do Sul, Ação Civil Pública na qual questiona o suposto alargado “Tempo Médio de Espera para Perícia Médica” – TMEA/PM, pugnando por decisão que determine ao INSS a análise dos pleitos de benefícios por incapacidade em até 30 (trinta) dias, sob pena de concessão automática 

[4] Com o mesmo teor: STF, Plenário, MS 25.206, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ 02.09.2005.

[5] Disponível em: https://conlegis.planejamento.gov.br/conlegis/legislacao/atoNormativoDet.... Acesso em 18 de junho de 2013.

 

 

 

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