Inventário e partilha


Porbarbara_montibeller- Postado em 02 maio 2012

Autores: 
SCOTTINI, Debora Tiemi.

INVENTÁRIO

            De acordo com Roberto Senise Lisboa (Direito Civil, v. 5, 2007, p. 35), inventário é o procedimento por meio do qual são oficialmente relacionados os bens encontrados em nome do de cujus.

            A realização do inventário é obrigatória, para que os sucessores do de cujus possam obter a atribuição legal dos bens que lhes são cabíveis.

O inventário comporta as seguintes etapas: a abertura do inventário, a nomeação do inventariante, o oferecimento das primeiras declarações, a citação dos interessados, a avaliação dos bens, o cálculo e o pagamento dos impostos, as últimas declarações, a partilha e sua homologação.

            Maria Helena Diniz conceitua o inventário como sendo "o processo judicial (CC, art. 1.796; CPC, art. 982) tendente à relação, descrição, avaliação e liquidação de todos os bens pertencentes ao de cujus ao tempo de sua morte, para distribuí-los entre seus sucessores" (Curso de Direito Civil, v. 6, p. 368).

            Ensina Zeno Veloso que o inventário tem por objetivo a arrecadação, a descrição e a avaliação dos bens e outros direitos pertencentes ao morto, bem como a discriminação, o pagamento das dívidas e dos impostos e os demais atos indispensáveis à liquidação do montante que era do falecido (Novo Código Civil.., 2006, p. 1.657). O que se almeja, nesse contexto, é a liquidação dos bens e a divisão patrimonial do acervo hereditário.

            Quanto ao instituto, há dispositivo inicial no Código Civil de 2002, o art. 1.991, segundo o qual: "Desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a administração da herança será exercida pelo inventariante". Como exposto, o inventariante é o administrador do espólio, conjunto de bens formado com a morte de alguém, que constitui um ente despersonalizado.            Age o inventariante com um mandato legal, após a devida nomeação pelo juiz. Em sua redação original, determinava a lei que proceder-se-ia ao inventário judicial, ainda que todas as partes fossem capazes. Assim, em regra, o procedimento de inventário era tido como o procedimento necessário para a partilha de bens do falecido, mesmo havendo plena capacidade e acordo entre os seus herdeiros.

            Por outro lado, com a aprovação pelo Congresso Nacional do Projeto de Lei 4.725/2004, convertido na Lei 11.441/2007, a questão foi profundamente alterada. A nova redação do art. 982 é a seguinte: "Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário. Parágrafo único. O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial".

            Note-se que em sendo as partes capazes e inexistindo testamento, poderão os herdeiros optar pelo inventário extrajudicial. Não se trata de forma obrigatória, mas sim facultativa. Caso prefiram o inventário judicial ao extrajudicial, poderão os herdeiros dele se utilizar seguindo todas as normas do CPC que serão comentadas no presente capítulo.

            O Código de Processo Civil, pela ordem, também traz regras quanto às colações (arts. 1.014 a 1.016), ao pagamento das dívidas (arts. 1.017 a 1.021), à partilha (arts. 1.022 a 1.030) e ao arrolamento (arts. 1.031 a 1.038).

ESPÉCIES DE INVENTÁRIO E SEUS PROCEDIMENTOS

 Inventário judicial

            Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim, em sua obra considerada clássica quanto ao tema, apresentam-nos três espécies de inventário judicial. Vejamos essa importante visão doutrinária (Inventários e partilhas, p. 338):

            a)Inventário judicial pelo rito tradicional - está previsto nos arts. 982 a 1.030 do CPC.

            b)Inventário judicial pelo rito do arrolamento sumário - está previsto no art. 1.031 do CPC, sendo cabível quando todos os interessados forem maiores e capazes, abrangendo bens de quaisquer valores.

            c)Inventário judicial pelo rito do arrolamento comum - está previsto no art. 1.036 do CPC, sendo cabível quando os bens do espólio forem de valor igual ou menor que 2.000 OTN.

Inventário judicial pelo rito tradicional - arts. 982 a 1.030 do CPC

            O art. 983 do CPC, já comentado, prevê que "o inventário e a partilha devem ser requeridos dentro de 60 (sessenta) dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subseqüentes". Deve-se ressaltar que o parágrafo único desse dispositivo, que previa a possibilidade de o juiz da causa dilatar o último prazo havendo motivo justo, foi revogado pela Lei 11.441/2007. Atualmente, prevê o art. 983 do CPC que o juiz pode prorrogar o prazo de ofício ou a requerimento das partes.

            Como estudado, a grande crítica que se faz ao dispositivo é que ele não prevê sanção em caso de descumprimento do menciona­do prazo. No entanto, a ausência de previsão não impede que cada Estado institua uma multa como sanção pelo retardamento do início ou da ultimação do inventário, não havendo qualquer inconstitucio- nalidade (Súmula 542 do STF).

            A legitimidade para requerer a abertura do inventário e a respectiva partilha consta no art. 987 do CPC, a favor de quem estiver na posse e na administração do espólio. Esse requerimento, por óbvio, será instruído com a certidão de óbito do autor da herança (art. 987, parágrafo único, do CPC).

            Nos termos do art. 988 do CPC, têm, contudo, legitimidade concorrente para requerer a abertura:

            I- o cônjuge supérstite;

            II- o herdeiro;

            III- o legatário;

            IV- o testamenteiro;

            V- o cessionário do herdeiro ou do legatário;

            VI- o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança;

            VII- o síndico da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou do cônjuge supérstite;

            VIII- o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes;

            IX- a Fazenda Pública, quando tiver interesse.

            Apesar da ausência de menção expressa, o companheiro ou companheira do falecido têm legitimidade para a abertura do inventário. Ademais, o que se discute, atualmente, é se o companheiro homoafetivo também tem a referida legitimidade.

            Segundo a jurisprudência, se o herdeiro não faz a abertura, poderá fazê-lo qualquer credor, justamente pela legitimidade concorrente prevista nesse dispositivo processual:

"Inventário. Reclamação. Art. 1.000, inc. 11, CPC. Pedido de abertura do processo de inventário e exercício da inventariança. Legitimidade do credor. Existência de herdeiros necessários. Ordem legai. 1. Decorrido in albis o prazo para a abertura do inventário de que trata o art. 983 do CPC, tem legitimidade concorrente qualquer interessado, inclusive o credor do herdeiro. Inteligência do art, 988, inc. VI, CPC. 2. No entanto, essa legitimidade para abrir o inventário não afeta a legitimação para o exercício da inventariança, devendo ser nomeado para tal múnus o herdeiro necessário que estiver na posse dos bens e administração do espólio, já que não há cônjuge supérstite. Inteligência do art. 990, II, do CPC. Recurso provido, por maioria" (TJRS, 7.a Câm. Cível, Proc. 70010615953, Juiz Rei. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Origem: Comarca de Caxias do Sul, j. 23.02.2005).

            Caso nenhuma das pessoas mencionadas nos últimos dispositivos requeira a abertura do inventário no prazo legal, o juiz poderá fazê-lo de ofício (art. 989 do CPC).

            Para Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, trata-se de uma exceção ao princípio da inércia da jurisdição, ne procedaí judex ex offício, prevista no art. 262 do CPC (Código de Processo Civil..., p. 1.016).

            Nesse sentido já se decidiu:

"Civil. Inventário. Abertura ex offício. Arts. 987 e 988 do CPC. Ao tomar conhecimento de que ultrapassado o prazo (art. 983 do CPC) ninguém requereu a abertura do inventário, o juiz deve fazê-lo de ofício. A norma do art. 989 do CPC é imperativa" (STJ, 3 a T., REsp 515.034/RS, Rei. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 08.03.2007, DJ 26.03.2007, p. 231).

            Como não poderia ser diferente, pensamos como os renomados juristas paulistas e concordamos com o julgado mencionado.

            O administrador do inventário é denominado inventariante. Até que o inventariante preste o compromisso, continuará o espólio na posse do administrador provisório nomeado pelo juiz (art. 985 do CPC).

             Além disso, tem o administrador direito ao reembolso das despesas necessárias e úteis que fez na administração, respondendo pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causa quando da sua atuação (art. 986 do CPC). Como se vê, a sua responsabilidade depende da prova de culpa, sendo, portanto, hipótese de responsabilidade subjetiva. O tratamento do administrador é o mesmo previsto para um possuidor de boa-fé. já que ele exerce um mandato legal, por nomeação do juiz da causa.

            O art. 990 do CPC prevê as pessoas que podem ser nomeadas pelo juiz como inventariante, a saber:

            "I - o cônjuge sobrevivente casado sob o regime de comunhão, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste;

            II- o herdeiro que se achar na posse e administração do espólio, se não houver cônjuge supérstite ou este não puder ser nomeado;

            III- qualquer herdeiro, nenhum estando na posse e administração do espólio;

            IV- o testamenteiro, se lhe foi confiada a administração do espólio ou toda a herança estiver distribuída em legados;

            V- o inventariante judicia), se houver;

            VI- pessoa estranha idônea, onde não houver inventariante judicial".

            Quanto ao inventariante judicial, previsto no inciso V do referido dispositivo, Sebastião             Amorim e Euclides de Oliveira apontam ser uma figura totalmente em desuso entre nós (Inventários e partilhas, 2004, p. 344).           

            A união estável é entidade familiar e constitucionalmente protegida, não havendo qualquer razão para não se admitir o companheiro do falecido como inventariante. Com relação ao tema. o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul admitiu, inclusive, a legitimidade do companheiro homoafetivo:

"Sucessões. Inventário. Agravo de instrumento. União homoafetiva. Nomeação do sedizente companheiro como inventariante. Possibilidade no caso concreto. Ainda que a alegada união homoafetiva mantida entre o recorrente e o de cujas dependa do reconhecimento na via própria, ante a discordância da herdeira ascendente, o sedizente com­panheiro pode ser nomeado inventariante por se encontrar na posse e administração consentida dos bens inventariados, além de gozar de boa reputação e confiança entre os diretamente interessados na sucessão. Deve-se ter presente que inventariante é a pessoa física a quem é atribuído o múnus de representar o Espólio, zelar pelos bens que o compõem, administrá-lo e praticar todos os atos processuais necessá­rios para que o inventário se ultime, em atenção também ao interesse público. Tarefa que, pelos indícios colhidos, será mais eficientemente exercida pelo recorrente. Consagrado o entendimento segundo o qual a ordem legal de nomeação do inventariante (art. 990. CPC) pode ser relativizada quando assim o exigir o caso concreto. Ausência de risco de dilapidação do patrimônio inventariado. Recurso provido (art. 557, § l.°-A, CPC)" (TJRS, 7.a Câm. Cível, Agln 70022651475, Rei. Maria Berenice Dias, j. 19.12.2007).

            Ressalte-se, contudo, que a questão sobre a união homoafetiva é polêmica e para tanto sugere-se a leitura do volume 5 da presente coleção.

            0 inventariante, intimado da nomeação, prestará, dentro de cinco dias, o compromisso de bem e fielmente desempenhará o cargo (art. 990, parágrafo único, do CPC). Quanto às suas atribuições, prevê o art. 12, V, do CPC que o inventariante deve representar ativa e passivamente o espólio. Em complemento, o art. 991 do Estatuto Processual em vigor traz essa e outras incumbências ao inventariante, a saber:

            I- Representar o espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, observando-se, quanto ao dativo, o disposto no art. 12, § 1.°, do CPC, já analisado.

            II- Administrar o espólio, velando-lhe os bens com a mesma diligência como se seus fossem. Na visão atual do Direito Privado, pode-se associar a sua conduta à lealdade decorrente da boa-fé objetiva.

            III- Prestar as primeiras e últimas declarações pessoalmente ou por procurador com poderes especiais.

            IV- Exibir em cartório, a qualquer tempo, para exame das partes, os documentos relativos ao espólio.

            V- Juntar aos autos certidão do testamento, se houver.

            VI- Trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro ausente, re- nunciante ou excluído.

            VII- Prestar contas de sua gestão ao deixar o cargo ou sempre que o juiz lhe determinar.

            VIII- Requerer a declaração de imsolvência do falecido, se for o caso.

            Em complemento, o art. 992 do CPC lista outras incumbências do inventariante, que necessitam, no entanto, de autorização do juiz da causa e da oitiva dos interessados, sob pena de nulidade absoluta do ato (NERY JÚNIOR, Nelson e NERY. Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil..., 2006, p. 1.016). Esses atos são: a) alienação de bens de qualquer espécie; b) transação em juízo ou fora dele; c) pagamento de dívidas do espólio; d) pagamento das despesas necessárias para a conservação e o melhoramento dos bens do espólio.

            Seguindo na análise dos procedimentos relacionados com o inventário, prevê o art. 993 do CPC que dentro de 20 dias, contados da data em que prestou o compromisso, fará o inventariante as primeiras declarações, das quais se lavrará termo circunstanciado. O dispositivo prevê ainda que no termo, assinado pelo juiz, escrivão e inventariante, serão exarados:

            I- o nome, estado, idade e domicílio do autor da herança, dia e lugar em que faleceu, bem ainda se deixou testamento;

            II- o nome, estado, idade e residência dos herdeiros e, havendo cônjuge supérstite. o regime de bens do casamento;

            III- a qualidade dos herdeiros e o grau de seu parentesco com o inventariado;

            IV- a relação completa e índividuada de todos os bens do espólio e dos alheios que nele forem encontrados, descrevendo-se:

            a)os imóveis, com as suas especificações, nomeadamente local em que se encontram, extensão da área, limites, confrontações, benfeitorias, origem dos títulos, números das transcrições aquisitivas e ônus que os gravam;

            b)os móveis, com os sinais característicos;

            c)os semoventes, seu número, espécies, marcas e sinais distintivos;

            d)o dinheiro, as jóias, os objetos de ouro e prata, e as pedras preciosas, declarando-se-lhes especificadamente a qualidade, o peso e a importância;

            e)os títulos da dívida pública, bem como as ações, cotas e títulos de sociedade, mencionando-se-lhes o número, o valor e a data; as dívidas ativas e passivas, indicando-se-!hes as datas, títulos, origem da obrigação, bem como os nomes dos credores e dos devedores;

            f)direitos e ações;

            g)o valor corrente de cada um dos bens do espólio.

            Nesse processamento, prevê o parágrafo único do art. 993 do CPC que o juiz determinará, ato contínuo, que se proceda: ao balanço do estabelecimento, se o autor da herança era comerciante em nome individual; e à apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade não anônima.

            Os dispositivos a seguir prevêem penalidades contra o inventariante.

            No que concerne à pena de sonegados, prevê o art. 994 do CPC que "só se pode argüir de sonegação ao inventariante depois de encerrada a descrição dos bens, com a declaração, por ele feita, de não existirem outros por inventariar". Como se sabe, quando for citado, nos termos do art. 999 do CPC, o inventariante herdeiro terá a oportunidade de informar e descrever quais os bens do falecido que estão na sua posse. Se assim não o fizer, estará sujeito às penas legais, que ainda serão abordadas.

            O art. 995 do CPC prevê as hipóteses em que o inventariante pode ser removido. A primeira hipótese de remoção ocorre se não prestar, no prazo legal, as primeiras e as últimas declarações. A segunda ocorre se não der ao inventário andamento regular, suscitando dúvidas infundadas ou praticando atos meramente protelatórios. O terceiro caso de remoção ocorre se, por culpa sua, se deteriorarem, forem dilapidados ou sofrerem danos os bens do espólio. Também será removido o inventariante que não defender o espólio nas ações em que for citado, deixar de cobrar dívidas ativas ou não promover as medidas necessárias para evitar o perecimento de direitos. O quinto caso de remoção está presente quando o inventariante não presta contas ou se aquelas que prestar não forem julgadas boas. Por fim, haverá remoção do inventariante se ele sonegar, ocultar ou desviar bens do espólio.

            A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a remoção de ofício, sendo interessante a transcrição da seguinte ementa:

"Remoção de inventariante. Ausência de cerceamento de defesa. 1. Não se configura o cerceamento de defesa no caso de remoção de inventariante quando está presente o contraditório, e pode o Juiz, constatado qualquer dos vícios do art. 995 do Código de Processo Civil, promover de ofício a remoção. 2. Recurso especial não conhecido" (STJ, 3 a T., REsp 539.898/MA (200300644088), 616051 Recurso Especial, Rei. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 29.03,2005, DJ 06.06.2005, p. 318).

            Mesmo sendo admitida essa remoção de ofício, o Código de Processo Civil prevê procedimentos para que esta ocorra. Primeiramente, requerida a remoção com fundamento em quaisquer dos motivos elencados, o inventariante será intimado para, no prazo de cinco dias, defender-se e produzir provas (art. 996). Vale dizer que o incidente da remoção correrá em apenso aos autos do inventário (art. 996, parágrafo único, do CPC). Decorrido o prazo, com ou sem a defesa do inventariante, o juiz decidirá (art. 997 do CPC). Se remover o inventariante, o juiz nomeará outro, observada a ordem estabelecida no art. 990 do CPC, já analisado. Mesmo diante do teor da ementa transcrita, percebe-se que o contraditório deve ser instituído no processo de remoção do inventariante,

            Decidindo pela remoção, o inventariante entregará imediatamente ao substituto os bens do espólio (art. 998 do CPC). No entanto, se deixar de fazê-lo, será compelido mediante mandado de busca e apreensão, no caso de bens móveis, ou de imissão na posse, no caso de bens imóveis.

Inventário judicial pelo rito sumário

            Quanto ao arrolamento sumário, prevê o art. 1.031 do CPC:

            "'Art. 1.031. A partilha amigável celebrada entre partes capazes, nos termos do art. 2,015 da Lei n.° 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, será homologada de plano pelo juiz, mediante a prova da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, com observância dos arts. 1.032 a 1.035 desta Lei.

            § 1.° O disposto neste artigo aplica-se, também, ao pedido de adjudicação, quando houver herdeiro único.

            §2." Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou adjudicação, o respectivo formal, bem como os alvarás referentes aos bens por ele abrangidos, só serão expedidos e entregues às partes após a comprovação, verificada pela Fazenda Pública, do pagamento de todos os tributos".

            Como o artigo em questão fazia remissão ao art. 1.773 do Código Civil de 1916, a Lei 11.441, de 4 de janeiro de 2007, apenas alterou sua redação para que se faça remissão ao artigo correspondente, qual seja, o 2.015 do Código Civil de 2002. Frise-se que não há mudança no conteúdo da norma, mas simples adequação ao atual Código Civil. Prevê o art. 2.015 do CC/2002 que "Se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz".

            Ensinam Euclides de Oliveira e Sebastião Amorím que o arrrolamento sumário é uma forma abreviada de inventário e partilha de bens, havendo concordância de todos os herdeiros, desde que maiores e capazes. Observam os autores que, aqui, não importa os valores dos bens a serem partilhados (Inventários e partilhas..., 2006, p. 457). Em suma, pode-se dizer que o seu fator predominante é justamente o acordo entre as partes envolvidas.

            O procedimento, como o próprio nome já diz, é sumário, visando a uma maior celeridade na partilha de bens. Demonstrando esse intuito célere, prevê o art. 1,032 do CPC que os herdeiros, na inicial: a) requererão ao juiz a nomeação do inventariante que designarem; b) declararão os títulos dos herdeiros e os bens do espólio; c) atribuirão o valor, dos bens do espólio, para fins de partilha.

Em regra o arrolamento sumário não comporta a avaliação de bens do espólio para qualquer finalidade (art. 1.033 do CPC). A única ressalva feita pelo dispositivo refere-se à avaliação da reserva de bens (art. 1,035 do CPC).

            Também visando a uma maior simplicidade ou facilitação, no arrolamento sumário não serão conhecidas ou apreciadas questões relativas ao lançamento, ao pagamento ou à quitação de taxas judiciárias e de tributos incidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio (art, 1.034 do CPC). A taxa judiciária, se devida, será calculada com base no valor atribuído pelos herdeiros, cabendo ao fisco, se apurar em processo administrativo valor diverso do estimado, exigir a eventual diferença pelos meios adequados ao lançamento de créditos tributários em geral (art. 1.034, § do CPC). O imposto de transmissão será objeto de lançamento administrativo, conforme dispuser a legislação tributária, não ficando as autoridades fazendárias adstritas aos valores dos bens do espólio atribuídos pelos herdeiros (art. 1.034, § 2.°, do CPC).

            Por fim, encerrando os procedimentos, prevê o art. 1.035 do Estatuto Processual que a existência de credores do espólio não impedirá a homologação da partilha ou da adjudicação, se forem reservados bens suficientes para o pagamento da dívida. Essa reserva de bens será realizada pelo valor estimado pelas partes, salvo se o credor, regularmente notificado, impugnar a estimativa. Nesse último caso, é que deverá ser realizada a única forma de avaliação admitida no arrolamento sumário (art. 1.035, parágrafo único, do CPC).

Inventário judicial pelo rito do arrolamento comum

            Como já dito, o arrolamento comum é disciplinado pelo art. 1,036 do CPC. De acordo com o caput desse dispositivo, quando o valor dos bens do espólio for igual ou inferior a 2.000 Obrigações do Tesouro Nacional - OTN, o inventário processar-se-á na forma de arrolamento. Nesse caso, cabe ao inventariante nomeado, independentemente da assinatura de termo de compromisso, apresentar, com suas declarações, a atribuição do valor dos bens do espólio e o plano da partilha.

            Como se pode perceber, essa forma de arrolamento não leva em conta eventual acordo entre as partes interessadas, mas sim o valor dos bens inventariados.

            Sobre o valor de 2.000 OTN (Obrigações do Tesouro Nacional), tendo em vista a extinção do indexador pela Lei 7.730/1989, sua quantificação em reais é matéria conturbada. O índice é inadequado e defasado, sendo praticamente impossível saber o valor exato, como lembram Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim, que também sugerem mudança da lei para que conste o valor de 500 salários mínimos como limite para a adoção do arrolamento em questão. Para os auto­res, no ano de 2006, se seguida a Tabela de atualização do Tribunal de Justiça de São Paulo, o valor de 2.000 OTN corresponderia a RS 38.826, 41 {Inventários e partilhas..., 2006, p. 503-504).

No que toca aos procedimentos, se qualquer das partes ou o Ministério Público impugnar a estimativa anteriormente realizada pelo inventariante, o juiz nomeará um avaliador que oferecerá laudo em dez dias (art. 1.036, § 1°, do CPC). O que se percebe é que a elaboração desse laudo diferencia o arrolamento comum do arrolamento sumário.

            Apresentado o laudo, o juiz, em audiência que designar, deliberará sobre a partilha, decidindo de plano todas as reclamações e mandando pagar as dívidas não impugnadas (art. 1.036, § 2.°, do CPC). Lavrar-se-á de tudo um só termo, assinado pelo juiz e pelas partes presentes (art. 1.036, § 3.°, do CPC).

            Podem ser aplicadas ao arrolamento comum, eventualmente, as disposições antes analisadas previstas no art. 1.034 do CPC, relativamente ao lançamento, ao pagamento e à quitação da taxa judiciária e do imposto sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio. E o que prevê o § 4.° do art. 1.036 do CPC, que aproxima as duas formas de arrolamento. Por fim, provada a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, o juiz julgará a partilha (art. 1.036, § 5.°, do CPC).

            Analisadas essas espécies de inventário, com enorme aplicação prática, interessante aqui anotar a existência de outras modalidades, que são muito bem apresentadas por Flávio Augusto Monteiro de Barros {Manual..., 2005, v. 1, p. 304 e 305):

            Inventário orfanológico - havendo herdeiro menor, interdito, ausente ou desconhecido.

            Inventário de provedoria - quando o de cujus houver deixado testamento ou codicilo.

            Inventário de maiores - quando, não havendo testamento, todos os herdeiros forem maiores e capazes.

            Inventário conjunto - aquele que abrange mais de um espólio. Segundo o professor paulista, seria possível em apenas duas hipóteses: quando o cônjuge meeiro falecer antes da partilha do pré-morto, sendo as duas heranças inventariadas e partilhadas de forma cumulativa, se os herdeiros forem os mesmos (art, Í.043 do CPC); quando, antes da partilha, falecer um dos herdeiros, que não possui outros bens, além daqueles da herança inventariada (art, 1.044 do CPC). Nos dois casos, o inventariante será o mesmo.

            Inventário negativo - nas hipóteses em que o de cujus não deixa bens. No volume anterior dessa coleção vimos que há interesse em fazer esse inventário para que não se imponha a causa suspensiva do casamento prevista no art. 1.523, I, do CC. A jurisprudência vem reconhecendo sua viabilidade e possibilidade, mesmo que não haja um interesse patrimonial direto: "Inventário negativo - Possibilidade da declaração judicial da inexistência de bens em nome do de cujus - Interesse jurídico reconhecido - Afastamento do decreto de extinção do feito - Recurso provido" (TJSP. La Câm. de Dir. Privado, Apelação Cível 261.452-4/1-Suzano, Rei. Elliot Akel, j. 08.04.2003, v.u.).

 Inventário extrajudicial ou por via administrativa

            De acordo com o art. 982 do CPC:

            "Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário. Parágrafo único. O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial".

            Desse modo, como ocorreu com relação à separação e ao divórcio extrajudicial, a lei foi demais concisa e disse muito pouco a respeito do tema, cabendo à doutrina e à jurisprudência sanar as dúvidas decorrentes desses institutos.

            A Resolução 35 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de 24 de abril de 2007, é de profunda importância para a compreensão desse novo instituto, razão pela qual será mencionada no presente capítulo. A Resolução se divide em cinco seções, sendo que a Seção I, com regras de caráter geral, e a Seção II, com disposições referentes ao inventário e à partilha, são as que nos interessam para o estudo em questão.

            Os requisitos para que se possa utilizar a via administrativa são os seguintes:

            a) Todos os herdeiros devem ser capazes.

            A capacidade, mencionada na lei, é a capacidade de fato, ou seja, a aptidão para praticar pessoalmente os atos da vida civil (arts. 3.° e 4.° do CC). Caso o de cujas deixe herdeiro menor que seja emancipado, legal ou voluntariamente, poderá ser utilizada a via administrativa. A capacidade dos herdeiros deve ser verificada no momento da elaboração da escritura. Isso porque a incapacidade retira a validade do negócio jurídico e deve ser verificada no mo­mento da celebração, não importando se, no momento da morte, o herdeiro era ou não capaz.

            Questão interessante é saber se, em razão da existência de nascituro no ventre materno, a via administrativa seria afastada. O nascituro está concebido e nidificado no ventre materno, mas ainda não nasceu. A questão esbarra no debate a respeito da personalidade jurídica do nascituro. Conforme esclarecido no volume l da presente coleção, duas são as principais teorias no tocante ao início da personalidade jurídica do nascituro: a natalista e a concepcionista. Pela teoria natalista, o nascituro não poderia ser considerado pessoa, pois o Código Civil exigiria o nascimento com vida e o nascituro teria mera expectativa de direitos. São adeptos dessa teoria Silvio Rodrigues, San Tiago Dantas, Caio Mario da Silva Pereira e Sílvio de Salvo Venosa. Pela teoria concepcionista, o nascituro é pessoa humana, tendo seus direitos resguardados pela lei. Seguem a teoria em questão: Rubens Limongi França, Giselda Hironaka, Francisco Amaral, Renan Lotufo e Maria Helena Diniz.

            b)Concordância de todos. Se houver litígio, por óbvio, só a via judicial poderá ser utilizada.

            c) O falecido não pode ter deixado testamento.

            A questão da existência do testamento, por si só, não deve servir de impedimento à utilização da via extrajudicial. Desde que o testamento não tenha conteúdo patrimonial (ex.: testamento que reconhece um filho ou perdoa o indigno), a via extrajudicial pode ser adotada (CASSETTARI, Christiano. Separação..., 2007, p. 95).

            Juliana da Fonseca Bonates vai mais longe. Para ela  as razões para impedir a utilização da via extrajudicial não existem quando o falecido deixa apenas codicilo, e tampouco quando o testamento não realiza partilha alguma, limitando-se à revogação do testamento anterior, à deserdação de um herdeiro, ou, ainda, se o conteúdo patrimonial não for economicamente relevante: esmolas, funerais, etc. (Há hipóteses..., Separação..., 2007, p. 318).

            Superada a análise dos requisitos para a incidência da lei, é imperioso apontar que não há que falar em competência do Tabelião para a elaboração da escritura pública.

            Qualquer Tabelião de Notas, independentemente de sua localização, bem como do domicílio do falecido ou da localização dos bens a serem inventariados. Ilógico seria a aplicação da regra de competência prevista no CPC para um ato extrajudicial. A Lei 8.935/1994, em seu art. 8.°, garante a liberdade da escolha do tabelião de notas, independentemente do domicílio das partes ou do lugar da situação dos bens objeto do ato. Nesse sentido, o art. l.° da Resolução 35 do CNJ, cuja redação é a seguinte: "Para a lavratura dos atos notariais de que trata a Lei n. 11.441/07, é livre a escolha do tabelião de notas, não se aplicando as regras de competência do Código de Processo Civil".

            Com relação aos requisitos que devam constar da escritura, o art. 982 do CPC apenas menciona que as parles interessadas devem estar assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

            O art. 8.° da Resolução 35 reforça essa determinação, prevendo que é necessária a presença do advogado, dispensada a procuração, ou do defensor público, na lavratura das escrituras decorrentes da Lei 11.441/2007, nelas constando seu nome e registro na Ordem dos Advogados do Brasil. No entanto, a dita resolução não menciona a conseqüência da ausência do profissional da área.

TESTAMENTEIRO

            O testamenteiro é o executor do testamento. Já a testamentaria é o conjunto de funções atribuídas ao testamenteiro.

            É uma função personalíssima, intransmissível e indelegável. Ele tem como dever lutar pela validade do testamento bem como cumprir o testamento, de acordo com o artigo 1976 do Código Civil.

            O testamenteiro pode ser nomeado pelo testador, e pode ser o cônjuge ou herdeiro nomeado pelo juiz (artigos 1976 e 1984 do Código Civil).

            Para Clóvis Beviláqua, é obrigatória a nomeação do testamenteiro. AS OBRIGAÇÕES DE TESTAMENTEIRO SÃO:

            - 1.979: ABERTURA E REGISTRO DO TESTAMENTO

            - 1.978: CUMPRIR O TESTAMENTO

            - PRESTAR COMPROMISSO E CUMPRIR COM ZÊLO O ENCARGO

            - 1.980, 1.981 E 1.982

            - DEFENDER O ESPÓLIO

            - ADMINISTRAR AS DESPESAS FUNERÁRIAS; ...

            O PRAZO PARA CUMPRIMENTO DAS DISPOSIÇÕES TESTAMENTÁRIAS, DE ACORDO COM O ARTIGO 1.983 É DE 180 DIAS.

            DENTRE AS ESPÉCIES DE TESTAMENTEIRO ESTÃO:

            TESTAMENTEIRO UNIVERSAL: POSSE E ADMINISTRAÇÃO DE TODA A HERANÇA.

            TESTAMENTEIRO PARTICULAR: PARTE DISPONÍVEL.

            A VINTENA, ART 1.987 DO CÓDIGO CIVIL CORRESPONDE AO TRABALHO REMUNERADO DO TESTAMENTEIRO;sE HOUVER PREVISÃO NO TESTAMENTO, SERÁ DE ACORDO COM A VONTADE DO TESTADOR e SE NÃO HOUVER PREVISÃO NO TESTAMENTO SERÁ DE UM A CINCO POR CENTO DA HERANÇA LÍQUIDA (PARTE DISPONÍVEL)

SONEGAÇÃO

            Prevê o art. 1.992 do Código Civil em vigor que "o herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento, estejam no poder de outrem; ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou ainda que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia1'. Sonegados, portanto, são os bens que deveriam ter sido inventariados ou trazidos à colação, sendo ocultados pelo inventariante ou por algum dos herdeiros.

            Para Roberto Senise Lisboa (Direito Civil, v. 5, 2007, p. 68) sonegados são os bens pertencentes ao de cujus no momento de sua morte, que não foram inseridos nas primeiras declarações ou nas últimas declarações, para sobre eles se realizar a partilha.

            Os bens sonegados devem se achar na posse do herdeiro que omi­tiu a informação a respeito deles ou deixou de restituí-los.

            Os bens sonegados devem ser declinados perante o juiz, para que ocorra uma partilha justa e equilibrada.

            O dispositivo conceitua a pena de sonegados, que vem a ser uma sanção ou penalidade civil imposta para os casos mencionados, de ocultação de bens da herança, gerando a perda do direito sobre os bens ocultados.

            Para essa imposição, exige-se a presença de dois elementos: um objetivo - a ocultação dos bens em si - e outro subjetivo – o do inventario e da partilha ato malicioso do ocultador. o seu dolo. a sua intenção de prejudicar. O CPC prevê no seu art. 1.040, I, que os bens sonegados ficarão sujeitos a sobrepartilha.

            Em relação ao elemento subjetivo, a doutrina se divide quanto à sua prova. Euclides de Oliveira, Sebastião Amorim (Inventários e partilhas..., 2006, p. 363), Maria Helena Diniz (Curso..., 2005, v. 6, p. 391) e Zeno Veloso (Comentários..., 2003, p. 398) entendem pela necessidade da prova do dolo por quem alega a ocultação, Já Sílvio de Salvo Venosa se posiciona no sentido de que, provado o elemento objetivo por parte do autor da ação - a sonegação dos bens cabe ao réu provar que a omissão não se deu por dolo (Direito civil..., 2003, v. 7, p. 355). Haveria, portanto, uma presunção simples contra o sonegador, que poderia provar a ausência de dolo para se livrar da penalidade imposta por lei.

            Há jurisprudência neste sentido:

"Sonegados. Omissão de bem móvel que foi adquirido através de financiamento. Lucro decorrente de parceria rural. 1. A ação de sonegados pressupõe a ocultação dolosa de bens por quem deveria trazê-los à colação, sendo imprescindível provar não apenas a existência dos bens sonegados, mas, sobretudo, do dolo na ocultação. 2. A possibilidade de terem o inventariante e os herdeiros tido algum proveito econômico em razão de parceria rural e que não foi levado ao inventário não constitui hipótese de sonegação, pois o lucro depende de apuração e não se vislumbra dolo, e caso venha a ser apurado poderá ser alvo de sobrepartilha. 3. Também a não descrição no rol dos bens partilháveis de máquina colheitadeira, que foi adquirida mediante financiamento, não configura sonegado, pois não se verifica omissão dolosa, tratando-se de fato de todos conhecido, devendo tal bem ser objeto de sobrepartilha. Recurso desprovido" (TJRS, 7.a Câm. Cível, Apelação Cível 70020009254, Rei. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j. 08.08.2007).

            E ainda:

"Ação de sonegados. Imóvel destinado aos filhos em vida. Ocultação dolosa não configurada. Imóvel destinado aos filhos pelo pai, pela metade, em vida, ainda que em momentos distintos, não se configura em bem dolosamente ocultado. Logo, descabe ação de sonegados quanto ao mesmo. Apelação principal provida. Apelação adesiva improvida" (TJMG, 2.a Câm. Cível, Processo 1.0024.99.025790-9/001(2), Rei. Des. Nilson Reis, j. 23.05.2006).

            Relativamente aos procedimentos, Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim ensinam que a sonegação deve ser argüida nos próprios autos do inventário e "havendo apresentação do bem, serão aditadas as declarações, para o regular seguimento do processo. Mas se persistir a recusa, a controvérsia haverá de ser resolvida em vias próprias, por meio da ação de sonegados" (Inventários e partilhas,,., 2006, p. 363). Na grande maioria das vezes, estaremos diante de uma questão de alta indagação, o que justifica a ação específica.

            Essa ação somente pode ser promovida pelos herdeiros ou pelos credores da herança, conforme prevê o art. 1.994 do CC em vigor, correndo no mesmo foro do inventário. Quanto ao prazo prescricional para a sua propositura, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem aplicando o prazo de 20 anos, constante do art, 177 do CC/1916, que deve ser contado da prática de cada ato irregular

            Quanto à sentença que for proferida nessa ação, ela aproveitará aos demais interessados (art. 1.994, parágrafo único, do CC). Isso faz com que os bens sonegados voltem ao monte para serem sobrepartilhados.

            Em casos excepcionais, não sendo possível a restituição dos bens sonegados pelo sonegador, tendo em vista que já não os tem em seu poder, este pagará a importância correspondente aos valores que ocultou mais as perdas e danos. Essa é a regra prevista no art. 1.995 do CC, que deve ser analisada tendo como parâmetro o princípio da reparação integral de dano. Desse modo, é possível o ressarcimento dos danos materiais - nas modalidades danos emergentes (valores que a pessoa efetivamente perdeu) e lucros cessantes (valores que a pessoa efetivamente deixou de lucrar) -, nos termos do art. 402 do CC. Sendo o caso, também são reparáveis os danos morais se o herdeiro ou credor sofrer um prejuízo imaterial que possa ser provado. Anote- se que, nos termos dos arts. 403 do CC e 333, I, do CPC, cabe ao autor do pedido também provar esse prejuízo suportado.

            Encerrando o tratamento da pena civil de sonegados, prevê o art. 1.996 do CC quais os são momentos oportunos para argüir a sonegação, ou seja, para ingressar com a ação de sonegados.

Quanto à sonegação praticada pelo inventariante, a alegação somente poderá ser feita depois de encerrada a descrição dos bens, com a declaração, por ele feita, de não existirem outros bens por inventariar (em regra, após as últimas declarações). Em relação ao herdeiro, somente cabe a argüiçâo de sonegados depois de ele declarar no inventário que não possui tais bens. Se a ação for proposta antes desses momentos, deverá ser extinta sem a resolução do mérito, por falta de interesse de agir, não estando presente uma das condições da ação (art. 267, VI, do CPC).

COLAÇÃO

            Para Roberto Senise Lisboa (Direito Civil, v. 5, 2007, p. 46), Colação é a conferência dos bens recebidos do de cujus em vida deste, que deve ser feita pelos herdeiros, trazendo-os à sucessão.

            A colação é instituto destinado a manter a igualdade das legítimas, trazendo-se ao inventário o que foi antecipadamente recebido e que constitui adiantamento da legítima.

Para o cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos deve ser computado na parte indisponível, sem se proceder ao aumento da disponível.

            O valor da colação dos bens doados corresponde àquele atribuído por ocasião do ato de liberalidade do de cujus. O cálculo deverá ser feito tomando-se por base o valor dos bens à época da abertura da sucessão (art. 1.014, parágrafo único, do CPC).

            A doação por excesso, ou seja, aquela cujo bem excede a legítima a ser preservada, sofrerá redução proporcional, restituindo-se o excesso apurado ao monte hereditário em espécie. E, se a restituição em espécie não se fizer possível, ela será feita em dinheiro, conforme o seu valor ao tempo da abertura da sucessão e observadas as regras sobre redução das disposições testamentárias.

            A colação é conceituada pela doutrina como sendo "uma conferência dos bens da herança com outros transferidos pelo de cujus, em vida, aos seus descendentes, promovendo o retorno ao monte das liberalidades feitas pelo autor da herança antes de falecer, para uma eqüitativa apuração das quotas hereditárias dos sucessores legitimários" (DINIZ, Maria Helena. Código Civil..., 2006, p. 1.599). A matéria também está tratada tanto no Código Civil (arts. 2.002 a 2.012) quanto no Código de Processo Civil (arts. 1.014 a 1.016).

            De início, o conceito de colação ou conferência pode ser retirado do art. 2.002 do CC, segundo o qual: "Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação". O próprio comando legal prevê a sanção para o caso de o descendente não trazer o bem à colação: a pena civil de sonegados, já estudada. Prevê o seu parágrafo único que, para o cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos será computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível.

            A colação é justificada, segundo a doutrina, diante da possibilidade de doação do ascendente ao descendente ou mesmo entre cônjuges, implicando esta adiantamento da legítima, conforme prevê o art. 544 do atual Código Civil. Ensina Zeno Veloso que ua regra de que a doação é feita como adiantamento da legítima não é absoluta, cogente, inafastável, pois o ascendente-doador pode dispensar da colação as doações feitas ao descendente, seu herdeiro necessário, determinando que saiam de sua metade disponível, contanto que não a excedam, e computando o seu valor ao tempo da doação (art. 2.003, parágrafo único). Porém, se o ascendente silenciar, se não fizer expressamente a dispensa da colação, mandando embutir o que foi doado na sua parte disponível, a regra do art. 544 incide" 0Comentários.... 2003, p. 405).

            Desse modo, a colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida no próprio Código Civil, as legítimas dos descendentes e do cônjuge sobrevivente, obrigando também os donatários que, ao tempo do falecimento do doador, já não possuírem os bens doados. E o que prevê o art. 2.003 do atual Código Civil, dispositivo que coloca o cônjuge sobrevivente, ao lado dos descendentes, como pessoa obrigada a colacionar. Apesar de não mencionado nos comandos legais anteriores, filiamo-nos à corrente doutrinária pela qual o cônjuge também é destinatário do referido dever legal (DINIZ, Maria Helena. Código Civil..., 2003, p. 1.356; e VELOSO, Zeno. Comentários..., 2003, p. 417).

            A opinião que endossamos tem por fundamento a dicção do art. 544 supramencionado, que expressamente menciona a doação entre cônjuges como adiantamento de legítima ("Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança").

            Quanto aos descendentes, é de se salientar que os filhos sempre terão o dever de colacionar; já quanto aos netos a questão merece certa ponderação. Se os netos receberam a herança por representação, colacionam o que seus pais colacionariam, ou seja, os bens que seu pai (pré-morto) recebeu diretamente por doação do avô, mesmo que o bem não mais exista (ex.: pai recebe casa do avô em doação como adiantamento de legítima. Quando o avô falece, o pai já é pré-morto e seu filho - neto do falecido - é chamado a suceder em representação. Como o pai deveria colacionar a casa, seu filho - neto do falecido - colaciona, ainda que a casa já tenha sido vendida). Já se os netos receberam a herança por direito próprio, devem colacionar os bens que eles mesmos receberam por doação de seu avô.

            Essa é a disposição do art. 2.009 do CC. Quando os netos, representando os seus pais, sucederem aos avós, serão obrigados a trazer à colação, ainda que não o hajam herdado, o que os pais teriam de conferir, O dispositivo, assim, acaba transferindo o dever aos herdeiros daquele que deveria colacionar, quebrando com a regra pela qual a colação é pessoal.

            Os netos não colacionam os bens a eles doados diretamente por seu avô, se o seu pai estiver vivo no momento do óbito do avô, pois não são herdeiros do avô. O herdeiro é o pai, que por ser descendente de 1.° grau exclui os netos que são descendentes de 2.° grau. Também os netos não colacionam bens recebidos diretamente do avô quando herdarem por representação (pois estão substituindo o pai pré-morto).

            Os ascendentes e colaterais estão dispensados da colação, pois a lei não prevê que tais pessoas têm referido dever. Diferentemente do sistema francês, por exemplo, em que se determina a colação pelo ascendente. Como a norma é restritiva de direitos, não merece interpretação extensiva.             O mesmo deve ser dito quanto ao companheiro que, aqui, não está na mesma situação que o cônjuge, até porque o convivente não é herdeiro necessário, não tendo direito à legítima. Além disso, o companheiro não está mencionado no art. 544 do CC, que trata somente da doação entre cônjuges.

            O parágrafo único do art. 2.003 do CC prevê que, "se, computados os valores das doações feitas em adiantamento de legítima, não houver no acervo bens suficientes para igualar as legítimas dos descendentes e do cônjuge, os bens assim doados serão conferidos em espécie, ou, quando deles já não disponha o donatário, pelo seu valor ao tempo da liberalidade".

            Interpretando o dispositivo, conforme ensina Maria Helena Diniz, nosso ordenamento jurídico adotou o sistema da colação em substância, pois "a mesma coisa doada em adiantamento da legitima ao descendente e ao cônjuge (arts. 544 e 2.003, parágrafo único, segunda parte, do Código Civil) deve ser trazida à colação.

            O ideal seria que o bem doado permanecesse com o donatário, seja ele descendente ou cônjuge e que, com os demais bens do acervo, fossem igualadas as legítimas dos outros herdeiros necessários.

            Quanto ao valor de colação dos bens doado, será aquele, certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade, ou seja quando da doação (art. 2.004, caput, do CC). Relativamente ao valor estimativo, o juiz do inventário pode nomear um perito para a sua determinação, se houver dificuldades na fixação do quantum.

            Há uma certa contradição entre esse último comando legal e o art. 1.014 do CPC, segundo o qual: "No prazo estabelecido no art. 1.000, o herdeiro obrigado à colação conferirá por termo nos autos os bens que recebeu ou, se já os não possuir, trar-lhes-á o valor. Parágrafo único. Os bens que devem ser conferidos na partilha, assim como as acessões e benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da sucessão".

            A contradição está presente, pois o Código Civil menciona o valor do bem ao tempo da doação, enquanto o CPC fala no momento da abertura da sucessão. A solução é apontada por Zeno Veloso, que afirma que o Código Civil de 2002 revoga o art. 1.014 do Código de Processo Civil (Comentários..., 2003, p. 419). É uma questão de direito intertemporal. Caso o falecimento tenha ocorrido em período anterior à vigência do Código Civil de 2002, as suas regras não produzem efeitos, aplicando-se apenas o previsto no Código de Processo Civil, ou seja, o valor dos bens a ser colacionado é o do tempo da abertura da sucessão. Já para as sucessões abertas na vigência do novo Código Civil, o valor é o do tempo da liberalidade. Aplica-se, assim, o art. 2.035 do Código Civil de 2002.

            No que concerne ao valor do bem ao tempo da doação, eventual valorização ou desvalorização da coisa deve ser desconsiderada, mas de qualquer forma o valor histórico deve ser monetariamente corrigido até o momento da abertura da sucessão (RODRIGUES, Silvio. Direito civil..., 2002, v. 7, p. 319; AMORIM, Sebastião e OLIVEIRA, Euclides. Inventários e partilhas..., 2006, p. 378).

            Se do ato de doação não constar valor certo, nem houver estimação feita naquela época, os bens serão conferidos na partilha de acordo com o seu valor ao tempo da liberalidade (art. 2.004, § 1.°, do CC). Só o valor dos bens doados entrará em colação (art. 2.004, § 2.°, do CC). Pelo último dispositivo, não entram na colação os valores correspondentes às benfeitorias acrescidas, as quais pertencerão ao herdeiro donatário, correndo também à conta deste os rendimentos ou lucros (frutos civis), assim como as perdas e danos que os bens sofrerem, que deverão ser suportados pelo donatário.

            O art. 2.005 do atual Código Civil trata da dispensa da colação das doações que saíram da parte disponível da herança. A dispensa é possível, desde que tais liberalidades não excedam essa parte disponível, ou seja, desde que não ingressem na parte da legítima, computado o seu valor ao tempo da doação. A lei presume imputada na parte disponível a liberalidade feita a descendente que, ao tempo do ato, não seria chamado à sucessão na qualidade de herdeiro necessário (art. 2.005, parágrafo único, do CC). A presunção é relativa ou iuris tantum, e o exemplo a ser citado é de uma doação realizada a um neto, cujo pai, sucessor legítimo, está vivo.

            Ainda no tocante à dispensa da colação, esta pode ser outorgada pelo doador em testamento, ou no próprio título de liberalidade (art. 2.006 do CC). Assim, a dispensa da colação também pode constar do próprio instrumento de doação, como decorrência da autonomia privada do doador, Para tanto, devem-se respeitar todos os requisitos de validade do negócio jurídico, extraídos do art. 104 do CC: partes capazes; vontade livre (sem vícios); objeto lícito, possível e determinado ou determinável; forma prescrita e não defesa em lei. Isso sob pena de nulidade (arts. 166 e 167 do CC) ou anulabilidade (art. 171 do CC) do ato de dispensa da colação.

            Não virão à colação os gastos ordinários do ascendente com o descendente, enquanto menor, em sua educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento de enfermidades, enxoval, assim como as despesas de casamento, ou as feitas no interesse de sua defesa em processo-crime. E o que prevê o art, 2.010 da atual codificação, que apesar da vedação do enriquecimento sem causa, entende que tais valores foram gastos não como liberalidades, mas como dever do ascendente.

            Encerrando o tratamento no Código Civil, prevê o seu art. 2.012 que, sendo feita a doação por ambos os cônjuges, no inventário de cada um se conferirá por metade. No caso em questão, serão aplicadas, de forma concomitante, as regras de procedimento vistas anteriormente. Como a norma não é restritiva, não vemos problemas em aplicá-la também para a união estável. Nesse sentido, ensina Zeno Veloso que, "dando uma interpretação compreensiva ao dispositivo, havemos de concluir que se aplica ao caso de a doação ser feita ao descendente por ambos os companheiros, se a família é constituída por uma união estável" (Comentários.... 2003, p. 432).

            No campo prático e processual, se o herdeiro negar o recebimento dos bens ou a obrigação de os conferir, o juiz, ouvidas as partes no prazo comum de cinco dias, decidirá à vista das alegações e provas produzidas. Essa é a regra do art. 1.016, caput, do CPC, sendo certo que essa decisão do juiz é interlocutor ia no processo de inventário, sendo passível de agravo (NERY JR,, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil.., 2006, p. 1.023). Mas, havendo questão de alta indagação, haverá remessa às vias ordinárias (art. 1.016, § 2.°, do CPC).             Enquanto pender essa demanda, o herdeiro não poderá receber o seu quinhão hereditário, a não ser que preste caução correspondente ao valor dos bens discutidos em juízo.

            Encerrando o estudo da colação, prevê o CPC que, sendo declarada improcedente a oposição, se o herdeiro, no prazo improrrogável de cinco dias, não proceder à conferência, o juiz mandará seqüestrar-lhe os bens sujeitos à colação, para serem inventariados e partilhados (art. 1.016, § 1.°, do CPC). Cabe, ainda, a imputação ao seu quinhão hereditário do valor desses bens, se já não os possuir.

            A colação dos bens doados não se confunde com a redução da doação inoficiosa. Se for o caso de uma doação que exceda a parte que poderia ser disposta (inoficiosa), fica ela sujeita a redução, conforme o art. 2.007 do CC. O dispositivo em questão é decorrência do art. 549 do mesmo Código, que considera nula a doação inoficiosa na parte que exceder o que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

            Haveria prazos para a redução da doação inoficiosa? Na opinião dos presentes autores, a resposta é negativa, pois, sendo nula, a ação é declaratória e não estaria sujeita a prazos. Ademais, nos termos do art. 169 do CC, a nulidade não convalesce pelo decurso do tempo.

Assim, não há necessidade de aguardar o falecimento do doador para propositura da ação de redução, em caso de doação inoficiosa. Em outras palavras, poderá ser proposta, mesmo estando vivo o doador que instituiu a liberalidade viciada. Visando a esclarecer, o Projeto de Lei 276/2007 (antigo PL 6.960/2002) pretende acrescentar um parágrafo único ao art. 549, com o seguinte teor: "Art. 549. (...) Parágrafo único. A ação de nulidade pode ser intentada mesmo em vida do doador". A proposta confirma o entendimento doutrinário atual, que já pode ser invocado (ALVES, Jones Figueiredo. Código Civil..., 2008, p. 500; GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil..., 2007, v. III, p. 270).

            Todavia, quanto ao prazo, surge um outro entendimento no sentido de que, pelo fato de a questão envolver direitos patrimoniais, está sujeita a prazo prescricional, que é próprio dos direitos subjetivos. Como não há prazo especial previsto, deverá ser aplicado o prazo geral de prescrição.

Também estará sujeita a redução a parte da doação feita a herdeiros necessários que exceder a legítima e mais a quota disponível (§ 3.°). Dessa forma, um herdeiro necessário que foi beneficiado além do que deveria também pode, por óbvio, ser atingido pela redução. Por fim, sendo várias as doações a herdeiros necessários, feitas em diferentes datas, serão elas reduzidas a partir da última, até a eliminação do excesso (§ 4.°).

            Além disso, prevê o art. 2.008 do CC que aquele que renunciou à herança ou dela foi excluído deve, mesmo assim, conferir as doações recebidas, para o fim de repor o que exceder a parte disponível. Em suma, mesmo o renunciante à herança e o excluído por indignidade devem trazer à colação, no que tange à parte inoficiosa, os bens recebidos. A doutrina majoritária entende que o dispositivo também deve incluir aquele que foi deserdado, entendimento este que deve ser considerado para fins de provas, prática e concursos públicos (VELOSO, Zeno. Comentários..., 2003, p. 427; e DINIZ, Maria Helena. Código Civil..., 2003, p. 1.359). No mesmo sentido, aliás, prevê o art. 1.015 do CPC que "o herdeiro que renunciou à herança ou o que dela foi excluído não se exime, pelo fato da renúncia ou da exclusão, de conferir, para o efeito de repor a parte inoficiosa, as liberalidades que houve do doador".

             O § 1.° desse comando processual prevê a licitude do donatário ao escolher, entre os bens doados, tantos quantos bastem para perfazer a legítima e a metade disponível, entrando na partilha o excedente para ser dividido entre os demais herdeiros. Em casos de exceção, se a parte inoficiosa da doação recair sobre bem imóvel, que não comporte divisão cômoda, o juiz determinará que sobre ela se proceda entre os herdeiros a licitação. Nesses casos, o donatário poderá concorrer na licitação e, em igualdade de condições, preferirá aos herdeiros (art. 1.015, § 2.°, do CPC). Como se pode perceber, o dispositivo processual traz aqui um direito de preferência a favor do donatário.

            Não se deve confundir a redução da doação inoficiosa com a redução das disposições testamentárias, que, conforme já visto ao se estudar o art. 1.967 do CC, trata das cláusulas previstas em testamento que invadem a legítima, as quais só produzirão efeitos após a morte do testador. A doação inoficiosa sujeita à redução que acabamos de estudar foi realizada em vida pelo falecido.

 PARTILHA

            De acordo com Roberto Senise Lisboa (Direito Civil, v. 5, 2007, p. 64), Partilha é meio de complementação do inventário, com a distribuição dos bens em favor dos herdeiros.

            A partilha pode ser amigável e judicial:

a) partilha amigável ou consensual, realizada quando da existência exclusiva de sucessores maiores e capazes.

            A partilha amigável pode ser realizada adotando-se uma das seguintes formas:

            a escritura pública;

            a redução a termo nos autos do inventário ou do arrolamento; e

            a homologação judicial de instrumento particular escrito.

            Para os fins sucessórios, a partilha é ato post-mortem, porque apenas há sucessão com o falecimento do de cujus.

            Todavia, nada impede a celebração de partilha amigável por ato inter vivos, com a distribuição dos bens do ascendente em favor dos seus descendentes, sem prejuízo da legítima dos herdeiros.

            Referido ato, que na prática se reveste como uma genuína "antecipação da herança", não é testamento e nem sucessão hereditária, porém doação.

            b) partilha judicial, efetuada sempre após a morte do autor da he­rança, quando há interesse de herdeiro incapaz ou, ainda, pela falta de consenso entre os herdeiros capazes.

            Viabiliza-se a partilha amigável quando há apenas sucessores capazes, mediante a lavratura de escritura pública com termo nos autos do inventário ou, ainda, de instrumento particular homologado pelo juiz.

            O pedido de partilha dos bens decorre da sua indivisibilidade e é imprescritível, enquanto subsistir o estado de comunhão sobre a coisa.

            Não há, contudo, a necessidade de partilha, quando:

            a)há apenas sucessores capazes, que não pretendem partilhar a coisa;

            b)há tão-somente um sucessor;

            c)as dívidas são de valor mais elevado que o acervo hereditário.

            A partilha é o instituto jurídico pelo qual cessam a indivisibilidade e a imobilidade da herança, uma vez que os bens são divididos entre os herdeiros do falecido. Trata-se do momento pelo qual os herdeiros aguardam ansiosamente, sendo certo que a partilha tem efeito declaratório e não constitutivo (VELOSO, Zeno. Comentários..., 2003, p. 1.870).

            Em relação à matéria, também devem ser estudadas as regras previstas tanto no Código Civil (arts. 2,013 a 2.022) quanto no Código de Processo Civil (arts. 1.022 a 1.030). Passaremos à análise desses dispositivos.

            De início, prevê o Código Civil que o herdeiro pode sempre requerer a partilha, ainda que o testador o proíba, cabendo igual faculdade aos seus cessionários e credores (art. 2.013 do CC). Percebe-se que o direito à partilha constitui um direito do herdeiro inafastável pela vontade do testador.

            A partir dos ensinamentos da melhor doutrina, e pelo que consta do Código Civil, podem ser apontadas três espécies de partilha: a amigável (ou extrajudicial), a judicial e a em vida (DINIZ, Maria Helena. Curso..., 2005, v. 6, p. 412).

 

Partilha amigável ou extrajudicial

 

            A partilha será amigável na hipótese em que todos os herdeiros forem capazes, fazendo-se por escritura pública, por termo nos autos do inventário ou por escrito particular, homologado pelo juiz (arts. 2.015 do CC e 1.029 do CPC). Nesse caso, não há qualquer conflito entre os herdeiros.

            A Lei 11.411, de 4 de janeiro de 2007 que instituiu o inventário extrajudicial, conforme dito anteriormente, alterou a redação do art. 1.031 do CPC para fins de adequação da remissão legislativa. Isso porque o CPC fazia remissão ao art. 1.773 do Código Civil de 1916 e, com a alteração, a remissão agora é feita ao art. 2.015 do Código Civil de 2002. Frise-se que não há alteração de conteúdo e, assim, tal mudança não produz qualquer feito prático. Aliás, a partir dessa constatação, conforme mensagem eletrônica enviada por Euclides de Oliveira aos autores desta obra, em 19 de janeiro de 2007, pode-se dizer que o inventário extrajudicial feito por escritura pública não necessita de posterior homologação judicial.

            Segundo Euclides de Oliveira: "O procedimento judicial, para tais casos, permanece mas fica reservado aos casos de exigência dessa via, quando haja testamento, ou quando as partes optem pela abertura do inventário em Juízo. Por outras palavras, mantém-se o art. 1.031 do CPC, com arrolamento sumário pela via judicial, mas só para as hipóteses em que seja necessária essa forma procedimental ou que essa seja escolhida pelas partes. Nos outros casos, quando não haja testamento e as partes maiores e capazes optem pela via administrativa, será bastante a escritura pública, como título hábil para o registro imobiliário, nos precisos termos da nova redação dada pelo art. L° da nova lei ao art. 982 do CPC. Não fosse assim, teríamos retornado à estaca zero do sistema legal anterior que sempre admitiu partilhas amigáveis por escritura pública nos inventários e arrolamentos sob homologação judicial. E a lei, nessa absurda situação, somente teria inovado com relação aos processos de separação e divórcio consensuais, fazendo tabula rasa da extensão ao inventário e partilha, constante da própria ementa que explicita o objetivo da norma inovadora. Anoto que os notários já estão praticando escrituras de inventário e partilha com plenos efeitos, independente de homologação judicial, e sem maiores questionamentos a esse respeito."

Como o objetivo da Lei 11.441/2007 foi a celeridade, diminuindo a burocracia, deve-se concordar plenamente com as palavras de Euclides de Oliveira.

Partilha judicial

            Essa espécie de partilha é obrigatória para os casos em que há divergência entre os herdeiros ou quando algum deles for incapaz (art. 2.016 do CC). O CPC traz procedimentos específicos. Vejamos tais regras.

            De início, prevê o art. 1.022 do CPC que separados os bens para pagamento dos credores para a respectiva praça ou leilão, o juiz facultará às partes que, no prazo comum de dez dias, formulem o pedido de quinhão.

            Em seguida o juiz proferirá, também no prazo de dez dias, o despacho de deliberação da partilha, resolvendo os pedidos das partes e designando os bens que devem constituir quinhão de cada herdeiro e legatário.

            Nos termos do art, ] ,023 do CPC, o pcirticlor - denominação dada ao agente do órgão do Poder Judiciário responsável pela or­ganização da partilha - fará o esboço da partilha de acordo com a decisão, observando nos pagamentos a seguinte ordem: 1.°) dívidas atendidas; 2.°) meação do cônjuge; 3.°) meação disponível; 4.°) qui­nhões hereditários, a começar pelo co-herdeiro mais velho.           Feito o esboço, dirão sobre ele as partes no prazo comum de cinco dias. Resolvidas as reclamações, será a partilha lançada nos autos (art, 1.024 do CPC).

            Prevê o art. 1.025 do CPC que da partilha constará:

            I)Um auto de orçamento, que mencionará: a) os nomes do autor da herança, do inventariante, do cônjuge supérstite, dos herdeiros, dos legatários e dos credores admitidos; b) o ativo, o passivo e o líquido partível, com as necessárias especificações; c) o valor de cada quinhão.

            II)De uma folha de pagamento para cada parte, declarando a quota a pagar-lhe, a razão do pagamento, a relação dos bens que lhe compõem o quinhão, as características que os individualizam e os ônus que os gravam.

            O auto e cada uma das folhas serão assinados pelo juiz e pelo escrivão (art. 1.025, parágrafo único, do CPC). Pago o imposto de transmissão a título de morte e juntada aos autos a certidão ou a informação negativa de dívida para com a Fazenda Pública, o juiz julgará por sentença a partilha (art. 1.026 do CPC). Trata-se da sentença homologatória da partilha, que é passível de recurso de apelação.

            Passada em julgado essa sentença, receberá o herdeiro os bens que lhe tocarem e um formal de partilha, que serve de prova da divisão dos bens, do qual constarão as seguintes peças, nos termos do art. 1.026 do CPC: I) termo de inventariante e título de herdeiros; II) avaliação dos bens que constituíram o quinhão do herdeiro; III) pagamento do quinhão hereditário; IV - quitação dos impostos; V - sentença. Vale dizer que o formal de partilha é fundamental para o registro da aquisição da propriedade imóvel, visando prová-la.

            Se for o caso, o formal de partilha poderá ser substituído por certidão do pagamento do quinhão hereditário, quando este não ex­ceder cinco vezes o salário mínimo vigente, na sede do juízo (art. 1.027 do CPC). Nesse caso, se transcreverá na certidão a sentença de partilha transitada em julgado.

            Ainda depois de passar em julgado a sentença homologatória, a partilha poderá ser emendada nos mesmos autos do inventário, con- vindo todas as partes, quando tenha havido erro de fato na descrição dos bens (art. 1.028 do CPC). Sem prejuízo disso, prevê o mesmo comando legal que o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, poderá, a qualquer tempo, corrigir-lhe as inexatidões materiais.

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