A estabilidade nas relações de emprego


PorJeison- Postado em 01 abril 2013

Autores: 
CASSEPP, Alexandre Azambuja.

 

1 NOÇÕES GERAIS

 

A relação de emprego é informada pelo princípio da continuidade. Parte-se da premissa da necessidade e conveniência recíprocas da sua manutenção: do empregado, porque fonte de subsistência, consubstanciada no salário, pago periodicamente em contraprestação da força de trabalho entregue; do empregador, porque dela emerge a tranqüilidade de poder contar com a energia do trabalhador, canalizada, através de sua capacitação profissional, aos fins da empresa. Esta, por sua vez, tende a perenidade, transcende gerações. Excepcionalmente tem caráter transitório. 

 

O direito do trabalho consagrou o instituto da estabilidade no emprego, num primeiro momento elevada a grau de direito absoluto. Contudo, a tendência moderna é de relativizá-la, dando ao trabalhador, em lugar da garantia definitiva do emprego, a proteção contra a despedida abusiva.

 

2 A PRECARIEDADE DO EMPREGO NO BRASIL

 

Não há proteção de emprego no Brasil.

 

A Carta Política de 1998 compatibilizou o regime do FGTS com a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa.

 

Fruto de uma visão economicista do valor do trabalho, a política de emprego no Brasil, já desde os anos setenta do século passado, tem sido desastrosa, com notória tendência de considerar o trabalho humano mero fator de produção, de oferta abundante escassa procura.      

 

A força de trabalho entregue pelo homem é medida em números, estatísticas, colunas de perdas e ganhos, de lucros e custos.

 

 

 

Melhor teria sido uma Constituição omissa se quaisquer regras de proteção contra o despedimento imotivado. Isso porque, ao remeter a regulamentação da proteção enganosamente assegurada no inciso I do seu art.7º a uma lei complementar, para cuja aprovação é necessária a maioria absoluta do Congresso Nacional (art. 69, CF), a própria Assembléia Constituinte a inviabilizou. Houvesse o silêncio da Constituição, a garantia de emprego poderia ser obviada através de lei ordinária, assim como o fora anteriormente a outubro de 1988. A própria CLT, um decreto-lei, consagrou durante mais de quatro décadas, a estabilidade decenal como um dos institutos mais marcantes. Também garantiu, e ainda garante, do dirigente sindical e, desde 1977, resguardou o empregado eleito titular da CIPA contra o despedimento arbitrário.

 

A Justiça do Trabalho transformou-se numa justiça de desempregados ressentidos, que tentam ir à forra na reclamação trabalhista, onde postulam tudo o que podem e o que não podem. Os empregadores, não menos ressentidos, queixam-se da indústria das reclamatórias que eles próprios incentivam, ao mandarem seus empregados “procurar seus direitos”, apostando que a exaustão do Judiciário para absorver a demanda de ações postergue a sentença por anos a fio.

 

O princípio da boa-fé, tanto enquanto informador da relação de emprego, como das relações no âmbito do processo judicial, não pode frutificar em solo tão árido.

 

3 ESTABILIDADE IMPRÓPRIA

 

Estabilidade imprópria é aquela na qual malgrado o despedimento válido e eficaz, há ônus de natureza econômica que, a par de desestimular o despedimento, de certa forma compensa o empregado pela perda do emprego.

 

Deve ter sido esse o escopo do legislador constituinte, quando cogitou de uma indenização compensatória de despedida.

 

A nova ordem constitucional instaurada em 1988, através da qual a garantia de emprego passou a conviver harmoniosamente com o fundo de garantia do tempo de serviço e a disposição transitória contida no art. 10, inciso I, instituiu a indenização compensatória equivalente a 40% dos depósitos do FGTS.

 

4 VEDAÇÃO AO DIREITO DE DESPEDIR - ESTABILIDADE NO EMPREGO

 

O conceito de estabilidade comporta duas acepções, conforme Amauri refere:

 

1) sob o ponto de vista econômico, corresponde a política oficial de garantia de pleno emprego, atendendo ao valor social do trabalho, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil; 2) no sentido jurídico, consubstancia o direito do empregado em manter-se no emprego, salvo situações exaustivamente previstas na lei, retirando do empregador o direito de resilir o contrato de forma aleatória. Na primeira hipótese, temos a estabilidade do emprego; na segunda, a estabilidade no emprego. (Nascimento, 2011, p. 396).

 

Tomada na sua acepção restrita, estabilidade significa a vedação absoluta ao direito de denúncia do contrato pelo empregador, impossibilidade jurídica do despedimento, mesmo diante de falta grave do empregado.

 

            Se é bem verdade que algumas faltas típicas são graves pela sua própria natureza (uma agressão física, com lesões corporais, ao superior hierárquico, o furto de numerário da empresa, a revelação de segredo da empresa em troca de propina etc.) outras permitem avaliação com maior ou menor severidade: um ato isolado de indisciplina, alguns atrasos ou faltas injustificadas do empregado, um único registro de comportamento inadequado no local de trabalho jamais constituirão faltas capazes de fundamentar uma ação judicial fundada em justa causa, em se tratando de empregado estável.

 

5 VEDAÇÃO AO DIREITO DE DESPEDIR ALEATORIAMENTE – ESTABILIDADE RELATIVA NO EMPREGO

 

A despedida será sempre motivada e caso não demonstrados os motivos relevantes ensejadores do despedimento, em eventual questionamento deste pelo empregado, perante o Poder Judiciário, reata-se a relação de emprego, através da reintegração do empregado.

 

            No Brasil, a estabilidade relativa é direito constitucional assegurada ao empregado, provisoriamente regulamentado no art. 10, inciso I, das disposições transitórias da Constituição Federa. Diríamos minimizado porque reduzidos a irrisórios 40% dos depósitos do fundo de garantia do tempo de serviço.

 

            O inciso I do art.7º da CF/88 protege a relação de emprego contra a denúncia aleatória, entendendo-se como tal a que não se fundar em razões disciplinares, intrínsecas a relação contratual (as justas causas), ou em razões extrínsecas justificadoras do rompimento do contrato, em geral decorrentes de motivos técnicos, econômicos e financeiros.

 

            As empresas, diante da concorrência de mercado cada vez mais acirrada, são compelidas a modernizar sua metodologia de atuação, informatizar parte de suas atividades, adquirir novas e complexas máquinas ou introduzir novos insumos, matérias-primas cada vez mais delicadas no seu manuseio. Tal demanda de adaptação do quadro de pessoal, qualificação profissional que nem sempre é possível exigir dos atuais empregados, muitos deles resistentes a novos métodos de trabalho. A dispensa de empregados em tal contexto é inevitável, sob pena de perda de competitividade ou até de inviabilizar a atividade econômica. Teríamos, aqui, vários exemplos, de motivo técnico.

 

            No aspecto econômico-financeiro, a CLT fornece seguro parâmetro analógico, em seu art. 501, quando trata da força maior. Ali está dito que a imprevidência do empregador não a qualifica (§1º). Diremos, também, que as dificuldades econômico-financeiras de uma empresa mal gerida , quando todas as demais similares estão a gozar de plena solvência e pujança, não podem ser invocadas como fundamento do despedimento. E assim sustentaremos, com fundamento em outra lei, a de nº4.923/65, quando, ao tratar de redução de salários, refere-se à conjuntura econômica, devidamente comprovada (art. 2º).

 

6 BREVE ESTUDO DA CONVENÇÃO Nº158 DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

 

            Em 26 de junho de 1963, a Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho - OIT aprovou a Recomendação-119, segundo a qual, entre outras providências, as despedidas somente deveriam ocorrer quando fundadas por razões vinculadas às necessidades ou ao funcionamento da empresa ou de ordem disciplinar, relativas à conduta do trabalhador.

 

            Através do Decreto nº. 1.855, de 10.04.1996, a Convenção nº. 158 foi promulgada, ensejando intenso debate doutrinário e jurisprudencial em torno da sua eficácia vinculativa, diante da exigência de lei complementar regulamentadora do instituto da proteção contra o despedimento abusivo.

 

            A Convenção nº158 é paradigma universal para as legislações protetivas da relação de emprego e a Constituição de 1988 adotou seus postulados no inciso I do art.7º.

 

            Vejamos suas disposições mais relevantes:

 

            O art.4º preconiza que não haja despedimento do trabalhador “a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com a sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”.

 

            Diante de justa causa ou de desempenho insatisfatório, haver-se-á de garantir ao empregado a possibilidade de se defender das acusações feitas contra ele (art. 7º)

 

            Acaso despedido, o trabalhador poderá questionar a legitimidade do despedimento “perante um organismo neutro, como, por exemplo, um tribunal, um tribunal do trabalho, uma junta de arbitragem ou um árbitro” (art.8º).

 

            No art.10, contempla-se uma espécie de indenização em favor do empregado, mesmo quando a despedida seja despida de aleatoriedade.

 

            Nos art. 13 e 14 da Convenção nº158 também se dispõe sobre as providências que deverão anteceder o despedimento por “motivos econômicos, tecnológicos, estruturais ou análogos”.

 

            Como visto, não há mínima dificuldade em regulamentar a garantia constitucional insculpida no art. 7º, inciso I, da Constituição. Basta segirmos as recomendações do direito internacional.

 

7 DESPEDIMENTO ABUSIVO

 

            Se voltarmos a Convenção nº158, encontraremos ali destacadas as circunstancias que não poderão ser invocadas como motivação para o despedimento, a exemplo do que já constava na Recomendação 119, entre elas, a militância do empregado, o ajuizamento de demanda de natureza trabalhista, qualquer espécie de discriminação (racial, de cor, sexual, religiosa, política, diante do estado de gravidez etc. – art.5º) e a ausência ao trabalho motivada por doença (art.6º).

 

            A Lei nº9. 029, de 13 de abril de 1995, proíbe a adoção de “qualquer prática discriminatória e limitativa para o efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas as hipóteses de proteção ao menor prevista no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal”.

 

            A vedação à despedida abusiva constitui proteção da pessoa humana do trabalhador, independentemente da sua prévia condição de estável ou não estável no emprego. È do ato discriminatório que decorre o direito à reintegração ou a indenização, não da condição prévia de estável do empregado.

 

            A jurisprudência tem sido fértil na construção de um eficaz meio de proteção contra a despedida abusiva. A mais significativa reside na pacífica inteligência ampliativa do art. 1º, cuja leitura permite concluir tratarem-se, as hipóteses ali elencadas de enumeração meramente exemplificativa, não exaustiva.

 

8 ESTABILIDADE PROVISÓRIA

 

8.1 Aspectos gerais

 

            A legislação brasileira contempla escassas espécies de estabilidades ditas provisórias, decorrentes de status peculiar do empregado em determinado lapso de tempo.

 

            Tais estabilidades poderão ser de natureza absoluta (impossibilidade de despedimento pelo empregador) ou relativa (impossibilidade de despedimento aleatório pelo empregador) e têm em como o fato de serem concedidas temporariamente ao empregado, enquanto perdurarem as condições estabelecidas para a sua fruição. Portanto, poderíamos também chamá-las de estabilidades sob condição, temporárias.

 

            Devemos, ainda, ter presente que o direito contemplado ao empregado estável é o direito ao emprego, não aos salários do período da estabilidade.

 

            O salário é contraprestação do trabalho, portanto, o empregado somente a ele fará jus se desincumbir da sua obrigação de trabalhar. A interrupção do contrato somente ficará restrita ao período intermediário do despedimento e da reintegração.

 

            A pretensão a salário sem trabalho, salvo nos períodos em que a lei contempla hipóteses de interrupção do contrato (repouso semanais remunerado, feriados, primeiros quinze dias de doença incapacitante para o trabalho, férias etc.) carece de amparo legal.

 

8.2 Espécies contempladas no direito brasileiro

 

            No direito brasileiro, têm estabilidade provisória legal no emprego:

 

- o dirigente sindical;

 

            - o trabalhador acidentado no trabalho, a partir do retorno do benefício previdenciário;

 

            - a empregada gestante;

 

            - o trabalhador eleito para o cargo de titular ou suplente junto à CIPA;

 

            - o trabalhador indicado para integrar, na condição de representante dos trabalhadores, o Conselho Curador do FGTS;

 

            - o dirigente de cooperativas de trabalhadores;

 

            - o representante dos empregados membro de comissão de conciliação prévia.

 

8.2.1 Dirigente Sindical

 

      A Constituição Federal em seu art. 8º, inciso VIII, veda “a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidadura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei”. A Consolidação das Leis do Trabalho somente admite a apuração de falta grave em inquérito judicial, diante de empregado estável no emprego. Assim, a estabilidade plena do dirigente sindical está contemplada na CLT, que amplia a garantia minimamente estabelecida na Constituição. É a mesma a orientação jurisprudencial expressa no Precedente SDI-I/TST nº114.

 

8.2.2 Acidente no trabalho

 

A Lei nº 8.213/91 que trata dos planos e benefícios da previdência social, em seu art.118, garante ao trabalhador acidentado que tenha se afastado do trabalho em gozo de auxílio-doença acidentário, pelo prazo de 12 meses após a cessação do benefício, “a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa (...) independentemente da percepção de auxílio-acidente”. Esse art. 118 contempla espécie de estabilidade plena no emprego, impossibilidade jurídica de despedimento. A única hipótese de rompimento do contrato dar-se-á na via judicial, diante de falta grave cometida pelo empregado.

 

O Poder Executivo, através da Medida Provisória nº. 1.729 de 02.12.1998, alterou o dispositivo do art.118 da Lei nº. 8.213/91.

 

            O art. 118 passou a ter a seguinte redação: “Art.118. O segurado que sofreu acidente do trabalho, tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, à manutenção de seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio doença acidentário, desde que, após a consolidação das lesões, resulte seqüela que implique redução da capacidade para o trabalho que exercia habitualmente.

 

Contudo, a MP 1.729 teve vida efêmera. Já em 11.12.1998, foi sancionada a Lei 9.732 que, entre as alterações legislativas contempladas, não incluiu o art. 118 nº. 8.213/91. Implicitamente, restou revigorada a antiga redação, diante do contido no § 3º do art. 62 da Constituição, restabelecendo-se a garantia da manutenção do emprego a todo trabalhador acidentado no trabalho quando do retorno do auxílio doença acidentário, independentemente da percepção do auxílio-acidente.

 

8.2.3 Membro integrante da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA

 

O chamado cipeiro, eleito por seus colegas de trabalho para compor a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA, quando na condição de titular, já detinha garantia contra o despedimento aleatório à luz do art. 165 da CLT e seu único parágrafo. As disposições transitórias constitucionais, em texto dúbio, contemplaram a mesma garantia ao “empregado eleito para cargo de direção”.

 

            À luz da Portaria nº. 3.214/78, NR-6, a CIPA compõe-se, exclusivamente, de empregados. Estes poderão ser eleitos por seus colegas de empresa para representá-los, ou designados pelo empregador, também com poderes de representação.

 

            É importante destacar que apenas os empregados eleitos por seus colegas estão protegidos contra o despedimento abusivo. Aqueles indicados pelo empregador não detém tal garantia.

 

            A estabilidade, na espécie, é relativa – porque o empregador pode despedir, desde que fundado em motivo disciplinar, técnico ou econômico-financeiro - e transitória – perdura até um ano após o término do mandato.

 

8.2.4 Representante dos trabalhadores no Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

 

Os membros do Conselho Curador, enquanto representantes dos trabalhadores, indicados pelas centrais sindicais, sejam efetivos ou suplentes, à luz do art. 3º, § 9º, da Lei 9.036/90, têm assegurada a estabilidade no emprego, desde a nomeação até um ano após o término do mandato, podendo, a dispensa somente ocorrer diante de falta grave, devidamente comprovada, através de “processo sindical”.

 

            Há evidente impropriedade na expressão “processo sindical”.

 

            Numa visão sistemática, a estabilidade contemplada ao representante dos trabalhadores junto ao Conselho Curador do FGTS tem a mesma natureza de estabilidade sindical, posto tratar de cargo de representação dos interesses dos trabalhadores. Portanto, estamos diante de estabilidade plena, ainda que temporária.

 

8.2.5 Gestante

 

A empregada gestante possui proteção contra o despedimento aleatório, desde o momento da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (art. 10, inciso II, alínea b ADCT-CF/88). Trata-se de outro exemplo de estabilidade relativa, eis que o empregador conserva o direito de despedir, em caso de justa causa.

 

            A exegese da norma transitória, ao se referir á confirmação da gravidez, é controvertida. Há os que sustentam como marco inicial do prazo de estabilidade, o momento em que comprovada a gravidez. Outros, o momento em que comprovada a gravidez perante o empregador. Outros, ainda, entre os quais nos incluímos, o momento da concepção, ainda que comprovada posteriormente. Essa a inteligência da norma constitucional transitória à luz do in dúbio pro operário. O fato gerador da proteção contra o despedimento arbitrário é objetivo, a gravidez, independentemente do momento em que constatado o estado gravídico da mulher. Portanto, desde que demonstrada a gravidez à época do despedimento, há direito à reintegração no emprego.

 

            Deve-se reiterar que direito é à reintegração no emprego.

 

            Consequentemente deve ser exercido ainda enquanto é possível invocá-lo, enquanto vigente a estabilidade.

 

8.2.6 Dirigente de cooperativa

 

O art. 55 da Lei nº. 5.764/71, que define a política nacional do cooperativismo, estabelece que os empregados de empresas, eleitos diretores de sociedades cooperativas “gozarão das garantas asseguradas aos dirigentes sindicais pelo art. 543 da CLT”. Temos espécie de estabilidade plena, eis que é esta a atribuída ao dirigente sindical.

 

8.2.7 Representante dos empregados nas comissões de conciliação prévia

 

A Lei 9.958/00 introduziu no ordenamento legal vigente as comissões de conciliação prévia, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais de trabalho. À luz de um melhor estudo e numa visão sistemática do organismo consolidado, estamos diante de estabilidade plena, que paralisa o direito de denúncia do empregador, cujo poder disciplinar ficará adstrito à suspensão.

 

9 CONSEQÜÊNCIAS DA OCORRÊNCIA DE FATO GERADORAS DE ESTABILIDADE NO EMPREGO NO CURSO DO AVISO PRÉVIO CONCEDIDO PELO EMPREGADOR

 

Sabemos que, no curso do aviso prévio, há execução residual do contrato de trabalho, com possibilidade de aquisição de direitos por ambos os sujeitos contratantes.

 

            A conseqüência no âmbito do contrato de trabalho é nenhuma, na mesma linha da orientação jurisprudencial consagrada no Precedente SDI/TST nº. 41.

 

            A denúncia do contrato concretiza-se no momento em que o sujeito denunciante comunica ao sujeito denunciado a sua intenção de rompê-lo, iniciando-se, incontinenti, o prazo de aviso prévio, ao cabo do qual sobrevém a extinção da relação contratual.

 

            Portanto, se uma empregada, com seu contrato de trabalho já denunciado pelo empregador, engravida no curso do aviso prévio, esse fato posterior  à denúncia não se reveste de retroeficácia. O contrato marcha inexoravelmente para a sua extinção porque a denúncia ocorreu antes do fato gerador da estabilidade.

 

            A situação é diferenciada, contudo, em relação ao empregado acidentado no trabalho no curso do aviso prévio. O art. 118 da Lei 8.213/91 não veda dispensa. Apenas determina a manutenção do emprego, vale dizer, no caso de aviso prévio já concedido, a postergação da eficácia deste prazo da estabilidade.

 

            O contrato, validamente denunciado, mantém-se pelo prazo da estabilidade. Fluído o prazo de doze meses, o contrato extingue-se de pleno direito.

 

10 FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO

 

10.1 Breve Histórico

 

Criou-se uma ilusória convivência de dois regimes legais da relação de emprego: o tradicional, da estabilidade plena aos dez anos, regulamentado na CLT, de fato não mais existente, e um segundo regime, sem qualquer espécie de proteção contra a despedida, consubstanciada no fundo de garantia do tempo de serviço, instituído pela Lei nº. 5.107, de setembro de 1966, com vigência a partir de 1º de janeiro de 1967.

 

            Para aqueles empregados já estáveis, abriu-se a possibilidade de transação do tempo de serviço anterior, à razão de 60% do valor da respectiva indenização, o que levou muitos trabalhadores a abrir mão do direito adquirido, quer pela possibilidade de receber um valor considerável em dinheiro, quer diante da pressão do próprio empregador.

 

            A estabilidade foi banida paulatinamente das relações de trabalho no Brasil, submetida a alenta agonia após o golpe mortal desferido pela Lei nº. 5.107/66.

 

A Constituição de 1967 consagrou a “estabilidade, com indenização ao trabalhador despedido, ou fundo de garantia por tempo de serviço” (art.158, inciso XIII). A Emenda Constitucional nº. 1, de 1969, repetiu o mesmo texto, mas suprimiu a vírgula após o vocábulo “despedido” (“estabilidade, com indenização ao trabalhador despedido ou fundo de garantia por tempo de serviço” – art. 165, inciso XIII), ensejando célebre e tormentosa discussão doutrinária e jurisprudencial em torno da possibilidade de dois regimes: estabilidade com indenização ao trabalhador despedido, ou estabilidade com fundo de garantia por tempo de serviço.

 

           

 

            O engodo da garantia de emprego no Brasil, persiste nos dias de hoje, com outra coloração. Têm, os trabalhadores, relação de emprego, constitucionalmente protegida contra a despedida abusiva, mas sem efetividade. A enganosa manobra concebida na Assembléia Nacional Constituinte, mercê da qual a regulamentação do instituto ficou sujeita a lei complementar – portanto, a aprovação por maioria absoluta – deu às forças conservadoras a certeza da improbabilidade da sua efetivação.

 

No aspecto restrito de fundo de garantia do tempo de serviço, contudo, a Constituição promulgada em 1988 avançou.

 

A Constituição vigente, ao erigir o FGTS a direito universal, em favor de qualquer trabalhador, urbano, rural ou avulso (art. 7°º, inciso III e XXXIV). Baniu-se a falácia da opção.

 

Como a inclusão do empregado doméstico é faculdade do empregador, de fato essa categoria de trabalhadores continua à margem do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

 

10.2 Natureza Jurídica

 

            Tem sido tormentosa, desde o momento do nascimento do instituto, em setembro de 1966, a construção doutrinária em torno da natureza jurídica do FGTS.

 

            É um patrimônio destinado a fins específicos, foi criado por lei e tem personalidade jurídica de direito público. Tem autonomia, ainda que não plena, de disciplinar as suas ações, através de seu Conselho Curador. Contudo, não tem administração própria, cometida ao agente operador, a Caixa Econômica Federal.

 

            Para Eduardo Gabriel Saad, a instituição é

 

uma pessoa jurídica pública secundária, imperfeita – autarquia – porque tem desta alguns traços caracterizadores, mas lhe faltam outros”. (Saad, 1995, p.72)

 

A teoria mais consistente inclina-se pela definição de tais contribuições como uma espécie de tributo paralelo ao arrecadado diretamente pelo Estado, com finalidade social e tendo como fato gerador o pagamento dos salários. Tem respaldo legal no art. 217 do Código Tributário, com a redação do Decreto-Lei nº27/86.

 

            Os tribunais, contudo, inclinam-se em favor da corrente segundo a qual as contribuições junto ao FGTS seriam uma espécie de contribuição previdenciária, “proteção contra os efeitos do desemprego ou da inatividade por motivo de idade ou tempo de serviço.? (Ibidem, 1995, p.203-211) O legislador também parece ter se sensibilizado com essa segunda posição, ao atribuir à Previdência Social a fiscalização do efetivo recolhimento dos depósitos, no art. 23 da Lei nº 8.036/90.

 

            O Tribunal Superior do Trabalho, desde a vigência da Lei nº 5.107/66, proclamava a natureza social das contribuições do FGTS, a exemplo das contribuições previdenciárias.

 

            As decisões do Supremo Tribunal Federal também se inclinam pela natureza de contribuição de contribuição social dos depósitos do FGTS, na mesma linha adotada pelo TST.

 

            Outras correntes, de menor consistência, têm sido enumeradas e são sinteticamente resumidas por Amauri Mascaro Nascimento:

 

* Teoria da indenização, à luz da Lei nº. 5.107/66.

 

* Teoria da natureza jurídica dupla, ao atribuir aos recolhimentos mensais o caráter de depósitos bancários e ao acréscimo devido no ato da despedida sem justa causa (a razão de 40%), caráter indenizatório;

 

* Teoria do salário diferido, os depósitos mensais nada mais são do que salários com disponibilidade futura para o empregado;

 

* Teoria da obrigação dualista, em que sustentada uma espécie de desdobramento dos depósitos, mercê do qual as contribuições feitas pelo empregador teriam natureza fiscal, mas adquiririam natureza salarial (salário social) no momento em que objeto do saque pelo empregado (Nascimento, 2011, p. 475-476).

 

10.3 Aspectos gerais

 

10.3.1 Estrutura

 

A Lei nº. 8.036/90 dispõe, exaustivamente, sobre a estrutura do fundo de garantia do tempo de serviço.

 

            As normas e diretrizes para o seu funcionamento são ditadas pelo Conselho Curador, composto de três representantes da categoria dos trabalhadores e de três representantes da categoria dos empregadores, além de um representante de cada um dos ministérios ou entidades enumerados no art. 3º. A par de integrante do Conselho Curador, a Caixa Econômica Federal detém a atribuição de Agente Operador de FGTS (art.4º da Lei 8.036/90).

 

            A representação paritária de empregados e empregadores atende à disposição do art. 10 da Constituição Federal, onde assegurada a participação de ambas as classes nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses sejam objetos de discussão e deliberação.

 

A gestão do FGTS ficou a cargo do Ministério da Ação Social (arts. 4º e 6º), a quem compete, também, juntamente com o conselho curador e com a Caixa Econômica Federal, Agente Operador, velar pelo cumprimento da lei (art. 8º).

 

            A fiscalização da regularidade dos depósitos do FGTS, a apuração dos débitos e das infrações praticadas pelos empregadores, bem como as notificações visando ao cumprimento das obrigações relativas aos depósitos, é do encargo da Previdência Social, através do Instituto Nacional de Previdência Social – INSS (arts. 23 da Lei e 54 do Regulamento respectivo).

 

            As competências dos diversos órgãos do fundo estão previstas na Lei nº. 8.036/90 e no seu Regulamento (Conselho Curador, respectivamente, arts. 5º e 64; Gestor, arts. 6º e 66; Agente Operador, arts. 7º e 67; Fiscalizador, arts.23 e 54). O processo de fiscalização, a cargo do INSS, está disciplinado no Regulamento da Lei (arts. 54/58).

 

10.3.2 Recursos

 

            O legislador dispôs sobre as diversas fontes dos recursos do FGTS.

 

            A principal delas é o saldo dos depósitos feitos, mensalmente, pelos empregadores nas contas vinculadas de seus empregados, à razão de 8% das respectivas remunerações, pagas no mês anterior (arts. 15 da Lei e 27 do Regulamento). A lei abre a possibilidade de as empresas equipararem seus diretores não empregados, assim considerados aqueles exercentes de cargo de administração, aos demais trabalhadores. Nessa hipótese, os recolhimentos junto ao FGTS serão calculados sobre as “retiradas” de tais diretores, obviamente aquelas relativas à remuneração do trabalho prestado na empresa (arts. 15, §4º, e 16 da Lei).

 

A inadimplência da empresa em relação aos recolhimentos dos depósitos enseja imposição de juros de mora e multa de 20% sobre o montante atualizado do débito (art.22). A multa reverte em favor do Fundo de Garantia (art.2º, 1º, alínea d), não do empregado lesado.

 

            Entenda-se por conta vinculada a conta pessoal de cada empregado ou dos diretores não empregados, aberta pela empresa na Caixa Econômica Federal, junto (“vinculada”) ao FGTS. Tais contas são protegidas pela impenhorabilidade absoluta (art. 2º, § 2º, da Lei).

 

            Os trabalhadores avulsos também são beneficiados com os depósitos, feitos por quem estiver definido, na legislação especial, como gestor da mão-de-obra (art.15, § 1º). Nessa mesma situação, encontram-se os trabalhadores temporários, regidos pela Lei nº. 6.019/74.

 

            Além do montante das contas vinculadas, o FGTS também incorpora aos seus recursos as dotações orçamentárias específicas, os resultados obtidos da aplicação dos recursos do fundo, as multas (incluídas, aqui, aquela antes referida, nos termos do art. 22), os juros moratórios e as demais receitas patrimoniais e financeiras (art.2º, § 1º, alínea e, da Lei). Há notória impropriedade na Lei, quando cogita da correção monetária como “recurso” carreado ao FGTS. A correção monetária é mera atualização do valor da moeda, não constitui rendimento, tampouco acréscimo patrimonial.

 

            Tais recursos são geridos pelo Poder Executivo, através do Ministério da Ação Social (art.6º da Lei).

 

10.3.3 Destinação dos depósitos e hipótese de saque pelo empregado

 

            Ao contrário do que pode parecer, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço não foi instituído exclusivamente para beneficiar o trabalhador, enquanto sujeito de um contrato de trabalho.

 

            Os recursos carreados ao FGTS são aplicados em habitação, saneamento básico e infra-estrutura urbana. Há ressalva legal em favor de um mínimo de 60% de tais recursos para financiamento da habitação popular e da vinculação dos projetos de saneamento e infra-estrutura urbana a programas habitacionais (art.9º, §§ 2º a 4º).

 

            Justamente em vista da destinação do FGTS, o trabalhador empregado não tem imediata disponibilidade dos depósitos feitos em sua conta vinculada.

 

            A Lei enumera, exaustivamente, no art.20, as hipóteses em que o saque é permitido:

 

* denúncia vazia do contrato de trabalho pelo empregador;

 

* resolução judicial do contrato por justa causa do empregador;

 

* casos de caducidade do contrato de trabalho, inclusive em razão da aposentadoria concedida pela Previdência Social ao empregado;

 

* quitação de parte das prestações em contratos de financiamento da casa própria do empregado, liquidação ou amortização extraordinária do respectivo saldo devedor, desde que implementadas determinadas condições;

 

* ausência de movimentação da conta vinculada, em face de ter permanecido, o empregado, fora do regime do FGTS, por mais de três anos ininterruptos;

 

* resolução de contrato de trabalho a prazo determinado;

 

* suspensão do trabalho avulso por período superior a três meses.

 

Poderão, também, sacar o FGTS:

 

* os trabalhadores portadores da síndrome da imunodeficiência adquirida – SIDA (AIDS), à luz de lei anterior à Constituição de 1988 (Lei nº. 7.670, de 08.09.1988), mas em plena vigência porque com ela perfeitamente compatível; 

 

* os trabalhadores acometidos de neoplasia maligna ou que tiver dependente acometido da mesma doença(Lei nº8.922/94, Lei 8.036/90, art.20, inciso XI); 

 

* previsão de aplicação de 50% do montante do fundo na conta do empregado em fundos de privatização (Lei 9.491/97, art.20, inciso XII);

 

* casos de pessoa da família do empregado ser portadora do vírus HIV, de doença grave em estágio terminal do empregado ou seus dependentes e quando o trabalhador tiver idade igual ou superior a 70 anos(Medida  Provisória nº2.164-41/01, acrescentou os incisos XIII, XIV e XV).

 

10.3.4 Acréscimo de 40% sobre os depósitos do FGTS

 

Aos empregados despedidos sem justa causa é, ainda, devido, pelo empregador, o pagamento de quantia equivalente a 40% dos depósitos do FGTS, consoante disposto no art.18, § 1º, da Lei nº 8.036/90.

 

            Evitemos o equívoco consagrado de nos referirmos à “multa de 40%” do FGTS.    

 

Ao contemplar os trabalhadores brasileiros com a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, a Constituição de 1988 remeteu à lei complementar a regulamentação do instituto (art.7º, inciso I), com previsão da fixação de uma indenização compensatória.

 

            Enquanto aguardam a improvável iniciativa do legislador – ela já tarda há quinze anos – os trabalhadores brasileiros amargam a inusitada solução adotada nas disposições transitórias constitucionais: o legislador constituinte entendeu de “limitar” tal garantia a 40% do FGTS.

 

            A expressão “limitada”, embutida no texto da disposição transitória, não pode ser entendida na sua literalidade. Não se concebe viesse, a mesma Assembléia Constituinte que consagrara a proteção contra a despedida arbitrária, reduzi-la a simples e irrisória expressão pecuniária.

 

            A compreensão razoável permite concluir em favor de uma espécie emergencial de indenização, resultante da conversão provisória da garantia de emprego, até que o Congresso Nacional, através da lei complementar, venha a discipliná-lo.

 

            A indenização de 40% sobre os depósitos do FGTS era paga diretamente ao empregado, no ato da quitação do contrato. A alteração introduzida pela Lei nº9. 491/97, ao dar a atual redação ao § 1º do art. 18, teve, apenas, o escopo de evitar fraudes ao FGTS, diante do expressivo número de quitações simuladas dos contratos de trabalho, com o único fito de ensejar o saque dos depósitos pelo empregado.

 

            A Lei nº. 8.036/90 adequou a disposição constitucional transitória, baixada ainda a luz da Lei nº. 5.107/66, ao fixar em 40% sobre os depósitos do FGTS a indenização devida pelo empregador aos empregados despedidos sem justa causa ou, por metade, nos casos de resolução do contrato de trabalho por culpa recíproca de ambos os sujeitos (§ 2º do art. 18), numa reminiscência de indenização de antigüidade devida por metade, contemplada no art. 484 da CLT.

 

10.3.5 Aspectos importantes em caso de ações judiciais

 

Em oportuna providência, a exemplo do que já fizera na Lei nº 5.107/88, o legislador explicitou competir à Justiça do Trabalho a solução de conflitos judiciais entre empregados e empregadores, tendo por objeto os depósitos do FGTS (art. 25). Afaste-se, assim, qualquer possibilidade de discussão quanto ao foro competente, em vista de inclinação doutrinária em torno da natureza tributária ou social (e não trabalhista) dos depósitos aos quais obrigado o empregador.

 

O art. 25 da Lei nº. 8.036/90 garante ao trabalhador, seus dependentes e sucessores, ou, ainda, ao sindicato de sua categoria profissional, ação junto à Justiça do Trabalho contra o empregador inadimplente em relação aos depósitos do FGTS. O parágrafo único determina sejam intimadas da propositura da ação a Caixa Econômica Federal e a Previdência Social (no caso, o INSS).

 

            Três particularidades devem ser destacadas no dispositivo legal:

 

            A competência da Justiça do Trabalho resume-se àqueles dissídios individuais cujo objeto seja a inadimplência do empregador em relação aos depósitos do FGTS.

 

            Eventuais equívocos ou omissões na aplicação de juros e correção monetária, dificuldades de saque junto à Caixa Econômica Federal, ou outros litígios cuja causa não possa ser atribuível à inadimplência do empregador, não são da competência da Justiça do Trabalho.

 

Os dependentes ou sucessores do empregado titular de conta vinculada junto ao FGTS são aqueles habilitados como tais perante a Previdência Social (Lei nº. 6.858/80).

 

            O sindicato profissional tem legitimidade ativa, na condição de substituto processual do empregado lesado, para ajuizar a ação contra o empregador inadimplente quanto aos depósitos junto ao FGTS. Implementa-se, na lei infraconstitucional, o comando expresso do art.8º, inciso III, da Constituição Federal.

 

10.3.6 Prescrição

 

            A prescrição do FGTS tem suscitado profícua discussão nos planos doutrinário e jurisprudencial.

 

            No art. 23, § 5º, da Lei nº. 8.036/90 está disposto que o processo de fiscalização, de autuação e de imposição de multa reger-se-á pelas normas pertinentes contidas na CLT, “respeitado o privilégio do FGTS à prescrição trintenária”.

 

            Contudo, devemos ter presente a disposição contida no art.7º, inciso XXIX, ao limitar o curso do prazo prescricional até dois anos após a extinção do contrato de trabalho para ação quanto aos créditos resultantes da relação de trabalho. A largueza do texto constitucional permite enquadrar no elenco de tais créditos também aqueles decorrentes do FGTS, eis que, embora não tenham natureza trabalhista, resultam da relação de trabalho. Daí a orientação jurisprudencial expressa no Enunciado SJ/TST nº. 362, segundo a qual, “é trintenária a prescrição do direito de reclamar contra o não pagamento da contribuição para o FGTS, observado o prazo de 2(dois) anos após o término do contrato de trabalho”.

 

10.3.7 Sucessão causa mortis

 

            Em caso de falecimento do trabalhador titular de conta vinculada junto ao FGTS, são seus sucessores naturais perante o empregador eventualmente inadimplente (art. 25 de Lei nº8. 036/90) e perante o próprio FGTS (art. 20, IV), os que dele dependeram economicamente em vida, habilitados como tais perante a Previdência Social. Somente secundariamente podem se habilitar os sucessores segundo a lei civil.

 

Implementa-se, na lei do FGTS, a regra geral em relação à sucessão de créditos trabalhistas, consagrada na Lei nº. 6.858/90.

 

            Nas ações judiciais de cobrança dos depósitos do FGTS, a exemplo de qualquer ação trabalhista, é bastante para a habilitação dos sucessores a prova de sua condição de dependentes perante a Previdência Social, geralmente o documento relativo à percepção de pensão alimentícia, passível de ser obtido junto ao INSS sem a mínima dificuldade.

 

            No caso de se habilitarem os herdeiros do trabalhador falecido, quando este não deixa dependentes perante a Previdência Social, são necessárias providências tais como: prova de abertura de arrolamento ou de inventário, de habilitação do inventariante, etc.

 

            Quando se habilitam os sucessores à luz da lei civil, sem a condição de dependentes perante a Previdência Social, é curial deles exigir que, a par da prova da sua condição de herdeiros, também exibam certidão negativa de dependentes do de cujus expedida pela Previdência Social. Isso porque eventuais dependentes, ainda que não vinculados a relações de parentesco ou mais distantes na ordem de sucessão, detêm preferência em relação aos créditos oriundos do contrato de trabalho do trabalhador falecido.

 

REFERÊNCIAS

 

1 BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Nelson Mannrich. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

 

2 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

 

3 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4. ed. Porto Alegre: Síntese, 2004.

 

4 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

5 SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários à lei do fundo de garantia por tempo de serviço. 3. ed. São Paulo: LTr, 1995.

 

Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.42666&seo=1>