Direitos autorais, criatividade e liberdades na cibercultura


Porbgomizzolo- Postado em 30 março 2015

Direitos autorais, criatividade e liberdades na cibercultura
Alexandre Henrique Tavares Saldanha
Grupo de estudos de Direitos autorais,  criatividade e liberdades na Cibercultura da UFPE 
 
RESUMO: O exercício das liberdades civis é considerado direito fundamental, garantido em cartas constitucionais e documentos internacionais      de   direitos   humanos. Porém,     apesar    de   seu caráter absoluto, os direitos às liberdades são sistematicamente limitados.   Em   outros   termos,   o   mesmo   sistema   jurídico   que garante as liberdades, cria limites legais para seu exercício. Tais limites são reflexos de um contexto cultural e também de uma 
situação de tempo específica. No que diz respeito às liberdades de manifestação, seja de expressar algo, de criar, de manifestar um dom artístico etc., um de seus limites estão nas regras de tutela dos direitos de autor, na forma como estes direitos são legalmente        previstos      e    postos      em     prática.     Com      o desenvolvimento da cibercultura, em um contexto denominado sociedade       da  informação,      as  regras    tradicionais    de   direitos autorais     requerem      novas    leituras,   tendo    como     fundamento novas         exigências        sociais       decorrentes        de      novos comportamentos.           Assim,      na    cibercultura      as    liberdades fundamentais          de     manifestação      são      redimensionadas, provocando reação no sistema de proteção aos direitos de autor, e até mesmo na concepção do que seja autor e autoria. 
 
INTRODUÇÃO 
 
      As tecnologias da informação sempre provocam diversos impactos nos comportamentos sociais, na produção econômica, no    sistema    legal   e  em   praticamente      quaisquer     setores   do convívio humano.  Seja   o   surgimento   da   imprensa,   do   telefone   ou   do   mais recente   modelo   de   smartphones,   qualquer   tecnologia   que   se torne patê do comportamento humano irá provocar reações em diversos setores deste comportamento.        No   que   diz   respeito   ao   Direito,   são   diversas   também   as conseqüências do desenvolvimento tecnológico na forma como algumas      regras   e   princípios   são   interpretados     e  aplicados, provocando reações também na criação de “novos” direitos para  novos tempos, ou novas exigências humanas. 
      A cibercultura, como característica da cultura do século XXI em termos genéricos, passou a representar uma expressão que resume       o    contexto     contemporâneo          de    relacionamento hiperdimensionado entre homem e tecnologias digitais, gerando novos     hábitos,    novas    demandas      sociais,   novas    formas    de consumir bens e culturas etc. 
       Daí a necessidade de analisar quais são os impactos desta característica     cultural   de   uma    era   no   desenvolvimento       do sistema      jurídico.   Em     tempos      de    inclusão    digital,   rede hiperconectada de computadores pessoais, compartilhamentos digitais      e     microprocessadores            realmente        “micros”  completamente portáveis, a produção e o acesso à informação adquire      uma     nova     proporção,     pois    os    mecanismos        e 
oportunidades propícios a acessar e produzir informações, bem como   para   comunicar   e   ser   comunicado,   estão   amplamente disponíveis.        Com     a  devida    inclusão   digital,  todos   poderão     acessar informações antes restritas a alguns meios, ou poderão produzir informações,        o   que    estaria    anteriormente       reservado      a determinadas   categorias   profissionais   e   classes   sociais.   Com essa     ampla    e,  quase,    irrestrita  gama     de  possibilidades      de comunicações, a internet e a cultura digital permitem que cada indivíduo exerça sua liberdade de manifestação, lançando suas 
opiniões em ambiente virtual, expresse suas opções artísticas, informe e obtenha informações, crie e divulgue algo, tais como histórias, ilustrações e músicas.        Em     qualquer     dessas     dimensões       das    liberdades     em ambiente virtual reside uma série de problemas legais.        Este    grupo    de   estudo    foca   na   análise    de   problemas relacionados       com    a   última   dessas     possibilidades      de   livre manifestação,   a   de   criar   algo   que   esteja   afim   e   que   se   sinta vocacionado. 
       A   liberdade   de   expressão   proporcionada   pelas   práticas cibernéticas   recebe   diversos       tipos   de  supressão,   seja     pelos direitos   civis   (danos   morais   e   à   imagem,   por   exemplo),   pelos direitos   penais   (a   exemplo   dos   crimes   contra   a   honra),   pelos fundamentais previstos na constituição (como a privacidade) e outros. 
       O problema adotado como marco de pesquisa envolve o exercício     da  criatividade    em   ambiente     virtual  e  seus    limites legais, pois questões de propriedade intelectual podem inibir o ato    de  criar   e  assim    tolher  uma     liberdade    fundamental      da pessoa. 
       Analisa-se   também   a   adequação   dos   modelos   legais   de direitos autorais para tempos de cultura de compartilhamento, de convergência, de participação etc., uma vez que a questão não é   simplesmente       levantar    a  bandeira     da   quebra    de   direitos autorais,   ou   de   patentes,   ou   abertura   total   da   informação   e criação, já que isso envolve interesses econômicos imediatos e necessários.
        A hipótese é a de se analisar novos modelos de negócio e gestão de direitos autorais que melhor se adéqüe à cibercultura, equilibrando   a   satisfação   de   liberdades   fundamentais   para   a personalidade        humana       com    a    satisfação     de   pretensões econômicas. Então, o grupo de pesquisa propõe uma discussão sobre a supressão provocada pelos direitos autorais sobre a liberdade de expressão proporcionada pelos mecanismos da internet. 
      A hipótese trabalhada é a de que o modelo tradicional de direitos autorais, previsto nas regras de direitos autorais, não é adequado para ser aplicado em situações que envolvam novos comportamentos típicos da cibercultura, principalmente aqueles que    estão   associados      a  liberdades   fundamentais       garantidas tanto    em    plano   constitucional,    quanto     em   instrumentos      de proteção a direitos humanos. 
 
OBJETIVOS: 
 
       O objetivo geral da pesquisa desenvolvida pelo grupo de estudos      é  analisar    como    as   liberdades     fundamentais      são exercidas      no   contexto    da    cibercultura    e  como     as   regras tradicionais de direitos autorais podem servir como uma barreira para    o  exercício    de   diversos   atos   de   livre  manifestação.     A hipótese não é defender uma extinção total ou parcial de direitos autorais, mas sim uma adaptação destes a novos modelos, a novos      contextos      culturais.    Por    ser    considerado      direito fundamental, é necessário que o direito de criar, ou participar de uma   criação,   não   seja   tolhido.   Isso   em   tempos   de   cultura   de participação e convergência redimensiona o conceito de autor e autoria, exigindo novas formas legais. 
       Os objetivos específicos da pesquisa passam por analisar os diversos aspectos das liberdades de expressão, focando na liberdade de criar. Na verdade, um dos objetivos é identificar a criatividade     como    um   direito  fundamental      da   personalidade. Outro   objetivo   é   analisar   se   as   regras   tradicionais   de   direitos autorais   chegam   a   realmente   inibir   de   alguma   forma   atos   de exercício     de    criatividade,    representando       assim    um    limite 
sistemático   a   um   dos   direitos   humanos.   Ainda,   analisa-se  a relação da criatividade no contexto da cibercultura para, enfim, analisar se novos modelos de tutela de direitos autorais servem melhor      à   criatividade,    bem     como     às   demais     liberdades fundamentais. 
 
TEMA: 
 
       A   pesquisa   versa   sobre   os   impactos   da   cibercultura   na regulamentação dos direitos   autorais,   sobre  a   compatibilidade dos modelos legais de direitos de autor frente a novas exigências e comportamentos sociais típicos da sociedade da informação, focando   na   questão   do   exercício   de   liberdades   fundamentais, previstas em textos constitucionais e cartas de direitos humanos, tais   como    a   liberdade    de  expressão      e  de   criação   artístico-cultural. 
 
MÉTODO: 
 
       A   pesquisa   parte   inicialmente   de   pesquisa   bibliográfica sobre   direitos   autorais   e   cibercultura.   Depois,   os   temas   das liberdades são estudados em sua perspectiva teórica. Após isso, a   pesquisa   se   volta   para   exemplos   reais   em   que   liberdades foram     suprimidas     por  regras    de  direitos   de   autor,  mediante pesquisa jurisprudencial e também leitura de livros que narram situações      reais.   Documentários        e  demais     materiais     sobre criatividade,   economia   criativa   e   contextos   culturais   diferentes são também analisados. Ao fim, pesquisa-se casos reais em que regras de direitos de autor foram interpretadas sob a ótica dos direitos fundamentais, encerrando com uma análise sobre novas formas     de   licenças    de  obras    e  como     estas   impulsionam      a liberdade fundamental de criação. 
 
RESULTADOS: 
 
       Pensar      em     novas     regras    de    direitos    autorais,    ou reinterpretações delas, é possível pois já há, em primeiro lugar, diversos   precedentes   judiciais   cujos   fundamentos   se   baseiam numa leitura dos direitos de autor sob o parâmetro dos direitos fundamentais, ou humanos. 
       Quanto a novos modelos, ou instrumentos, que permitam uma     melhor    adequação       de  tais  direitos   à  cibercultura    e  às liberdades      fundamentais,       a   pesquisa     também      identifica   a viabilidade,   pois   existem   diversos   instrumentos   juridicamente permitidos   que   trabalham   com   novas   tutelas   da   propriedade intelectual,    tais  como    os  softwares     livres  e   as  licenças    do creative   commons.   A   pesquisa   volta-se   agora   à   possibilidade destes dois exemplos, ou a lógica por trás deles, tornarem-se a regra geral, a postura oficial e não a exceção. 
 
CONCLUSÃO: 
 
       O   grupo   de estudo   vem   atingindo   resultados   teóricos   no sentido     de   concluir   algumas     das   análises    propostas     como objetivos específicos. 
       Há,    com    certa  maturidade,      o  entendimento      de   que   a criatividade     é  algo    inerente   ao   desenvolvimento        digno    da personalidade humana, e assim existe um direito fundamental de    exercer    liberdade     de   criação,   podendo      criar,  podendo participar de empreendimentos criativos em colaboração.       Além      disso,    atualmente      existe    todo    um     segmento econômico       que    prioriza   a   criatividade    como    elemento      de 
sucesso, qual seja, a economia criativa, o que leva ao fato de tal ofício    humano      não   se   adéqua      a  restrições    indevidas     ou supressões       infundadas.     O   grupo    de   estudos     já  consegue identificar que a economia criativa não é uma tendência, mas sim uma realidade produtiva que gera desenvolvimento.       Assim      como    a   liberdade    associada     à  criatividade,    as demais liberdades associadas às manifestações humanas são tratadas como fundamentais, em qualquer análise científica ou análise de tratamento jurisprudencial.        Os estudos do grupo, na situação em que se encontram, analisam os efeitos que todas elas sofrem dos comportamentos típicos   da   chamada   cibercultura,   com   foco   na   relação   entre restrições de direitos autorais e exercício da criatividade.        Casos analisados envolvendo artistas que adotaram novas estratégias de negócio com novas licenças de direitos autorais (free     software    e   creative      commons)        já   permitem      um entendimento       mais    maduro     de   que   é  possível    reinterpretar regras tradicionais da propriedade intelectual, satisfazendo não somente        direitos    humanos        garantidos       como      também satisfazendo interesses econômicos justos.  Ainda há muito a ser analisado, principalmente envolvendo outras     liberdades    de   manifestação       e  regras    de  incentivo    à cultura, mas já há indícios de resultados almejados. É possível novas      regras    de   direitos    de   autor    não    extremistas,     que impulsionem a atividade econômico-empresarial, sem prejudicar direitos fundamentais da personalidade.