Democracia eletrônica x alfabetização digital


Pormarciele- Postado em 03 abril 2011

Marciele Berger Bernardes

Nas últimas décadas, os impactos da Internet e das redes de computadores sobre diversas áreas de atividades humanas, vêm provocando uma importante reflexão sobre uma importante vertente do governo eletrônico a chamada "democracia eletrônica".
Sendo assim, não é surpreendente que o fenômeno tenha chamado a atenção da literatura política e que ganhassem terreno as teorizações acerca da importância das relações entre a Internet e os processos políticos e sociais, inspirando a idéia de que democracia e conectividade podem ser inter-relacionadas (SANCHEZ; PICANYOL, 2008); (LEVY:1993); (LUÑO, 2004).
Na obra “La democracia eletrônica” Sanchez e Picanyol apresentam o papel da internet na democracia do futuro, além de apresentar argumentos pró e contra a democracia eletrônica. Como se sabe uma das idéias mais caras à produção teórica acerca das possibilidades das TICs no campo político diz respeito à recuperação da esfera pública como um espaço de ação dialógica entre os agentes sociais. Para Sanchez e Picanyol, um exemplo disso é o voto eletrônico (votação digital remota e votação digital presencial) esse último modelo é utilizado pelo Brasil (2008, p. 62). Nesse aspecto, a obra se destaca pois além de apresentar os argumentos favoráveis ao uso dessas tecnologias também apresenta as críticas.
Vale destacar que uma leitura superficial pode nos levar a acreditar que a o uso da internet pela política é democratizante e educativa, graças a sua capacidade de atingir grandes massas de pessoas e facilitar o acesso dos partidos e candidatos mais fracos a um eleitorado sempre mais difícil de ser alcançado. No entanto, é preciso estar atento aos aspectos problemáticos, com os quais a política é rebaixada e banalizada, vê seus ritos e rotinas sendo subvertidos.
No que concerne ao uso da internet pela política, a democracia pode ser abalada por aquilo que Paul Virilio chamou de "tirania do tempo real", que transforma todos em espectadores e desta forma substitui o esforço de reflexão pela dinâmica passiva dos reflexos. Vão-se assim diluindo a relevância e o sentido das instituições e dos espaços públicos.
Sendo assim, partindo-se da premissa de que a democracia requer um tipo específico de sujeito: o cidadão ativo, sintonizado com sua época, em condições de igualdade com os demais e disposto a participar politicamente, nas palavras do jurista Norberto Bobbio: “uma democracia é mais forte se se baseia em ciadadãos ativos” (1992), alguns questionamentos são relevantes: - As novas tecnologias ajudam a criar este cidadão? - De que modo: facilitando seu acesso a informações ou dando-lhe também mais e melhores condições de se envolver com o inteiro processo da decisão política? Em suma, as novas tecnologias ao tornar tecnicamente possível o ingresso mais imediato dos cidadãos no circuito proposta/decisão/controle, poderão nos ajudar a inventar a democracia de que necessitamos?
O livro a democracia eletrônica já alerta que a internet sozinha não trará nenhuma alteração se não for acompanhada de transformações nas formas democráticas atuais (2008, p. 08).
Dessa forma, se quisermos mesmo aproveitar os benefícios das novas tecnologias, a resposta a essas interrogantes passa pela compreensão de que no Brasil a imensa maioria da população está afastada das novas tecnologias, são os chamados excluídos digitais que vivem a vida digital de modo passivo, reativo, alienado. Nesse sentido, pode-se inferir que dificilmente poderá haver "cidadão eletrônico" enquanto houver analfabetismo digital, portanto, antes de se pensar em cidadania, democracia eletrônica é indispensável políticas educacionais de governo, para que se dissemine o uso do computador e se crie uma cultura eletrônica crítica e consistente. Acima de tudo, será indispensável conectar o sistema escolar, desde a base, e antes de tudo a escola pública, lugar democrático por excelência, onde se educam as grandes maiorias. Vale lembrar ainda que a alfabetização digital não passará de uma nova forma de opressão e alienação se não vier acompanhada de educação política.