Consumo e sustentabilidade: um desafio para a administração pública Aumente o tamanho da letra Diminua o tamanho da letra


PorThais Silveira- Postado em 03 maio 2012

Autores: 
Ana Paula Fonseca Valadares Guimarães
Serguei Aily Franco de Camargo

Consumo e sustentabilidade: um desafio para a administração pública



Ana Paula Fonseca Valadares Guimarães, Serguei Aily Franco de Camargo Resumo: A efetiva preocupação com a utilização dos recursos naturais, enquanto bens considerados como finitos se deu em fins da década de 60, início dos anos 70, com a divulgação de análises dos impactos de restrições de recursos ambientais ante o frenético crescimento econômico. O presente artigo vem traçar um panorama da evolução das discussões que vai desde o processo produtivo, principalmente a partir da Revolução Industrial, quando a produção cresce em escala exorbitante e é tido como responsável pela poluição e esgotamento de recursos naturais, passando pela mudança de paradigma ao considerar a sociedade consumista como ato de degradação ambiental, até chegar ao compromisso das aquisições Estatais, na esfera do Poder Público, adotarem critérios ambientais como forma de gestão dos recursos naturais, inclusive nas suas aquisições através das licitações sustentáveis. Paradoxalmente, aborda o discurso de sustentabilidade levantado principalmente a partir da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, realizada em 1972. A preocupação gira em torno não apenas da exploração dos recursos naturais, mas também pela poluição que adquiriu caráter multifatorial. Ou seja, existem diversos fatores que contribuem para a degradação ambiental e um grande desafio para a sociedade e para o poder público para assegurar a reserva de recursos naturais e a sustentabilidade ambiental para as presentes e futuras gerações.

Palavras-chave: Consumo; Sustentabilidade; Meio Ambiente; Administração Pública.

Abstract: The effective concern with the use of natural resources, while goods considered to be finite in the late 60's, early 70, with the dissemination of analyses of the environmental impacts of resource constraints against frenzied economic growth. This article comes to draw a panorama of the evolution of discussions ranging from the production process, particularly since the Industrial Revolution, when production grows in exorbitant scale and is regarded as responsible for the pollution and depletion of natural resources, through paradigm when considering the consumerist society as Act of environmental degradation, until you reach the commitment of State acquisitions, in the sphere of public authority, adopt environmental criteria as a way of managing natural resources, including in their acquisitions through sustainable procurement. And paradoxically, discusses the sustainability discourse raised mainly from the United Nations Conference for the environment, held in 1972. The concern revolves around not only the exploitation of natural resources, but also by pollution which acquired multifactorial character. That is, there are several factors that contribute to environmental degradation and a great challenge for society and for the public authorities to ensure the reserve of natural resources and environmental sustainability for the present and future generations.

Keywords: Consumption; Sustainability; Environment; Public Administration.

1 O PROCESSO PRODUTIVO E A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

O processo de ocupação territorial, povoamento e exploração comercial do continente americano pelos europeus teve início logo após o descobrimento da América. Dois anos depois (1494), o Tratado de Tordesilhas divide o controle do Novo Mundo entre portugueses e espanhóis. Nos anos seguintes, espanhóis, portugueses, franceses, ingleses e holandeses disputam o domínio do novo continente e sua exploração nos moldes do mercantilismo europeu.

Neste período, a extração de recursos naturais era maciça, contudo, como se tratava dos novos continentes descobertos, não havia preocupação com a exploração exacerbada, posto que praticamente tudo pertencia à Coroa.

Mais à frente a Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra em meados do século XVIII, consistiu em um conjunto de mudanças tecnológicas com profundo impacto no processo produtivo em nível econômico e social, foi outro fenômeno que contribuiu para o aumento da exploração dos recursos naturais. Juntamente com o conjunto das chamadas Revoluções Burguesas do século XVIII, foram responsáveis pela crise do Antigo Regime, na passagem do capitalismo comercial para o industrial.

Com a Revolução Industrial a capacidade da humanidade de intervir na natureza dá salto colossal e crescente. É interessante notar que esta enorme capacidade de intervenção ao mesmo tempo em que provocou grandes danos ambientais, também ofereceu, em muitas situações, os meios para que a humanidade afastasse a ameaça imediata que estes danos pudessem representar para sua sobrevivência e, com isso, retardasse a adoção de técnicas e procedimentos mais sustentáveis. Um exemplo significativo neste sentido foi o uso intensivo de fertilizantes químicos baratos que, em muitas regiões, mascarou o efeito da erosão dos solos sobre a produtividade agrícola.

Para além dos desequilíbrios ambientais decorrentes desta maior capacidade de intervenção, a Revolução Industrial baseada no uso intensivo de grandes reservas de combustíveis fósseis, abriu caminho para uma expansão inédita da escala das atividades humanas, que pressiona fortemente a base de recursos naturais do planeta. Ou seja, mesmo se todas as atividades produtivas humanas respeitassem princípios ecológicos básicos, sua expansão poderia ultrapassar os limites ambientais globais que definem a “capacidade de carga” (carrying capacity) do planeta.

A magnitude da punção exercida pelas sociedades humanas sobre o meio ambiente, sua “pegada ecológica” (ecological footprint), pode ser demonstrada através da equação que resulta do tamanho da população multiplicado pelo consumo per capita de recursos naturais, dado a tecnologia. O progresso técnico pode atenuar relativamente esta pressão, mas não eliminá-la.

Surgiram assim os primeiros modelos neoclássicos que propunham o equilíbrio geral. A visão de que as relações entre sistema econômico e meio ambiente eram secundárias foi suplantada pela idéia do papel relevante do meio ambiente como fornecedor de recursos naturais ao sistema econômico, além da preocupação quanto à absorção pelo meio ambiente dos resíduos e rejeitos resultantes do processo.

Contudo, com o desenvolvimento das sociedades industriais no século XX (embora tenha modificado não só as formas de organização das relações econômicas e sociais e nas relações de poder, ao mesmo tempo em que eram proporcionadas condições de desenvolvimento tecnológico, apropriação de bens e livre acumulação econômica) observou-se uma crescente proliferação de ameaças originas de diversas fontes, muitas vezes, de difícil exposição das relações causalidade, ou, mesmo, de difícil identificação, na medida em que grande número das espécies de ameaças originárias desse processo de radicalização do capitalismo deixou de ser visível e cognoscível, e sua identificação somente se fazia possível no momento em que seus efeitos já produziam prejuízos sobre a segurança da população, não permitindo a reação institucional mediante instrumentos de controle, cálculo e previdência, por exemplo.

Naquele momento a incapacidade do Estado de dar respostas eficazes para tais ameaças invisíveis, (como ameaça nuclear e aquecimento global), era latente.

2 A MUDANÇA DE PARADIGMA: A SOCIEDADE DE CONSUMO

Além da preocupação com o processo produtivo industrial em larga escala, como sendo o grande responsável pela poluição do planeta, intensifica-se também a discussão sobre a chamada Sociedade de Consumo, que se instalou no mudo ocidental como decorrência do capitalismo industrial.

O Relatório Nosso Futuro Comum, sustenta a “poluição da pobreza” ao identificar como fatores de problemas ambientais o crescimento população e iniquidade nos termos do comércio internacional e do desenvolvimento tecnológico. Contudo omite ou minimiza a chamada “poluição da riqueza” oriunda do processo produtivo e do aumento do consumo pela sociedade.

A partir do denomidado “Novo Ambientalismo”, movimento de massas que surge nos EUA, na década de 70 do século XX, a preocupação com as questões ambientais, que anteriormente era restrito a poucos cientistas, administradores e grupos conservacionistas, passa a caracterizar-se pelo ativismo político, assumindo posições reativas e antiestablishment. A percepção dos “efeitos colaterais” das sociedades afluentes e as críticas ao consumismo materialista são fatores que determinaram essa mudança – surgem novos argumentos contra os hábitos ostensivos, perdulários, hedonistas e consumistas, deixando evidente que o padrão de consumo das sociedades ocidentais modernas, além de socialmente injustos e moralmente indefensáveis, como criticado, há tempos, são ambientalmente insustentáveis (PORTILHO, 2005).

Durante a preparação para a Conferência Rio92, tornou-se mais evidente a desigual contribuição dos diferentes estilos de vida e padrões de consumo para os problemas ambientais globais.

Nesta óptica, a questão dos padrões de consumo também foi a temática mais marcante da Conferência da ONU sobre População e Desenvolvimento, em 1997, ocorreu no Cairo.

Assim, observa-se o deslocamento da preocupação que antes estava afeta ao processo produtivo e agora passa para a esfera do consumo, até como reflexo do mundo de obsolescência programada instituído pelo mercado capitalista.

Fato é que segundo (PORTILHO, 2005) o consumo total da economia humana tem excedido a capacidade de reprodução natural e assimilação de rejeitos da ecosfera, enquanto fazemos uso das riquezas produzidas de uma forma socialmente desigual e injusta. Essas duas dimensões, exploração excessiva dos recursos naturais e iniquidade inter e intrageracional na distribuição dos benefícios oriundos dessa exploração, conduziram à reflexão sobre a insustentabilidade ambiental e social dos atuais padrões de consumo e seus pressupostos éticos-normativos.

3 O DESPERTAR DA PREOCUPAÇÃO INTERNACIONAL COM O MEIO AMBIENTE

Até recentemente as relações entre sistemas economicos e meio ambiente eram secundárias: entendia-se a economia como um conjunto de fluxos de valor de troca entre empresas e famílias que se davam em um ciclo fechado de circulação contínua, sem trocas com o meio.

Contudo, esta visão foi alterada no final da década de 60 e início dos anos 70, principalmente a partir da divulgação da análise do impacto de restrições ambientais sobre o crescimento economico.

Três eventos levaram a ciência economica a prestar atenção a estes problemas, dando início a um novo ramo de conhecimento, a economia ambiental:

1. a acentuação da poluição no primeiro mundo;

2. o choque do petróleo;

3. o relatório do Clube de Roma de 1972.

Neste contexto fora realizada em 1972, em Estocolmo a Conferencia das Nações Unidas para o Meio Ambiente (ALEGRETTI, 2008).

Esta crise ambiental é simultaneamente a crise do vínculo e a crise do limite: uma crise de paradigma sem dúvida. Crise do vínculo: já não conseguimos discernir o que nos liga o animal, ao que tem vida, à natureza; crise do limite: já não conseguimos discernir o que deles nos distingue (OST, 1995).

Foi nesse quadro que se desenvolveu a economia ambiental neoclássica, apresentando soluções para os problemas ambientais, de acordo com os seguintes pressupostos: mercados livres e concorrência perfeita, não interferência do governo, não existência de monopólios, liberdade dos agentes econômicos. O problema central do meio ambiente passou a ser a poluição e instrumentos econômicos foram delineados para medir o impacto e orientar o processo de tomada de decisão dos agentes econômicos.

A dicotomia entre crescimento econômico/desenvolvimento e conservação do meio ambiente começou a ser questionada a partir da Assembléia Geral da ONU em 1983 que constituiu comissão especial (Comissão Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento) criada para avaliar o comprometimento real dos recursos naturais e sugerir estratégias para implementar formas de compatibilizar crescimento com conservação ambiental, corrigindo os padrões distributivos distorcidos predominantes. A mudança nos conceitos é radical. Até então, progresso esteve sempre associado à idéia utilitária de dominar a natureza e transformá-la em produção, através da extração de riquezas. Assim como a natureza foi transformada em recurso natural, a população o foi em recurso humano, ambos devendo ser monetarizados e capitalizados.

Embora o conceito de sustentabilidade seja recente, a idéia de limites ao crescimento colocados por questões ambientais está presente há mais tempo. Malthus os relacionou à tendência exponencial de crescimento da população que em um mundo finito significa que a divisão per capita dos bens do mundo deve diminuir permanentemente. Segundo Malthus, a natureza impõe limites à produção de alimentos e, em consequência, sobre o crescimento da população. Com o crescimento da população, aumenta a demanda por alimentos levando à necessidade de utilização de terras cada vez menos férteis, aumentando o pagamento de renda pelas terras mais férteis. Como consequência, há mudança nos padrões de distribuição de renda, redução da poupança, dos investimentos e do crescimento da economia.

A partir da análise dos fatores que limitam o crescimento humano – população, produção agrícola, recursos naturais, produção industrial e poluição – no tempo e no espaço, cujos resultados foram expostos no livro Limites do crescimento, em 1972, representou um marco no debate mundial sobre o futuro deseja para o planeta.

Também em 1972, foi realizada em Estocolmo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, onde estiveram reunidos países desenvolvidos e em desenvolvimento, com o objetivo de estabelecerem direitos universais a um meio ambiente sadio e produtivo.

Várias conferências e reuniões se sucederam, mantendo sempre o enfoque principal nos “direitos universais” traçados em Estocolmo.  As relações entre sistema econômico e ecossistemas foram ficando mais evidentes à medida que os impactos foram crescendo em escala e amplitude.

O Relatório da Comissão Bruntland, lançado em 1987, Our Common Future  (Nosso Futuro Comum), resultado de mais de três anos de trabalho,  aponta limitações de vários tipos ao desenvolvimento: tecnológicas, de organização social, recursos ambientais e capacidade de absorção pela biosfera. E passou a ser um dos elementos-chave das discussões sobre a conservação da natureza e o desenvolvimento mundial.

A principal mensagem do documento era voltada para a reflexão sobre nosso modo de apropriação dos recursos naturais e a necessidade premente de se desenvolver ações para garantir um futuro para as gerações futuras.

Surge assim, a primeira conceituação oficial de Desenvolvimento Sustentável, como sendo aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades.

A partir de então este conceito se consolidou, evoluiu, difundiu e proliferou, e atingiu às grandes massas.

Entretanto, para Elkington (2001), mesmo com o conceito formulado, inicialmente, a idéia de desenvolvimento sustentável era entendida como a harmonia entre a questão financeira e ambiental. Mesmo dez anos após a Comissão, viu-se que somente as questões ambientais - que tanto afligiam a sociedade e o meio organizacional - não resolveria os problemas de uma economia global sustentável. Seria necessário atingir outros meios para se conseguir a sustentabilidade. “Aqueles que pensam ser a sustentabilidade somente uma questão de controle de poluição, não estão vendo o quadro completo” (Hart, 2005, apud Elkington, p.74, 2001).

Rosa Virgínia, abordou a questão, trazendo posicionamentos de, Antônio Carlos Diegues, segundo o qual:

“Esse termo, referindo-se ao desenvolvimento sustentável, transita pelos mais diversos círculos e grupos sociais, desde organizações não governamentais até as de pesquisa, com notável e estranho consenso, como se fosse uma palavra mágica ou um fetiche. Uma análise mais aprofundada revela uma falta de consenso, não somente quanto ao adjetivo “sustentável”, como também quanto ao desgastado conceito de “desenvolvimento”.

E complementa com as palavras de Selene Herculano:

 “Estas expressões, muito abstratas e ambíguas, vêm sendo interpretadas das mais diversas formas pelos diferentes atores sociais, ora despertando o nosso imaginário e uma certa esperança milenarista, ora alimentando suspeitas acerca de uma conspiração do hemisfério norte contra o sul”.

Já durante a Conferência da ONU, ECO-92, documentou-se o crescimento da consciência sobre os problemas do sistema econômico vigente. Este fato promoveu a discussão entre a relação do desenvolvimento sócio-econômico com as transformações ecológicas.

Hoje são incontáveis os documentos na esfera legal, social, político e educacional que inserem a proposta do desenvolvimento sustentável sem, todavia, aprofundar-se na questão metodológica para viabilizar a consecução de tal instrumento ainda mais pelas diversas interpretações são dadas à expressão.

4 O MODELO SUSTENTÁVEL

Conforme Sachs (2004) o conceito de desenvolvimento sustentável acrescenta uma outra dimensão – a sustentabilidade ambiental – à dimensão da sustentabilidade social. Ela é baseada no duplo imperativo ético da solidariedade sincrônica com as gerações futuras. Ela nos compele a trabalhar com as escalas múltiplas de tempo e espaço, o que desarruma a caixa de ferramentas do economista convencional. Ela nos impele ainda a buscar soluções triplamente vencedoras, eliminando o crescimento selvagem obtido ao custo de elevadas externalidades negativas, tanto sociais quanto ambientais. Outras estratégias, de curto prazo, levam ao crescimento ambientalmente destrutivo, mas socialmente benéfico, ou ao crescimento ambientalmente benéfico mas socialmente destrutivo. Assim, para tentar equalizar crescimento e meio ambiente, sob a ótica da sustentabilidade, foram desenvolvidas diversas teorias sobre os pilares do desenvolvimento sustentável. Alguns autores atribuem apenas três pilares, outros quatro, mas optamos pela teoria que considera que sejam cinco as bases para alcançar o desenvolvimento sustentável, a saber:

a) Social - fundamental por motivos tanto intrínsecos quanto instrumentais, por causa da perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muitos lugares problemáticos do nosso planeta;

b) Ambiental - com suas dimensões (os sistemas de sustentação da vida como provedores de recurso e com “recipientes” para a disposição de resíduos);

c) Territorial - relacionado à distribuição espacial dos recursos, das populações e das atividades;

d) Econômico - sendo a viabilidade econômica a conditio sine qua non para que as coisas aconteçam;

e) Político - a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário pra fazer as coisas acontecerem, a liberdade faz toda a diferença.

Passaremos a estudar com mais detalhes ao pilar Político da Sustentabilidade para demonstras mecanismos também assumidos pelo próprio Estado como forma de promover o desenvolvimento sustentável nas suas atividades.

4.1 O PILAR POLÍTICO DA SUSTENTABILIDADE

Os meios de controle ambiental executados pelas iniciativas públicas atravessam três gerações principais de políticas ambientais. A primeira geração é baseada na abordagem do comando e controle, a segunda no emprego de instrumentos econômicos e de mercado e a terceira em instrumentos de interação e responsabilização social ou de auto- regulação. Alcoforado (2001)

Os instrumentos de comando e controle, são também conhecidos como instrumentos reguladores, podem ser definidos como: “[...] um conjunto de normas, regras, procedimentos e padrões a serem obedecidos pelos agentes econômicos, de modo a adequar-se a certas metas ambientais, acompanhado de um conjunto de penalidades previstas para os recalcitrantes.”

A 2ª geração de políticas ambientais se refere aos instrumentos econômicos que podem ser classificados como: (a) incentivos econômicos e uso de mercado, e (b) mecanismo de mercado e criação de mercado. O primeiro age como prêmio ou penalidade sobre determinado produto ou fator de maneira a alcançar a melhoria ambiental. O segundo age de maneira a criar um “mercado ambiental”, negociando-se direta ou indiretamente alguma certificação que reflita a escassez de um recurso ambiental.

A co-regulação (interação público-privado), presente na 3ª geração é uma forma híbrida entre a gestão pública e auto-regulação, onde a autoridade pública estabelece metas ou objetivos de qualidade ambiental e a iniciativa privada firma as medidas a serem adotadas para que as metas sejam atingidas.

A 3ª geração de instrumentos utilizados nas políticas ambientais apresenta uma visão baseada em negociações e acordos, em que é presente uma maior integração dos interesses públicos e privados. Essas iniciativas têm influenciado os rumos das novas políticas ambientais como também apontam uma evolução no sentido da auto-regulação, onde as empresas se utilizam de iniciativas voluntárias como processos de certificação e criação de selos verdes de forma a garantir a qualidade ambiental.

Uma outra iniciativa inovadora de instrumento econômico, conforme observado por Oliveira (2003), é a compra verde efetuada pelo governo, ação que pode ser estendida às contratações sustentáveis. O governo compra produtos com características ambientalmente responsáveis em decorrência da qualidade do produto, processo de fabricação ou pelas características da empresa como, por exemplo, empresas certificadas em processo de gestão ambiental ISO 14.000. Esse tipo de iniciativa contribui no surgimento de mercados limpos em uma situação que o produto sustentável pode competir com produtos e processos tradicionais.

4.2 LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS

A atividade estatal não se concretiza pela atuação isolada dos agentes públicos, sendo comum valer-se de pessoa ou órgão estranho à sua estrutura, para a realização do interesse público, revelado pelo desempenho de serviços burocráticos internos ou pela prestação de serviços públicos direcionados aos administrados.

Quando o Poder Público julga necessário socorrer-se de pessoa física ou jurídica para concretizar seus objetivos, se vale de contratos e, para tanto, a Constituição da República e a lei estabelecem uma série de limites à atuação estatal, exigindo a obediência aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Nesse sentido, a lição de Meirelles (2006, p.26):

“A licitação é o antecedente necessário do contrato administrativo; o contrato é o conseqüente lógico da licitação. A licitação é o procedimento administrativo preparatório do contrato; é condição para a sua formalização. Pela licitação se seleciona a melhor proposta; pelo contrato se vinculam as partes para a consecução de seu objeto”.

A Constituição da República, sem embargo, reconhece a possibilidade de realização de contratos administrativos sem prévia licitação, ao permitir, no inciso XXI, do art. 37 que a lei poderá estabelecer ressalvas.

A adoção do termo “sustentável” implica que as Autoridades Públicas na celebração de seus contratos se apóiem nos três pilares da sustentabilidade, ou seja, nos critérios ambientais, econômicos e sociais.

Conforme Biderman e outros (2006, p.22):

“A licitação sustentável é uma solução para integrar considerações ambientais e sociais em todos os estágios do processo da compra e contratação dos agentes públicos (de governo) com o objetivo de reduzir impactos à saúde humana, ao meio ambiente e aos direitos humanos. A licitação sustentável permite o atendimento das necessidades específicas dos consumidores finais por meio da compra do produto que oferece o maior número de benefícios para o ambiente e a sociedade.”

Tal ferramenta estatal ganhou ainda mais força com a conversão da MP 495 na Lei 12. 349, de 15/12/2010, e promoveu relevantes modificações na concepção da contratação administrativa vigente no Brasil. O diploma determinou que o caput do art. 3º da Lei 8.666/93 tenha a seguinte redação:

“Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos”.

Ademais, houve a alteração da redação dos parágrafos do art. 3º, assim como foram acrescidos os §§ 5º a 13 ao mesmo dispositivo. Essas inovações estipularam preferências diversas a bens e serviços produzidos no Brasil.

Assim, além da preservação dos recursos ambientais, a Administração Pública brasileira ainda tenta alavancar a produção sustentável e a geração de renda para os trabalhadores locais.

O desenvolvimento nacional é indispensável para assegurar a disponibilidade dos recursos destinados à realização dos direitos fundamentais, em cujo núcleo se encontra a dignidade humana. Portanto, os direitos e garantias previstos constitucionalmente dependem, em maior ou menor extensão, do desenvolvimento nacional.

CONCLUSÃO

O progresso científico e tecnológico na avaliação dos impactos ambientais e sua contabilização monetária são elementos importantes neste processo de educação e conscientização ecológica.

A “capacidade de carga” do planeta terra não poderá ser ultrapassada sem que ocorram grandes catástrofes ambientais. Entretanto, como não se conhece qual é esta capacidade de carga, e que será muito difícil conhecê-la com precisão, é necessário adotar uma postura precavida que implica agir sem esperar para ter certeza. Nesse sentido, é preciso criar condições socioeconômicas, institucionais e culturais que estimulem não apenas um rápido progresso tecnológico poupador de recursos naturais, como também uma mudança em direção a padrões de consumo que não impliquem o crescimento contínuo e ilimitado do uso de recursos naturais per capita.

Algumas condições são definidas como básicas para se atingir o desenvolvimento sustentável: a retomada do crescimento nos países subdesenvolvidos e moderação do crescimento nos desenvolvidos; mudança nos padrões de consumo compatíveis com a sanidade ambiental; prioridade na conservação dos sistemas naturais de suporte à vida: atmosfera, água, solos, seres vivos; respeito estrito aos limites da regeneração e do crescimento natural dos recursos naturais renováveis; contenção da depleção dos recursos naturais não renováveis para que o esgotamento não se dê antes da descoberta de substitutos; estímulo à economia no uso e à reciclagem; contenção do crescimento demográfico harmonizando a população às potencialidades dos ecossistemas; fomento ao desenvolvimento tecnológico ampliando a capacidade de suporte da base de recursos naturais; garantia de acesso equitativo a recursos e tecnologias (Mueller, 1994, p. 10).

É preciso entender que a questão ambiental impõe as sociedades uma busca nova e pensar e agir, individual e coletivamente de novos caminhos e modelos de produção de bens para suprir necessidades humanas e relações sociais que não perpetuem tantas desigualdades e exclusão social, e ao mesmo tempo, que garantam a sustentabilidade ecológica.

A questão da qualidade de vida, qualidade ambiental, tão presente nas preocupações ambientais e, portanto presente em uma Educação Ambiental pode ser facilmente cooptada pelo discurso dominante, reivindicando essa qualidade para segmentos sociais, nações e blocos econômicos, integrantes desta nova ordem mundial, escamoteando, contudo, o sentido de exclusão presente nesta reestruturação do mercado mundial

No contexto político, contemporâneo, as coletividades difusas são os novos atores, os determinantes são a igualdade, a liberdade, a solidariedade e a "qualidade de vida". A questão ambiental é um canal de abertura para a participação sociopolítica que abre possibilidades de influenciadas classes de diferentes estratos diversos da sociedade, no processo deformação de decisões políticas (LONDERO,1999).

Importante também, que os Estados, principalmente dos países do sul, adotem uma postura de mobilização e mudanças enquanto detentores da maior gama de recursos naturais disponíveis no planeta, não se sujeitando a mero “compensadores” pelos excessos dos países desenvolvidos.

A intervenção do poder público como regulamentador das relações sociais também é essencial para a gestão ambiental. Algumas condições institucionais são necessárias para a gestão ambiental possa ser efetiva: ação decisiva do Estado em termos de regulação e regulamentação; regras claras e transparentes; sustentabilidade institucional; canais de interlocução entre sociedade e estado; legitimidade social das políticas públicas; continuidade das políticas públicas; ações concertadas entre os diferentes níveis de governo; instrumentos jurídicos claros e efetivos; flexibilidade no uso dos instrumentos; sustentabilidade dos recursos humanos; criar salvaguardas contra a descontinuidade, através de colegiados gestores; responsabilizar tomadores de decisões; avaliar impactos de políticas públicas.

Bem como o próprio Estado deve procurar contribuir para o liame da sustentabilidade também nas suas aquisições e contratações, impondo em seus editais licitatórios cláusulas sustentáveis, visando não apenas a obtenção de produtos e serviços com menor impacto para o meio ambiente e gerando mais economia para a Administração e menos resíduos para a natureza.

Como bem nos ensina OST, enquanto não for repensada a nossa relação com a natureza enquanto não formos capazes de descobrir o que dela nos distingue e o que a ela nos liga, nossos esforços serão em vão, como o testemunha a tão relativa efetividade do direito ambiental e tão modesta eficácia das políticas públicas neste domínio.

 

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