CIÊNCIA E COMPLEXIDADE


Pordarelli- Postado em 10 novembro 2011

Localização

UFSC
por: Darelli, em Florianópolis, Santa Catarina
Brasil

A CIÊNCIA E A COMPLEXIDADE

- O mundo que construímos, e, que nos constrói –

 

Lucio Eduardo Darelli[1]

UFSC/PPGEGC – darelli@gmail.com

 

‘A ciência não é eterna, mas é feita de tempo’

 

RESUMO:

   

Este trabalho apresentará uma revisão histórica, resumida, acerca da concepção de ciência e, em especial, do conhecimento científico. Não pretende ser uma historiografia completa, mas quer apontar as variações por que passou o pensamento científico. Também tratará das principais abordagens e métodos para investigação científica, iniciados na antiguidade clássica até os postulados mais utilizados hoje em dia nas academias. Culminará, sem esgotar o assunto, com as propostas do método investigativo, ou abordagem da organização e estrutura de Maturana e Varella, onde demonstram que o conhecimento é uma construção compartilhada entre seres vivos, toda evolução ou extinção se dá pela interação com o meio. A base de conhecimento repousará na obra dos autores ‘A Árvore do Conhecimento – As bases Biológicas da Compreensão Humana’.

 

ABSTRACT

This work presents a historical review, summarized, about design science and, in particular, of scientific knowledge. Not intended to be a full historiography, but want to point out the changes that went on scientific thinking. Will also handle of the main approaches and methods for scientific research, started in classical antiquity until the postulates more used nowadays in academies. Will culminate, without exhausting the subject, with the proposals of the investigative method, or approach of the Organization and structure of Maturana and Varela, whose base of knowledge will rest in the work ' the tree of knowledge '.

 

PALAVRAS-CHAVE:

História das ciências; conhecimento; paradigmas da ciência; complexidade.

 

UMA BREVE HISTÓRIA DA CIÊNCIA

             A ideia de Ciência - como a conhecemos hoje - passou por várias concepções desde que o homem, com o ato de investigar, se interessou por entender e explicar as coisas que o cercam bem como toda a complexidade do mundo. Embora não possamos com exatidão apontar o início do interesse investigativo do homem, podemos remontar à antiguidade clássica, não necessariamente como ponto de partida, mas, como um referencial histórico do pleno desenvolvimento do raciocínio humano.

            O berço do pensamento e da sabedoria – a Grécia de 600 a.C. -  legou ao mundo a Filosofia[2] e seus filósofos. Desde as concepções de mundo (homem, natureza e coisas intangíveis) até a própria concepção de ciência como é entendida hoje, a humanidade necessitou de alguma forma, do pensamento filosófico para fundamentar suas ideias.

           A Ciência em si está muito atrelada ao ato de ‘fazer ciência’. E o fazer científico abordado nas perspectivas de renomados autores como Triviños[3], Hughes, Morgan, Kunh, Severino, Lakatos, Comte, Maturana[4] e Varela – somente para referenciar alguns dentre tantos outros -, nos dão uma pequena ideia do quão complexo é o entendimento de ‘ciência’ tanto quanto o de ‘fazer ciência’.

          Segundo o dicionário Houaiss (2007), ciência: “É o processo racional usado pelo homem para se relacionar com a natureza e assim obter resultados que lhe sejam úteis”.

           Para Severino (2002, p. 30) “A ciência, enquanto conteúdo de conhecimentos, só se processa como resultado da articulação do lógico com o real, da teoria com a realidade”.

           Desta forma, o fazer científico produz como resultado um conhecimento científico, que se acumula com o tempo, e pode ou não tornar-se obsoleto dada as mudanças de todas as ordens por que pode passar a humanidade. Essaideia parece ser ponto pacífico uma vez que descobertas científicas, modelos e métodos científicos tendem às mudanças (que são as inevitáveis adaptações ou reedições teóricas, incrementos, avanços, ou mesmo mudanças bruscas de paradigmas) e a sociedade, por sua vez, é o grande termômetro para o seu desenvolvimento. Ora, descobertas científicas nada são antes da pesquisa científica, que trilha por alguns caminhos que vai desde a trabalhosa investigação, reflexão, comprovação, até finalmente, reprodução do evento ou fenômeno.

        O destino de uma descoberta ou de uma proposta científica não é o de ser eterna, mas o de atender uma demanda investigativa que em dado momento histórico foi (é, e será) necessária. Portanto, a boa ciência é feita com critério, atenção, método, e, sobretudo, compromisso. Isso leva tempo!

Na antiguidade clássica os filósofos eram os senhores do conhecimento. O conhecimento clássico não possuía divisões, contudo, era concebido segundo dimensões: as matemáticas, as naturais e, as místicas (divindades, espirituais, ou teológicas).

 

CIÊNCIA MODERNA E CIÊNCIA CONTEMPORÂNEA

            É de se supor, por que seja da natureza da ciência reciclar-se ao longo do tempo, que as premissas da atitude disciplinada ao ato investigativo proposta por Triviños(1987) e a necessária base filosófica para empreender investigação científica segundo Hughes(1983) sejam normas de um ‘fazer ciência’ com esmero ao compromisso científico.

            O positivismo, como abordagem metodológica foi muito utilizado na pesquisa das ciências sociais, principalmente nas décadas de 50 a 70. Contudo, em meados da década de 80, tem início a contestação, pela crítica mundial,  do uso dessa abordagem na pesquisa em ciências sociais. Os principais críticos (historicamente) são representantes da Escola de Frankfurt (Adorno, Habermas, Mercuse).

 

O positivismo perdeu a importância na pesquisa das ciências sociais que se realizava, especialmente nos cursos de prós-graduação das universidades, porque a prática da investigação se transformou numa atividade mecânica, muitas vezes alheia às necessidades dos países, sem sentido. (TRIVIÑOS, 1987, p.31)

 

          Hughes(1983) afirma que: Nenhuma técnica ou método de investigação confere autenticidade a si próprio: sua eficácia, sua própria categoria enquanto instrumento de pesquisa capaz de investigar o mundo depende, em última análise de justificação filosófica”.

          A pesquisa em ciências sociais, para Triviños, não pode utilizar-se de métodos científicos que desconsiderem a questão sócio-política como inerente ao processo investigativo tanto quanto ao objeto investigado. Muito embora as abordagens positivista, marxista e fenomenológica possam cada qual dar resposta a problemas diversos, ainda assim necessitam de grande dose de disciplina metodológica, ou seja, para Triviños(1983) o grande problema da pesquisa científica não está no método, mas, na indisciplina no desenvolvimento do pensamento investigativo.

         A indisciplina de Triviños(1983) constitui-se na  ausência de coerência entre métodos científicos e abordagem conceitual ou corrente de pensamento científico. A mistura desses ingredientes torna difícil a tarefa de investigar e concluir. É quase impossível justificar de forma racional quando o método e a corrente filosófica contrapõem-se.   

        As ciências do século XIX têm influência direta do pensamento revolucionário por que passa a Europa daquela época. Desde a revolução industrial – cujo processo demorou pelo menos três ciclos de 50 anos - até a revolução francesa de 1789, o pensamento crítico daquele período também revolucionou sua ciência. A filosofia que possuía lugar de destaque quase inabalável começa ceder espaço para as disciplinas oficiais com interesse das indústrias. A química, a física (com ênfase na mecânica e engenharias) e as geociências (mapas, cartografias, geografia), as ciências matemáticas reeditadas para subsidiar as novas disciplinas, dão origem à fragmentação do conhecimento em disciplinas isoladas. No campo das ciências sociais, a evolução ocorre mais tarde, nasce antes, a política, e a antropologia.

          Pensadores como Comte e Dürkhein contribuiram para o nascimento das ciências sociais. Comte com o mérito de inaugurar o pensamento positivista como método investigativo científico, e Dürhein – seu sucessor e não menos importante - por elevar ao nível de ciência, a disciplina de sociologia, aplicando a abordagem positivista ao estudo da sociedade de seu tempo.

           Para Comte e Durkheim a sociedade é regulada por leis naturais, leis invariáveis, independentes da vontade e da ação humana, como a lei da gravidade ou do movimento da terra em torno do sol, de modo que nela reina uma harmonia semelhante à da natureza, uma espécie de harmonia natural. Assim a metodologia utilizada pelas ciências sociais tem que ser idêntica à metodologia das ciências naturais, posto que o funcionamento da sociedade seja regido por leis do mesmo tipo das da natureza.

       Destarte, os elementos da ciência segundo Vilela Jr.(2008, p. 6) devem conter os seguintes aspectos:

Objetividade– é a identificação de características comuns (ou leis gerais) de um dado fenômeno. A busca de similaridades é o primeiro passo para sistematização que é inerente ao processo científico.

Funcionalidade– característica da ciência que se refere ao aumento da capacidade de compreensão do mundo, e possui natureza cumulativa.

Formalidade– refere-se às normas e métodos específicos pelas quais uma determinada ciência estuda o mesmo objeto material.

Materialidade- refere-se ao objeto de estudo em si, aquilo que se torna objeto de análise ou interpretação.

Ainda segundo Vilela Jr. (2008, p. 7) a Classificação da ciência pelo modelo proposto por Comte é o seguinte:

 

 

 
 
O MÉTODO CIENTÍFICO
 
 
             O pesquisador, a fim de poder realizar seu trabalho de investigação científica, necessita empregar um conjunto de processos, regras ou operações mentais que será a base de todo seu raciocínio lógico-investigativo, este conjunto metodológico chamamos de MÉTODO CIENTÍFICO.

            Os métodos empregados, de maneira geral, em investigação científica, ao longo do tempo e ainda hoje, são: detutivo, indutivo, hipotético-dedutivo, dialético e fenomenológico (e neste último ainda cabe sua variação ‘a complexidade’). Segundo Gil (1999, p.26) “A investigação científica depende de um “conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos.”

             Considerando esses métodos podemos descrevê-los brevemente:

 

Método Dedutivo

             Método proposto pelos racionalistas, Descartes, Spinoza, Leibniz, que pressupõe que só a razão é capaz de levar ao conhecimento verdadeiro. O raciocínio dedutivo tem o objetivo de explicar o conteúdo das premissas. Por intermédio de uma cadeia de raciocínio em ordem descendente, de análise do geral para o particular chega-se a uma conclusão. Usa o silogismo, construção lógica para, a partir de duas premissas, retirar uma terceira logicamente decorrente das duas primeiras, denominada de conclusão (Gil, 1999; Lakatos & Marconi, 1993).

 

Exemplo de raciocínio dedutivo:

Todo homem é mortal. ...........................................(premissa maior)

Pedro é homem. .....................................................(premissa menor)

Logo, Pedro é mortal. .............................................(conclusão)

 

            Método Indutivo

            Método proposto pelos empiristas, Bacon, Hobbes, Locke, Hume. Considera que o conhecimento é fundamentado na experiência, não levando em conta princípios preestabelecidos. No raciocínio indutivo a generalização deriva de observações de casos da realidade concreta. As constatações particulares levam à elaboração de generalizações. (Gil, 1999; Lakatos & Marconi, 1993).

 

            Exemplo de raciocínio indutivo:

Antônio é mortal. João é mortal. Paulo é mortal. .....Carlos é mortal.

Ora, Antônio, João, Paulo ... e Carlos são homens.

Logo, (todos) os homens são mortais.

 

Método hipotético dedutivo

             Proposto por Popper consiste na adoção da seguinte linha de raciocínio: “quando osconhecimentos disponíveis sobre determinado assunto são insuficientes para a explicação de um fenômeno, surge o problema. Para tentar explicar as dificuldades expressas no problema, são formuladas conjecturas ou hipóteses.

           Das hipóteses formuladas, deduzem-se conseqüências que deverão ser testadas ou falseadas. Falsear significa tornar falsas as conseqüências deduzidas das hipóteses. Enquanto no método dedutivo procura-se a todo custo confirmar a hipótese, no método hipotético-dedutivo, ao contrário, procuram-se evidências empíricas para derrubá-la” (Gil, 1999, p.30).

 

Método Dialético

             Fundamenta-se na dialética proposta por Hegel na qual as contradições se transcendem dando origem às novas contradições que passam a requerer solução. É um método de interpretação dinâmica e totalizante da realidade. Considera que os fatos não podem ser considerados fora de um contexto social, político, econômico, etc. Empregado em pesquisa qualitativa (Gil, 1999; Lakatos & Marconi, 1993).

 

            Método Fenomenológico

            Preconizado por Husserl, o método fenomenológico não é dedutivo nem indutivo. Preocupa-se com a descrição direta da experiência tal como ela é. A realidade é construída socialmente.

            A realidade é entendida como o compreendido, o interpretado, o comunicado. Então, a realidade não é única: existem tantas quantas forem as suas interpretações e comunicações.

            O sujeito/ator é reconhecidamente importante no processo de construção do conhecimento (Gil, 1999; Triviños,1992). Empregado em pesquisa qualitativa.

            A Complexidade é considerado um paradigma científico do que propriamente um método, está na essência do método fenomenológico justamente porque tal método abrange contextos complexos, aceita a subjetividade e considera as qualidades do objeto como fatores de variância fundamentais ao estudo científico.

 

O Conhecimento

            O conhecimento como percepção, conhecer como ação, na proposta de Maturana e Varela é diferente da perspectiva positivista. O mundo está para ser desvendado na medida em que nós o construímos e por ele somos construídos.

            Na perspectiva positivista a realidade como se apresenta precisa ser absorvida e compreendida por nós. Ela está lá e cabe ao observador analisá-la, esmiuçá-la, catalogá-la e só então estaremos aptos a entendê-la. Dissecados todos os meandros da natureza, podemos a partir dai reproduzi-la, demonstrando assim a prova necessária do domínio de um conhecimento.

           É o que depreende Humberto Mariotti em seu prefácio da obra dos autores acima citados “A Árvore do Conhecimento” em relação ao contra senso dos positivistas cuja investigação científica se dá de forma objetiva descartando a subjetividade, pois pode comprometer a exatidão científica:

 

“Tal modo de pensar se chama representacionismo, e constitui o marco epistemológico prevalente na atualidade em nossa cultura. Sua proposta central é a de que o conhecimento é um fenômeno baseado em representações mentais que fazemos do mundo. A mente seria, então, um espelho da natureza. O mundo conteria “informações” e nossa tarefa seria extraí-las por meio da cognição.” (Mariotti, 2001)

 

            Na perspectiva da complexidade, em especial nos conceitos de Maturana e Varela, como demonstrado em sua obra “A Árvore do Conhecimento” existem outros fatores que se devem levar em consideração, tais como a necessária atitude de construção do conhecimento a partir da interação dos vários processos de acoplamentos estruturais, as ontogenias de cada ser compõe a história do grupo que por sua vez compõe a história da organização.

            Como imperativo desse princípio, os seres vivos enquanto sistemas autônomos se constituem como unidades, e essas unidades são definidas pela organização autopoiética[5] que lhes é peculiar, buscam a conservação das organizações a que pertencem, evoluem segundo os acoplamentos estruturais e buscam manter a continuidade do sistema, equivale dizer, da espécie.

            É exatamente essa identidade autopoiética das organizações que assume variâncias estruturais e pode adquirir complexidade reprodutiva, a reprodução contínua dessas unidades gera uma rede histórica indissociável das linhagens reproduzidas. Isso se aplica aos seres vivos, qualquer que sejam, e também às organizações sociais a que pertencem.

           Essa perspectiva nos dá uma nova visão a respeito do processo cognitivo, da maneira como o conhecimento se processa, como nós interagimos com o meio e como o meio sofre transformações por conta dessa interação. O conhecimento deixa de ser simplesmente adquirido, ou, absorvido como que numa atitude passiva ou meramente contemplativa. Ao contrário, o conhecimento que se processa nas várias ontogenias históricas que compõe e interagem com a gênese da espécie humana é troca e interação contínua. É um processo pelo qual observador e objeto, organismo e meio interagem e trocam ‘experiências’ no viver cotidiano. Ambos se transformam nessa interação, e o conhecimento passa ser exteriorizado, como compartilhamento e troca. Como afirma os autores da Árvore do Conhecimento:

 

“Tudo isso resulta em que há ontogenias de seres vivos que são capazes de se reproduzir e filogenias de diferentes linhagens reprodutivas que se entretecem em uma gigantesca rede histórica que, por sua vez, representa uma assombrosa variação. Podemos constatar isso no mundo orgânico que nos rodeia, (...). Essa grande rede de transformações históricas dos seres vivos é a trama de sua existência como seres históricos.“ (Maturana, et al., 2001)

 

            CONCLUSÃO

 

           A ideia de que a “ciência não é eterna, mas, é feita de tempo” guarda em si um paradoxo, e como todo paradoxo, a frase somente pode ser explicada por uma lógica própria. A dialética platônica pode nos explicar que é da essência de todas as coisas se eterno, porquanto existindo no mundo das ideais nada depois disso pode ser destruído, o fazer científico tem início na mais profunda ilação – mundo das ideias – e à partir de então não mais deixará de existir, tanto para seu criador quanto para o mundo.

          No entanto, para passarmos da ideia à concretude – ou para aquilo que consideramos realidade – há toda uma trajetória a se percorrer, e o tempo como aliado incorpora-se a essa ideia, para um dia concretizar-se. Mesmo assim, como no Mito da Caverna de Platão, nem todos entenderão, poucos aceitarão muitos nem sequer tomarão conhecimento, mas, a descoberta (científica) posta estará. Surtirá seus efeitos, influenciará direta ou indiretamente, servirá de contestação, de hipótese ou de antítese, de referência ou de descrença. Não importa, pois enquanto houver humanidade, - a descoberta, a ciência e seus desdobramentos, seus pensadores, seus adeptos e seus contestadores – tudo permanecerá no mundo das coisas.

         Em que pese todas as tentativas dos defensores do positivismo, desde o século XIX, impor como ‘verdade’ a abordagem científica positiva para todos os ramos da ciência, não encontra unanimidade na pesquisa das ciências humanas e sociais, como pudemos observar pelas propostas de Triviños e Hughes.

         Na perspectiva de se avançar além-fronteiras do conhecimento, há que se esboçar uma proposta de interelação das metodologias e conceitos sobre ciência. A busca pela interdisciplinariedade ou da transdisciplinariedade – tema recorrente nos meios acadêmicos – exige uma reanálise dos atuais paradigmas da ciência.

         O desenvolvimento humano e social, em todas as eras, deu saltos significativos toda vez que paradigmas foram quebrados. As grandes descobertas, assim como, as importantes contribuições da ciência que se fizeram notar no dia-a-dia do homem comum, foram justamente aquelas que possibilitaram a sociedade como um todo evoluir de seus estágios anteriores. Há, portanto uma evidente sinergia entre desenvolvimento social e desenvolvimento científico. Talvez, o mais importante para a sociedade humana, a partir de agora, seja considerar que a ciência – seja ela qual for – esteja a serviço de justificar a própria existência humana integrada neste e em todos os possíveis contextos que a raça humana poderá vir coexistir. Todo o esforço humano, seja técnico ou científico, tem como pano de fundo a busca pela inexorável questão existencial – quem sou eu, de onde venho, e para onde vou? 

         Talvez as questões primárias do existencialismo sejam irrespondíveis por natureza. É como conceituar o Big-Bang, como modelo atual de criação do cosmo e de todas as coisas que se permitiu criar com esse primeiro estopim cósmico. Mas, se esse modelo é o mais provável, pergunta-se: - e antes do Big-bang, o que havia? Sobra muito pouco da imaginação humana para tecer algumas alternativas. A mais comum seria que talvez Deus existisse antes do big-bang ou, simplesmente de que nada mais havia. O problema é que nem Deus (que pode ser tudo para alguns ou nada para outros) nem o universo (que não se consegue conceber) cabem em qualquer outro modelo científico – são questões irrespondíveis. Então, não fará diferença se dermos um passo atrás e considerarmos o big-bang como início de tudo, ou o fim de tudo (já que o universo se expande e se contrai) porque mesmo esse modelo não consegue explicar tudo.

          Talvez devamos ser realmente mais humildes e admitir que a nossa ciência ainda esteja muito preocupada em entender como funcionam as coisas ao invés de buscar conhecer as coisas – para muito além do intelecto –, o conhecimento como um sentido, um estado de pré-consciência.

           O conhecimento, na perspectiva de Maturana e Varela, de que somos viventes no mundo, esse mundo que antes de tudo sentimos, percebemos, e construímos juntamente com outros seres vivos além dos nossos semelhantes; também por esse mesmo mundo somos construídos. 

          É mais uma perspectiva, mais uma maneira de ver o mundo e entender a vida, para Maturana e Varela o conhecimento não está limitado às imagens e símbolos já preexistentes e que o mundo exterior nos apresenta. O processo do conhecimento se dá por interação continua entre observador e o mundo, o processo tem maior importância do que os elementos da interação. O conhecimento nasce desse fluxo de viver conhecendo e de conhecer vivendo. O conhecimento é ação: O conhecer é fazer e o fazer é conhecer.

        Ao admitirmos esta premissa, e talvez, nesse instante, cada um de nós se recrie na compreensão/consciência das três perguntas/respostas que tanto inquietam o coração humano. Quem sou eu, de onde venho, e para onde vou?

        Maturana e Varela, em sua obra, legou à humanidade uma perspectiva das bases biológicas da compreensão humana. Como aprendemos e como interagimos com o mundo? Todo processo cognitivo depende desse agir com o outro e com o mundo, acaba que é um processo de mão dupla, pois o mundo que acabamos de conhecer é diferente do que iremos conhecer. Isso ocorre porque de alguma forma, nessa interação, mudamos o mundo. E, é exatamente por isso que nós também mudamos!

 

REFERÊNCIAS:

DURKHEIM, Émile. A função da divisão social do trabalho. In Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

DEMO, Pedro. Pesquisa e construção de conhecimento. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 1991.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999.

HUGHES, J. A filosofia da Pesquisa Social. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980.

MORGAN, G. Paradigms, Metaphors, and Puzzle Solving in Organization Theory.Administrative Science Quarterly, v. 25, 1980.

Maturana Humberto R. e Varela Francisco J. A Árvore do Conhecimento / trad. Mariotti Humberto e Diskin Lia. - São Paulo : Palas Athena, 2001. - 8 : Vol. I : I : p. 288. - 978-85-7242-032-7.

LAKATOS, Eva Maria, MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de  metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1993.

LAKATOS, Eva Maria, MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Atlas, 1991

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 22ª edição, São Paulo: Cortez, 2002.


[1] Lucio Eduardo Darelli é Doutorando do progrma de pós-graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC.

[2] Filosofia – termo empregado pela primeira vez por Pitágoras referindo-se a si mesmo como amante do conhecimento, amigo inseparável do saber.

[3] Augusto Nibaldo Silva Triviños é doutor em Filosofia e Letras pela Universidade Central de Madri, Espanha, Mestre em Educação e Pós-doutorado na Alemanha Federal. Professor de Metodologia da Pesquisa na Faculdade de Educação e no Curso de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

[4] Humberto Maturana – professor e biólogo chileno, desenvolveu juntamente com Francisco Varela, francês e teórico da ciência cognitiva, a ‘biologia da cognição’ que pretendem, seja um novo paradigma científico em oposição ao representacionismo.

[5] Autopoiese em Maturana e Varela – é a capacidade de um organismo, - enquanto organização ou unidade - ou sistema de se autoreproduzir, no sentido da conservação da unidade ou da organização.

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