Éticas: Ética da convicção x ética da responsabilidade


Porvinicius.pj- Postado em 01 novembro 2011

Autores: 
SILVA, Diego Sabóia e

SUMÁRIO: Introdução. Os reflexos e influências das espécies de ética no cenário político brasileiro. Conclusão.

Resumo

O presente artigo objetiva realizar uma análise geral sobre as diversas espécies de ética, bem como tentar explicar seus reflexos e influências no hodierno cenário político brasileiro.

Palavras-chave:Ética da convicção. Ética da responsabilidade.


      I – Introdução

O estudo realizado para elaboração deste artigo tem como finalidade tecer algumas considerações acerca das diversas espécies de ética, apresentando as peculiaridades de cada uma, tomando por base seu titular, culminando em suas conseqüências na política brasileira. Objetiva responder a indagações da sociedade, tais como o motivo pelo qual várias ações, se praticadas pelo Poder Público são válidas, ao passo que essas mesmas ações, se praticadas pelo particular, são passíveis de reprimenda.

II - Os reflexos e influências das espécies de ética no cenário político brasileiro

     Uma parte do hodierno cenário político do Brasil assombra e indigna a população, dadas as denúncias e constatações de malversação da máquina pública. No entanto, existe uma linha bem tênue que passa quase sempre despercebida aos olhos do grande público: a diferença da ética do particular e da ética do gestor público, algumas vezes incompreendida. E é justamente o motivo desta incompreensão que passaremos a explanar.

Antes de adentrar no mérito do que seja ética da convicção e ética da responsabilidade, cumpre explicar o gênero, ou seja, a Ética, do qual aquelas são espécies.

 

De acordo com Miguel Reale:

... não é a Doutrina da Ação em geral, mas propriamente a Doutrina da Conduta, da ação inseparável de sua razão ou critério de medida, de sua norma, mediante a qual se expressa teleologicamente um valor. A Ética é, em suma, a teoria da conduta, o que equivale a dizer: teoria normativa da ação.” (Miguel REALE, Filosofia do Direito, Vol. I, Tomo II, p. 346)

Para responder ao questionamento de por qual motivo o ordenamento jurídico por vezes parece destoar do fim para o qual ele foi preponderantemente criado, mister se faz informar o que seja ética da convicção e ética da responsabilidade, e ainda as teorias do Mínimo Ético e dos Círculos Secantes.

Chama-se ética da convicção as ações morais individuais, praticadas independentemente dos resultados a serem alcançados. Ou seja, é o “dever pelo dever”, no dizer de Immanuel Kant. Ética da responsabilidade, por sua vez, é a moral de grupo, muito diferente da individual, pois aquela se refere às decisões tomadas pelo governante para o bem-estar geral, embora muitas das vezes possam parecer erradas aos olhos da moral individual.

Na ética da responsabilidade, o que valida um ato é o resultado, e não a intenção. Destarte, podemos afirmar que a ética da responsabilidade corresponde às decisões tomadas por aqueles que, investidos no poder, tudo fazem para manter a harmonia social.

A Teoria do Mínimo Ético, desenvolvida por diversos doutrinadores, teve por maior aperfeiçoador e expositor o alemão Georg Jellinek, no final do século XIX e começo do seguinte, preceitua que o Direito seria apenas o mínimo de Moral exigido para que a sociedade não se dilacerasse.

Para esclarecer ainda mais o tema, valhamo-nos da lição do saudoso  Miguel Reale, luminescência jurídica universal, que ao lado de Teixeira de Freitas, Clóvis Beviláqua e Pontes de Miranda, representa o que de melhor já produziu este país em matéria jurídica:

“A Teoria do Mínimo Ético consiste em dizer que o Direito representa apenas o mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável armar de força certos preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre. A Moral, em regra, dizem os adeptos dessa doutrina, é cumprida de maneira espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é indispensável que se impeça, com mais vigor e rigor, a transgressão dos dispositivos que a sociedade considerar indispensável à paz social. Assim sendo, o Direito não é algo diverso da Moral, mas é uma parte desta, armada de garantias específicas.”(Miguel REALE, Lições Preliminares de Direito, p. 42)

A Teoria do Mínimo Ético pode ser representada através da imagem de dois círculos concêntricos, sendo o círculo maior o da Moral, e o círculo menor o do Direito.

Referida teoria revela-se insustentável, uma vez que acaba por defender que tudo que pertence à esfera do Direito é moral, o que constitui verdadeira aberração, uma vez que a experiência, de sobejo, nos demonstra o contrário.

Mais afeita à realidade e à teoria é a “Teoria dos Círculos Secantes”, segundo a qual Moral é Moral e Direito é Direito, com alguns pontos de contato, e jamais um contendo o outro. Esta teoria pode ser representada através da imagem de dois círculos secantes, onde um faz as vezes do Direito e o outro as da Moral, sendo a intersecção os pontos de contato entre as duas Ciências.

III - Conclusão

Isso posto, temos agora subsídios suficientes para responder com precisão ao questionamento “por qual motivo o ordenamento jurídico parece por vezes contrariar o fim para o qual ele foi criado, a saber, atender às aspirações sociais?”

Este sentimento de insatisfação com o ordenamento jurídico, na esmagadora parte das vezes repousa no fato de que foge aos espíritos mais despreparados a noção das éticas individual e de grupo. Desta maneira, as prescrições do ordenamento que em um primeiro momento possam parecer desconforme ao querer social individual, está conforme ao querer social coletivo e vice-versa. Logo, o que parece em desacordo com as aspirações sociais, em sua quase totalidade provém da diferenciação entre a ética da convicção e a ética da responsabilidade, que como já visto são bem diferentes; a primeira informa a moral individual, o dever pelo dever, ao passo que a segunda informa a moral de grupo, onde o que importa é o resultado, e não a intenção. Contudo, ambas são tuteladas pelo ordenamento jurídico, e imprescindíveis para o bom funcionamento, pacificação e segurança das relações jurídicas.

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