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Calline Oliveira de
Assis*
1. INTRODUÇÃO
A notícia mais longínqua sobre dano moral versa dos
Códigos de Manu1 e Hamurabi, onde se considerava que o compromisso
oriundo de um contrato válido tinha algo de sagrado a que não podiam,
impunemente, furtarem-se os pactuantes.
Já o Código de Hamurabi estipulava que, se alguém
difamasse uma mulher consagrada ou a mulher de um homem livre e não pudesse
provar, o mesmo deveria ser arrastado perante o Juiz, onde retirava-lhe a
fronte (art. 127 Hamurabi).
Entretanto, a nossa visualização do dano moral na
atualidade, é muito mais próxima da perspectiva dos babilônios, que viam o dano
moral como algo reparável pecuniariamente, estabelecendo penas de ressarcimento
material em casos de ofensa à moral humana. Vale ressaltar que, também no
Direito Romano, a lei das Doze Tábuas previa penas patrimoniais para crimes
como dano, injúria e furto.
Atualmente, no que diz respeito ao dano de cunho
moral, temos a sua proteção expressa no nosso Código Civil de 2002 e em nossa
Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 5°, V, estabelece que: "é assegurado o direito de resposta,
proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à
imagem", e ainda, neste mesmo artigo, no inciso X que: "são invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização
pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".
Tendo esclarecido esses pontos preliminares, a
problemática das linhas do presente trabalho se concentrará na seara do
questionamento no que diz respeito ao protesto indevido no dano moral e nas
possibilidades de se garantir esse direito fundamental de maneira que
possibilite a contenção de pedidos desregrados, não palpáveis e descabidos de
efetiva proteção do ordenamento jurídico, sendo desencadeados apenas como
desmembramento de um pedido material, porém sem uma justificativa cabível, ou
ainda por sentimentos momentâneos de difamação, etc., infundados.
Buscar-se-á, pois, trazer reflexões importantes
acerca do tema e de sua atual exacerbação de requerimentos sem critérios legais
precisos, além da sua caracterização como nova vertente de direito fundamental.
Como função prática, o tocante tema terá em termos
concretos a importância teórico-social de ampliar os horizontes da sociedade e
da classe jurídica quanto às solicitações de reparo por dano moral, na medida
em que, pretende que a discussão promova um equilíbrio dessa nova tendência
exacerbada.
2.DANO MORAL
2.1 CONCEITO DE DANO MORAL
A respeito do dano moral, faz-se mister estabelecer
a sua conceituação devido principalmente ao fato de que, é através do seu
conceito que podemos tirar conclusões acerca da existência ou não da
necessidade de sua efetiva tutela ou se o equilíbrio e a ponderação na sua
solicitação não foram observados.
Importante também é o conceito, para desencadear
uma discussão acerca do que efetivamente entedemos por dano moral e fixarmos ou
não uma intersecção deste com o dano patrimonial.
As lesões sofridas pela pessoa, de natureza não
econômica caracterizam o dano moral, porém, várias são as definições
doutrinárias sobre o tema, destacando-se dentre tantas, as de:
CARLOS ALBERTO BITAR, que conceitua dano moral
como:
"Diz-se, então, morais os danos experimentados
por algum titular de direito, seja em sua esfera de consideração pessoal
(intimidade, honra, afeição, segredo), seja na social (reputação, conceito,
consideração, identificação), por força de ações ou omissões, injustas de
outrem, tais como agressões infamantes ou humilhantes, discriminações
atentatórias, divulgação indevida de fato íntimo, cobrança vexatória de dívida
e outras tantas manifestações desairosas que podem surgir no relacionamento
social." (Bitar, Apud Michellazzo, 2000, p.16).
Para JOSÉ DE AGUIAR DIAS, dano moral significa:
"As dores físicas ou morais que o homem
experimenta em face da lesão. Quando ao dano não correspondem às
características do dano patrimonial, dizemos que estamos em presença do dano
moral. A distinção, ao contrário do que parece, não decorre da natureza do
direito, bemou interesse lesado, mas do efeito da lesão, do caráter da sua
repercussão sobre o lesado. De forma que tanto é possível ocorrer dano
patrimonial em conseqüência de lesão a um bem não patrimonial como dano moral
em resultado a ofensa à bem material". (Aguiar Dias, Apud Michellazzo,
2000, p.16 e 17).
NÍLSON NAVESleciona que dano moral é:
"Todo sofrimento humano resultante da lesão de
direitos da personalidade. Seu conteúdo é a dor, o espanto, a emoção, a
vergonha, em geral, uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa". (Naves, Apud Michellazzo, 2000, p.17).
Tendo já em mente algumas diferentes conceituações
sobre dano moral, é cabível ressaltar que, nem todo dano é passível de trazer à
tona a teoria da responsabilidade civil, e que, efetivamente, o dano deve, em
primeiro lugar, ser injusto, ou seja, contrário ao ordenamento jurídico e às
aspirações da sociedade, onde, todavia, essa injustiça deve ser visualizada de
forma equilibrada, analisando-se que, o conceito de injustiça pode e será
sempre exaustivo.
É justamente neste quesito que se concentra o
motivo da exacerbação de pedidos de tutela por dano moral, pois, houve nos
últimos anos uma expansão da esfera da responsabilidade civil, saindo esta
apenas da reparação de ato ilícito para a reparação também e principalmente de
ato injusto, o que veio a ampliar e em muito os seus horizontes de aplicação.
O aumento do número de danos ressarcíveis em
virtude desse giro conceitual do ato ilícito para o dano injusto, segundo o
qual, a ressarcibilidade estende-se à lesão de todo bem jurídico protegido,
dilata a esfera da responsabilidade civil e espicha o manto da sua incidência.
Ressarcíveis passam a ser, por exemplo, na área dos
direitos de personalidade, os danos provenientes de lesão ao direito à
intimidade, na esfera dos direitos de família, o dano moral puro, no setor dos
direitos de crédito nos quais há perda de uma utilidade econômica que já fazia
parte da própria esfera jurídica patrimonial do credor, e, no campo dos
interesses legítimos, os danos ocasionados aos particulares pelo Estado na sua
política interventiva, ou por empresas privadas que poluem o ambiente ou
produzem defeituosamente seus artigos.
Essa ampliação não é maléfica, entretanto, é
importante ter-se em mente um panorama, uma delimitação, de sua incidência,
pois, caso o contrário estaremos diante de uma estimulação de demandas, que
podem vir a gerar uma periclitação da segurança jurídica, que não deve estar
acima de tudo, mas que deve ser respeitada até mesmo como forma de convivência
em sociedade.
Neste viés, o importante é estarmos atentos à
subjetividade da estipulação da existência ou não do dano moral (devido ao
próprio subjetivismo do conceito de justiça), pois, na maioria dos casos o dano
moral apresenta-se com algo não-visível.
Logo, faz-se imprescindível a utilização da
ponderação como forma reguladora e de inserção da proporcionalidade nos pedidos
de tutela por dano moral, haja vista que, seu desregramento pode estar levando
a uma confusão nem sempre muito viável ou de positiva intersecção entre a honra
e o dinheiro.
2.2 DANO MORAL COMO NOVA VERTENTE DE DIREITO
FUNDAMENTAL
A Constituição do Brasil de 1988, na trilha das
demais Constituições elaboradas após a eclosão da chamada questão social,
colocou o homem no vértice do ordenamento jurídico da nação, fez dele a
primeira e decisiva realidade, transformando os seus direitos no fio condutor
de todos os ramos jurídicos. E, ao inserir em seu texto normas que tutelam os
valores humanos, a Constituição fez também estrutural transformação no conceito
e valores dos direitos individuais e sociais, o suficiente para permitir que a
tutela desses direitos seja agora feita por aplicação direta de suas normas.
Ninguém desconhece que as normas constitucionais,
por serem de hierarquia superior, balizam a interpretação e aplicação de toda a
legislação infraconstitucional, de sorte a não ser possível aplicar esta em
desarmonia com aquelas.
Neste viés, a Constituição de 1988, mais do que as
outras, realçou o valor da moral individual, tornando-a mesmo um bem
indenizável.
Ela trouxe à tona a valoração da vida humana,
colocando-a não apenas como um conjunto de elementos materiais. Integrou a ela
também, valores imateriais, como os morais, imprestando muita importância à
moral como valor ético-social da pessoa e da família, que se impõe, dentre
outros, ao respeito dos meios de comunicação social.
Conforme acentua José Afonso da Silva:
A moral individual sintetiza a honra da pessoa, o
bom nome, a boa fama, a reputação que integram a vida humana como dimensão
imaterial. Ela e seus componentes são atributos sem os quais a pessoa fica
reduzida a uma condição animal de pequena significação. Daí por que o repeito à
integridade moral do indivíduo assume feição de direito fundamantal. (2003, p.
200).
Mas do que isso, a nova feição dada pela
Constituição de 1988 ao dano moral, se liga ao que podemos chamar de direito
subjetivo constitucional à dignidade, na medida em que, a Carta Magna proclamou
em seu art. 1°, III, a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado
Democrático de Direito, o que faz com que, a integridade moral, adquira não só
uma nova feição, mas também, uma maior dimensão porque a dignidade humana nada
mais é do que a base de todos os valores morais, a essência de todos os
direitos personalíssimos.
O que temos com isso é a moral do indivíduo, como
todos os outros direitos fundamentais, englobados no direito à dignidade e como
verdadeiros fundamentos e essência de cada preceito constitucional relativo aos
direitos da pessoa humana.
Entretanto, o fato de a Constituição ter dado uma
nova feição ao dano moral vem fazendo com que essa nova perspectiva desencadeie
principalmente nos últimos tempos, uma nova vertente dos direitos fundamentais,
a da proteção ou tutela de coisas extrapatrimoniais (o que é imprescindível),
porém com um detalhe e que é o mais importante, com grande intensidade.
Sendo assim, é a partir daí que devemos traçar a
configuração do dano moral. Se dano moral é agressão à dignidade humana, não
basta para configurá-lo qualquer contrariedade, desconforto, mágoa, irritação
ou aborrecimento, sob pena de estarmos ensejando a sua banalização.
Por isso é que, torna-se sem sombra de dúvida
importante, fazermos a título de urgência, uma delimitação da sua configuração
e existência, sob pena de nos lançarmos em uma verdadeira fuga de realidade, de
sairmos do quadro de uma proteção possível e realizável.
Essa delimitação deve pautar-se levando-se em
consideração a agressão que atinja o sentimento pessoal de dignidade, que,
fugindo à normalidade, cause sofrimento, vexame e humilhação intensos,
alteração do equilíbrio psicológico do indivíduo, duradoura perturbação
emocional, tendo-se por paradigma não o homem frio e insensível, tampouco o de
extrema sensibilidade, mas sim a sensibilidade ético-social comum. Mero
inadimplemento contratual ou prejuízo econômico não configuram dano moral,
porque não agridem a dignidade humana.
Partindo dessa perspectiva é que seria possível evitar
essa exacerbação de pedidos por dano moral ou promover uma razoabilidade pelo
menos no seu quesito quantum
indenizatório, haja vista que, como a Constituição não ponderou um
limite de fixação de valores para essas querelas (onde interpretar-se-ia por aí
pois é ela a Lei Maior) vem ocorrendo desregramentos na fixação das
indenizações, quando não, como já citado, a abundância de pedidos, muitas vezes
que colocam até em choque preceitos constitucionais, como por exemplo, pedidos
de ressarcimento por dano moral contra à imprensa que também é revertida de
proteção constitucional no quesito liberdade de expressão e de informação.
Assim, a Constituição, elevando o status do dano
moral, foi capaz de redirecionar o estudo da reparação por danos morais, o que
é um ponto extremamente positivo, conferindo-lhes maior eficácia qualitativa
(ampliação das hipóteses de incidência e da legitimidade ativa) e quantitativa
(o valor da indenização a ser arbitrada pelo magistrado), que, todavia, devem
ser vistos como pontos absolutamente questionados e passíveis de limitação,
onde caso contrário, estaremos dando a esse direito fundamental importante um
potencial extremamente destrutivo.
2.3 O INCREMENTO DA "INDÚSTRIA DO DANO
MORAL"
O surgimento arbitrário das questões judiciais
referentes à busca indenizatória por dano moral vem levando ao que se chama de
"indústria do dano moral".
Isso porque, ultimamente a disseminação dos pedidos
de dano moral tem tido como parâmetro, por exemplo, o pedido em que uma pessoa
perde parte de uma falange do dedo mínimo, ou sofre simples empurrão de um
segurança para arvorar-se, no direito de pleitear indenização milionária.
Nestas circunstâncias tem-se desencadeado uma
denominada Loteria dos Espertos, pois, passou-se a desenvolver a máxima de que
se ninguém quer ter sua honra colocada em dúvida, então é preciso parar de ir
dormir ofendido e fazer de tudo para acordar milionário.
Ao se considerar esse giro de perspectivas
relativas aos pedidos de ofensa à honra ou ao psíquico do indivíduo, acabou acontecendo
um "efeito dominó" nas lides judiciais provenientes, passando estas a
vir sempre ou quase sempre com um pedido de ressarcimento por um dano moral na
maioria das vezes inconcebível.
Vale ressaltar que, a intenção aqui não consiste em
desmerecer e nem em negar a existência das lesões de cunho moral, pretende-se
de fato, esclarecer tão somente o desregramento e os descabimentos de alguns
pedidos que vêm gerando menos agilidade no âmbito judicial e servindo de modelo
para que outras pessoas também venham a solicitar essa tutela, que em seu
entendimento subjetivo (a pessoa acha) é passível de ser ressarcida.
Quando digo que esses pedidos incabíveis acabam
servindo de modelo, digo no sentido de que, por ser a honra, a dor e a moral
algo de cunho extremamente subjetivo, a análise e decisão da sua violação
também assim se manifesta, ou seja, de maneira impreterivelmente subjetiva, o
que vem levando a procedência de muitos pedidos às vezes inconcebíveis de dano
moral, sobretudo, como manifestação da inquestionável inexistência de
neutralidade axiológica dos juízes.
Esse modelo de incremento da "indústria do
dano moral", também é válido ressaltar, tem no Brasil, como inúmeras
outras coisas, a influência dos Estados Unidos, pois, aí gerou-se uma cultura
de alegação por compensação devido a danos morais que vem desencadeando
avalanches de novas ações.
Essa influência, todavia, deve ser urgentemente
amenizada, pois, o Brasil precisa se adequar ao Poder Judiciário em que se
enquadra e estabelecer critérios legais precisos, que faltam no nosso
ordenamento para a caracterização de uma indubitável tutela de dano moral, haja
vista que, antes disso, estamos diante do desenvolvimento, nestes casos, de um
duplo subjetivismo, por parte de quem se acha lesado e por parte de quem afere
a necessidade dessa tutela: o juiz.
O problema então, se reduz à procura de uma solução
de equilíbrio entre a preocupação de equidade, que não tolera que fique a
vítima de erro judiciário sem compensação, e o interesse não menos imperioso de
não perturbar o funcionamento da justiça, inspirando aos juízes o enervante
receio de estar, possivelmente, com a sua atuação, provocando o desencadeamento
de futuras ações indenizatórias descabidas.
2.4CONTESTAÇÕES AOS NEGATIVISTAS DA REPARAÇÃO DO
DANO MORAL
Existem alguns juristas que afiançam a
impossibilidade de, na prática, serem aplicados os princípios embasatórios do
dano moral. É que, segundo afirmam, "as faculdades humanas estão
impossibilitadas de serem reparadas, porquanto inexiste o que reparar,
somando-se a isso a inexistência de uma medida apropriada." (VALLE, 1996,
p. 17).
Assim, os adversários da ressarcibilidade por dano
moral alegam a sua inexistência jurídica, por se tratar de dano subjetivo,
alheio à esfera jurídica. Argumentam que dano, juridicamente, só é o que
prejudica o patrimônio, ou restringindo-o ou coartando-lhe o crescimento. Por
isso, os juristas que adversam a doutrina do dano moral alegam que esse dano
não passa de simples metafísica.
Entretanto, devemos inquestionavelmente nos
colocarmos contra essas estipulações. Primeiro por ser essa idéia retrógrada e
obsoleta, na medida em que, nos remonta a uma idéia antiga de que só os bens
patrimoniais devem ser passíveis de aferição e que os bens extrapatrimoniais
devem ser relegados a segundo plano como forma de retrocesso do Direito às
idades longínquas em contrapartida as conquistas alcançadas pelo mesmo na
modernidade.
Assim sendo, não se defende aqui o não
reconhecimento de possíveis ressarcimentos de tutelas por motivos de dano moral.
O que se examina é a visualização de uma realidade alarmante, na qual
periclita-se a segurança jurídica em razão de demandas desconexas com uma
possibilidade viável, sendo estas compostas de pedidos absurdos e
inconvenientes, que na verdade são apenas frutos de uma busca desregrada por
dinheiro, e uma confusão entre o mesmo e a honra como já colocado.
Como a lei não alude expressamente ao que venha ser
dano moral, o seu entendimento fica comprometido por estar vinculado a um
entendimento de certas pessoas em determinado momento, causando inúmeros
contratempos, dos quais muitos já expostos.
Em resumo, a intenção destas linhas consiste em
fazer sim uma objeção aos negativistas da reparação do dano moral, pois,
entendemos que este deveras existe e deve ser aferido, todavia, defendendo
alguns pré-requisitos para tal, como forma de contenção da elevação de status
proporcionada pela Constituição Federal de 1988 ao instituto do dano moral,
pois deve haver de fato uma ponderação para que não ocorram extravagâncias e
nem muito menos deixe de existir a necessária tutela, pois, a primeira pode vir
a trazer um enriquecimento ilícito ou sem causa e a segunda uma inviabilização
do acesso à justiça que seria ainda muito pior.
3.O DANO MORAL E A
DESAGREGAÇÃO SOCIAL
O estímulo ao pleito de indenizações por dano moral
pode aumentar a faixa de desagregação social. A prevalência de indenizações sem
objetivos palpáveis e que merecem consideração pode vir a gerar a promoção do
ódio e da rivalidade, da busca de vantagem sobre outrem, ou a exaltação ao
narcisismo.
Isso porque, também devemos ficar atentos para o
errôneo objetivo da sanção pecuniária que não é o de punir o ofensor, mas de
deferir uma sensação agradável à vítima. Estaríamos com isso diante da criação
de uma sociedade revoltada tendo no Judiciário uma multiplicação de litígios
onde se pleiteiam indenizações, muitas vezes milionárias sem qualquer simetria
da conseqüência com a causa. Exemplo disto é um pedido que tramitou no Rio
Grande do Sul, onde postulou-se elevada indenização por dano moral pelo fato de
um consumidor ter encontrado um inseto no interior de um vidro de um produto
alimentício.
Dessa maneira, estamos aí promovendo um conflito e
indo de encontro aos parâmetros da razoabilidade, com desastrosas conseqüências
para a vida social que apregoa a paz como critério indispensável a sua
existência.
4.A LUTA PELO DIREITO
TODAVIA NÃO PODE SUCUMBIR
Essas colocações quanto à ponderação de litígios
por dano moral, não devem, entretanto, vir a "podar" a denomina da
"luta pelo direito", preconizada por Rudolf Von Ihering, que é de
cunho extremamente importante para o Direito, pois, segundo aos seus próprios
ensinamentos, a essência do direito é a sua realização prática.
Devemos sim lutar pelas coisas que degeneram os
nossos direitos, e exigir uma resposta para questões as quais vão de encontro
ao direito objetivo posto e ao direito subjetivo que nos pertence, sempre,
entretanto, buscando a razoabilidade e a proporcionalidade para que essa
procura pela paz social através da efetivação de um direito, não venha a se
inverter, transformando-se em um motivo de desagregação social por
inobservância do equilíbrio e da ponderação que são essenciais no
estabelecimento do próprio direito e da sua finalidade: a justiça.
A luta pelo direito, portanto, continua tendo uma
importância precípua na teoria desta ciência que necessita de fato da
concretização para ganhar vida e existir, onde, com isso, torna-se
imprescindível a existência de pessoas que queiram obter satisfação para a lesão
sofrida e garantir seus concidadãos de lesões futuras, mas, como já frisado
inúmeras vezes, no que tange ao dano moral, a obtenção dessa satisfação deve
ser viável e não ridícula.
5.CONCLUSÃO
Na busca pela reparação por dano moral temos
estabelecido uma verdadeira loteria jurídica, onde, o direito a dupla aferição
da sua existência ou não, bem como o estabelecimento do valor da sua reparação,
fica entregue ao subjetivismo do juiz, o que vem desencadeando arbitrariedades
quanto à necessidade da existência do dever de reparação do dano, que muitas
vezes não existe, ou que é desproporcional com a realidade e com a cobrança
pecuniária.
O que urge acontecer é a definição do que seja
tolerável e o que seja indenizável, para valorizar-se qualitativamente a atividade
judicante e não esvaziá-la de seus mais nobres e profundos objetivos através da
multiplicação descontrolada de processos ou de soluções inaceitáveis como a
instituição do seguro para cobrir indenizações advindas de dano moral.
Isso pode vir a levar segmentos do tecido social a
temer o incremento de condenações que possam fomentar uma indevida fonte de
riqueza para terceiros que evidentemente se beneficiarão disto, eis que o custo
será muito alto, pela inquietude, desassossego e perplexidade do cidadão
demandado ou a ser penalizado.
A Constituição de 1988, trouxe uma importante
previsão legal, que deve ser seguida e acima de tudo vista como algo de cunho
extremamente plausível, pois, a reparação deve sim ultrapassar as coisas apenas
materiais, todavia, é preciso que se estipule em que medida essa reparação por
dano moral deve se dar e em que pontos ela é inconcebível.
A indenização a título de dano moral inegavelmente
existe, mas deve sofrer os temperos da lei e da vida. Sua incidência há que se
dar numa faixa dita tolerável e sua reparação não pode servir de motivo para se
gerar mais uma espécie de desagregação social.
NOTAS
1.O Código de Manu (séc. II a.C.- séc. II d.C.) não
teve uma projeção legal, quando comparado ao Código de Hamurabi, porém se infiltrou na Assíria,
Judéia
e Grécia.
Em certos aspectos é um legado, comparado ao deixado por Roma à modernidade.
Inscrito em sânscrito, constitui-se na legislação do mundo indiano.
Historicamente as leis da Manu, são tidas como a primeira organização geral da
sociedade sob a forte motivação religiosa e política. O código possui a adoção
ideológica de que o castigo e a coação são essenciais para se evitar o caos na
sociedade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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da República Federativa do Brasil. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
IHERING, Rudolf Von. A luta pelo direito. 19. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2000.
MICHELLAZZO, Busa
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VALLE, Christiano Almeida do. Dano Moral: doutrina, modelos e
jurisprudência. 1.ed. Rio de Janeiro: Aide Editora, 1996.
ZENUN, Augusto. Dano Moral e sua reparação. 7.ed. Rio de Janeiro: Editora Forense,
1998.
* Estudante de Direito da Universidade Estadual de Feira de Santana -
UEFS, e estagiária do Ministério Público Estadual em Feira de Santana, Bahia.
Disponível em:
http://www.webartigos.com/articles/6823/1/a-exacerbacao-dos-pedidos-de-dano-moral/pagina1.html
Acesso em: 12 jun. 2008.