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Advocacia Preventiva

 

 

René Vial*

 *Graduado em Direito pela PUC-MINAS, Técnico em contabilidade pelo IMACO (Instituto Municipal de Administração em Ciências Contábeis) e mestrando em Direito Comunitário pela PUC-MG.          


1.INTRODUÇÃO


Este trabalho sugere aos operadores do Direito qual a melhor forma de prevenir a elaboração de contratos defeituosos que possam, quando da sua execução, causar discórdia entre os contratantes.

Cabe, mencionar, nesta rápida introdução, que todo conhecimento alcançado com o presente estudo teve em vista destacar a relevância da interpretação contratual na prática forense.

2. LINGUAGEM E ELABORAÇÃO DOS CONTRATOS 


A linguagem representa o uso da palavra articulada ou escrita como instrumento capaz de efetivar a comunicação entre as pessoas. Assim, por sua natureza, esta maneira humana de se manifestar é inerente à formação de qualquer negócio jurídico. 

No exercício da plena liberdade de contratar, os negociadores podem formular uma imensidade de contratos, estejam ou não previstos em lei, e, ainda, introduzir em seus termos uma variedade infinita de cláusulas.     

Neste cenário, a escolha das expressões capazes de traduzir com perfeição a vontade de cada uma das partes é o alicerce do que se pode considerar um acordo elaborado com qualidade, e que, provavelmente, será executado sem maiores transtornos.    

2.1 Da linguagem natural e a da falibilidade humana    


Mesmo com todo zelo empregado na comunicação, as partes envolvidas num contrato, na maioria das vezes, deixam, pela inexperiência que apresentam, de expressar, claramente, o que pretendem. Quando um contrato for elaborado com termos obscuros, ambíguos ou contraditórios, e as partes não concordarem no sentido exato das palavras ou frases usadas, não haverá outro remédio aos contratantes, senão recorrer ao Judiciário a fim de se esclarecer o alcance do negócio jurídico firmado.          

É o que afirma o ilustre professor DARCY BESSONE:         

Não é outro, com efeito, o objetivo da atividade exegética. As expressões utilizadas pelos contratantes constituem simples meios de revelar as vontades. Se, por imperícia ou inabilidade dos declarantes, são equivocas, plurívocas, políssensas, insuficientes ou imprecisas, não se mostram aptas para tal revelação. [1]     

A questão da linguagem avulta de importância quanto mais se constata o enorme número de litígios provenientes de divergências na interpretação dos contratos, quase sempre em razão da falta de técnica com que estes são celebrados.      

Mesmo antes de começar a escrever os termos do contrato, as partes interessadas têm um primeiro e fundamental trabalho de pesquisa; quando, então, devem colher os dados necessários ao negócio jurídico para evitar que a falta de subsídios deixe lacunas que nenhum artifício de estilo poderá colmatar. Assim, um contrato bem apurado, no qual o seu objeto esteja presente em toda sua extensão; apresenta, no núcleo, uma linguagem bem trabalhada e, portanto, controlável.           

Todavia, não se quer dizer que depois de apurados os fatos de interesse das partes, qualquer linguagem de uso geral possa ser utilizada na redação do contrato; pois a forma de comunicação natural, que nasce de maneira espontânea entre os indivíduos, carrega dentro de si todos os problemas de ambigüidade, incerteza e vagueza que acabam por frustrar a execução do contrato.      

É por esses motivos que a terminologia específica é componente trivial de qualquer área do conhecimento. E no uso desta linguagem própria, só um técnico possui o rigor conceitual que permite ajudar às partes transmitir, com clareza e exatidão, o que pretenderam ao celebrar o negócio jurídico.

CARLOS EDUARDO NICOLLETI ao afirmar que a ciência dogmática do Direito procura construir seus enunciados através de uma linguagem artificial que atenda e respeite à rigidez esperada, lembra que o cientista assim o faz numa tentativa de contornar a fragilidade da língua natural, procurando escapar dos seus problemas.[2] 

Nota-se, destarte, que a preocupação com a boa escolha das palavras não é apenas estética. Uma vírgula colocada no lugar errado dá margem a discussões posteriores que podem inviabilizar todo o contrato. Portanto, não é frívolo o receio de se deixar a cargo das partes a difícil tarefa de elaborar um negócio jurídico; visto que o leigo, sem notar os perigos que corre, utiliza sinais altamente vulneráveis e comprometedores.      

Além das previsíveis falhas de quem é estranho ao mundo do Direito, o risco de comprometer a declaração das vontades aumenta, dia a dia, em face da complexidade dos termos utilizados no meio jurídico; o que torna a presença do advogado fundamental para decifrar estas expressões e, assim, fazer com que as partes exprimam o que realmente desejaram.

3. Da advocacia como solução preventiva      


Cabe, neste momento, salientar a importância da prestação de serviços advocatícios já na fase em que as partes estão elaborando o contrato, pois resta evidente a necessidade de uma atitude prévia que oriente a repercussão da linguagem adotada para os fins econômicos que se pretendem alcançar.      

Foi dito acima que ocorrem, com muita freqüência, problemas de interpretação que tiveram em sua origem a ausência de técnica com a qual foram celebrados os contratos, apresentando contradições ou deixando pontos essenciais sem regulamentação adequada. E neste sentido, DARCY BESSONE adverte:

As partes, no momento do consentimento, são geralmente otimistas. Acreditam na feliz execução do contrato; não se preocupam, em regra, com a previsão de eventos aparentemente secundários. Falta-lhes mesmo preparo técnico para prever e dispor. Logo depois, a execução do contrato as surpreende com lacunas, por vezes de graves repercussões na economia do negócio.[3]     

Estes acontecimentos, certamente, seriam evitados se as partes tivessem procurado o auxílio de um operador do Direito, posto que o advogado é o único capaz de oferecer toda a assistência técnico-profissional que elas necessitam na hora de celebrar um negócio jurídico.

Assim é que atua a advocacia preventiva, destinada a dar ao cliente todas as orientações jurídicas de que precisa. Seu objetivo fundamental está na analise das circunstâncias que envolvem a celebração do contrato, para quantificar e eliminar riscos, visando a impedir o aparecimento dos dissabores futuros que possam, naturalmente, surgir de uma linguagem imprecisa.

Valendo-se dos seus conhecimentos, o advogado pode assegurar às partes a manifestação exata da suas vontades e, por conseguinte, o cumprimento do que foi realmente desejado por elas. Neste mister, caberá ao advogado examinar todos os documentos que sirvam ao contrato; e, sua eficiência consistirá, até mesmo, em desaconselhar o negócio ao cliente, ou aconselhá-lo a tomar um rumo diferente do que pretendia.      

A atuação preventiva é, deste modo, um meio inteligente e econômico[4] de evitar que se apresentem litígios fundados nas questões que envolvem a interpretação contratual.

4. CONCLUSÕES    


Ao final deste trabalho, é necessário sublinhar, apenas, que diante da falta de preparo dos contratantes, a assistência de um advogado é altamente recomendável. Todavia, quase sempre este apoio é dispensado na prática, o que resulta em sucessivos problemas na fase de execução dos contratos, com sérias conseqüências para o negócio jurídico realizado.

Por fim, cumpre salvaguardar que não se pretendeu discutir todas as peculiaridades que fazem parte da elaboração contratual; senão deixar registrado um alerta, ainda que de forma superficial, para o cidadão que necessita, pelas circunstâncias da vida moderna, entrar em acordos com seus pares e que não pretende amargar prejuízos financeiros ou morais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS           


ANDRADE, Darcy Bessone de Oliveira. Do contrato. Rio de Janeiro: Forense, 1960.          

______. Aspectos da Evolução da Teoria dos Contratos. São Paulo: Saraiva, 1949. 

BITTAR, Carlos Alberto. Contornos atuais da teoria dos contratos. São Paulo: RT, 1993.

CAMILO, Carlos Eduardo Nicoletti; FERRON, Fabiana. Monografia Jurídica: uma abordagem didática.
Belo Horizonte: Del Rey, 2001.   

DAIUTO, Reynaldo Ribeiro. Introdução ao estudo do contrato. São Paulo: Atlas, 1995.      

DANZ, Erich. A interpretação dos negócios jurídicos. São Paulo: Saraiva & Cia, 1941.        

FIUZA, César. Direito Civil: curso completo.
2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.  

GOMES, Orlando. Contratos. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.           

LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil: fontes das obrigações - contratos. 4. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1991. v. 3.       

MAGALHÃES, Maria da Conceição Ferreira. A Hermenêutica Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1989.      

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: contratos, declarações unilaterais da vontade, obrigações por atos ilícitos. 31. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999. v. 5.      

RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade. 26. ed. rev. São Paulo. Saraiva, 1999. v. 3.       

THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios. Rio de Janeiro: Aide, 1993.

VIANA, Marco Aurélio S. Curso de Direito Civil: direito das obrigações II - contratos, declarações unilaterais de vontade, obrigações por atos ilícitos.
Belo Horizonte: Del Rey, 1996. v. 5.          

NOTAS

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[1] ANDRADE, Darcy Bessone de Oliveira. Do contrato, p. 230.     

[2] CAMILO, Carlos Eduardo Nicoletti; FERRON, Fabiana. Monografia Jurídica: uma abordagem didática, p. 4.   

[3] ANDRADE, Darcy Bessone de Oliveira. Do contrato, p. 236.     

[4] Diz-se econômico porque, certamente, os gastos com honorários advocatícios sairão mais em conta do que as custas de um longo processo judicial.      




VIAL, René.
Advocacia Preventiva. Disponível em http://pontojuridico.com/modules.php?name=News&file=article&sid=29. Acesso em 27 de set. de 2006.