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A Maioridade: uma visão interdiciplinar
João Batista Costa Pereira *
A questão da maioridade está
presente na vida do cidadão brasileiro desde a época do período imperial e faz
parte da própria história. Aliás, teve início com a campanha da maioridade para
conduzir D. Pedro II ao trono de imperador, então com apenas 14 anos de idade,
fato marcante não só pelo ineditismo da época, em que o direito era ditado
pelas Ordenações Filipinas e, portanto, ainda sob a influência lusitana, mas
também porque o fato veio contribuir para a mudança de rumos do poder político
do Brasil dos idos de 1840.
Acompanhando a tendência mundial da evolução que se observa em todas as formas
da atividade humana, a maioridade civil está para inaugurar idade nova no
Brasil. Medida atualmente pela exata idade de vinte e um anos, a partir de
janeiro de 2.003, quando entra em vigor o Código Civil de 2.002, esse
importante marco será rebaixado ao patamar dos dezoito anos, idade mais
consentânea com o atual nível de discernimento e maturidade do jovem do século
XXI. A gradativa redução da maioridade já incorporada ao dia-a-dia das pessoas
- por exemplo, dirigir automóveis, votar, trabalhar, casar, etc. - fez com que
a inovação promovida traga mais equilíbrio e uniformidade às relações jurídicas
envolvendo o direito em seus diversos ramos.
Sem esgotar o assunto, a monografia busca trazer à tona o resultado da evolução
conquistada pelo jovem com a idade de dezoito anos dentro da sociedade
hodierna, sopesando, de um lado, o benefício proporcionado pelo seu
amadurecimento quando lhe confere a plena capacidade, vale dizer, a
independência para gerir sua vida mais precocemente, e de outro, os ônus que
tal progresso acarretam, como o de se ver obrigado a trabalhar mais cedo para autosustentar-se e a enfrentar as dificuldades cotidianas
próprias de um cidadão independente. Tudo isso em uma visão
interdisciplinar, mesclando o direito civil com as demais legislações
existentes, sempre presente a melhor doutrina e a experiência emprestada
por renomados juristas e operadores de direito.
2 A MAIORIDADE NO CÓDIGO CIVIL DE 1.916
2.1 HISTÓRICO
Remonta à época da renúncia de D. Pedro I do trono de Imperador do Brasil, nos
idos de 1831, o início do episódio mais conhecido como o "golpe da
maioridade". Pressionado pela ala liberal e setores da elite, D. Pedro I
deixou o poder em meio a enorme crise institucional, passando o Brasil a ser
governado por uma regência escolhida pela Assembléia Geral, porquanto o
príncipe herdeiro - D. Pedro II - tinha apenas 6 anos
de idade.
Após a saída de D. Pedro I do poder, inúmeros conflitos e rebeliões fizeram
parte do cenário histórico. Interesses regionalistas, aliados ao extenso espaço
territorial que dificultava um controle adequado por parte do Regente, fizeram
com que memoráveis rebeliões populares eclodissem do Brasil. A Farroupilha no Rio
Grande do Sul (1835), a Cabanagem no Pará (1835), a Sabinada na Bahia (1837) e
a Balaiada no Maranhão (1838), marcaram o período regencial.
Diante do insucesso da descentralização ocorrida durante o período regencial,
palco de revoltas sociais, e também em função da agitação e desentendimentos
travados entre liberais e conservadores, cenário esse agravado pelos resquícios
de rebeliões ainda não debeladas totalmente, como a Farroupilha e a Balaiada,
urgia a tomada de medidas para acabar com tal estado de ânimo. A ala
capitalista constituída por proprietários de escravos e de terras mostrava-se
assustada com a malsucedida experiência da descentralização, exigindo maior
estabilidade política.
Assim, a idéia da maioridade, como forma de solução para a grave crise
política, através do restabelecimento da autoridade monárquica, ganhava força e
passava a amealhar o interesse das duas correntes - liberais e conservadores -
que, divergências de ideais à parte, nutriam interesse em participar da
organização do novo estado brasileiro. Para essas correntes era necessário
impor a ordem, que não se restringia apenas a acabar com a monarquia, mas, pelo
contrário, clamava-se pelo fortalecimento do poder central.
Avançava, assim, como ares de salvação nacional, o projeto de antecipação da
maioridade do menino Pedro de Alcântara, então com quatorze anos de idade.
Alguma providência já havia sido tomada para antecipar esse anseio, pois a
Constituição outorgada em 1824 fixava a maioridade do Imperador aos vinte e um
anos e o Ato Institucional rebaixava esse patamar para dezoito anos. No
entanto, era necessário retroceder ainda mais e fixá-la em quatorze anos, para
que fosse possível ao jovem príncipe assumir o comando do país ainda em 1840. A
idéia obteve apoio dos liberais, à espera de poder retornar ao governo, e dos
conservadores, que queriam consolidar a monarquia e preservar a unidade do
império, mesmo porque, no poder desde a nomeação do Regente Uno, não estavam
seguros da continuidade do regime regencial, dada a impossibilidade da
manutenção da ordem política. Por isso, visando antecipar ainda mais o lapso
superior ao previsto na Constituição e na lei subsequente,
o "golpe da maioridade" provocou a inauguração prematura do governo
pessoal do D. Pedro II.
Em outubro de 1840, por iniciativa do senador José Martiniano de Alencar, pai
do romancista José de Alencar, foi criada a Sociedade Promotora da Maioridade,
inicialmente secreta e mais tarde pública, que posteriormente
passou a chamar-se Clube da Maioridade, tendo como presidente Antônio
Carlos de Andrada, um dos líderes do Partido Progressista. Os conservadores
procuraram adotar medidas visando restaurar a mística da figura imperial, o
protocolo e as pompas reais nas solenidades públicas. Restabeleceu-se a prática
do "beija-mão", procedimento consistente numa saudação que
simbolizava o reconhecimento do Imperador por seus súditos.
A campanha, de início tímida, foi ganhando espaço, primeiro na Câmara, depois
no Senado, nas praças, enfim, tomou conta de todo o universo político-ideológico
do país. Mesmo diante da iminente vitória dos liberais, o governo regencial
procurou em vão retardar ao máximo o desfecho, tentando obstaculizar o processo
de votação do projeto de declaração da maioridade, com vistas à antecipação do
início do governo pessoal de D. Pedro II.
Assim, em 23 de julho de 1840 o jovem Príncipe prestou juramento na Assembléia
Geral "Juro manter a religião Católica Apostólica Romana, a integridade e
indivisibilidade do Império, observar e fazer observar a Constituição política
da nação brasileira, e mais leis do Império, e prover ao bem geral do Brasil,
quanto em mim couber", selando um processo que rendeu inúmeros embates e
divergências entre liberais e conservadores, mas que, ao final, restabeleceu a
paz no Império. A cerimônia de sagração e coroação de D. Pedro II como
Imperador do Brasil, então com 15 anos de idade, aconteceu no Rio de Janeiro,
em 18 de julho de 1841, em meio a cerimônias e festividades de grande pompa.
Foram gastos recursos de elevada monta dos cofres públicos para embelezamento
da cidade, em inúmeras obras.
Para alguns, na visão política, a maioridade foi um golpe
palaciano, que contou com a participação do próprio jovem Pedro de Alcântara,
culminando com a derrota dos conservadores e a volta dos liberais ao poder.
Vozes discordantes, porém, interpretaram o fato como uma manobra arquitetada
por correntes políticas dominantes, dentro de uma concepção idealista de
centralização do poder.
2.2 PESSOA
Antes de adentrar no assunto específico do presente trabalho, que é a
maioridade, torna-se necessário tecer considerações acerca da personalidade,
mais precisamente sobre a acepção jurídica do termo "pessoa".
É incerta a origem do vocábulo "pessoa". Etimologicamente, a corrente
mais aceita , originária da interpretação tradicional,
indica que a palavra pessoa vem do latim persona,
que, numa adaptação à linguagem teatral, significava máscara. Evoluindo, passou
a exprimir a atuação dos atores ou personagens, passando ao longo dos tempos,
para a vida real, na qual cada pessoa representa um papel, seja pai, filho,
empregado, comerciante, etc.
A partir de então o termo "pessoa" recebeu três acepções diferentes:
a) acepção vulgar -- incompatível com a linguagem jurídica --, em que o termo é
sinônimo de ente humano, não se adaptando, portanto, à linguagem jurídica, pois
as pessoas jurídicas não são pessoas humanas, mas tem uma conotação que lhes dá
a conformação de pessoa;
b) acepção jurídica, sendo pessoa o ente físico ou moral que tem aptidão
genérica para adquirir direitos e contrair obrigações. Existe um sujeito que
tem a função de exercer a titularidade, podendo tanto ser o homem - caso da
pessoa física, ou pessoa natural --, ou um agrupamento de homens ligados a um
interesse comum - caso da pessoa jurídica, ou pessoa coletiva.
c) acepção filosófica, que considera a pessoa como o
indivíduo agindo de modo consciente na realização da finalidade moral,
circunstância em que se considera o homem ou uma coletividade no sentido amplo
de pessoa.
Segundo a doutrina tradicional, o termo "pessoa" vem a ser o ente
físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações, aí também entendido
como sinônimo de sujeito de direito. Entende-se por sujeito de direito aquele que é sujeito de uma pretensão ou titularidade jurídica,
ou, em outras palavras, do poder de intervenção na produção da decisão
judicial. Kelsen tinha uma visão diferente, pois para
ele a pessoa é uma unidade personificada das normas jurídicas que lhe impõem
deveres e lhe conferem direitos. Entendia, pois, o significado de sujeito de
direito como um conceito auxiliar necessário à
facilitar a exposição do direito.
Assim, na linguagem jurídica, as expressões "sujeito de direito" e
"pessoa" são equivalentes e desdobram-se em duas realidades
fundamentais: os seres humanos, denominados pessoas físicas, pessoas naturais,
pessoas singulares, ou até pessoas de existência visível, e as instituições,
sejam públicas ou privadas, denominadas pessoas jurídicas, pessoas coletivas,
pessoas morais, ou pessoas de existência ideal, etc.
2.2.1 Pessoa natural
Enquanto o termo pessoa, isoladamente considerado, seja conceituado como o ente
físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações, pode-se dizer que
pessoa natural é um desdobramento daquele, ou seja, uma espécie do gênero
pessoa. Pessoa natural, segundo DINIZ, é o ser humano considerado como sujeito
de direitos e obrigações. É o termo adotado pelo Código Civil, embora existam
discussões doutrinárias quanto à correta denominação desse vocábulo. Teixeira
de Freitas, por exemplo, foi crítico a tal denominação, afirmando a
possibilidade de existir "pessoa não natural", sugerindo a alteração
para "ser de existência visível". O termo "pessoa física", mais utilizado nos meios tributários e econômicos,
também não é o adequado, vez que dá idéia do aspecto material do homem,
em detrimento de suas qualidade morais e espirituais. A pessoa natural,
portanto, considerada em conjunto com a pessoa jurídica, que
é a versão não corporificada dos atributos humanos -- também chamada de pessoa
coletiva, pessoa civil, pessoa intelectual, de existência ideal, etc. -
forma o elemento maior denominado pessoa em sentido lato.
Conforme previsto no artigo 4o do Código Civil de 1916, "a personalidade
civil do homem começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo desde a
concepção os direitos do nascituro". É necessário que haja a separação por
completo da criança do ventre materno para se configurar o nascimento, não se
admitindo o fenômeno enquanto permanecer o infante ligado à mãe pelo cordão umbilical.
Entretanto, não basta o simples fato do nascimento. É necessária a existência
de sinais inequívocos de vida por parte do recém-nascido, para que lhe seja
reconhecida a personalidade civil e se torne sujeito
de direitos. A segunda parte do art. 4o protege o direito do nascituro, levando
MONTEIRO a afirmar que a aquisição da personalidade acha-se sob a dependência
de condição suspensiva, que é o nascimento com vida. Trata-se, entretanto, de
uma discussão polêmica, dividindo-se a doutrina e a jurisprudência em duas
vertentes. A primeira defende a concessão da personalidade ao nascituro desde a
concepção, ficando seus direitos, em geral, condicionados ao ulterior
nascimento com vida. A segunda vertente admite a personalidade apenas a partir
do nascimento com vida, cabendo, porém, resguardar eventuais direitos do
nascituro. Ficou o Código Civil de 1916 com esta segunda opção, o que não deixa
de ser uma posição destituída da necessária clareza jurídica, revelando uma
certa vacilação do legislador para tratar do assunto em sua essência. O direito
comparado também se divide no posicionamento de duas escolas, uma das quais - a
exemplo de nosso ordenamento jurídico - mantém-se a favor da fixação do início
da personalidade jurídica com o nascimento, reservando para o nascituro uma
expectativa de direitos. A outra corrente pende por fazer coincidir a vida
jurídica com a vida física, estabelecendo-se como extremos a
concepção e a morte.
Com relação ao fim da personalidade, esta se dá com sua morte, tal como expresso
no artigo 10 do Código Civil de 1916: "A existência da pessoa natural
termina com a morte", a partir do que extinguem-se
seus direitos de personalidade. A lei prevê ainda casos especiais, como a morte presumida, em casos dos ausentes e desaparecidos, e
a comoriência, que ocorre com a morte simultânea de
duas ou mais pessoas.
2.2.2 Personalidade jurídica
Para BEVILÁQUA "personalidade jurídica é a aptidão, reconhecida pela ordem
jurídica a alguém, para exercer direitos e contrair obrigações". Tal conceito
é ampliado por Sílvio Rodrigues, que afirma ser a aptidão para adquirir
direitos e assumir obrigações na ordem civil. Assim, a personalidade jurídica
(ou civil) confere ao indivíduo a capacidade de direito. Convém fazer uma
distinção entre personalidade jurídica e direitos da
personalidade. Enquanto a personalidade jurídica é a aptidão para
adquirir direitos e contrair obrigações, direitos da personalidade são os
direitos propriamente ditos que a pessoa tem (direitos subjetivos) de defender
sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo
alheio vivo ou morto, partes separadas do corpo vivo
ou morto), intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística
e literária) e moral (honra, recato, segredo pessoal, profissional, e
doméstico, imagem, identidade pessoal, familiar e social).
TELLES JÚNIOR considera os direitos da personalidade como os direitos
subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a identidade, a
liberdade, a sociabilidade, a reputação, a honra, a autoria, etc.
2.2.3 Estado
Proveniente do latim status, a expressão estado , que
era utilizada pelos romanos na designação dos predicados da personalidade,
tinha como escopo a circunstância de tornar os homens como sujeitos de direito
na sociedade civil. O estado era considerado sob três aspectos: liberdade
(status libertatis), cidade (status civitatis) e família (status familiae),
os quais, somente quando possuídos em conjunto pelo cidadão poderiam lhe
conferir a condição de caput civile. Por outro lado,
se se perdesse qualquer dos três atributos,
configurava-se a capitis deminutio
(diminuição da capacidade), expressão sujeita ainda à gradação máxima, média e
mínima, dependendo do grau de importância de perda.
Das três modalidades de estado oriundas do direito romano, apenas duas - a
nacionalidade e família -- sobreviveram no direito moderno, abstraindo-se a
liberdade, diante do fato consagrado universalmente de que na atualidade todos
os cidadãos são livres e capazes de direitos e obrigações.
O sentido de estado (status) está estreitamente ligado ao de capacidade.
Para DINIZ, estado "é a soma das qualificações da pessoa, permitindo sua
apresentação na sociedade, em dada situação jurídica, para que possa usufruir das vantagens e sofrer os ônus dela
decorrentes."
Hodiernamente, o estado das pessoas comporta classificação de três modos
distintos: estado político, familiar e individual. O estado político diz
respeito à situação jurídica do indivíduo dentro de uma sociedade politicamente
organizada (nação). O estado familiar refere-se à posição que a pessoa ocupa
dentro da família. O estado individual é a essência da pessoa no que diz
respeito à sua constituição orgânica, ai incluído o sexo, a idade e a
capacidade.
O estado individual é um dos atributos da personalidade, tal como a capacidade,
o nome e o domicílio. É a maneira de ser da pessoa no que se refere à idade,
sexo e saúde mental e física, ou seja, estão intimamente ligados à capacidade
civil.
2.3 CAPACIDADE
Capacidade é a maior ou menor extensão dos direitos de uma pessoa, entendido
que sob o ponto de vista jurídico todos são igualmente dotados de
personalidade, mas nem todos têm a mesma capacidade jurídica. Nesse
entendimento, a capacidade jurídica das pessoas estende-se aos diversos setores
da vida jurídica, como a capacidade civil, comercial,
penal, política, etc. Daí advém a adequação que o ordenamento jurídico prevê às
variadas classes de atividades, atribuindo-lhes os parâmetros cabíveis em
função dos setores individualizados. Por exemplo, a capacidade penal tem toda
uma legislação específica quando se trata da fixação da pena em função da idade
do agente. Da mesma forma a capacidade eleitoral, e assim por diante.
MONTEIRO define a capacidade como "a aptidão para ser sujeito de direitos
e obrigações e exercer, por si ou por outrem, atos da vida civil". O termo
capacidade é empregado em dois sentidos: capacidade de direito (ou de gozo), e
capacidade de fato (ou de exercício). Capacidade de direito
praticamente todos têm, com raras exceções; capacidade de fato, nem
todos, pois existem restrições diversas. Um exemplo para distinguir uma de
outra pode ser expresso na herança. Um menor recém nascido tem capacidade de
direito ao herdar um bem (capacidade de direito). No entanto, para alienar esse
bem, dependerá de representação de outra pessoa, na forma da lei (capacidade de
fato).
2.3.1 Capacidade de direito e capacidade de fato
A capacidade de direito é inerente à pessoa e a ela não pode ser recusada,
porque pode destituí-la dos atributos da personalidade. Desde seu nascimento
até sua morte, todo ser humano dispõe de capacidade de direito. Tal é o
preceito do art. 2o do atual Código Civil: "todo homem é capaz de direitos
e obrigações na ordem civil".
A capacidade de fato está contida na capacidade de direito, já que não se pode
exercer um direito sem tê-lo, sendo, portanto, impossível conceber a primeira
sem a segunda. No entanto, não se pode afirmar o contrário. Assim, fica claro
que as limitações ao exercício da capacidade de fato estão ligadas ao estado da
pessoa, sejam de ordem física ou jurídica. Tais limitações levam à
incapacidade, podendo este termo ser melhor entendido
quando se adquirir um direito mas não se pode exercê-lo.
Enquanto a capacidade de direito pressupõe a todo ser humano, desde o
nascimento até a morte, a prerrogativa de ser titular de direitos - sem contudo, significar que tais direitos possam ser exercidos
pelo próprio titular - a capacidade de fato, também conhecida por capacidade de
exercício, permite ao cidadão exercer tais prerrogativas pessoalmente, sem
intermediação de outrem. Em outras palavras, embora o ser humano tenha
capacidade para ser titular de direitos e obrigações na ordem civil, isto não
significa a possibilidade de todos, pessoalmente, exercerem tais direitos . Daí a necessidade de distinguir entre capacidade
de direito, que é a de ser, pura e simplesmente, titular de direitos, e
capacidade de fato, que é a de exercer tais direitos pessoalmente. Portanto,
pode-se afirmar que a capacidade de direito é garantida, sem limites, pelo
ordenamento jurídico ao ser humano, mas a capacidade de fato fica condicionada
a requisitos legais que prevejam casos de incapacidade. Isso porque a lei, em
seu papel de tutelar os interesses do cidadão, presentes as
condições de desenvolvimento intelectual, idade ou saúde de determinadas
pessoas, impõe limitações ao exercício pessoal desses direitos. Essa classe de
pessoas, a lei classifica de incapazes. Assim, se o ordenamento jurídico
garante a capacidade de direito, a capacidade de fato não segue o mesmo
destino, dependendo de requisitos legais que regulam situações de incapacidade.
É importante destacar que incapacidade de fato não suprime a capacidade de
direito, uma vez que esta pode ser suprida pela representação.
2.4 INCAPACIDADE
Se a capacidade é a aptidão para ter direitos e obrigações, a incapacidade é o
inverso, ou seja, a inaptidão para o exercício de direitos previstos na lei. Em
outras palavras, é a inexistência dos requisitos legais em uma pessoa para que
possa exercer seus direitos.
Na visão de DINIZ "a incapacidade é a restrição legal ao exercício dos
atos da vida civil, devendo ser sempre encarada estritamente, considerando-se o
princípio de que a capacidade é a regra e a incapacidade, a exceção". Como
toda incapacidade decorre de previsão legal, não se incluem como tal eventuais limitações ao exercício de direitos
provenientes de ato jurídico inter vivos ou causa mortis,
bem assim a proibição legal de se contrair determinados negócios jurídicos. Um
exemplo da exceção é o caso do doador que, gravando o bem doado de
inalienabilidade, deixará o donatário proibido de dele dispor. Também é assim
quando se proíbe ao ascendente vender bens ao descendente sem o consentimento
dos demais descendentes. Trata-se, pois, de impedimentos específicos para a
prática de determinados atos jurídicos, não se configurando
incapacidade do agente que os venha desempenhar, porquanto em pleno
exercício de seus direitos civis.
A lei, através dos artigos 5o e 6o do Código Civil de 1.916 trata dos
incapazes, dividindo-os em absoluta e relativamente incapazes. O aspecto
diferenciador de uma e outra está relacionado à idade imatura e à deficiências de ordem física ou mental.
Para RODRIGUES, o legislador, ao incluir na classe dos incapazes as pessoas
desprovidas de determinadas condições, com um conseqüente regime legal
privilegiado, teve a preocupação de dispensar-lhes especial proteção,
objetivando a preservação de seus interesses. Tal é a situação do menor,
desprovido do discernimento e maturidade para fazer seu próprio juízo; do
pródigo, que não possui o senso preciso para preservar seu patrimônio; do amental, carecedor da faculdade para decidir o que lhe
convém.
2.4.1 Incapacidade absoluta
Basicamente, são absolutamente incapazes aqueles que não podem praticar
quaisquer atos jurídicos por si mesmos, ou seja, quando houver total proibição
ao exercício do direito, ficando esses atos sujeitos à nulidade, pois que, uma
vez destituído de sua autonomia de vontade, não têm os atos qualquer efeito no
mundo das relações jurídicas. As causas da incapacidade absoluta estão ligadas
ao estado individual da pessoa, que são a idade e a saúde. Com efeito, como bem
expressa o art. 145, I, do Código Civil, é nulo o ato jurídico praticado por
pessoa absolutamente incapaz, vez que, sendo impedido de manifestar sua
vontade, é como se esta não existisse. Para DINIZ, a incapacidade será absoluta
quando existir total proibição do exercício do direito pelo incapaz,
acarretando, se houver violação do preceito, a nulidade do ato. Assim
considerado, os absolutamente incapazes, conquanto disponham de direitos, ficam
vedados de exercê-los direta ou pessoalmente, cabendo em tais situações, serem
representados.
O ordenamento jurídico admite também como incapacidade a ausência e a
condenação penal. Tanto o ausente como o condenado estão
impedidos de exercer por si sós os atos da vida civil. O ausente porque seu
desaparecimento do domicílio enseja a necessidade da nomeação de outrem para
administrar seus bens. O condenado pelo fato de sua separação compulsória da
sociedade o impedir de exercer seus atos civis. Tecnicamente, contudo, não se
deve considerá-los como incapazes. Diz o art. 5o do Código Civil de 1.916:
"São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida
civil:
I - os menores de 16 (dezesseis) anos;
II - os loucos de todo gênero;
III - os surdo-mudos, que não puderem exprimir a sua vontade;
IV - os ausentes, declarados tais por atos do juiz."
Interessa para este trabalho o inciso I, que trata os menores de 16 anos como
absolutamente incapazes para exercer os atos da vida civil. São
assim considerados em função de seu ainda pequeno desenvolvimento mental e por
não estarem adaptados à vida social. Antes, no direito pré-codificado
eram os impúberes, porque não contavam ainda com aptidão para procriar.
MONTEIRO assim se refere, relativamente ao inciso I acima: "
considera-os o Código civilmente incapazes, não porque privados de
aptidão para procriar, como se expressava o direito anterior, mas em razão de
seu exíguo desenvolvimento mental, de sua reduzida adaptabilidade à vida
social."
Um pouco diferente é a concepção do inciso I do citado artigo para GOMES, que
assim se expressa:
Até certa idade, presume-se que o homem não possui o discernimento indispensável
ao exercício pessoal dos direitos. A determinação do limite no qual essa
presunção não deve mais vigorar, varia nas legislações. Dois critérios podem
ser adotados para a sua fixação: o fisiológico e o social. Pelo primeiro, a
incapacidade absoluta deveria cessar com a puberdade. Pelo segundo, o que se
leva em conta é a experiência dos negócios (Oertmann).
Presume-se que o homem a adquira ao atingir certa idade, em vista do seu
desenvolvimento mental. Até essa idade deve ficar afastado da atividade
jurídica. (GOMES, 2001, p. 173)
2.4.2 Incapacidade relativa
Refere-se a incapacidade relativa àquelas pessoas que,
para praticar por si determinados atos da vida civil, dependem de assistência
de uma terceira pessoa, ligada pelo direito positivo em razão de parentesco, de
designação judicial ou mesmo de relação de ordem civil. VENOSA melhor delimita
a incapacidade relativa ao observar que esta, ao contrário da incapacidade
absoluta, não afeta a aptidão para o gozo de direitos, uma vez que o exercício
será sempre possível com a assistência de outrem. Entende a lei que, nesses
casos, a deficiência é menor do que aquela que atinge os absolutamente
incapazes; procura a lei proteger apenas a feitura de certos atos; restringe o
âmbito de atuação dos relativamente capazes; exige a assistência de outra
pessoa ou determina certa maneira pela qual alguns atos devam ser praticados.
Assim, um pouco mais amena em relação à incapacidade absoluta - que priva a
atuação da pessoa na vida civil - a incapacidade relativa situa-se em uma zona
intermediária, como se fosse a metade do caminho entre a total inaptidão e o
perfeito desenvolvimento intelectual. Assim, a incapacidade relativa poderá ser
mitigada pela utilização da assistência de outrem. A atuação da lei tem a condão
de suprir aquela parcela de deficiência, seja impedindo a prática de alguns
atos, seja determinando opção mais adequada para outras situações.
Há, contudo, alguns atos que os relativamente incapazes podem praticar
independentemente de autorização.
Estabelece o artigo 6o do Código Civil de 1.916 relativamente à incapacidade
relativa:
"São incapazes, relativamente a certos atos
(artigo 147, I) ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de 16 (dezesseis) e os menores de 21 (vinte e um) anos (arts. 154 a 156);
II - os pródigos;
III - os silvícolas.
Parágrafo Único. Os silvícolas ficarão sujeitos ao regime tutelar, estabelecido
em leis e regulamentos especiais, o qual cessará à medida que se forem
adaptando à civilização do País.
Relativamente ao inciso I, submetem-se à regra legal os maiores de dezesseis e
menores de vinte e um anos em razão de fatores ligados à pouca experiência e
insuficiente desenvolvimento mental, circunstância impeditiva de sua plena
participação na vida civil. Como é mais acentuado o discernimento nessa faixa
etária, o Código procurou reduzir-lhes a incapacidade, amenizando porém essa
limitação ao conferir-lhes o exercício de determinados direitos a partir dos
dezoito anos, para, finalmente, aos vinte e um anos
considerá-los plenamente aptos ao exercício dos direitos civis, cessando,
portanto, nessa idade, a incapacidade.
Desse modo, o menor entre dezesseis e vinte e um anos pode
livremente praticar os seguintes atos, segundo MONTEIRO:
a) servir de testemunha, inclusive em testamentos (artigos 142-III e
1650-I do CC);
b) testar (artigo 1627-I do CC);
c) ser mandatário (artigo 1298 do CC);
d) equiparar-se ao maior nas obrigações resultantes de atos ilícitos (artigo
156 do CC);
e) não se eximir de obrigação quando ocultar dolosamente sua idade (artigo 155
do CC);
e) alistar-se como eleitor, facultativamente entre dezesseis e dezoito anos
(artigo 14, par. 1o-II-"c" da CF).
Pode também, o menor entre dezoito e vinte e um anos:
a) casar (para mulher a idade é de dezesseis anos, conforme artigo 183,
XII do CC);
b) requerer pessoalmente e isento de multa o registro de seu nascimento (artigo
50, par. 2o da Lei 6.015/73;
c) pleitear perante a justiça do trabalho, sem assistência de pai ou tutor
(artigo 792 da CLT);
d) exercer o direito de queixa, renúncia e perdão no Juízo criminal (artigos
34, 50, par. único, e 52 do Código Penal);
e) comerciar (artigos 1o, II e 5o do Código Comercial, e 3o, II do Dec. Lei no.
7.661/45);
f) alistar-se como eleitor (artigo 14, par. 1o, I, da CF).
Com relação ao efeitos jurídicos, a incapacidade
relativa gera a anulabilidade do ato praticado sem a devida assistência, na
forma prevista no art. 147, I do Código Civil de 1.916.
É interessante a diferença de intensidade: enquanto a incapacidade absoluta
impede o menor de realizar o ato jurídico, a incapacidade relativa não afeta a
aptidão para o exercício do direito, apenas exige a assistência de pais ou
tutores.
2.4.3 Proteção aos incapazes
A proteção legal para casos de incapacidade absoluta está no instituto da
representação, através do qual é dado aos incapazes a devida
segurança, seja em relação a sua pessoa ou ao seu patrimônio, e o que é mais
importante, propiciando a essa classe de pessoas o exercício de seus direitos.
No entanto, nem todos os casos são atendidos pela representação. Existem
situações em que a incapacidade absoluta priva também a pessoa do gozo dos
direitos que somente ela própria poderia exercer, vedando-se, pela natureza
personalíssima, o exercício das representação. São os
casos, dentre outros, do direito de casar, de testar e de reconhecer filho
natural.
Assim, além da representação, a assistência e a autorização são os institutos
que protegem juridicamente os incapazes, dando-lhes segurança, seja em relação
à sua pessoa ou ao seu patrimônio, de modo a que possam exercer seus direitos.
Ocorrendo conflito de interesses entre o absolutamente incapaz e seu
representante, ou entre o relativamente incapaz e seu assistente, necessário será a nomeação de um curador especial pelo juiz,
visando a proteção ao menor, conforme estabelece o artigo 148, VII, parágrafo
único, da Lei 8.069/90.
Existem algumas medidas tutelares que tem o objetivo de defender os interesses
dos incapazes, segundo DINIZ , dentre as quais
destacam-se:
a) não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes;
b) não pode ser reavido o mútuo realizado com menor, salvo as exceções do art.
1260 do Código Civil;
c) possibilidade de o menor recobrar dívida de jogo que voluntariamente pagou
(art. 1477 do Código Civil);
d) possibilidade de tornar válido o pagamento feito a um incapaz, desde que
provado que reverteu em proveito dele (incapaz) a importância paga (art. 157 do
Código Civil);
e) vedação aos incapazes de fazer partilha amigável (art. 1773 do Código
Civil);
f) tipificação como circunstância agravante crime cometido contra menor;
g) possibilidade de menores entre 18 e 21 anos requerer, pessoalmente, o
registro de seu nascimento (art. 50, par. 2o da Lei 6015/73).
Reprimido pelo artigo 173 do Código Penal, com pena de reclusão de dois a seis
anos e multa, constitui delito de abuso de incapazes, "abusar, em proveito
próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência de menor, ou da
alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à prática de
ato suscetível de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de
terceiro".
Outra forma de proteção aos incapazes está na prerrogativa que a lei coloca à
sua disposição visando fulminar de nulidade, ou conferir-lhes ação anulatória
para tornar ineficaz quaisquer atos por eles praticados sem a representação ou
a assistência de seu representante.
2.4.4 Cessação da incapacidade
A incapacidade, via de regra, cessa quando desaparecem os motivos que a
determinaram. No que tange à menoridade, a incapacidade termina quando se
atinge a maioridade, através dos vinte e um anos completos ou através da
emancipação, que pode ser concedida pelos pais, desde que conte com idade
mínima de dezoito anos, ou pela emancipação de pleno direito, na forma do art.
9o do Código Civil de 1.916:
"Aos 21 (vinte e um) anos completos acaba a menoridade, ficando habilitado
o indivíduo para todos os atos da vida civil.
Par. 1o - Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - por concessão do pai, ou, se for morto, da mãe, e por sentença do juiz,
ouvido o tutor, se o menor tiver 18 (dezoito) anos cumpridos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau científico em curso de ensino superior;
V- pelo estabelecimento civil ou comercial, com economia própria.
Par. 2o - Para efeito do alistamento e do sorteio militar cessará a
incapacidade do menor que houver completado 18 (dezoito) anos de idade.
Destaque-se que a idade núbil para a mulher é
dezesseis anos, e dezoito para o homem, ocorrendo, com o casamento, a
emancipação. A lei, ao admitir a possibilidade do casamento com a devida
autorização dos pais ou responsáveis, pressupõe que já foi atingido o
necessário grau de discernimento e maturidade a ponto de possibilitar a
regência dos atos da vida civil. Essa prerrogativa visa evitar a ocorrência de
situação vexatória para o jovem casado que, diante da necessidade de praticar
qualquer ato, viesse a depender da autorização do pai ou responsável. Daí o
motivo por que, uma vez alcançada a maioridade através do casamento, não há
retorno à situação anterior de incapacidade relativa, dando-se o ato por pleno
e acabado.
VENOSA conceitua a emancipação como sendo " a
aquisição da capacidade civil antes da idade legal".
Além dos casos mencionados, onde a maioridade apenas é atingida com a idade de
vinte e um anos, existem ainda determinados atos que os menores podem praticar
livremente, previstos em legislação específica, tais como a maioridade
eleitoral, idade limite para o serviço militar, habilitação para dirigir
veículos automotores, etc.
A jurisprudência tem-se mostrado favorável à continuidade da responsabilidade
civil dos pais pelos atos ilícitos do filho emancipado, conforme demonstrou
GOMES:
"Embora o artigo 9o, parágrafo 1o, inciso I, do
Código Civil reconheça a plena capacidade civil do menor legalmente emancipado,
por ato de vontade paterna, nota-se na jurisprudência uma tendência a conservar
a responsabilidade civil solidária dos pais pelos atos ilícitos do filho
enquanto não completar os vinte e um anos de idade, o que não deixa de ser uma
incongruência, porquanto com a emancipação escapa o menor de todo poder e
controle do genitor. E a responsabilidade civil do pai pelos atos do filho pressupõe, segundo o artigo 1.521 do Código Civil,
falha no exercício do dever de guarda do menor sujeito a seu pátrio poder." (GOMES, 2001, p. 175)
2.5 MAIORIDADE CIVIL
Na legislação atual, maioridade civil é a prerrogativa conferida a quem
completar vinte e um anos de idade e poder praticar todos os atos da vida
civil. É um preceito hermético, não admitindo interpretação extensiva, de sorte
que, mesmo se demonstrando capacidade de uma pessoa com idade inferior a vinte
e um anos, ela não poderá exercer a plenitude da maioridade, a não ser através
da emancipação.
O Código Civil de 1.916 foi elaborado em uma época completamente diferente dos
dias atuais. O jovem com vinte e um anos de idade não dispunha das mínimas e
rudimentares condições de conhecimento, não existiam os meios de comunicação de
hoje, como TV e Internet. As revistas eram reduzidas, a propagação de notícias
era morosa, e a educação restrita a uma parcela mínima da população. A
violência era comparativamente pequena e os índices de criminalidade não
atingiam níveis preocupantes.
Dentro desse contexto foi estipulada a maioridade civil em vinte
e um anos.
O jovem daquela época não tinha o conhecimento dos de hoje, como também não era
maduro o suficiente para distingüir, com clareza, o
caráter lícito e ilícito de determinados atos e seu senso de responsabilidade
era ainda insipiente.
O legislador adotou o critério biológico para a determinação da idade limite da
maioridade, significando que apenas e tão-somente a idade do agente é o fator
determinante, independentemente de capacidade psíquica.
2.5.1 Maioridade eleitoral
Atualmente a capacidade eleitoral para exercer o direito ao voto é compulsória
aos dezoito anos, conforme previsto no artigo 14, parágrafo 1º, inciso I.
O artigo 14, parágrafo 1o, inciso II, alínea "c" da Constituição
Federal confere a capacidade eleitoral ativa aos jovens com idade entre
dezesseis e dezoito anos, em caráter facultativo, permitindo-lhes votar em
candidatos para qualquer cargo público eletivo, desde vereador a presidente da
república. Evidentemente, como se trata da possibilidade de desempenhar uma
atividade de absoluta importância no contexto social e político do país,
somente quem dispõe de reconhecido nível de maturidade mental e intelectual
pode exercê-la.
2.5.2 Direito comparado
No direito comparado a maioridade é alvo de
significativas e variadas características. O código civil
argentino, inspirado no modelo de Teixeira de Freitas, fixa a idade
inferior a quatorze anos para a completa impossibilidade de atos civis. O
código alemão tem por absolutamente incapaz o menor de sete anos, iniciando a
partir dessa idade a possibilidade do exercício de alguns atos, limitado,
porém, à necessidade de consentimento de representantes até completar dezoito
anos. O código francês não distingue a capacidade relativa ou absoluta,
atribuindo ao juiz a tarefa de analisar e decidir a idade do discernimento. O
código italiano prevê a cessação da incapacidade civil aos dezoito anos,
observadas algumas exceções.
3 MAIORIDADE PENAL
Atualmente a maioridade penal é atingida aos dezoito anos, o que significa
dizer que o jovem, antes de completar essa idade, é considerado inimputável,
sujeitando-se a uma penalidade mais branda. De acordo com o artigo 228 da
Constituição Federal, "são penalmente inimputáveis os menores de dezoito
anos, sujeitos às normas da legislação especial". Idêntica previsão legal
encontra-se no artigo 27 do Código Penal. As normas de legislação especial
mencionadas pela Carta Magna estão consubstanciadas na Lei
8.069/90, também conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), cujo art. 104 fixa a idade de dezoito anos como limite para a
inimputabilidade do menor.
3.1 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA (Lei no. 8.069/90)
Criado em decorrência de exigência prevista na Constituição Federal de 1.988 e em
substituição ao Código de Menores, o ECA tem como
objetivos, de um lado, garantir direitos fundamentais - vida, saúde, educação,
recreação, trabalho, assistência social -, reconhecendo os direitos dos jovens,
e de outro, estabelecer responsabilidade estatutária juvenil (enquanto os
maiores de 18 anos têm responsabilidade penal, os adolescentes têm
responsabilidade estatutária juvenil), sujeitando adolescentes a medidas
sócio-educativas.
O Estatuto da Criança e do Adolescente objetiva também, como medida preventiva
da delinqüência, assegurar os direitos fundamentais de saúde, educação,
recreação, profissionalização e assistência social, através de ações que podem
ser movidas contra os pais, responsáveis, inclusive contra o Estado.
As medidas sócio-educativas vão desde advertência, obrigação de reparar o dano,
prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, regime de semiliberdade até a privação de liberdade, exigindo-se
flagrante ou ordem escrita e fundamentada do juiz. A internação, portanto, é a
resposta concebida pelo ECA a uma maior periculosidade
do adolescente, verificada, em cada caso concreto, pela grave ameaça ou
violência a pessoa cometida por este. As medidas sócio-
educativas, mais especificamente no que se refere à internação, tem uma grande
diferença em comparação à prisão propriamente dita aplicada ao maior de dezoito
anos. A circunstância que distingüe fundamentalmente
uma da outra, segundo o Juiz SARAIVA está relacionada com local do cumprimento
da sanção. Enquanto o maior de idade cumpre pena no sistema penitenciário, onde
se misturam criminosos de graus de comprometimento e espécies diferentes, cujo
objetivo único aparente é o de encarcerar, a internação aplicável ao menor é
cumprida em estabelecimento próprio para adolescentes, dentro de um programa
especial de educação escolar, profissionalização, com assistência pedagógica e psicoterápica, tudo em consonância com critérios
previamente analisados dentro dos padrões internacionalmente definidos. A
diferença, comparativamente ao adulto, está no fato de que maiores de 18 anos,
pelos crimes, se submetem às penas criminais de multa, prestação de serviços à
comunidade, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana e
privação de liberdade, ao passo que os adolescentes se sujeitam às medidas
sócio-educativas. Tal punição, portanto, difere da dos adultos, porquanto de
caráter predominantemente pedagógico, de menor duração e cumprida em
estabelecimento próprio, de caráter educacional. Além disso, o Estatuto
privilegia as medidas restritivas de direitos, deixando a privação de liberdade
para os casos graves, com a diferença de serem cumpridas em estabelecimento
destinado a jovens e acompanhadas de medidas educativas e protetivas
abrangendo a própria família. Daí por que a denominação - internação - muito
mais branda e com caráter de atendimento voltado às pessoas que contam com o
desenvolvimento de seu intelecto ainda em andamento.
3. 2 DIREITO COMPARADO
A maioria dos países adota legislações específicas para evitar a impunidade.
Não existe uniformidade de procedimentos, dependendo do grau de tolerância de
cada nação para fixar parâmetros para a determinação da idade penal. Na França,
por exemplo, a maioridade penal é de 18 anos, mas jovens a partir dos treze e
até os dezoito anos podem ser penalizados.
Na Inglaterra, a maioridade penal é de vinte e um anos para crimes comuns.
Tratando-se de crimes hediondos o infrator é penalizado a partir dos 10 anos.
Já nos Estados Unidos, verifica-se divergências de
legislações nos 50 estados, sendo que em 18 deles os jovens que cometerem crime
grave podem ser responsabilizados a partir dos 14 anos, equiparando-se, nessa
condição, àquele que conta com 18 anos, considerada a maioridade. Em Portugal o
jovem pode ser condenado a partir dos 16 anos, o mesmo ocorrendo na Argentina,
Espanha, Bélgica e Israel. Na Alemanha e Haiti, a partir dos 14 anos.
O quadro seguinte ilustra o limite para a imputabilidade penal, em crimes mais
graves em alguns países do mundo
Idade a partir da qual os menores podem ser julgados em crimes mais graves
México 6 anos
África do Sul 7 anos
Escócia 8 anos
Inglaterra 10 anos
França 13 anos
Itália 14 anos
Japão 14 anos
Alemanha 14 anos
Egito 15 anos
Argentina 16 anos
Colômbia 18 anos
3.3 CORRENTES A FAVOR DA REDUÇÃO
Diversas entidades e organizações vêm, cada vez mais, somando forças
objetivando reduzir a idade penal. O argumento que mais encontra eco no meio
jurídico e também junto à população decorre da excessiva elevação do número de
crimes praticados por menores na faixa etária dos 14 aos 18 anos de idade.
Outro argumento muito utilizado é ligado à eficácia do ECA
(Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069/90). Para muitos juristas, o ECA falha por não punir com a desejável medida os delitos
praticados pelos adolescentes, fazendo com que, pela sua brandura e
condescendência, seja estimulada a prática criminosa. A pena que se aplica em
casos extremos é a da internação em instituições apropriadas por um período de,
no máximo, três anos, a partir do que o infrator passa a ser encarado sem
nenhuma restrição, ou seja, sem antecedentes, não importando a gravidade do
crime praticado.
No artigo intitulado "O menor delinqüente", o Professor Leon Frejda Szklarowski afirma que
"não se justifica que o menor de dezoito anos e maior de quatorze anos
possa cometer os delitos mais hediondos e graves, nada lhe acontecendo senão a
simples sujeição às normas da legislação especial. Vale dizer: punição
zero".
A questão da maioridade eleitoral é também um dos motivos a que se apega a
corrente defensora da redução da idade penal. A propósito, o mesmo legislador
constituinte que concluiu pela maturidade do jovem para escolher um presidente
da república -- vale dizer, estar apto nessa perspectiva a assimilar a
seriedade do mandato de que foi investido como eleitor, presentes a lucidez e o
discernimento exigidos --, deixa de considerar o mesmo jovem como responsável
pela prática de condutas delituosas, enquadrando o menor de dezoito anos como
inimputável, tal como expresso no artigo 228 da Magna Carta.
Assim, para a caracterização da idade penal, portanto, a mesma Constituição,
que de um lado reconhece a compleição intelectual do jovem entre dezesseis e
dezoito anos de idade, repele esse avanço até então admitido, ao considerá-lo
ainda imaturo e destituído do discernimento necessário para entender o caráter
ilícito da prática de crimes. Diante dessa antinomia principiológica
cometida pelo próprio poder constituinte, a pergunta que se faz, então, é como
pode um jovem ter discernimento para votar, por exemplo, em um presidente da
república, mas ao mesmo tempo não tem esse mesmo discernimento para saber que é
proibido praticar determinados crimes e ser responsabilizado por isso. Fica no
ar a indagação do que seria mais complexo para o jovem de dezesseis anos
entender: toda a importância dos poderes executivo, legislativo e judiciário
dentro do contexto maior da república, com as funções específicas do processo
eleitoral, ou ter conhecimento de que atos como matar,
roubar, seqüestrar, etc. são nocivos, proibidos pelo atual ordenamento
jurídico e sujeitam o infrator a ir para a cadeira no caso de praticá-los?
Cristalino e evidente fica aos olhos do cidadão comum que o processo eleitoral
é o mais complicado, daí a necessidade da revisão do ponto de vista
constitucional no que pertine à maioridade penal.
Esse pensamento no sentido de reduzir a maioridade penal perdura há mais de uma
década. Expressando-se com relação à possibilidade de o jovem poder exercer o
direito do voto a partir dos dezesseis anos, o Professor e jusfilósofo
Miguel Reale, responsável maior pela criação do Novo
Código Civil, já afirmava, em 1.990, a necessidade da mudança na área penal,
relacionando-a com a recente novidade que o legislador-constituinte houvera
inserido na Constituição de 1.988 ao abreviar a idade eleitoral do brasileiro.
Pesa também contra a atual idade penal o fato de criminosos estarem usando, na
prática de assaltos seguidos de morte, menores entre quatorze a dezoito anos,
na certeza de que estes não vão para a cadeia. É comum a imprensa noticiar, em
escala sempre crescente, a participação de menores em crimes
hediondos, desde homicídio qualificado, tráfico de entorpecentes,
extorsão mediante seqüestro, estupro, até latrocínio, quase sempre em concurso
com maiores de idade, que lhes servem de mentores e aos quais acabam se
tornando uma espécie de escudo, na medida em que assumem sua parcela de culpa.
3.3.1 Propostas de Emendas à Constituição Federal (PEC)
Atualmente encontram-se em tramitação no Congresso Nacional diversos projetos
de emenda à Constituição propondo a redução da idade penal dos atuais dezoito
anos para idades que variam de onze até dezesseis anos. Existe uma proposta que
prevê a responsabilização penal de jovens a partir dos onze anos de idade. Segundo
esse projeto, menores a partir dessa idade poderiam responder pelo delito
praticado, desde que, após submetidos a perícia
psicológica e psiquiátrica, sejam declarados desenvolvidos intelectual e
emocionalmente, vale dizer, se equiparariam aos "maiores" do ponto de
vista psíquico-emocional.
O Deputado Alberto Fraga (PMDB-DF), autor do projeto, defende em artigo
publicado no jornal Folha de São Paulo, edição de 16.12.00, que os adolescentes
já teriam adquirido amadurecimento necessário e suficiente autonomia moral para
adequar-se ao pretendido rebaixamento da idade penal. A redução da idade para a
imputabilidade estaria, assim, em sintonia com os avanços obtidos pela
modernização da sociedade. A dificuldade na implementação desse sistema --
aliás, já tentado algo parecido em 1.969, através da edição do Decreto-lei
1.004/69 - residiu na impraticabilidade da execução dos exames em todo menor
que viesse a cometer quaisquer delitos, que fatalmente redundaria em atraso da
solução dos processos, congestionando a rede pública e obstáculo à solução dos
conflitos. Sem falar na falta de profissionais habilitados para a efetivação de
tais exames em todas as regiões do país, notadamente no interior, onde a
carência de especialistas é constante.
Outra proposta, um pouco mais amena que a anterior - Proposta de Emenda à
Constituição no. 20, de 1.999 - refere-se à redução da idade penal para
dezesseis anos de idade, mais ou menos nos moldes da anterior, também calcada
no aspecto comportamental, isto é, o enquadramento penal do menor estaria
dependente do aferição de sua capacidade intelectual e
emocional. Diz a proposta, em trabalho de autoria de SILVA:
Proposta de Emenda à Constituição no. 20, de 1999
Altera o artigo 228 da Constituição Federal, reduzindo para dezesseis
anos a idade para imputabilidade penal.
As mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do parágrafo
3o do artigo 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda
constitucional.
Art. 1o - O art. 228 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezesseis anos,
sujeitos às normas da legislação especial.
Parágrafo único. Os menores de dezoito anos e maiores de dezesseis anos são
penalmente imputáveis quando constatado seu amadurecimento intelectual e
emocional, na forma da lei (NR)".
Art. 2o Esta Emenda à Constituição entra em vigor na data de sua publicação.
Como se vê, o parágrafo único da emenda está ligado ao subjetivismo, na medida
em que condiciona a imputabilidade dos menores entre dezesseis e dezoito anos
ao seu amadurecimento intelectual e emocional. Sua aprovação, conforme
enfatizado anteriormente, esbarra em inúmeros obstáculos, além de implicar na
onerosidade para os cofres públicos diante da necessidade de todo o aparato
profissional especializado para se aferir o grau de desenvolvimento
psíquico-emocional do menor.
Emenda alternativa em apreciação e que vem ganhando adeptos a cada dia
refere-se à proposta no. 18, a seguir transcrita:
Proposta de Emenda à Constituição no. 18, de 1999:
Altera a redação do artigo 228 da Constituição Federal.
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do artigo 60
da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional.
Art. 1o O artigo 228 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do
seguinte parágrafo:
"Artigo 228.
....................................................................................................
Parágrafo único. Nos casos de crimes contra a vida ou o patrimônio, cometidos
com violência, ou grave ameaça à pessoa, são penalmente inimputáveis apenas os
menores de dezesseis anos, sujeitos às normas da legislação especial."
Art. 2o Esta Emenda entra em vigor na data de sua publicação.
Referida proposta prevê, apenas para crimes mais graves, ou seja, contra a vida
ou o patrimônio e desde com cometidos com violência, ou grave ameaça, a fixação
da idade penal para responsabilização a partir dos dezesseis anos de idade,
tendo em conta apenas e tão-somente o aspecto biológico, sem a necessidade da
avaliação do grau de capacidade psíquico-intelectual ou qualquer outro
subjetivismo, como nas duas propostas anteriores. Com base nessa alteração, uma
vez completados dezesseis anos de idade, a pessoa sujeitar-se-ia às regras do
Código Penal e leis esparsas, ficando o agente em condições de igualdade com os
adultos, ou seja, responderia, quando praticasse crimes nas condições
previstas, com todo o rigor da lei hoje dirigido aos maiores de dezoito anos.
Isto significa dizer que a sociedade estaria considerando o jovem, a partir dos
dezesseis anos de idade, maduro o suficiente para entender o caráter ilícito de
sua conduta.
A defesa desse posicionamento se apega ao fato de que o jovem de hoje é
inegavelmente mais instruído e maduro que o do início do século XX,
contribuindo para isso os avanços e as transformações políticas, sociais,
econômicas observadas nos últimos cinqüenta anos. Novas tecnologias foram
incorporadas ao dia-a-dia das pessoas, e, com maior intensidade, são usufruídas
pelos jovens, seja através de canais de informações (telefone celular, internet, tv), seja através facilidade de assimilação das
inovações, sendo comum os filhos ensinarem os pais a lidar com o computador.
Tudo isso leva à constatação de que o adolescente, com dezesseis anos de idade,
já conta com um grau de compreensão no mínimo mediano para saber o que
significa matar alguém, subtrair coisa móvel, seqüestrar pessoas com o fim de
obter vantagem, e, principalmente, determinar-se de acordo com tal
entendimento, vale dizer, saber que se fizer tal crime será punido porque o
delito não é aceito pela sociedade.
3.4 CORRENTES CONTRA A REDUÇÃO
Fazendo contraponto às opiniões pró redução da
maioridade penal, existe uma corrente de juristas, legisladores e adeptos de
associações de defesa dos direitos humanos que perfilam pela manutenção da
idade para a imputabilidade aos atuais dezoito anos. Inúmeros são os argumentos
de que se utilizam os defensores desse posicionamento, constituídos, como na
opinião antagônica, por juristas de renome e portadores de irrestrito
conhecimento da área criminal voltada à juventude.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao contrário da pecha de condescendente
e ineficaz, é citado como um instituto que foi criado em consonância com o
espírito dos organismos internacionais voltados ao problema da juventude em
conflito com a lei. A própria Constituição Federal de 1.988, que trouxe em seu
bojo a preocupação com a criança e o adolescente, mostra a necessidade de o
Estado tutelar esse segmento da população.
Não se pode afirmar que suas medidas são pífias. O insucesso que se atribui ao ECA deve ser dimensionado não à falta ou a insuficiência
de comandos legais, que são fartos e adequadamente direcionados, mas à
seriedade na aplicação das leis. O instituto contém uma série de medidas
dirigidas aos jovens que cometem infrações. Aos menores até doze anos, prevê
medidas protetivas, através de orientação e apoio à
família, exigência obrigatória em estabelecimento de ensino, etc. Aos maiores
de doze e até dezoito anos prevê a aplicação de medidas sócio-educativas, que
vão desde prestação de serviços à comunidade até aplicação de penas privativas
de liberdade. O que deve ficar claro é que o ECA não foi
completamente implantado em grandes cidades, nas quais se utiliza como
estabelecimentos para internação as instalações e o organismo corrompido e
desfigurado da FEBEM (FUNDAÇÃO DO BEM ESTAR DO MENOR), notoriamente voltado aos
velhos e combatidos modelos repressores do Estado.
Outro argumento de que se vale a corrente a favor da redução da idade penal
está centrada na questão do voto. Seus opositores defendem que se o jovem com
dezesseis anos pode votar, ainda que facultativamente, também deve ter a
maturidade suficiente para determinar-se diante do caráter ilícito de praticar
crimes e, portanto, deveria responder penalmente a partir também dos dezesseis
anos. No entanto, refutam tal posicionamento sob o argumento de que o menor
infrator não pode ser comparado ao adulto delinqüente, porquanto aquele, com
uma personalidade ainda em construção e com o senso de discernimento
parcialmente formado, encontra-se em desigualdade de
condições com os criminosos adultos. Além disso, acrescente-se o fato de a
maioridade eleitoral ser facultativa, enquanto a imputabilidade é compulsória.
Comparar, em igualdade de condições menores com adultos criminosos seria
injusto, utilizando o ideal de justiça conferido por Aristóteles através do
brocardo "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na
medida das suas desigualdades". Assim se procedendo estar-se-ia tratando
igualmente os desiguais
Nos países em que a imputabilidade penal se situa dos sete aos dezesseis anos,
tem-se mostrado crescente a criminalidade, sendo que alguns deles, como medida
preventiva, refixaram o limite aos dezoito anos.
Presentemente, a nível mundial, a predominância é de que pouco mais da metade
da população mundial (55%) tem sua maioridade penal fixada em dezoito anos.
É de se notar que as medidas sócio-educativas apresentam-se mais eficazes que
as penas privativas de liberdade, em razão de sua finalidade pedagógica, e
também pelo fato de que o sistema prisional antiquado e desumano, ao contrário
de educar ou ressocializar o cidadão, pode levá-lo ao
mundo do crime.
Argumentam os defensores da manutenção da idade penal que, antes de se pensar
na alteração das leis, deve-se primeiramente primar pela efetividade das regras
existentes, através da correta e eficaz aplicação das diretrizes constantes do
Estatuto da Criança e do Adolescente em todos os seus níveis, com interligação
de sociedade e Estado. Considerar que o adolescente causador de ato infracional seja o responsável pela onda crescente da
criminalidade, com reflexos danosos no seio da população, é um tremendo
equívoco e pode levar a conseqüências desastrosas. As causas são maiores,
complexas e transcendem o entendimento mediano da população, que clama por
justiça em sua sede de vingança, como na época remota da antiguidade onde
imperava as regras da vingança privada. Hodiernamente as causas devem-se em
grande parte à desigualdade social que assola o país, associada à negligência
do Estado e à mudança de fatores culturais e comportamentais que se incrustraram no meio urbano com o advento da modernização.
Além da extensa gama de instrumentos de cidadania e responsabilização de que
dispõe o ECA, outro caminho que urge perseguir é o do
combate à miséria e à deseducação, seguramente a origem da crescente
criminalidade, cujo empenho deve partir principalmente de parte do Estado, de
modo a reintegrar o jovem infrator à sociedade, utilizando-se do viés
preventivo, que, como se sabe, custa menos aos cofres públicos, ao contrário da
via repressora, que é onerosa, fácil de corromper e de difícil
operacionalização. Muito menos deve-se atacar o
problema do menor infrator pela redução da idade para a imputabilidade penal.
4 O CÓDIGO CIVIL DE 2.002
4.1 BREVE HISTÓRICO
Depois de vinte e seis anos de tramitação no Congresso Nacional foi finalmente
aprovado o novo Código Civil Brasileiro, devendo entrar em vigor em janeiro de
2.003. Este diploma legal virá substituir o código em vigor desde 1.916, época
em que o Brasil e o planeta como um todo atravessam
uma escala de avanços em quase todos os setores das atividades conhecidas. No
governo do Presidente Ernesto Geisel foi instituída a comissão de altos estudos
para elaboração do Projeto no. 634/75, composta por Miguel Reale,
José Carlos Moreira Alves, Agostinho de Arruda Alvim, Sylvio
Marcondes e outros. O anteprojeto original teve início em 1.963 com Orlando
Gomes à frente, seguindo-se períodos de avanços, interrupções, readequações e
oscilações entre sua permanência ora na Câmara dos Deputados, ora no Senado. A
aprovação final veio ocorrer somente no dia 15 de agosto de 2001,
sacramentando-se através da promulgação da Lei no. 10.206, de 10.01.2002, pelo
Presidente Fernando Henrique Cardoso.
No cenário mundial a transformação foi radical no período que medeia os dois
institutos. Apenas na seara de acontecimentos significativos pode-se
citar as duas grandes guerras mundiais, a consolidação da potência norte
americana e seus desdobramentos na economia, a instalação da guerra fria e sua
decadência com o enfraquecimento do regime socialista russo, o avanço
tecnológico, o advento da era do computador, com a inegável disseminação de
seus efeitos em praticamente todas as áreas.
Doenças até então incuráveis, como a tuberculose e a hanseníase, hoje contam
com o beneplácito das vacinas e tratamento adequado, graças ao progresso
científico. Para outras, como o câncer e a aids, a ciência possibilitou a
descoberta de novas drogas, amenizando sofrimentos e proporcionando maior
sobrevida, quando não a extirpação da doença.
No âmbito do Brasil, a situação não foi diferente, haja vista transformações e
reformas radicais registradas no período. Foram mudanças no
sistema político, na organização social, no modelo econômico, enfim, na
própria cultura política e jurídica, hoje em constante dinamismo.
O regime imperial havia dado lugar à República, a Constituição Republicana
tinha pequena existência, a população era reduzida, com maior concentração da
sociedade brasileira na zona rural, e a família tinha a estrutura patriarcal
como esteio . No lapso compreendido nestes oitenta e
seis anos de vigência do código atual, a transformação do país foi
significativa. Adveio a derrubada do Estado Novo, a
ditadura de Getúlio Vargas, o governo desenvolvimentista de Juscelino Kubtschek, o parlamentarismo interrompido de Jânio Quadros,
culminando com o Golpe Militar de 1.964, quando deu-se a ditadura que perdurou
por duas décadas. Atravessou-se o período negro da ditadura militar de Costa e
Silva, Médici e Geisel, experimentou-se a transição através de Figueiredo e
Sarney, a consolidação para a tão desejada democracia, com a retomada das
eleições diretas inaugurada pelo desastrado e efêmero Governo de Fernando
Collor de Mello, até os dias atuais com o Governo neoliberal de Fernando
Henrique Cardoso. Politicamente pode-se destacar, como acontecimento histórico
de maior importância para o Brasil, a recuperação da legitimidade democrática,
através da possibilidade de eleições livres em todos os níveis, fato que atesta
a soberania popular e a consolidação do estado democrático de direito.
Vale acrescentar também que o Código Civil de 1.916 foi inspirado na
constituição anterior, sob a égide de costumes do século XVIII, significando
ideologias e conhecimentos calcados em época de diferentes condições sociais,
econômicas, culturais e comportamentais, o que implica em afirmar que o Brasil
mudou e hoje é inegável que as conquistas alcançadas atestam a necessidade da redirecionalização de rumos. A rapidez com que a ciência e
a tecnologia proporcionaram novas invenções é assustadora, com repercussões em
todas as atividades ligadas ao elemento humano.
O texto do novo Código trouxe significativa mudança de enfoque na medida em que
abandonou o rigorismo formal e o caráter individualista e patrimonial do Código
Civil de 1.916 -- próprio de uma sociedade agropatriarcal
-- para dar lugar a uma concepção voltada ao espírito de valorização da pessoa
humana, intimamente ligado também aos aspectos sociais do direito. Tais
inovações, entretanto, como já afirmado anteriormente, devem-se mais aos
progressos e às ideologias acumuladas nas últimas décadas, quando a maior parte
das constituições dos países contemporâneos ao Brasil -- aí também considerada
a Carta Magna de 1.988 - passou a defender a bandeira dos interesses sociais e
fundamentais como um de seus pilares, tendo como pressuposto principal a
valorização da pessoa humana.
Os dois mil e quarenta e seis artigos do novo diploma legal possivelmente
receberão ainda alguma alteração no período que se estenderá até janeiro de
2.003, já que persistem divergências de interesses e até mesmo doutrinárias que
se registraram nesses vinte e seis anos de tramitação. O período previsto para
a vacatio legis de um ano
será importante para se aparar eventuais arestas e
lacunas que com certeza surgirão no seio da sociedade.
4.2 ALTERAÇÕES EM RELAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL DE 1.916
O novo diploma não trouxe, em sua essência, grandes modificações, vez
que muitas das matérias nele contempladas ou já são fruto de preceitos
inseridos na Constituição de 1.988, de codificações através de leis
extravagantes, ou mesmo consagrados na jurisprudência. Assim, na visão de
grande parte de juristas e operadores de direito, o Código Civil de 2.002
representa mais a consolidação de mudanças legislativas e sociais verificadas
nas oito últimas décadas do que propriamente uma inovação no nosso ordenamento
jurídico. Exemplo disso estão estampados em diversos
institutos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei 8.069/90), o
Código de Defesa do Consumidor, leis sobre a união estável e outras.
É inegável o fato de, mesmo não trazendo em seu bojo novidades consistentes, o
novo diploma legal representa um avanço na medida em que, além de agrupar
inúmeras legislações e jurisprudência formada ao longo do período de forma
sistematizada, também contribuiu para o acolhimento de teorias importantes na seara
do direito. A teoria da imprevisão e a da desconsideração da personalidade
jurídica são exemplos de inovações importantes e que muito contribuirão para
enriquecer o trabalho dos operadores de direito.
4.2.1 Consagradas na CF/88, jurisprudência ou legislações
esparsas
As alterações introduzidas foram de grande porte, envolvendo enorme gama de
interesses e atividades, tais como a família, que passa a se constituir pelo
casamento civil ou religioso e pela união estável, esta bastando ser pública; a
substituição do conceito "pátrio poder" pelo "poder
familiar"; a substituição do termo "homem" por pessoa humana,
traduzindo assim a igualdade de direitos cristalizada na Constituição Federal;
a possibilidade de alteração do regime de casamento, antes vedada; a igualdade
de valor legal ao casamento religioso, passando o homem a poder acrescer o
sobrenome da mulher ao seu; a perda do poder sobre os filhos por parte do pai
ou da mãe que os maltratar ou abandonar; e a possibilidade de guarda dos filhos
com aquele - pai ou mãe - que detiver melhores condições de criá-los.
No âmbito comercial, algumas novidades significativas: a incorporação de uma
versão modernizada de parte do Código Comercial ao texto no livro denominado
"direito da empresa"; o "comerciante" passa a denominar-se
"empresário"; restabelece-se a distinção entre empresa nacional e
estrangeira; passa o administrador a responder solidariamente com seus bens
pelos danos causados por sua empresa.
O direito contratual, por sua vez, foi agraciado com um tratamento inovador no
novo diploma, quando o questão do pacta
sunt servanda foi atenuada
pela introdução, nos contratos, da cláusula rebus sic
stantibus, pela qual o polo
mais fraco de uma relação pode beneficiar-se pela revisão da prestação devida,
quando esta afigurar-se excessivamente onerosa. É a chamada teoria da
imprevisão. Da mesma forma, o novo código trouxe uma novidade polêmica,
consubstanciada nos chamados "estado de
perigo" ou "lesão" em que se faz abolição do respeito à vontade
das partes, podendo-se tornar sem efeito, de forma unilateral, um negócio
celebrado em razão de necessidade premente, tal como no caso de ver-se o
cidadão obrigado a vender um bem por preço irrisório, objetivando o pagamento
de uma cirurgia.
A previsão do dano moral passa a ser expressamente adotada, incorporando uma
prática reconhecida de longa data pela doutrina e pela jurisprudência.
O título referente à pessoa jurídica trouxe como novidade a inclusão da
despersonalização da pessoa jurídica.
Outra inclusão no novo código diz respeito à responsabilidade civil, quando o
dano exclusivamente moral passa a ser passível de ressarcimento pelo ofensor.
Este é um dos casos em que situações consagradas pela jurisprudência passam a
fazer parte da codificação.
4.2.2 Temas novos
A capacidade plena teve radical alteração, consubstanciada pela esperada
modificação na fixação da maioridade civil, que se reduz de vinte e um para
dezoito anos, refletindo também na redução da idade para a emancipação, que
passa para os dezesseis anos. Um capítulo novo foi inserido para albergar em
seus onze artigos os direitos da personalidade, atendendo antiga reivindicação
dos juristas e preenchendo uma lacuna em nossa legislação.
No âmbito contratual, foi criado o contrato estimatório
para expressar a consignação de coisas móveis para a venda, procedimento que já
vinha na prática sendo utilizado para que o terceiro pudesse vender coisa
alheia. Da mesma forma, outra inovação ocorreu com a transformação do contrato
de transporte em contrato nominado, o que virá
contribuir para melhorar as relações negociais dos trabalhadores ligados ao
meio de transporte.
Na direito sucessório foi incluído o direito de
superfície como um dos direitos reais. Outra novidade importante foi a inclusão do cônjuge como herdeiro e divisor da herança com
os filhos e pais do de cujus.
Embora de forma tímida, a prescrição e a decadência passaram a integrar o novo
código, bem como a prova, tida como matéria pertencente à lei processual, foi
contemplada na parte geral do recente diploma legal.
Inovação na parte especial teve como destaque a inclusão do direito
empresarial, cujo livro II trata de todas as formas de sociedade, assunto antes
afeto ao Código Comercial, que teve parcela significativa recepcionada pelo
novel documento.
Uma das grandes mudanças, sem dúvida, que irá marcar a vida dos brasileiros é a
questão da maioridade civil, que se reduz dos atuais vinte e um anos para
dezoito anos, permitindo-se a emancipação tanto pelo pai quanto pela mãe a
partir dos dezesseis anos.
4.3 OMISSÕES
Todavia, deixaram de ser contemplados no novo código temas novos e palpitantes,
principalmente aqueles advindos de avanços científicos verificados nas últimas
décadas, como a questão do genoma, da clonagem, e da inseminação artificial.
Outros assuntos, igualmente importantes para o cidadão, ficaram alheios à nova
codificação, como os contratos celebrados por meios eletrônicos, contratos
específicos de uso corrente, por exemplo, de franquia, de leasing, de shopping centers, e de emissão de cartões de crédito. Passou-se ao
largo o novo diploma, da mesma forma, de temas atuais, como a união entre
pessoas do mesmo sexo e suas consequências na área
sucessória.
4.4 CRÍTICAS
Tratando-se de um documento de fundamental importância para o país, não faltaram
críticas a favor ou contra sua edição, algumas voltadas à demora temporal entre
o início dos trabalhos, a discussão e a decisão final, outras mesmo em
decorrência da superficialidade de alguns temas, ou até da omissão de assuntos
hodiernos. Juristas de renome, processualistas, magistrados até do nível de
desembargadores, enfim operadores do direito de todas as áreas perfilaram-se
para externar suas opiniões, sempre maduras, respeitáveis e de incontestável profundamento jurídico.
Segundo TEPEDINO, o novo Código Civil representa um retrocesso político, social
e jurídico. Político, porquanto inexistem circunstâncias históricas que
normalmente antecedem a elaboração de um documento da magnitude de um código, a
exemplo do que ocorreu na Revolução Francesa ou na Europa após a Segunda Guerra
Mundial. Ou seja, nos quase 30 anos em que o documento ficou em processo de
amadurecimento, o processo histórico vivenciado no Brasil naquele período já
não é o mesmo de hoje. No plano jurídico, a crítica tem como principal destino
a desatualização, na medida em que, de um lado tratou
com superficialidade determinados assuntos, e de outro, desconheceu os
significativos avanços experimentados nas últimas oito décadas, em áreas tão
importantes e significativas para a população. No que se refere à esfera
social, expressou-se o autor da seguinte forma:
Do ponto de vista social, o retrocesso não é menos chocante. Os últimos 30 anos
marcaram profunda transformação do direito civil, simplesmente desconsiderada
pelo projeto do novo (?) código: os institutos de direito privado, em
particular a família, a propriedade, a empresa e o contrato, ganharam função
social que passa a integrar o seu conteúdo. As relações patrimoniais são
funcionalizadas à dignidade da pessoa humana e aos valores sociais insculpidos na Constituição de 1988. Fala-se, por isso
mesmo, de uma despatrimonialização do direito
privado, de modo a bem demarcar a diferença entre o
atual sistema em relação àquele de 1916, patrimonialista
e individualista. Os quatro personagens do Código Civil - o marido, o
proprietário, o contratante e o testador -- , que
exauriam as atenções (sociais) do codificador, renascem, redivivos, com o
projeto, agora em companhia de mais um quinto personagem: o empresário.
(TEPEDINO, 2001, p. 438)
Outra crítica que se faz ao novo código trata de sua "invasão" à área
de competência do direito processual. Como exemplo, a previsão do instituto da
prescrição e da decadência, e a questão da prova.
Abstraindo-se as críticas apresentadas em relação ao atraso no tempo e no
conteúdo com que o novo código se insere em nosso ordenamento jurídico, o
simples fato de se dispor de um documento novo, com os temas ordenados e
reconhecidos pela jurisprudência e impregnados de ideais constitucionais pode
ser considerado como um grande avanço para o trabalho dos operadores de direito
em benefício de toda a população.
4.5 MAIORIDADE NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
A partir de 1o de janeiro de 2.003 passará a vigorar a maioridade civil aos
dezoito anos, conforme previsão do artigo 5o do novo diploma:
Art. 5º A menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, quando a pessoa
fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante
instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença
do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 (dezesseis) anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de
emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 (dezesseis) anos completos
tenha economia própria.
Diferentemente do Código Civil de 1.916, que fixou a maioridade em vinte e um
anos, coerente portanto com a realidade vivenciada
naquele período, vez que sua elaboração fora destinada a uma nação
predominantemente agrícola, com reduzida população urbana e sem os graves e enormes
problemas sociais vividos na contemporaneidade, o novo código reduziu a idade
plena para 18 (dezoito) anos. Essa nova realidade -- traduzida pela fixação
praticamente uniforme da maioridade em quase todas as áreas de direito -
repercutiu favoravelmente nos meios jurídicos, porquanto não se justificam as
diferenças de tratamento que se verificam em determinadas situações. Por
exemplo, pelo atual Código o jovem com dezenove anos carece de assistência dos
pais para contratar uma operação de financiamento imobiliário, mas pode
livremente eleger um representante através do processo eleitoral, e pode também
ser responsabilizado criminalmente por ato ilícito praticado. Essas
discrepâncias deixarão de existir com o advento do novo diploma legal, fazendo
com que a interdisciplinariedade nos diversos âmbitos
do direito fiquem mais harmoniosos .
Nesses oitenta e seis anos de vigência do código atual o mundo passou por
inúmeras transformações de ordem social, econômica, comportamental, enfim,
verificou-se uma revolução de costumes, procedimentos e regras de vida em
sociedade, podendo-se, para resumir, afirmar que ocorreu uma metamorfose em
todos os sentidos na inauguração do século XXI. Nesse contexto, o jovem de
agora com dezoito anos está infinitamente à frente daquele cidadão de vinte e
um anos que viveu sob os auspícios do diploma de
1.916. São inúmeros os avanços experimentados no interregno dessas oito
décadas, que, somados à tendência mundial dos demais países na fixação de
dezoito anos para a maioridade civil e à constatação do pleno amadurecimento do
cidadão com essa idade, afastam qualquer possibilidade de descompasso na refixação do novo piso etário. A expansão dos meios de
comunicação, a melhoria nos padrões de cultura e a participação dos jovens no
seio da sociedade faz com que sejam cada vez mais cedo
habilitados ao amadurecimento e à assunção de responsabilidades.
Esse foi o princípio de que se valeram os legisladores e o entendimento a que
chegaram os juristas responsáveis pela Emenda no. 4,
de autoria do Senador Galvão Modesto, cuja justificativa a seguir transcrita
reflete as razões da redução da maioridade civil para dezoito anos.
"Substancialmente, as modificações propostas pela emenda decorrem da
fixação da maioridade civil em dezoito anos. E no particular procede.
A tendência prevalecente é no sentido de fixar a maioridade civil em dezoito
anos. Assim a estabelecem o Código Civil italiano, de 1942 (art. 2º), o
português, de 1966), com as alterações de 1977 (art. 130), o francês, com as
inovações da Lei de 1974 (art. 488). Esta é a consagração, também, da
Constituição espanhola de 1978 (art. 12).
Acresce que nossa Constituição prestigia essa tendência. Restringe a
inimputabilidade penal aos menores de dezoito anos, sujeitando-os a legislação
especial (art. 228). Considera o alistamento eleitoral e o
voto obrigatórios para os maiores dessa idade e facultativos para os
maiores de dezesseis anos (art. 14, § 1º, I e II, c). E estipula a idade de
vinte e um anos como condição de elegibilidade "para deputado federal,
deputado estadual ou distrital, vice-prefeito e juiz de paz", bem assim a
de 18 para vereador (art. 14, § 3º, VI, c e d), o que corrobora a fixação da
maioridade aos dezoito anos.
Essa inclinação legislativa repousa, também, na certeza de que os meios de
comunicação transmitem, permanente e crescentemente, conhecimentos e
informações, que ampliam o poder de observação das pessoas e de discernimento
dos fatos. Há de presumir-se, mesmo, que assim se teria orientado o Projeto, se
sua elaboração houvesse sido posterior à Carta de 1988."
Como se depreende do texto, a grande maioria de atos praticados pelo jovem de
hoje - votar, dirigir automóveis, trabalhar, ser responsabilizado penalmente,
entre outros -- já está consolidada pela legislação como direito próprio de
quem conta com idade plena ao exercício de atos da vida civil.
A capacidade relativa também foi alterada, na forma do artigo 4º abaixo
reproduzido, correspondendo assim à situação do adolescente já eleitor.
Artigo 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os
exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência
mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.
A emancipação passou a ser permitida a partir dos dezesseis anos (inciso I do
parágrafo único do art. 5º), cabendo aqui um registro
pela alteração aparentemente despercebida, mas cuja essência reflete a
preocupação constitucional da isonomia de tratamento entre o casal com relação
aos filhos: sua concessão passa a ser de competência dos pais, enquanto que no
Código Civil de 1.916 cabe ao pai, ou se for morto, à mãe (inciso I do
parágrafo 1º do art. 9º).
4.5.1 Quadro comparativo da maioridade civil nos dois códigos
Quadro comparativo
Código Civil de 1916 Código Civil de 2002
Art. 5º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I - os menores de 16 (dezesseis) anos;
II - os loucos de todo o gênero;
III - os surdos-mudos, que não puderem exprimir a sua vontade;
IV - os ausentes, declarados tais por ato do juiz. Artigo 3o A menoridade cessa
aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos
os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante
instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença
do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de
emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha
economia própria.
Art. 6º São incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, I), ou à maneira
de os exercer:
I - os maiores de 16 (dezesseis) e os menores de 21 (vinte e um) anos (arts. 154 a 156);
II - os pródigos;
III - os silvícolas.
Parágrafo único. Os silvícolas ficarão sujeitos ao regime tutelar, estabelecido
em leis e regulamentos especiais, o qual cessará à medida que se forem
adaptando à civilização do País. Art. 4º São incapazes, relativamente a certos
atos, ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência
mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.
Código Civil de 1916 Código Civil de 2002
Art. 9º Aos 21 (vinte e um) anos completos acaba a menoridade, ficando
habilitado o indivíduo para todos os atos da vida civil.
§ 1o Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - por concessão do pai, ou, se for morto, da mãe, e por sentença do juiz,
ouvido o tutor, se o menor tiver 18 (dezoito) anos cumpridos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau científico em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, com economia própria.
§ 2o Para efeito do alistamento e do sorteio militar cessará a incapacidade do
menor que houver completado 18 (dezoito) anos de idade. Art. 5º A menoridade
cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de
todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante
instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença
do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de
emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha
economia própria.
4.5.2 Quadro interdisciplinar da maioridade
MODALIDADE CÓDIGO CIVIL DE 1916 CÓDIGO CIVIL DE 2002
CÓDIGO PENAL CONSTI-TUIÇÃO FEDERAL LEIS INFRAC.
Civil plena Art. 9º Art. 5º
Civil relativa Art 6º Art. 4º
Civil absoluta Art. 5º Art. 3º
Penal: 18 anos Art. 27
Art. 228 Art. 104 Lei 8069/90
Estatutária-juvenil:
14 a 18 anos
Art. 101 Lei 8069/90
Eleitoral obrigatória:
18 anos Art. 14, par. 1º, I
Eleitoral facultativa: 16 anos Art. 14, par. 1º II-c
Laboral: 16 anos Art.7º, XXXIII
Núbil: 18 anos Art. 1.517
5 REFLEXOS DECORRENTES DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE CIVIL
São inúmeros os reflexos que a redução da maioridade de vinte e um para dezoito
anos acarretará nos vários ramos do direito, desde o âmbito familiar, com
repercussões nos institutos ligados ao dever de sustento, através da concessão
de alimentos, passando pela área previdenciária, que ensejará economia para o
governo na concessão de pensão a filhos de segurados, em detrimento destes,
culminando na área criminal, cuja campanha para se reduzir a
idade penal com certeza ganhará maior repercussão.
5.1 ALIMENTOS
A redução da idade para a capacidade civil trará uma grande celeuma nas
relações econômicas entre pais e filhos no que diz respeito ao pagamento de
pensão alimentícia. Uma vez extinto o "poder familiar" - termo que
substituirá o atual "pátrio poder" do Código Civil de 1.916 até agora
utilizado - aos dezoito anos de idade, prevê o Código Civil de 2.002 em seus
artigos 1.630 e 1.635, III, a cessação do dever alimentar. Essa interrupção em
momento precoce será danosa e trará resultados prejudiciais aos jovens, pois
que é exatamente na faixa dos dezoito anos que ocorre o ingresso nas
faculdades, em presumida falta de condições materiais de autosustentação.
É notório que a falta de formação acadêmica é uma das causas de desemprego no
Brasil, e isso somente pode ser revertido se houver um estímulo ou da família
ou poder público no sentido de suprir, em termos materiais, ao custeio dessa
fase. Como os cofres públicos estão combalidos e inexiste programa
governamental visando preencher essa indesejável lacuna -- é importante
enfatizar que o programa de bolsa estudo apenas minimiza o drama dos estudantes
e que somente 7% da população hoje conta com curso superior - tudo indica que
dependerá unicamente dos pais a superação do impasse.
Assim, abstraindo as situações dos pais que de forma voluntária persistam na
manutenção do estudo dos filhos até sua formação, a grande maioria ficará
dependendo das Varas de Família para buscar a prorrogação do vínculo alimentar
até então mantido.
5.2 PREVIDENCIA OFICIAL
O rebaixamento da maioridade civil trará, da mesma forma, conseqüência
desagradável também para quem recebe pensão da previdência oficial. Como se
sabe, o governo federal é responsável pelo pagamento de pensão de filhos de
segurados, cujo desembolso, a partir de janeiro de 2.003, será amenizado
substancialmente, resultando numa economia de três anos para os cofres
públicos. Analisando-se pelo viés oposto, o jovem também ficará três anos mais
cedo privado desse rendimento, com o agravante de que
tal ônus ensejará prejuízo ao seu desenvolvimento, pois terá que trabalhar mais
cedo para prover seu próprio sustento, às vezes antes mesmo de concluir o curso
superior.
5.3 RESPONSABILIDADE CIVIL
Um problema que surgirá, na seara da responsabilidade civil, está ligado à
responsabilização dos atos praticados pelos filhos e que venham a causar danos
a outrem. A partir de janeiro de 2.003, o jovem com 18 anos será plenamente
responsável pelos seus atos, resultando daí que, na ocorrência de um acidente
automobilístico por ele provocado, a vítima não poderá acionar os pais para
reaver seu prejuízo. Como normalmente nessa idade o jovem ainda não tem
rendimentos suficientes nem mesmo para se sustentar, o resultado é que a vítima
não terá de quem cobrar a indenização. Esse é o ônus que a sociedade moderna
pagará, assentado no entendimento universal de que o jovem
com a idade de dezoito anos encontra-se devidamente maduro e preparado
para a vida. Assertiva que se sabe, é válida em termos, pois não se pode
confundir responsabilidade pelos atos praticados com capacidade material. A distância entre uma e outra demanda preparação e
investimento intelectual.
5.4 IMPUTABILIDADE PENAL
A redução da maioridade civil também provocará um recrudescimento na discussão
que se trava a respeito da imputabilidade criminal.
Essa polêmica existe há séculos. A idade penal, ao longo da história, já sofreu
alterações para mais e para menos, desde quando, ainda sob a inspiração das
Ordenações Filipinas, em 1603, o Título 135 do Livro V, fixava a idade de
dezessete anos para a imputabilidade penal.
Com a proclamação da independência e após a promulgação da primeira Constituição
Brasileira, o Código Criminal do Império, de 1830, reduziu o limite de idade
penal para quatorze anos. Meio século após, com o advento do Código Penal
republicano, de 1890, exatamente um ano antes da primeira Constituição da
República, retrocedia para nove anos a idade da imputabilidade penal, o que
perdurou por quatro décadas, somente revogada em 1932, por ocasião da aprovação
da Consolidação das Leis Penais, quando o limite mínimo foi elevado para
quatorze anos.
Somente através do Código de 1.840, promovida pela reforma penal levada a
efeito pelo Estado Novo, foi refixada a capacidade
penal aos dezoito anos, norma em vigor atualmente. Posteriormente referida lei
foi incorporada à Carta Magna, figurando hoje no artigo 228 da CF/1988.
Como a matéria está inserta na Constituição da República - art. 228 - e
encontra-se devidamente normatizada através do ECA, sua redução somente poderá ser alterada por emenda
constitucional, o que significa um árduo e extenso trabalho de discussão até
sua final decisão. As vozes que defendem posições antagônicas são
representativas das mais variadas classes atuantes na área da infância e
juventude, com juristas de respeito e que contam com apoio de grande parcela da
população.
Diante do agravamento do problema no Brasil, notadamente nos últimos tempos, em
que a participação de menores de idade mostra-se crescente, é grande e
respeitável o número de defensores da redução da maioridade penal. No capítulo
3 - MAIORIDADE PENAL, o assunto foi abordado com maior profundidade, destacando-se
as várias correntes a favor ou contra tal redução.
6 CONCLUSÃO
A questão que se aborda é até onde a maioridade civil aos dezoito anos irá
influenciar a vida das pessoas. Em outra versão, até que ponto a alteração dos
atuais vinte e um anos, calcado no Código Civil de 1.916, para os dezoito anos
do novo Código Civil ensejará modificações nas relações jurídicas entre os
particulares. A resposta a essas questões pode ser sintetizada em três linhas
de raciocínio.
A primeira refere-se ao ponto de vista puramente
dogmático, através do qual a alteração na idade plena, conquanto substancial,
não trará significativas conseqüências. Como enfatizado no decorrer deste
trabalho, o jovem de hoje com dezoito anos está em absolutas condições de
igualdade -- aí considerados os aspectos culturais, sociais e comportamentais -
com seu par de vinte e um anos de oito décadas atrás.
Prova disso são as inúmeras atividades que, gradativamente, por vias
constitucionais ou mesmo através de leis esparsas, foram incorporadas ao
dia-a-dia das pessoas com dezoito anos: permissão para dirigir
automóveis, para votar, trabalhar, etc. Assim, dentro dessa assertiva, a
alteração teve o objetivo tão-somente de realocar o
jovem ao seu "habitat" jurídico adequado.
A segunda linha de raciocínio está relacionada com os efeitos patrimoniais que
advirão com a mudança da maioridade civil. Na prática isto significa que a
redução dos atuais vinte e um anos para os dezoito anos do Código de 2.002, com
certeza trará reflexos pecuniários desfavoráveis para os filhos dependentes
financeiramente de pais que, a partir de janeiro do próximo ano, deixarão mais
cedo de pagar a eles as pensões alimentícias. Vale dizer, serão prejudicados os
filhos principalmente de classe média que, por força de decisões judiciais,
vinham recebendo as verbas respectivas de seus pais, os quais se desonerarão
mais cedo daquela responsabilidade. É cediço que nessa faixa etária - entre
dezoito a vinte e um anos - normalmente os jovens estão cursando o terceiro
grau e por isso não dispõem ainda de rendimentos suficientes para se manter. É
claro que estarão à margem dessa restrição os filhos de pais que, pela
responsabilidade moral ou mesmo por afeição, mantenham a assistência até quando
julgarem conveniente, independentemente de haver expirado sua responsabilidade
legal.
Idêntica situação ocorrerá com os filhos de segurados da previdência social,
cuja data limite para a percepção da pensão passará para dezoito anos,
ensejando assim uma tormentosa e constrangedora redução em seus benefícios três
anos mais cedo do que ocorreria com as normas do Código que se agoniza. Nesta
nova realidade perderão os jovens que prematuramente deverão se atirar ao já
escasso mercado de trabalho ainda sem o devido preparo acadêmico, e ganhará a
União, que economizará recursos financeiros do Tesouro Nacional na questão
previdenciária.
A última implicação que se observa em função da redução da maioridade civil,
com certeza a mais polêmica, é a que se reflete na tentativa do rebaixamento da
imputabilidade penal para os dezesseis anos, ou até menos que isso, conforme
discutido no capítulo que tratou das propostas de emendas à Constituição. Como
se sabe, a idade para o jovem ser responsabilizado criminalmente hoje é dezoito anos. Abaixo desse patamar existe a proteção do
Estatuto da Criança e do Adolescente, norma que foi inspirada nos padrões
internacionais de atendimento ao menor infrator, que não funciona melhor devido mais à falta de sua correta e completa
implementação, e menos por sua política essencialmente voltada aos objetivos
educacionais.
A luta que se trava, pois, é no sentido de alterar o artigo 228 da Constituição
Federal, o artigo 27 do Código Penal e o artigo 104 da Lei 8069/90 (ECA), que
estabelecem a idade de dezoito anos para a imputabilidade penal. Conforme
enfatizado no decorrer deste trabalho, duas correntes defendem posições
sólidas, bem argumentadas e patrocinadas por juristas renomados no cenário
penal brasileiro. Em síntese, de um lado alguns defendem a redução alegando que
o jovem com dezesseis anos já se encontra maduro em todos os sentidos, de modo
a entender claramente o caráter ilícito de sua conduta e a determinar-se de
acordo com esse entendimento. Do lado oposto, outros entendem que o
amadurecimento ainda não é pleno e que a redução da idade penal traria um
retrocesso, pois o sistema penitenciário aplicado ao maior de dezoito anos é
ainda arcaico e rudimentar. A pergunta que se faz, portanto, é se o menor hoje
com dezesseis anos tem o senso de discernimento mínimo para saber com segurança
o que é uma ilicitude, e o mais importante, reconhecendo o caráter errado de
sua atuação (matar, roubar, estuprar, etc.), saber que tais
atos lhe sujeitará a ir para a cadeia. Não há dúvida, diante dos avanços
verificados na sociedade e do progresso intelectual vivido pelo jovem com
dezesseis anos, que a resposta é afirmativa, principalmente se se considerar que nessa idade, conquanto facultativamente,
é permitido exercer o direito soberano do voto. No entanto, existe um grande
abismo entre a aptidão à maioridade plena, ou seja, estar apto a assumir a
responsabilidade por um crime praticado, e a estrutura de que dispõe o sistema
penitenciário brasileiro para albergar criminosos, hoje corrompido, cruel, antieducativo e, o que é mais grave, dissociado do
princípio basilar do estado de direito.
Portanto, para finalizar, a idade penal não deve ser reduzida enquanto existir
a atual estrutura, pois como já ocorre com os criminosos, a cadeia de hoje,
longe de cumprir com sua função ressocializadora,
funciona como uma espécie de escola para formação de delinqüentes. Inserir
nessa estrutura menores de dezoito anos seria um desserviço à sociedade e um
retrocesso às funções do Estado que em última análise tem o dever
constitucional de prover o bem estar e a dignidade da pessoa humana,
princípios, aliás, excessivamente enfatizados e valorizados no novo Código
Civil.
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*Descrição
do Autor
Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de bacharel em
Direito, Faculdade de Direito de Curitiba
PEREIRA, João Batista Costa. A Maioridade: uma visão interdiciplinar.
Disponível em < http://www.intelligentiajuridica.com.br/v3/artigo_visualizar.php?id=483 >. Acesso em: 30 jul.2006