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A contribuição previdenciária para inativos e pensionistas em face da EC 20/98

 

 

Roberto Barbosa de Castro *

 

I - INTRODUÇÃO

A Lei nº 9.783, de 28 de janeiro de 1999, instituiu a alíquota uniforme de 11% para todos os servidores ativos, inativos e pensionistas da União. Além disso, instituiu adicionais temporários (até dezembro de 2002) de 9% sobre a parcela de vencimentos e proventos compreendida entre R$ 1.200,00 e R$ 2.500,00 e de 14% sobre a parcela excedente a esse valor. Criou faixas de isenção para as parcelas de até R$ 600,00 para inativos e pensionistas, isenção que se eleva para R$ 3.000,00 quando o inativo ou pensionista tenha mais de 70 anos ou tenha sido inativado por invalidez.

Em resumo, estendeu a obrigação de contribuir aos inativos e pensionistas e criou, verdadeiramente, uma escala progressiva de contribuição, por via de adicionais temporários.

O cotejo do conteúdo da citada lei com as disposições constitucionais, principalmente as regentes da matéria tributária e da matéria previdenciária (esta reformada profundamente pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) põe em evidência uma quantidade significativa de ilegitimidades do que, fatalmente, decorrerá seu afastamento do mundo jurídico por declaração de inconstitucionalidade.

Um sumário das inconstitucionalidades encontradas poderia ser listado como abaixo:

1 - ofensa ao direito adquirido do segurado, mediante o pagamento prévio de um número definido de contribuições, à percepção de um benefício igualmente definido no texto constitucional (art. 40, §§ 1º e 3º);

2 - ofensa ao princípio da causa eficiente para criação ou majoração de contribuição, em razão da desvinculação custo-benefício no caso dos aposentados (art. 40, c/c art. 195, § 5º), em razão da falta de prévia definição legal de modelo atuarial (art. 40) e em razão de instituição de alíquotas diferenciadas (art. 195, § 5º);

3 - ofensa à definição constitucional dos destinatários (e contribuintes) do regime previdenciário, ou seja, servidores titulares de cargo efetivo (art. 40, caput e § 12, c/c art. 195, II);

4 - ofensa ao princípio isonômico, em razão do tratamento diferenciado entre segurados do regime especial e do regime geral (art. 40, caput, c/c art. 195, II, art. 5º e art. 150, II) e entre segurados do regime do art. 40 em razão da imposição de alíquotas progressivas (art. 150, II);

5 - ofensa à obrigatoriedade de lei complementar para instituição de fonte nova de custeio para a previdência (art. 195, § 4º, c/c art. 154, I) ou, alternativamente, à obrigatoriedade de lei complementar e de observância de anterioridade plena (art. 149, c/c art. 146, III e 150 III);

6 - ofensa à vedação de criação de novo tributo com fato gerador ou base de cálculo próprios dos já existentes (art. 195, § 4º, c/c art. 154, I);

7 - ofensa à não autorização constitucional para instituição de alíquotas diferenciadas (art. 195, § 9º);

8 - utilização de tributo com efeito de confisco (art. 150, IV);

9 - contrariedade à mens legis e à mens legislatoris, apurada pela interpretação integrativa dos textos constitucionais e pela interpretação dos registros históricos dos trabalhos parlamentares na votação da Emenda Constitucional nº 20, de 1998.

 

II - EVOLUÇÃO HISTÓRICA

A Emenda 20 operou radical transformação na natureza do regime de aposentadoria dos servidores públicos, que se iniciara no século passado como benesse concedida aos militares, estendida aos funcionários civis invalidados para o trabalho, sendo gradativamente ampliada para alcançar outras hipóteses, como o simples cumprimento de determinado tempo de serviço ou atingimento de certa idade.

O conceito, de início claro e depois subjacente, era de um prêmio aos bons funcionários. O Estatuto de 1939 ainda subordinava a concessão ao arbítrio do Governo: "...e forem julgados merecedores desse prêmio, pelo bons e leais serviços prestados à administração pública." (DL nº 4.693 e DL nº 8.253, este de 29-11-45). MÁRIO MASAGÃO definia a aposentadoria como "a situação do funcionário público desligado definitivamente do exercício do cargo, por invalidez, ou como prêmio por longo tempo de serviço, e que continua a perceber, até o fim da vida, o estipêndio, integral ou reduzido, conforme o caso" (Revista de Direito Administrativo, vol. 79, pág. 249). MARCELLO CAETANO, completa sua definição de aposentadoria com a expressão "...mediante a atribuição de uma pensão vitalícia cuja importância é proporcional ao número de anos de serviço prestado ou correspondente a sacrifícios extraordinários feitos pelo interesse geral." (Curso, vol. II, pág. 254). HELY LOPES MEIRELLES não distoa: "a aposentadoria é a prerrogativa da inatividade remunerada, reconhecida aos funcionários que já prestaram longos anos de serviço público, ou se tornaram incapacitados para suas funções." (Direito Administrativo Brasileiro, 1964, pág. 388).

Até o advento da Emenda 20, a natureza da aposentadoria dos servidores sempre foi premial, sem embargo de que, sendo fundada na Constituição e no sistema legal, fosse direito subjetivo dos servidores. Contudo, sempre decorreu de liberalidade do Estado e nunca deixou de ser um prêmio ao servidor que cumpria determinados pressupostos de invalidação, de tempo de serviço ou de idade. Por comodidade contábil, ou não, (visto que o Estado que paga os vencimentos que ele próprio fixa como ato de príncipe é o mesmo que pagará os proventos) o fato é que, até a Emenda n.º 3, de 1993, nunca houve a preocupação de se cobrar contribuição do servidor. (A contribuição para o IPASE que anteriormente se cobrava, e continuou a ser cobrada mesmo depois da extinção daquele instituto, era destinada a custear despesas de saúde e o fundo de pensões dos dependentes). A despesa com inativos sempre foi considerada (inclusive no orçamento e na contabilidade pública) como despesa de pessoal. A doutrina e a jurisprudência sempre consideraram o inativo como espécie do gênero servidor, tanto que, mesmo após inativado e desligado do cargo, podia ser punido (inclusive com a cassação da aposentadoria) assim como chamado a fazer reposições ou indenizações à Fazenda, etc.. Enquanto na ativa, percebia pro labore facciendo. Uma vez inativado, os estipêndios tinham a natureza de pro labore facto.

J. E. Abreu de Oliveira acentua o caráter de continuidade da relação jurídica entre o Estado e o servidor, mesmo após a inativação. Nesse contexto, "o provento do aposentado tem a mesma natureza jurídica do vencimento, deste sendo uma continuação ou prolongamento". Citando exemplos concretos e doutrina de países como a Bélgica, França, Espanha, México, Argentina, Estados Unidos, conceitua o provento como uma parcela diferida dos vencimentos devidos durante a fase ativa. (Aposentadoria no Serviço Público, Freitas Bastos, 1970, pág. 149)

No Brasil, as Constituições simplesmente determinavam: "o funcionário será aposentado:" (e seguiam-se os pressupostos). Aliás, a Constituição de 1988 foi a primeira a trocar o termo funcionário pelo de servidor.

A Emenda n.º 3, de 1993, introduziu no art. 40, da CF, o § 6º, iniciando a transição ao determinar que os servidores deveriam contribuir para compartilhar a despesa com os aposentados. Iniciou-se, então, ainda embrionário, um regime de repartição simples: os ativos contribuindo para ajudar a manter os inativos. Todavia, o regime não deixou, mesmo assim, de ser premial. Ou, pelo menos, os doutrinadores não registraram a mudança. O STF, ainda em dezembro de 1994, editou acórdão considerando que o aposentado não poderia exercer cargo público sob pena de incorrer em acumulação, aludindo claramente a que se deveria considerar que, virtualmente, ele continuava servidor e ocupando cargo.

Todavia, a Emenda n.º 20, de 1998, completou a transição, e, vale dizer, radicalmente.

Não se trata de mero acaso. Na proposta inicial da reforma da previdência, o Governo pretendia simplesmente extinguir o regime de aposentadoria dos servidores, unificando-o no regime da previdência geral. No curso do processo legislativo a proposta foi mitigada para um regime próprio, porém o mais aproximado possível com o do regime geral. É bastante elucidativo o seguinte trecho do Relator da reforma no Senado Federal, Senador Beni Veras" ao descrever o projeto substitutivo que submetia à votação:

"...o estabelecimento de critérios similares para os regimes do servidor público e do INSS e a remissão ao artigo que trata do servidor público para as diversas situações específicas, o que tornou meu Substitutivo uma proposta uniforme e coerente para todos os cidadãos, ainda que contemplando diferentes regimes;"

Além da natureza contributiva e atuarial, diversos dispositivos fazem a ponte entre ambos. O mais explícito é o §12 do art. 40, que manda aplicar, no que couber, "os mesmos requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social". A rigor configura-se, hoje, um único regime geral, universal, de previdência social (art. 201) que passa a conviver com regimes especiais para os servidores (art. 40), de características muito semelhantes. O regime geral fornece as normas gerais, que se aplicam inclusive aos regimes especiais naquilo que não esteja especificado em suas próprias normas especiais. Aplica-se, no caso, a mesma doutrina pertinente à vigência simultânea de leis gerais e leis especiais.

Pela primeira vez na história, a CF subordinou a aposentadoria de seus servidores a um regime previdenciário de base contributiva e atuarial.

O câmbio é radical. O referencial doutrinário e jurisprudencial que informavam o regime premial não é mais adequado para o novo regime.

A aposentadoria do servidor deixa de ser um prêmio, uma benesse do Estado, passa a ser contraprestação ao pagamento de contribuições, as quais inclusive, devem ser calibradas de tal sorte a proporcionar equilíbrio financeiro e atuarial ao regime.

O regime premial cede lugar ao regime de seguro social.

Antes, o Estado era devedor da aposentadoria por liberalidade sua. Agora, é devedor porque se apossa da contribuição, mero prêmio do seguro social. Antes, o Estado pagava prêmio de aposentadoria ao servidor que se invalidava ou envelhecia. Agora, é o servidor que paga ao Estado o prêmio do seguro e, em contrapartida, torna-se credor dos benefícios da aposentadoria. Antes da Emenda nº 20, o aposentado continuava servidor, inclusive para fins disciplinares. E agora? Ter-se-á tornado inconstitucional, por exemplo, o instituto da cassação de aposentadoria?

Mais: pode o Estado, após a Emenda nº 20, de 1998, instituir contribuição daquele a quem já é devedor, exatamente para cobrir parte das despesas com o débito que ele, Estado, tem que pagar ao mesmo contribuinte?

Ao assim fazer, não estará o Estado cometendo simples confisco ou cobrança sem causa eficiente, visto que nenhuma contrapartida oferece a essa contribuição arrecadada? Já que está contribuindo, o aposentado poderá obter novo benefício, em contrapartida? Não, até porque isso é expressamente vedado no § 6º do art. 40.

 

III - A NATUREZA PREVIDENCIÁRIA E CONTRIBUTIVA DO REGIME

O art. 40 da CF, com a redação dada pela Emenda n.º 20, determina que o aos servidores titulares de cargos efetivos é assegurado "regime previdenciário de caráter contributivo".

Isso implica radical inovação na matéria, visto que, até então as aposentadorias dos servidores federais enquadravam-se no conceito "premial", em face do que todo o referencial doutrinário e jurisprudencial antes aplicável se torna inadequado.

Antes, as Constituições diziam que "o servidor será aposentado..." (em tais ou quais condições e requisitos). Agora, diz que o servidor será aposentado se abrangido (§ 1º do art. 40) por um regime previdenciário de caráter contributivo. Até então, o principal requisito era o "tempo de serviço". Agora, o principal requisito é o "tempo de contribuição".

Antes, o servidor recebia um prêmio pelos serviços prestados.

Agora, ele paga, previamente, um prêmio de seguro social para usufruir proventos na inatividade.

São da essência de um regime previdenciário contributivo o prévio pagamento das contribuições, que correspondem ao custo do seguro e a estrita vinculação causal entre tais contribuições e os benefícios, tal como se verá a seguir:

1 - o prêmio do seguro, isto é, as prestações que são ônus do segurado, são pagas previamente.

A Constituição impõe como requisito para auferir o benefício a verificação prévia de que o segurado contribuiu antes da concessão. Segundo o art. 40, o direito ao benefício, calculado segundo as regras que especifica, se constitui (além do requisito combinado de idade) com o recolhimento prévio da contribuição, durante tantos ou quantos anos. A Constituição não prevê nenhuma hipótese de contribuição a posteriori. Por exemplo, mesmo que o servidor cumpra, antes, o requisito de idade, ainda assim não pode ser aposentado sob a condição de que continue pagando a contribuição. O direito ao benefício somente se configura e se constitui com seu prévio pagamento. Uma vez configurado, é direito adquirido. Os benefícios podem, então, ser auferidos sem qualquer nova prestação, porque já foram previamente pagas todas as contribuições exigidas e já se encerrou o período aquisitivo de direitos. Nenhum direito novo nascerá para o segurado em troca de novas contribuições.

Antes da Emenda nº 20, o direito à aposentadoria se constituía com o implemento da condição de tempo de serviço. Uma vez constituído, o direito se considerava adquirido e nenhuma outra obrigação adicional ao pressuposto cuja condição já fora implementada, poderia ser criada posteriormente. Por exemplo, seria claramente inconstitucional por ofensiva ao direito adquirido uma lei que viesse a criar obrigação de prestação de serviço para o servidor já aposentado, ou de sua reversão ao serviço ativo (salvo por vício na concessão). Os pressupostos de invalidação definitiva, de implemento de idade e de implemento de tempo de serviço eram condições necessárias e suficientes para a constituição do direito. Nenhuma lei poderia, após a constituição do direito, exigir complementos em relação àqueles pressupostos.

Após a Emenda nº 20, o mesmo raciocínio se aplica aos novos pressupostos agora inscritos no art. 40 da Constituição. Afora o pressuposto de invalidação definitiva, agora o direito à aposentadoria se constitui e ingressa no patrimônio jurídico do servidor com o implemento das condições de idade e de tempo de contribuição. Essas são as novas condições necessárias e suficientes para o aperfeiçoamento e aquisição do direito. Assim como, antes, seria inconstitucional a lei que criasse obrigações de prestação de serviço para os aposentados, agora é inconstitucional a lei que cria nova contribuição em complemento ás contribuições já implementadas nos termos do art. 40 da Constituição, com a redação da Emenda nº 20.

Sequer pode-se argumentar que muitos dos atuais servidores e muitos dos atuais aposentados não contribuíram efetivamente durante todo o tempo para adquirirem o direito à aposentadoria, nos novos termos exigidos pela Constituição e que isso justificaria a imposição posterior do encargo. Acontece que a Emenda nº 20 cuidou de estabelecer presunção juris tantum dessa contribuição, pela equivalência do tempo de serviço cumprido, verbis:

"Art. 4º Observado o disposto no art. 40, § 10, da Constituição Federal, o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição."

Isso significa que todos os atuais servidores ativos estão em situação regular e que todos os atuais aposentados estão absolutamente quites com sua obrigação contributiva, na exata proporção de seus respectivos tempos de serviço considerados para a aquisição do direito ao benefício. Para os efeitos do art. 40 da Constituição Federal, todos os atuais aposentados contribuíram integralmente para a aquisição do direito aos proventos. Nada mais lhes pode ser exigido.

Essa é a própria lógica do seguro, agasalhada pela Constituição. Ofende a lógica e a Constituição que, depois de pagas as condições para obtenção do benefício (que é previamente definido) possa o segurador continuar cobrando o prêmio do seguro. Fazendo isso, ele está simplesmente sonegando o pagamento de parte do benefício previamente definido em norma constitucional e estendendo a obrigação do segurado para além do que a Constituição determinou para a constituição do seu direito.

A Constituição diz que o servidor contribua durante trinta e cinco anos para fazer jus aos proventos integrais. A Lei nº 9.783, de 1999, instituidora de contribuição para o aposentado, das duas uma: ou está estendendo o prazo de contribuição para trinta e seis, trinta sete, quarenta, cinqüenta, setenta anos - ou está diminuindo aritmeticamente o valor dos proventos, que, assim, deixam de ser integrais, configurando-se confisco por via oblíqua. Aliás, na Exposição de Motivos que acompanhou a mensagem presidencial que resultou no Projeto de Lei nº 4.898/99 e, posteriormente, na Lei nº 9.783, o Governo indica claramente a intenção de confisco:

"A instituição de contribuição previdenciária para os servidores públicos inativos é da maior relevância para corrigir as distorções existentes. Como atualmente eles deixam de contribuir ao se aposentarem, a remuneração líquida dos inativos acaba sendo mais elevada que a dos ativos."

A Emenda nº 20, em dois momentos, fornece indicação clara de que em matéria de contribuição do segurado, o seu pagamento por um determinado número de anos é condição necessária e suficiente para o aperfeiçoamento do direito à aposentadoria integral: tanto o § 1º do art. 3º quanto o § 5º do art. 8º conferem imunidade contributiva ao segurado que, tendo já contribuído pelo tempo suficiente, permaneça em serviço.

A Lei nº 9.783 também assim o reconhece, ao conferir isenção de caráter idêntico. Todavia, merece registro enfático que, a título de estimular o retardamento do pedido de aposentadoria, a citada lei incorre em absurda e inexplicável contradição jurídica. Ao conceder a isenção (na verdade, estendendo, no tempo a imunidade que a Emenda nº 20 já outorgara) ficou reconhecido pelo legislador ordinário o que o constituinte já explicitara: afora o pressuposto combinado de idade, a contribuição por determinado número de anos é o quanto basta para aperfeiçoar o direito ao benefício. Tendo contribuído por trinta e cinco anos, nem um centavo se há de exigir do segurado, porque já pagou o que tinha de pagar; já quitou previamente o que lhe competia pagar e adquiriu o direito de reclamar, quando lhe aprouver, o benefício da aposentadoria integral. Ora, a Lei nº 9.783 reconhece que o segurado já cumpriu a sua parte - a condição necessária e suficiente - mas volta a confiscar-lhe parte do benefício quando finalmente ele se dispõe a usufruí-lo.

2 - há estrita vinculação causal entre contribuição e benefício.

A contribuição somente se explica e se justifica ante a perspectiva da sua retribuição em forma de benefício, assim como o benefício somente se torna direito mediante a prévia contribuição. São dois termos da mesma equação. Um não existe sem o outro. Nem há contribuição sem benefício, nem benefício sem contribuição. A cobrança de contribuição do aposentado fere essa lógica e subverte a vinculação causal, porque não há nenhuma perspectiva de benefício que lhe vá ser dada em contrapartida. A Lei nº 9.783, de 1999 trata, então, de cobrança sem causa eficiente.

Em um regime previdenciário contributivo, necessariamente, há correlação entre custo e benefício. Regime contributivo é, por definição, retributivo.

No regime anterior à Emenda nº 20, a contribuição não era pressuposto para obtenção do direito aos proventos. Os pressupostos limitavam-se ao cumprimento de tempo de serviço, idade ou invalidação. A contribuição, introduzida pela Emenda nº 3, de 1993, era como uma obrigação acessória e não, propriamente, um pressuposto para a concessão da aposentadoria. Com a Emenda nº 20, não há mais benesse do Estado. A prévia contribuição é requisito para a aquisição do direito. Uma vez adquirido justamente com base na contribuição, o direito está protegido contra nova obrigatoriedade contributiva.

Aplica-se, agora, plenamente, o que já se enunciava para a previdência geral. No dizer do Ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, "a regra segundo a qual nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total, corresponde à relativa exigibilidade de causa eficiente para a majoração, sob pena de esta última discrepar do móvel que lhe é próprio, ligado ao equilíbrio atuarial entre contribuições e benefícios, implicando, aí sim, um adicional sobre a renda do trabalhador." (j. em 26-02-93, DJ 23-0493, pág. 06918).

No bojo da Representação nº 1.077, de 28-03-84, que feriu a constitucionalidade de aumento de taxa judiciária no Estado do Rio de Janeiro, no voto do Relator Ministro Moreira Alves afirmava: "Como já se acentuou - a taxa judiciária, em face do atual sistema constitucional, taxa que serve de contraprestação à atuação dos órgãos da justiça cujas despesas não sejam cobertas por custas e emolumentos, tem ela - como toda taxa, um caráter de contraprestação - um limite, que é o custo da atividade do Estado, dirigido àquele contribuinte (...) O que é certo, porém, é que não pode taxa dessa natureza ultrapassar uma equivalência razoável entre o custo real dos serviços e o montante a que pode ser compelido o contribuinte a pagar, tendo em vista a base de cálculo estabelecida pela lei e o quantum da alíquota por esta fixado." (apud Contribuição de Servidores, Paulo José Leite Farias, Correio Braziliense, 22-02-99).

Segundo a doutrina tributária, a contribuição previdenciária tem o caráter de tributo vinculado. Na falta de perspectiva futura do benefício correspondente não há que arcar o aposentado com a contribuição. Muito menos para o custeio do seu próprio benefício. Seguro social é, essencialmente, pacto entre gerações.

A natureza de tributo vinculado (à semelhança de taxa) da contribuição previdenciária decorre de ensinamentos dos maiores tributaristas, a exemplo de GERALDO ATALIBA (in Hipótese de Incidência Tributária, 2º ed., 1975, pág. 202), ALFREDO AUGUSTO BECKER (in Teoria Geral do Direito Tributário, S. Paulo, Ed. Saraiva, pág. 330), ROQUE ANTÔNIO CARRAZA (in Curso de Direito Constitucional Tributário, 3º ed., 1991, pág. 304), IVES GANDRA MARTINS (in Sistema Tributário na Constituição de 1988, 3º ed., 1991, pág. 125) e PAULO DE BARROS CARVALHO (in Curso de Direito Tributário, 5º ed., 1991, pág. 38).

A contribuição para o custeio da seguridade social do servidor tem características de uma taxa paga em contrapartida a uma dada prestação que lhe é posta à disposição. E, como bem lembra IVES GANDRA MARTINS, "as contribuições especiais não podem ser cobradas, por sua vinculação, além dos custos necessários aos serviços e finalidades a que se destinam." Contrario sensu, se a contribuição é cobrada em desvinculação com o futuro benefício, reveste-se, na verdade (a despeito de seu nomem juris) de tributo desvinculado, à semelhança do imposto de renda. E como tal, sua validade fica condicionada ao crivo dos pertinentes requisitos constitucionais.

O festejado Professor SACHA CALMON considera que a contribuição social do segurado da previdência "é sinalagmática, é paga justamente para que o pagante possa aposentar-se. Alcançada a aposentadoria, cessa a obrigatoriedade de contribuir." (Correio Braziliense, 03-02-99). Na verdade, reafirmação de sua posição doutrinária, (de resto, excelente síntese da doutrina universal) tal como, por exemplo, exarada no 1º Congresso Internacional de Direito Tributário - IBET, realizado em Vitória (ES) em agosto de 1998, ao desenvolver o tema "As "Contribuições Especiais no Direito Tributário Brasileiro": "Dentre as sociais ressaltam as previdenciárias, pagas por todos os segurados proporcionalmente aos seus ganhos, para garantirem serviços médicos, auxílios diversos e aposentadorias. Estas são as verdadeiras contribuições que podem ser incluídas na espécie dos tributos vinculados a uma atuação específica do Estado, relativamente à pessoa do contribuinte (...) Nas contribuições previdenciárias, o caráter sinalagmático da relação jurídica é irrecusável. Nas demais contribuições, inclusive as sociais, este aspecto inexiste." (in Justiça Tributária, coletânea dos temas tratados no citado Congresso. O destaque não é do original).

O parágrafo único do art. 2º da Lei nº 9.783, ao conferir caráter temporário aos adicionais de 9% e de 14% à contribuição, eleva ao extremo a desvinculação entre contribuição e benefício e, por isso, ressalta seu caráter de inconstitucionalidade. Não há como exigir acréscimo temporário de contribuição se nenhum acréscimo temporário correspondente haverá no benefício. A ofensa à retributividade é inegável e escancarada. Rompe-se claramente a relação custo-benefício. Não há qualquer resquício de causa eficiente para tal cobrança adicional.

Não merece acolhida o argumento de que, por ter direitos iguais aos do servidor ativo, o inativo deva contribuir em igual medida. A uma, porque não existe essa igualdade de direitos, vez que o aposentado, ao contrário do servidor ativo, não tem o principal direito em um regime previdenciário, que é uma futura aposentadoria (pois que já tem a sua, adquirida segundo os requisitos legais e constitucionais exigidos) e, a duas, porque a regra de paridade entre remuneração dos ativos e proventos dos inativos, nada mais é que regra de atualização de valores. Eventual acréscimo que sua aplicação provoque em relação à simples atualização de valores não deve ser objeto de nova contribuição, pois que isso terá decorrido de regra antes fixada e seu conteúdo, portanto, integrou o direito adquirido ao benefício. Poderia até ser moralmente justificável exigir-se do aposentado uma contribuição para sustentar os acréscimos de vantagem que viessem a ser incorporados aos seus proventos, visto que a Súmula 359 do STF reza que tais proventos são fixados quando da decretação da inativação, mas, obviamente, essa contribuição teria que guardar relação com os acréscimos e jamais ser idêntica à dos servidores ativos. Contudo, essa contribuição teria que ser autorizada pelo texto constitucional, o que não ocorre.

Essa autorização constitucional inexiste e a não existência decorreu de expressa vontade do Plenário da Câmara dos Deputados, deliberando na qualidade de poder constituinte derivado, tal como se vê na justificação do Destaque para Votação em Separado assinado por todos os líderes da bancada governista, o qual acarretou a supressão do dispositivo que permitia a cobrança de contribuição de inativos e pensionistas:

"Entendimentos firmados entre os Líderes dos Partidos da base de apoio ao Governo, com a expressa concordância do Poder Executivo, através de seu Líder, Deputado Luís Eduardo, concluíram que a cobrança de contribuição previdenciária de aposentados ou pensionistas da União, após o segurado ter cumprido todos os requisitos funcionais pecuniários e temporais estabelecidos legalmente como necessários à obtenção desse benefício, é indevida."

 

IV - A NATUREZA ATUARIAL DO REGIME

A Lei nº 9.783, de 28 de janeiro de 1999 é, também, inconstitucional, por fixar alíquotas de contribuição sem definição do modelo atuarial do regime de previdência dos servidores públicos, ou seja, sem atentar para o princípio de causa eficiente.

Pela Emenda n.º 20, de 1998, ficou inscrito no art. 40 que o regime previdenciário assegurado ao servidor titular de cargo efetivo, além de seu caráter contributivo, deve observar "critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial."

Repita-se que a Constituição, assim como as leis, não tem palavras inúteis.

Necessário, então, pesquisar o sentido jurídico da expressão. Segundo o Supremo Tribunal Federal (Ac. RE-166772/RS), "o conteúdo político de uma Constituição não é conducente ao desprezo do sentido vernacular das palavras, muito menos ao do técnico, considerados institutos consagrados pelo Direito. Toda ciência pressupõe a adoção de escorreita linguagem, possuindo os institutos, as expressões e os vocábulos que a revelam conceito estabelecido com a passagem do tempo, quer por força de estudos acadêmicos quer, no caso do Direito, pela atuação dos Pretórios."

Ocorre que, pela primeira vez, a Constituição brasileira tem inserida, em seu texto, a expressão "equilíbrio financeiro e atuarial", como determinante de organização e funcionamento dos sistemas previdenciários (a expressão aparece, também, no art. 201, relativo à previdência geral).

Após a Emenda nº 20, o caráter atuarial dos regimes previdenciários passa a ser um valor constitucional. Até então, era meramente um valor técnico. Antes, o equilíbrio atuarial era uma mera postulação técnica, um objetivo gerencial a ser perseguido na administração dos sistemas previdenciários. Agora, é um mandamento constitucional. A tutela constitucional envolve implicações de segurança jurídica, principalmente aqueles relacionados com a causa eficiente para a cobrança das contribuições.

Para a aprovação da Lei n.º 9.783, de 1999, o Governo divulgou e inseriu na mensagem presidencial números sobre supostos déficits no regime de previdência dos servidores federais, dando a entender que o aumento da taxação dos ativos e a instituição de cobrança dos inativos e pensionistas se justificaria pela necessidade de promover o equilíbrio atuarial. Nisso, cometeu erro palmar.

Com números muito sujeitos a crítica, conseguiu, no máximo, mostrar que a arrecadação das contribuições dos servidores ativos (cuja alíquota, até então, estava unificada em 11%) é, no momento, insuficiente para cobrir a despesa atual, total, com inativos e pensionistas civis e militares.

Ou seja, conseguiu demonstrar, no máximo, um desequilíbrio conjuntural entre receitas e encargos previdenciários. Seria isso um desequilíbrio atuarial?

Absolutamente, não.

Na verdade, a ciência atuarial, que é calcada em técnicas matemáticas, estatísticas e probabilísticas não tem apenas - ou tem muito pouco - a ver com o desequilíbrio presente. No caso de um sistema previdenciário, a atuária se preocupa com o equilíbrio de receitas e despesas a longo prazo. Para isso, leva em conta a massa de contribuintes, sua composição, regras de entrada e saída do sistema, tempo e volume de contribuição, probabilidades de evolução desses fatores, a aplicação e rentabilidade das receitas, enfim, o volume e a evolução do ativo atuarial; em confronto, o volume e a evolução do passivo atuarial que decorre da massa de beneficiários, sua composição, regras de entrada e probabilidades de saída, tempo médio de percepção de benefício, volume do benefício, probabilidades de evolução, etc.

São, enfim, cálculos de extrema complexidade que vão muito além do simples alinhamento de receitas e despesas no último exercício. O Senador Beni Veras, Relator da Reforma da Previdência no Senado Federal chamava a atenção para esse aspecto, em seu Relatório:

"O equilíbrio financeiro e atuarial é necessário não apenas para dar segurança às pessoas que contribuem mensalmente para o sistema, cuja expectativa é usufruir dos benefícios no futuro, mas também para garantir o pagamento dos benefícios àqueles que contribuíram no passado. Os cálculos dos atuários, portanto, são feitos para várias gerações."

A propósito, cabe lembrar a seguinte manifestação do Ministro MOREIRA ALVES, do Supremo Tribunal Federal, no Agravo Regimental em Agravo de Instrumento AGRAG-212515/RJ, datado de 16-06-98 - Primeira Turma:

"Agravo Regimental. Como salientado no despacho agravado, é mister examinarem-se previamente cálculos atuariais que não se traduzem necessariamente a simples confronto de proporções entre aumentos, mas é preciso levar em conta outros fatos como o número de contribuintes e de beneficiários, além do tempo provável de contribuição daqueles e o de percepção dos benefícios por parte destes."

Principalmente, a projeção do equilíbrio atuarial exige regras estáveis e a definição clara do modelo previdenciário adotado. Com base nesse modelo previdenciário, pode, enfim, ser configurado um plano atuarial, que no caso discutido, no mínimo tem que ser aprovado em lei formal. Se a Constituição determina que haja equilíbrio atuarial, e esse equilíbrio atuarial é decorrência de uma série de fatores predeterminados, tudo isso tem que ser definido em lei. Não pode ficar ao sabor do governo de cada momento que ache necessário aumentar ou criar novas alíquotas de contribuição para o atingimento de um "equilíbrio atuarial" cujos cálculos (se é que existem) ele guarda misteriosamente...

A busca do equilíbrio atuarial da previdência interessa não apenas às finanças públicas e à solvência do sistema, mas também ao direito subjetivo dos segurados. Num regime de benefícios definidos, como é a previdência dos servidores, a incorreta ou nenhuma definição do plano atuarial irá forçosamente produzir uma de duas conseqüências opostas:

1 - fixação de contribuições abaixo do necessário para sustentar o regime a longo prazo, levando-o à insolvência, ou

2 - fixação de contribuições acima do necessário para sustentar o regime a longo prazo, acarretando prejuízo aos segurados por pagarem mais que o necessário para a percepção dos benefícios, e assim desvirtuando o nexo causal entre contribuição e benefício.

A definição do modelo previdenciário leva em conta, basicamente, os seguintes quesitos:

1 - contribuições definidas e benefícios variáveis, ou contribuições variáveis e benefícios definidos;

2 - regime de repartição simples ou regime de capitalização.

A previdência dos servidores, por regra constitucional, já tem resolvido o primeiro quesito, pois trata-se de um regime de benefícios definidos, para cujo equilíbrio atuarial as contribuições devem, então, se ajustar.

Todavia, não há definição sobre o segundo quesito. O regime próprio de previdência dos servidores federais é de repartição simples ou de capitalização? A Lei nº 9.717, de 27 de novembro de 1998, que "dispõe sobre regras gerais para a organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos Militares dos Estados e do Distrito Federal e dá outras providências", não oferece essa definição, apenas indicando confusamente ora num, ora noutro sentido.

Assim é que, no art. 1º, sinaliza com o regime de capitalização, ao determinar, no inciso VII, "registro contábil individualizado das contribuições de cada servidor e dos entes estatais, conforme diretrizes gerais." O registro individual somente faz sentido em regime de capitalização, não tendo, no entanto, qualquer importância para o de repartição simples.

Entretanto, no art. 2º, § 1º, dispõe sobre limite de despesa com pessoal inativo e pensionistas, o que somente faria sentido em regime de repartição simples pois, em regime de capitalização, a despesa decorre dos direitos individuais dos segurados, apurados em sua conta individual e não pode ser limitada.

Portanto, não existindo lei que previamente defina o modelo e os parâmetros atuariais do regime previdenciário, é inelutável a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 9.783, de 1999, ou de qualquer outra lei que institua ou aumente alíquotas de contribuição, simplesmente porque, sem tais modelo e parâmetros, é impossível estabelecer a relação custo-benefício, isto é, a causa eficiente para a cobrança de contribuições.

Há dois aspectos adicionais de suma importância para a busca do equilíbrio atuarial do regime previdenciário, o qual, por força da Emenda nº 20 passou a ter valor constitucional.

O primeiro diz respeito às tábuas biométricas (ou tábuas de mortalidade), que são fundamentais e indispensáveis para o cálculo e projeção atuarial da previdência. A partir delas calculam-se as probabilidades de morte dos segurados e, principalmente, médias estatísticas de tempo de contribuição e de fruição de benefícios.

Acontece, simplesmente, que não existem tábuas biométricas calculadas segundo as peculiaridades da população brasileira, com índices de mortalidade e de esperança de vida aferidos em razão das condições étnicas, sanitárias, alimentares etc. do Brasil.

A propósito de regulamentar a Lei nº 9.717, de 1998, e de ditar parâmetros para a organização de regimes de previdência para os servidores públicos, o Senhor Ministro da Previdência baixou a Portaria nº 4.992, de 5 de fevereiro de 1999 (DOU de 08-02-99) em cujo Anexo I - Das Normas de Atuária, manda aplicar, para cálculo atuarial de mortalidade geral, tábuas biométricas norte-americanas (CSO - 58, CSO - 80, AT - 49, AT - 80, EB7 - 75).

Ora, como tudo indica que os índices de esperança de vida nos Estados Unidos da América sejam muito maiores que os do Brasil, da aplicação dessas tábuas biométricas resultam alíquotas contributivas mais altas que necessárias às peculiaridades brasileiras. Está, aí, caracterizada a cobrança sem causa eficiente.

O segundo aspecto diz respeito às condições para equilíbrio atuarial do regime de previdência dos servidores federais em modelo de repartição simples.

Nesse modelo, tem-se uma massa de contribuintes (os servidores ativos) e uma massa de beneficiários (aposentados e pensionistas). Cada uma dessas massas tem suas regras e tendências de ingresso, de fluxo e de saída. Em situação normal, a massa de contribuintes tende a ser bem maior que a dos beneficiários, pela simples razão de que a grande maioria dos contribuintes permanece trinta anos ou mais nessa condição, enquanto que os beneficiários permanecem no máximo em torno de quinze a vinte anos, na média (a idade média de aposentadoria, segundo estatísticas oficiais, situa-se na casa dos cinqüenta e sete anos).

A despesa com inativos e pensionistas da União, que hoje situa-se em 42% do total das despesas com pessoal, era de pouco mais de 20% até 1990. Diversos fatores, desde então, promoveram o atual desequilíbrio conjuntural, contando-se aí a implantação do Regime Jurídico Único e a política de pessoal do Governo Collor, bem como a própria reforma da Previdência, as quais estimularam a efetivação de milhares de aposentadorias represadas. O mais importante, todavia, foi o fato de que o Estado brasileiro optou por uma linha de encolhimento, deixando de repor integralmente os quadros, de tal sorte que, na década de noventa a massa de contribuintes perdeu pelo menos duzentos mil elementos que, evidentemente, foram-se somar à massa de beneficiários. A médio prazo a tendência seria a de retorno à situação de equilíbrio anterior, inclusive em face das novas e mais rigorosas regras de aposentadoria, contagem de prazo, idade mínima, etc.

Acontece que estão em curso novas políticas de organização do Estado, como decorrência da Emenda Constitucional nº 19 (Reforma Administrativa) e de gestão de pessoal que tornarão simplesmente impossível qualquer equilíbrio atuarial em regime de repartição.

Informe oficial do Governo (Cadernos MARE da Reforma do Estado, nº 11, pág. 11) apregoa:

"A reorganização das atividades do Estado tem um rebatimento no que diz respeito à composição do quadro de pessoal. Os profissionais atuando em setores voltados para a produção de bens e serviços para o mercado, setor que será transferido do Estado para o setor privado por meio do processo de privatização, serão administrados com base em regras vigentes para o setor privado, não constituindo-se em funcionários públicos. O mesmo se aplica para os profissionais atuando na área de serviços sociais e científicos, que será transferida mediante o processo de publicização para entidades de direito privado sem fins lucrativos integrantes do setor público não-estatal.

Os servidores públicos, e portanto integrantes de carreiras de Estado, serão apenas aqueles cujas atividades estão voltadas para as atividades exclusivas de Estado relacionadas com a formulação, controle e avaliação de políticas públicas e com a realização de atividades que pressupõem o poder de Estado. Esses servidores representarão o Estado enquanto pessoal. Para a realização de atividades auxiliares como manutenção, segurança e atividades de apoio diversas será dada continuidade ao processo de terceirização, transferindo-as para entidades privadas."

Coerentemente, o Governo remeteu ao Congresso Nacional projeto de lei (que tramita na Câmara dos Deputados sob o nº 4.811, de 1998) instituindo o regime celetista para todos os novos servidores federais, à exceção apenas dos integrantes das carreiras jurídicas, policiais e que sejam compostas de cargos privativos de brasileiros natos.

A menção, aqui, dessas políticas de governo, não envolve qualquer juízo de valor quanto a elas. Apenas se deseja chamar atenção para o fato de que, se a massa de contribuintes não vai mais receber componentes, e se a massa de beneficiários vai continuar recebendo componentes (à medida que se forem aposentando os atuais servidores ativos) será impossível alcançar o equilíbrio atuarial exigido pelo art. 40 da Constituição Federal, na redação da Emenda nº 20, a não ser que as alíquotas sejam sucessivamente elevadas até representar confisco quase total da remuneração dos remanescentes servidores ativos. Ou que se defina claramente que o regime não é de repartição, mas de capitalização.

A interpretação e a aplicação da Constituição não podem levar ao absurdo.

A política de encolhimento do Estado não pode ser contestada, mas os servidores públicos não podem pagar o ônus decorrente. A política de encolhimento é uma decisão da sociedade, através de seus representantes; logo, o ônus há de ser suportado por ela própria.

 

V - A CLIENTELA (E OS CONTRIBUINTES) DO REGIME DO ART. 40

O art. 40, caput, com a redação dada pela Emenda n.º 20, de 1998, dispõe:

"Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo."

Como se vê da redação acima, o regime de previdência é assegurado aos servidores titulares de cargos efetivos. Os servidores titulares de cargos efetivos são os destinatários da norma. Eles constituem a clientela do regime previdenciário de caráter contributivo mencionado no art. 40. Logo, eles são seus contribuintes. Fora de qualquer dúvida que os aposentados não são titulares de qualquer cargo efetivo, e muito menos os pensionistas. A eles não se dirige a norma. Não são eles clientela nem tampouco contribuintes do regime previdenciário mencionado. São beneficiários do regime.

Dir-se-á que a expressão relativa aos titulares de cargos efetivos aí está apenas para contrastar com a expressão relativa aos titulares de cargos em comissão (e outros cargos temporários), matéria tratada no § 13 do art. 40, para remetê-los ao regime geral de previdência. O argumento é verossímil. Contudo, o fato é que, restringindo-se aos titulares de cargos efetivos, automaticamente operou-se a exclusão também dos aposentados.

De mais a mais, fosse a intenção do legislador apenas contrastar titulares de cargos efetivos com ocupantes de cargos em comissão, a técnica legislativa indicada seria outra. O correto seria, então, exprimir a regra geral no caput (menção ao gênero "servidores") e a exceção no parágrafo (menção aos titulares de cargos em comissão, etc.). É o que dispõe o art. 11, III, c da Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998 que dispõe sobre normas para a elaboração, a redação a alteração e a consolidação das leis: "expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma anunciada no caput e as exceções à regra por este estabelecida."

A interpretação sistemática comprova, também, que a exclusão dos aposentados não foi meramente acidental. Muito pelo contrário.

O "servidor titular de cargo efetivo" do regime do art. 40 corresponde exatamente ao "trabalhador" do regime do art. 201, combinado com o art. 195, II.

Além disso, de acordo com os parágrafos do art. 40, o direito à aposentadoria é condicionada ao prévio pagamento de contribuição durante determinado numero de anos. Ou seja, enquanto o segurado é titular de cargo efetivo.

O § 1º do art. 40 busca definir ainda mais a clientela do regime de previdência assegurado no caput. Reza, ele, que "os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata esse artigo serão aposentados..." Ora, se o preceito constitucional precisou especificar quanto aos "servidores abrangidos", resta evidente que há "servidores não abrangidos". E, à toda clareza, os "não abrangidos" não são os ocupantes de cargos em comissão, porque deles trata regra específica, constante do § 13 do mesmo art. 40. Não haveria o menor sentido ou necessidade de o redator constitucional salpicar em diversos dispositivos redação discriminatória dos ocupantes de cargos em comissão. A lei não tem palavras inúteis. Seria ridículo imaginar que o constituinte temesse que o § 13 não tivesse clareza ou força suficiente para impedir que os comissionados fossem abrangidos pelo regime do art. 40.

Mais, ainda. O § 12 do art. 40 determina que "além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral da previdência social.". Como já assinalado antes, esse dispositivo é a ponte principal entre os dois regimes, lembrando que a intenção do Governo (e do constituinte) sempre foi a de extinguir (objetivo não atingido) ou pelo menos identificar ao máximo possível o regime aplicável aos servidores com o regime geral. O § 12 explicita a configuração da convivência de normas gerais do, regime geral, tratado no art. 201, com normas especiais, aplicáveis aos regimes especiais, tratados no art. 40.

A interpretação gramatical do § 12 do art. 40 não oferece dificuldades, pois ele é de meridiana clareza. O ponto fulcral de seu deslinde, todavia, reside na expressão "no que couber". Em princípio, o "que couber" compreende tudo o que exceder do regime dos servidores em relação ao regime geral e não for com ele incompatível. Ambos os regimes são assemelhados: são contributivos e de base atuarial.

A pesquisa pode ser facilitada indo-se pelo caminho inverso. Eliminando-se o que escapa ao "que couber", chega-se ao que cabe.

Por exemplo, não cabe o que se relacione com a definição de segurados, que já são claramente definidos no art. 40; idem quanto aos benefícios e muito menos quanto aos critérios para concessão dos benefícios. A atualização do valor dos benefícios também tem regras claras, bem definidas. Os cálculos atuariais obviamente terão que ser específicos para cada regime, senão deixariam de ser atuariais.

Regra exegética de ouro diz que a lei (muito menos a Constituição) não tem palavras inúteis. O que cabe, então?

Por exclusão, verifica-se que a única lacuna do regime previdenciário do art. 40 em relação ao regime previdenciário do art. 201 diz respeito à sua natureza contributiva, isto é, à sua fonte de custeio na parte que toca aos segurados.

O art. 40 determina a natureza contributiva do regime, porém não oferece mais detalhes sobre isso. Para elucidação da lacuna, então, CABE a aplicação supletiva da regra contributiva do regime geral, matéria tratada no art. 195.

E aí se vê que é critério inerente à natureza contributiva do regime geral que somente os trabalhadores em atividade devem contribuir. É o que salta aos olhos pela simples leitura do inciso II do art. 195, que trata das contribuições que são fontes de custeio da previdência:

"II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201."

A restrição da parte final, que poderia impressionar, não tem a menor importância. No caso, o que interessa pesquisar no dispositivo são os requisitos e critérios da natureza contributiva do regime do art. 201, para que possam, supletivamente, ser aplicados à definição da natureza contributiva do regime do art. 40. E os requisitos e critérios do regime do art. 201 informam que somente os trabalhadores não aposentados são obrigados à contribuição.

Logo, a Lei nº 9.783, de 1999 não poderia inovar, quando o texto constitucional estabelece quem são os contribuintes do regime do art. 40. A inconstitucionalidade material é flagrante.

 

VI - OFENSA AO PRINCÍPIO ISONÔMICO

Além disso, curial que a contribuição dos servidores tem arrimo no mesmo art. 195 II da CF, que dá suporte à cobrança de contribuições dos segurados do regime geral. O próprio art. 12 da Emenda 20 deixa claro que as leis "que irão dispor sobre as contribuições (...) destinadas ao custeio da seguridade social e dos diversos regimes previdenciários" são tratadas no art. 195. Não o fosse, a contribuição teria que derivar do art. 149, do que resultaria sujeição à forma de lei complementar e ao princípio da anterioridade plena, ou seja, a Lei nº 9.783 resultaria igualmente inconstitucional.

Ora, se a raiz constitucional da contribuição dos segurados de ambos os regimes é exatamente a mesma, o tratamento desigual aos aposentados de um regime, comparativamente aos do outro regime fere o direito à isonomia, mormente porque outro dispositivo constitucional (o § 12 do art. 40) manda que se aplique, no caso, os mesmos requisitos e critérios.

Ylves José de Miranda Guimarães preleciona: "Como corolário da natureza tributária das contribuições em tela, deflui ficarem sujeitas a todos os princípios e normas constitucionais aplicáveis aos tributos, quer expressos, quer implícitos. Assim, afora o princípio de legalidade, com a ressalva acima feita, o que lhes dá um tratamento exclusivo, no tocante a sua natureza de tributo vinculado, estão as contribuições também sujeitas ao princípio de igualdade tributária..." (in Curso de Direito Tributário, diversos autores, Ed. Saraiva, 1982, pág. 588).

O direito à isonomia decorre do primeiro e básico enunciado da declaração dos Direitos e Garantias Fundamentais, inscrito no próprio caput do art. 5º da CF, cláusula pétrea nos termos do art. 60, § 4º, inc. IV. Em matéria tributária, a Magna Carta foi mais explícita e particularizou o princípio isonômico no Inciso II do art. 150, proibindo a União, os Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios de:

"II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por ele exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos."

Fora de qualquer dúvida que, dos pontos de vista jurídico e constitucional, os contribuintes do regime do art. 40 estão em "situação equivalente" aos contribuintes do regime do art. 201. Será absolutamente extra-jurídica e extra-constitucional qualquer argumentação calcada em comparações entre magnitudes de benefícios de uns e de outros, assim como em chavões do tipo "privilégio". Inclusive porque, a partir da Emenda nº 20, as responsabilidades dos segurados dos regimes especiais são absolutamente iguais às dos segurados do regime geral, no que toca à natureza contributiva atuarial, isto é, cada um deles deve contribuir na medida e proporção necessária para a usufruição dos respectivos benefícios.

A invocação da parte final do inciso II do art. 195, como autorizativa do tratamento diferenciado, no tocante às obrigações contributivas dos aposentados do regime geral em relação aos aposentados dos regimes especiais faria aflorar a discussão sobre a legitimidade do legislador constituinte derivado em criar norma em flagrante arrepio de um princípio constitucional pétreo. O Supremo Tribunal Federal já tem precedente claro, de considerar inconstitucional norma superveniente de reforma constitucional que contrarie cláusula pétrea.

 

VII - INSTITUIÇÃO DE NOVA FONTE DE CUSTEIO: EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR E DE DISTINÇÃO DE FATO GERADOR

Ainda que ultrapassada a questão relativa ao princípio isonômico, outro corolário inevitável é que, ao instituir contribuição para o aposentado, a lei desbordou da autorização constitucional no relativo às fontes ordinárias de custeio da previdência dos servidores públicos (art. 195, II) e instituiu fonte nova de custeio, com sede no § 4º do mesmo artigo, do que decorre a manifesta necessidade de que isso devesse ser feito por via de lei complementar. Isso, na melhor das hipóteses, abstraindo-se outros tipos de análise que concluam por outras implicações no campo constitucional tributário.

O princípio contributivo inerente a ambos os regimes de previdência rege-se pelos mesmos requisitos e critérios, por força da aplicação do § 12 do art. 40. Logo, a responsabilidade contributiva do segurado do regime do art. 40 limita-se ao que for instituído para o titular de cargo efetivo, que corresponde ao trabalhador, contribuinte do regime do art. 201, vedada a cobrança de contribuição do aposentado.

Além disso, como visto antes, o art. 40 e seus parágrafos determinam que o servidor titular de cargo efetivo deve contribuir por trinta e cinco anos - e não mais que isso - para constituir direito à percepção integral dos proventos. O mesmo raciocínio vale para as hipóteses de percepção proporcional.

Logo, é inarredável a constatação de que a lei n.º 9.783, na verdade, instituiu nova fonte de custeio ao estender o tempo de contribuição ao aposentado, assim como, para isso, equiparando-o ao "servidor titular de cargo efetivo".

Não encontrando arrimo no inciso II do art. 195, a contribuição dos aposentados teria de assentar-se no § 4º do mesmo art. 195 (redação não alterada pela Emenda nº 20), que autoriza a instituição de outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social. Todavia, a autorização é condicionada: o dispositivo conclui com a restrição de que deve ser "...obedecido o disposto no art. 154, I." O qual, por sua vez, reza:

"A União poderá instituir:

I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição."

A conclusão óbvia é de que a contribuição dos aposentados, é nova fonte de custeio para a previdência:

I - deveria ter sido instituída por lei complementar, estando, então, configurada inconstitucionalidade formal visto que está sediada em lei ordinária;

II - tem o mesmo fato gerador do imposto de renda da pessoa física, configurando-se inconstitucionalidade material.

Eventual tentativa de deslocar-se o arrimo constitucional da nova exação para o art. 149 levaria a conclusão de que, identicamente, teria havido erro de forma por falta de lei complementar, com a agravante de que haveria necessidade da observância da anterioridade plena, preconizada no art. 150, III.

 

VIII - PROGRESSIVIDADE

A Lei n.º 9.783, de 1999 estabeleceu escala progressiva de aliquotagem para a contribuição dos segurados pelo regime de previdência do art. 40. Assim fazendo, ofendeu o princípio de causa eficiente e de isonomia entre os contribuintes do mesmo regime, além de, na verdade, criar disfarçado tributo adicional sobre a renda.

Aplicam-se, ao caso, duas ordens de consideração.

Primeiro, que regras constitucionais básicas, em matéria tributária, são a da isonomia e a da proporcionalidade.

Todas as hipóteses de diferenciação de alíquotas, previstas nos diversos impostos, são expressamente autorizados pela própria Constituição. O Supremo Tribunal Federal tem rechaçado todas as tentativas de se estabelecer diferenciação constitucionalmente não autorizada. Por exemplo, não obstante o disposto no § 1º do art. 156, formou-se torrencial jurisprudência naquela Corte sobre a impossibilidade de qualquer laivo de progressividade no IPTU que não corresponda ao desiderato constitucional de assegurar o cumprimento da função social da propriedade.

Apenas em alguns casos, expressamente contemplados, a Magna Carta previu fossem os tributos progressivos. Estabeleceu como princípio geral o da proporcionalidade e como princípio específico o da progressividade. A progressão das alíquotas dos impostos não é admitida pela Constituição de 1988, senão nos casos expressamente especificados.

Preleciona AIRES FERNANDINO BARRETO (in Justiça Tributária, coletânea de temas do 1º Congresso Internacional de Direito Tributário, Vitória (ES), agosto de 1988):

"Especificamente quanto ao tema da progressividade, é preciso, antes de tudo, afastar a apressada conclusão, no sentido de que o disposto no art. 145, § 1º da Constituição Federal, ao impor a gradação dos impostos segundo a capacidade econômica do contribuinte, possa justificar a progressividade. (...) Versar o tema da progressividade das alíquotas exige, preliminarmente, se tenha presente que, na Constituição de 1988, há radical diferença entre graduação, progressão, seletividade e diferenciação dos impostos. (...) A graduação dos impostos decorre de sua proporcionalidade em relação à base tributável (imposto ad valorem). Essa proporcionalidade é, como sabido, obtida pela aplicação de uma alíquota única sobre base tributável variável; da aplicação desse mecanismo (graduação) resulta imposto a pagar em montantes tanto maiores quanto maior for a base tributável. Pela graduação, portanto, é que se realiza o princípio da capacidade contributiva. (...) A progressão, todavia, é matéria inteiramente diversa da simples graduação. (...) A progressividade opera-se pelo estabelecimento de alíquotas tanto maiores quanto o forem os níveis de intensidade ou de grandeza de um específico fator ou aspecto do fato tributário. A progressão, portanto, implica desigualação, na medida em que extrapassa a mera graduação (proporcionalidade) e, conforme o fator de discriminação utilizado, desconsidera o princípio da capacidade contributiva. Daí por que a progressividade somente pode ser legitimamente adotada: a) em razão de critérios extrafiscais ou ordinatórios e b) se restrita às situações e formas previstas, expressamente, na Constituição Federal."

De qualquer maneira, o dilema de se aplicar ou não a progressividade como forma de aferição da capacidade contributiva somente se apresenta quando se trata de impostos não vinculados. Não há que se falar em capacidade contributiva em matéria de tributos vinculados, que são decretados em razão de uma atividade específica do Estado e não em relação a características do contribuinte ou de um fato econômico a ele relacionado.

A contribuição para a previdência é tributo vinculado à prestação de benefícios previdenciários. Não tem qualquer correlação com redistribuição de renda. Não é redistributivista, e sim retributivista.

São oportuníssimas as palavras do saudoso GERALDO ATALIBA, em Hipótese de Incidência Tributária, 5º ed., Ed. Malheiros, 1980, pág. 171:

"Pode-se dizer que - da noção financeira de contribuição - é universal o asserto no sentido de que se trata de um tributo diferente do imposto e da taxa e que, por outro lado, de seus princípios informadores, fica sendo mais importante o que afasta, de um lado, a capacidade contributiva (salvo a adoção da h.i. típica e exclusiva de imposto) e, doutro, a estrita remunerabilidade ou comutatividade relativamente à atuação estatal (traço típico da taxa).

Outro traço essencial da figura da contribuição, que parece ser encampado - pela universalidade de seu reconhecimento e pela sua importância, na configuração da entidade - está na circunstância de relacionar-se com uma especial despesa, ou especial vantagem referidas aos seus sujeitos passivos (contribuintes). Daí as designações doutrinárias special assessment, contributo speciale, tributo speciale, etc.

Em outras palavras, se o imposto é informado pelo princípio da capacidade contributiva e a taxa informada pelo princípio da remuneração, as contribuições serão informadas por princípio diverso. Melhor se compreende isto, quando se considera que é da própria noção de contribuição - tal como universalmente entendida - que os sujeitos passivos serão pessoas cuja situação jurídica tenha relação, direta ou indireta, com uma despesa especial, a ela respeitante, ou alguém que receba da ação estatal um reflexo que possa ser qualificado como ´especial´."

No que concerne às fontes de custeio da previdência, a Magna Carta é absolutamente clara ao restringir, no § 9º do art. 195 (introduzido pela Emenda nº 20), autorização para diferenciação de alíquotas apenas das contribuições previstas no inciso I:

"§ 9º As Contribuições Sociais previstas no inciso I deste artigo poderão ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica ou da utilização intensiva de mão-de-obra."

A contrario sensu, resta absolutamente clara a vedação de igual tratamento para aquelas derivadas do inciso II, que são as contribuições sociais dos trabalhadores, para o regime geral de que trata o art. 201, e dos servidores públicos, para o regime próprio de que trata o art. 40. Além de clara, coerente, porque as contribuições do inciso I têm a natureza jurídica de tributos não vinculados, enquanto que as do inciso II têm a natureza de tributos vinculados (como, aliás, avaliza Sacha Calmon Navarro).

Segundo, a contribuição previdenciária, por natureza, é vinculada a uma contrapartida. Não tem qualquer correlação com a capacidade contributiva do segurado e sim com os benefícios que podem ser auferidos em retorno. Se os benefícios não são progressivos, ipso facto se entende que também a contribuição não o deva ser.

As aposentadorias e pensões dos servidores são concedidas e atualizadas segundo a regra da proporcionalidade. Guardam paridade com os vencimentos dos agentes públicos em atividade, sendo revistas sempre na "mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos ativos..." (art. 40, § 8º, com a redação da Emenda nº 20).

Além disso, reza o § 5º do art. 195 que "nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total." A correspondência custo-benefício apresenta dupla face. Por um lado, limita a concessão de benefícios sem a prévia instituição das contribuições necessárias ou das fontes de custeio suficientes; por outro, impõe limitação ao aumento de contribuições sem causa eficiente, vale dizer, sem correlação com os benefícios.

Essas limitações têm perfeita e imediata aplicação quando são fixadas alíquotas progressivas para contribuições previdenciárias. Evidencia-se, nestes casos, o rompimento da relação custo-benefício, pois os benefícios não são progressivos, mas proporcionais à remuneração do agente público. Claramente importam em desvirtuamento da natureza da contribuição social, que passa significar verdadeira tributação adicional sobre a renda, desfigurando a natureza e a finalidade da exação, com infringência do princípio da isonomia tributária.

No caso de contribuição dos servidores públicos federais, o STF já se manifestou, ainda que indiretamente, pela impossibilidade constitucional de se imporem alíquotas diferenciadas.

Na ADIN n.º 790-4 DF, proposta pelo Procurador-Geral da República, discutiu-se a inconstitucionalidade do § 1º do art. 231 da Lei n.º 8.112, de 11-12-90, do seguinte teor:

"§ 1º A contribuição do servidor, diferenciada em função da remuneração mensal, bem como dos órgãos e entidades, será fixada em lei."

Na inicial e no parecer, o Procurador-Geral da República pugnou pela inconstitucionalidade do dispositivo, vez que o montante da contribuição deve atender à relação custo-benefício, sendo que estes não são progressivos, mas proporcionais à remuneração do contribuinte. A progressividade, segundo ele, implica o desvirtuamento da natureza da contribuição social, passando-se a ter verdadeiro adicional sobre a renda, contrariando-se, assim, os artigos 149 e 153, III, da CF.

A alegada inconstitucionalidade do § 1º do art. 231 foi negada (por maioria) apenas pelo fato de que os Senhores Ministros não viram, no texto atacado, obrigatoriedade à diferenciação por via de alíquotas progressivas, porque a diferenciação poderia ser feita exclusivamente por via de incidência de uma mesma alíquota sobre bases de cálculo diferenciadas, ou seja, a remuneração de cada servidor. Entretanto, restou bem claro que não seria admitido que a diferenciação se operasse por meio de variação de alíquotas. A seguir, alguns trechos de votos dos Senhores Ministros do STF:

I - Ministro Marco Aurélio (Relator): "Em um primeiro plano, constata-se que o texto não é explícito relativamente à forma da diferenciação nele contemplada, ou seja, junge-se à remuneração do servidor sem especificar, em si, o fator percentual. (...) Nada impede que o legislador ordinário venha a fazer a diferenciação preconizada de forma consequencial, isto é, tendo-a como resultado único e exclusivo do fato de a alíquota incidir sobre bases variáveis, considerados os níveis de vencimentos dos servidores." (Os negritos não são do original);

II - Ministro Francisco Rezek: "Quanto ao § 1º do art. 231, meu ponto de vista é aquele que o parecer (do Procurador-Geral da República) exteriorizou. Esse § 1º induz à progressividade. Penso que o propósito social que se estaria desejando prestigiar de tal maneira - fazendo variar não apenas os montantes absolutos, em função de montantes também absoluto de retribuição mensal, mas fazendo variar as próprias alíquotas - já é atendido pela diferença de contribuição em seus números absolutos, e que a diferenciação de alíquota configura, tal como ponderou o Ministério Público, uma tributação sobre a renda que não se compatibiliza com as regras pertinentes da Constituição Federal." (idem);

III - Ministro Carlos Velloso: "Poderá ocorrer inconstitucionalidade material por parte do legislador, ao dar cumprimento ao que nele se contém. O legislador ordinário poderá entender - porque o § 1º não determina que haja de uma certa forma, nem ele está obrigado a respeitar o que se contém no § 1º do art. 231, que a diferenciação dar-se-á em razão da remuneração maior ou menor ou, em razão da base de cálculo e não da alíquota. Nestes termos, não haverá inconstitucionalidade material." (Idem).

O Governo tem plena consciência da inconstitucionalidade material da progressividade. Tanto que, em risível tentativa de fugir àquela manifestação da Suprema Corte, fez revogar o art. 231 da Lei 8.112, de 1990, exatamente no contexto da Lei n.º 9.783, de 1999, que estabeleceu as alíquotas diferenciadas.

 

X - DESTINAÇÃO DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO E CONSEQUÊNCIAS SOBRE A CAUSA EFICIENTE

Conforme já assinalado antes, a contribuição dos servidores públicos, tal como instituída e agravada na Lei nº 9.783, de 1999, tem assento inconteste no art. 195. Se antes poderia haver discussão a respeito disso, agora não mais. O art. 12 da Emenda nº 20 deixa claríssima a subordinação, ao art. 195, das contribuições "destinadas ao custeio da seguridade social e dos diversos regimes previdenciários."

Acontece que a mesma Emenda nº 20 criou vedação absoluta para o emprego dos recursos arrecadados em finalidades diversas do pagamento de benefícios do regime geral. Eis o texto pertinente:

"Art. 1º A Constituição Federal passa a vigorar com as seguintes alterações:

..................................

Art. 167. São vedados:

..................................

XI - a utilização dos recursos provenientes das contribuições sociais de que trata o art. 195, I, a, e II, para a realização de despesas distintas do pagamento de benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201."

"Art. 12. Até que produzam efeito as leis que irão dispor sobre as contribuições de que trata o art. 195 da Constituição Federal, são exigíveis as estabelecidas em lei, destinadas ao custeio da seguridade social e dos diversos regimes previdenciários."

A leitura não deixa dúvida. Pelo art. 12, as contribuições então vigentes, para o custeio da seguridade social e dos diversos regimes previdenciários, continuaram exigíveis somente até a produção dos efeitos das novas leis pertinentes às contribuições de que trata o art. 195 - obviamente para custeio da mesma seguridade social e dos mesmos diversos regimes previdenciários.

A Lei nº 9.783, de 1999, é uma dessas novas leis, relativa ao regime previdenciário dos servidores públicos federais.

Entretanto, o produto de sua arrecadação, por força do inciso XI, acrescentado ao art. 167, somente pode ser utilizado para pagamento de despesas do regime geral de previdência de que trata o art. 201.

Ora, desta forma a própria Emenda nº 20 tira a causa eficiente para a cobrança da contribuição dos servidores e inviabiliza qualquer possibilidade de equilíbrio atuarial do regime previdenciário derivado do art. 40.

 

X - CONFISCO

Ao criar contribuição previdenciária para o aposentado, a Lei nº 9.783, de 1999, afrontou o art. 150, IV da Constituição Federal, verbis:

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas aos contribuintes, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

..................................

IV - utilizar tributo com efeito de confisco."

A ilegitimidade constitucional da imposição contributiva aos aposentados é corolário inevitável a que se chega por qualquer dos caminhos trilhados nas análises precedentes. Aliás, como já mencionado, nem se pejou o Poder Executivo, autor do projeto, de camuflar seu intento na própria Exposição de Motivos que acompanhou a Mensagem Presidencial:

"A instituição de contribuição previdenciária para os servidores públicos inativos é da maior relevância para corrigir as distorções existentes. Como atualmente eles deixam de contribuir ao se aposentarem, a remuneração líquida dos inativos acaba sendo mais elevada que a dos ativos."

Meridianamente claro que o Senhor Presidente da Republica propôs, e o Congresso Nacional foi coagido a aprovar como penhor de credibilidade no calor da crise financeira que assolava o país, um instrumento tributário para, mediante via indireta, confiscar parte da renda dos aposentados para que sua remuneração líquida fosse igualada aos dos ativos. Olvidando-se, entretanto, de que, certo ou errado, a remuneração líquida dos aposentados decorre de comandos constitucionais.

A nítida noção de confisco, no caso, emerge, também, do valor da exação. Por sua indisfarçável natureza de tributação adicional da renda ela deve ser somada ao imposto de renda pessoa física. Verifica-se então que, na maioria dos casos, nada menos que 44,1% dos proventos serão descontados.

Paralelamente à infringência ao princípio do não-confisco, a taxação adicional da renda confere também um caráter nítido de quebra da igualdade de direitos com os demais contribuintes de imposto de renda pessoa física, assunto tratado no já transcrito inciso II do art. 150 da Magna Carta.

 

XI - MENS LEGISLATORIS

O legislador constituinte derivado desejou, inequivocamente, que o aposentado não contribuísse para a previdência, ao aprovar a Emenda n.º 20, de 1998. Quanto ao segurado da previdência geral o texto final assim o expressou, na redação do inc. II do art. 195, in fine: "II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de que trata o art. 201."

Quanto ao segurado do regime do art. 40, de ver que, na versão da PEC-33, na forma do Substitutivo do Senado Federal, levada a votação em primeiro turno na Câmara dos Deputados, conforme ata da sessão publicada no Diário da Câmara dos Deputados, de 12 de fevereiro de 1998, constava o § 1º do art. 40, com o seguinte teor:

"§ 1º As aposentadorias e pensões serão custeadas com recursos provenientes das contribuições dos servidores e pensionistas e do respectivo ente estatal, na forma da lei, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão de valor igual ou inferior ao limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201."

Esse dispositivo foi rejeitado em plenário, ao se deliberar o Destaque para Votação em Separado da bancada governista, na forma abaixo (Pág. 04218 do Diário da CD):

"DESTAQUE DE BANCADA.

Senhor Presidente da Câmara dos Deputados, Nos termos do art. 161, inciso I, § 2º do Regimento Interno, requeremos a Vossa Excelência, destaque para votação em separado - DVS, para supressão do § 1º, do art. 40, constante do art. 1º do Substitutivo do Senado Federal à PEC n.º 33-G, de 1995. -

JUSTIFICAÇÃO - Entendimentos firmados entre os Líderes do Partidos da base de apoio ao Governo, com a expressa concordância do Poder Executivo, através de seu Líder, Deputado Luís Eduardo, concluíram que a cobrança de contribuição previdenciária de aposentados ou pensionistas da União, após o segurado ter cumprido todos os requisitos funcionais pecuniários e temporais estabelecidos legalmente como necessários à obtenção desse benefício, é indevida. Entendeu-se, também que essa decisão ao nível de Estados e Municípios compete aos respectivos entes, em absoluto respeito ao princípio da autonomia federativa, para o que, é essencial que a desoneração dos servidores federais inativos e pensionistas seja definida em lei específica e não na Constituição Federal.

Sala das Sessões, 11 de fevereiro de 1998. Dep. Gerson Peres, 1º Vice-Líder do PPB - Dep. Odelmo Leão, Líder do PPB - Dep. Inocêncio de Oliveira, Líder do PFL - Dep. Aécio Neves, Líder do PSDB - Dep. Geddel Vieira Lima, Líder do Bloco Parlamentar PMDB/PSD/PRONA - Dep. Paulo Heslander, Líder do PTB - Dep. Luís Eduardo, Líder do Governo."

Como se vê na página 04229 do mencionado Diário da Câmara dos Deputados, o dispositivo em votação (§ 1º do art. 40) foi rejeitado por 481 votos contra 5, contando-se, ainda, 5 abstenções.

Sem embargo de todas as restrições que as regras de hermenêutica jurídica impõem à apuração da vontade do legislador como condicionante da mens legis, de ver que o direito brasileiro não refuga a interpretação histórica do texto constitucional, conforme precedentes do próprio Supremo Tribunal Federal.

No Acórdão prolatado no MS 20.069, (RDA, v. 135, 1979, pág .64-65), o qual é baseado em lições de Carlos Maximiliano, sendo relator o Ministro Moreira Alves, são enumerados os princípios que devem nortear o intérprete na utilização dos elementos históricos na tarefa hermenêutica, quais sejam:

"a) só devem servir de guia da exegese os materiais legislativos quando o pensamento diretor, o objetivo central, os princípios que dos mesmos ressaltam encontram a expressão no texto definitivo;

b) proceda também o intérprete ao exame do dispositivo, em si e em relação ao fim a que se propõe; tente, sempre e complementarmente, o emprego de processo sistemático e o confronto do resultado com os princípios científicos do Direito;

c) admita o sentido decorrente dos trabalhos preparatórios quando plenamente provado, evidente, acima de qualquer dúvida razoável;

d) se um preceito figurava no Projeto primitivo e foi eliminado, não pode ser deduzido, nem sequer por analogia, de outras disposições que prevaleceram, salvo quando a supressão se haja verificado apenas por o considerarem desnecessário ou incluído implicitamente no texto final." (o negrito não é do original).

Inequivocamente, os princípios acima enunciados ajustam-se perfeitamente ao caso presente. Resta plenamente provado, acima de qualquer dúvida razoável que o preceito figurava no projeto de reforma constitucional e foi retirado como resultado de vontade claramente manifestada pelos legisladores e não pode ser deduzido nem por analogia, de outras disposições que prevaleceram. Pelo contrário, a interpretação sistemática da Emenda Constitucional nº 20, não só de seus próprios dispositivos, mas deles com os demais dispositivos constitucionais não alterados, leva à única interpretação possível: da impossibilidade de se impor contribuição previdenciária, pois, "após o segurado ter cumprido todos os requisitos funcionais pecuniários e temporais estabelecidos legalmente como necessários à obtenção desse benefício é indevida" (cf. justificação do Destaque de Votação em Separado).

E, pode-se acrescentar, muito menos mediante lei ordinária e com estabelecimento de alíquotas progressivas.

 

XII - CONCLUSÃO

As notas precedentes decorreram da preocupação central de examinar o enquadramento constitucional da Lei nº 9.783, de 28 de janeiro de 1999 no regramento introduzido pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998, principalmente no que se refere ao encargo criado para os aposentados. As incompatibilidades apontadas emergiram como as mais evidentes. Sem embargo, outras poderão surgir do exame percuciente pelos doutrinadores e por todos aqueles que carregam a responsabilidade de interpretar, aplicar e construir o Direito.

Não se afasta, também, o apontamento de discrepâncias com outros dispositivos e princípios da Carta Magna. O escopo desse documento era, basicamente, demonstrar que as alterações trazidas pela Emenda nº 20 ao regime de aposentadoria dos servidores públicos foi de tal monta que a inelutável obsolescência condenou ao desuso todo o arsenal doutrinário e jurisprudencial que antes informavam o conceito de prêmio que embasava o antigo regime. O conceito previdenciário, contributivo e atuarial que agora fornece os alicerces para o novo regime estão a desafiar a argúcia e a ciência jurídica para a construção de um novo referencial interpretativo. As apontadas incongruências da Lei nº 9.783 decorrem, basicamente, da incapacidade (ou impossibilidade prática) dos legisladores em atentarem para isso. Certamente caberá ao Poder Judiciário restabelecer a normalidade jurídica, para segurança dos cidadãos e gáudio dos que foram diretamente atingidos pela malsinada lei.

 

 

* Auditor fiscal do Tesouro Nacional aposentado, ex-diretor-geral da ESAF, ex-coordenador-geral de Recursos Humanos do Ministério da Fazenda.

 

 

 

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1456>. Acesso em: 02 jun. 2006.