A maioridade
à luz do novo projeto do Código Civil
Autor: Ricardo Braga Lou
Dentre tantas outras importantíssimas
alterações e inovações que o novo Código Civil trará para o cenário jurídico
pátrio; a questão da maioridade é, sem dúvida, uma das questões que se aprovada
como está no Projeto ao novel codex, refletirá em muitas outros ramos do
direito, o que, sem sombra de dúvidas irá fazer nascer uma das mais implacáveis
batalhas de posições que veremos no novo século que se iniciará juntamente com
a vigência do tão esperado novo Código Civil.
Hoje vivemos sobre a égide do Artigo 9º onde a
maioridade se finda aos vinte e um anos completos e, sobre o disposto no artigo
6º, I, onde os menores de vinte e um e maiores de dezesseis anos, são
relativamente incapazes para a vida civil, o que significa dizer que, dentre os
limites deste último artigo, a pessoa necessita de ser assistida para ser
validado certos atos seus na vida civil.
Pois bem, pretende o novo codex impor que se
atingirá a maioridade civil aos dezoito anos, havendo assim o rebaixamento de
tal instituto civil, rebaixamento este que implicará na modificação tanto da
Constituição Federal como também do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Há uma grande corrente parlamentar e até
jurídica que entende que aos 18 anos a pessoa já tem capacidade para gerir sua
vida integralmente, obviamente que a primeira corrente vê neste rebaixamento
uma grande alavanca eleitoral.
Mas para os juristas que defendem a
continuidade da maioridade ser atingida somente aos 21 anos, este vêem este
rebaixamento como uma grande irresponsabilidade, pois os danos que serão
causados pelo advento da maioridade ser alcançada aos 18 anos, será de grande
monta.
Em sendo aprovado o novo Código Civil com esta
alteração ter-se-á instalado o caos jurídico em nosso cotidiano.
Sabemos que o genitor tem o dever de sustento
aos filhos enquanto dure o pátrio poder e que por adoção jurisprudencial esta
obrigação se estende até aos 24 anos, desde que o filho esteja em universidade
e não exerça atividade remunerada. Pois bem, tornando possível a maioridade aos
18 anos, chegada essa idade, o genitor não mais terá a obrigação de sustento,
esteja o filho em universidade ou não; exerça ele atividade remunerada ou não. Assim,
este filho terá de exercer uma atividade remunerada, pois já não mais contará
com a obrigação de seu genitor. De modo que necessitando de auxílio este deverá
ingressar com Ação de Alimentos contra o pai.
Percebe-se, nesta modificação, que o dever de
sustento não irá mais existir, o que significa dizer, que cessará também o
pátrio poder, restando ao filho somente o caminho da Justiça.
Said Cahali sustenta em suas palavras sobre
esta temática o seguinte:
"Aqui o genitor é que será o grande
beneficiado, porque ele terá o dever de sustentar o filho até os 18 anos. Com
essa idade, ele pára de pagar alimentos para o filho. A partir da aí, o filho
terá que exercer atividade para sua manutenção ou entrar com ação de alimentos.
Outro aspecto: vamos reduzir, pelo projeto,
para 16 anos a possibilidade de emancipação do filho. Ora, se o filho é
emancipado com essa idade, ele passa a adquirir a maioridade por força da
emancipação, e, sob esse aspecto, o pai não é obrigado a sustentá-lo. O pai
pode ser obrigado a prestar alimentos em função de uma ação que venha a ser
proposta pelo filho, que terá de provar que não tem condições para trabalhar e
que o pai tem condições para prestar alimentos a ele. Esse é primeiro aspecto
que me parece relevante.
Até agora não vi vantagem para o filho. É um
erro de perspectiva. A incapacidade civil é imposta ao menor, ao deficiente
mental e, antes do Estatuto da Mulher Casada, também à mulher casada, mas não
no pressuposto de que se trata de uma pessoa discriminada, numa situação
constrangedora. O instituto da incapacidade visa a proteção do incapaz, e com
essa redução da menoridade para 18 anos, estamos retirando um instrumento de
proteção do menor".
É comum hoje em nossos dias escutarmos que uma
criança é inteligente, mas pergunta-se até onde vai essa inteligência? Tem esse
adolescente capacidade para gerir sua vida? Estará ele capaz para enfrentar os
estranhos caminhos da vida?
Temos que nos aperceber de que uma coisa é ser
inteligente e outra, esta bem diferente, é conhecer a malícia da vida.
Dizer-se-á, mas hoje alguns atos
poderá ser efetivado pelo menor de 21 e maior de 18. Por que então tanta
polemica sobre se reduzir a maioridade para os 18 anos? Simplesmente porque
para os que hoje se encontram nesta condição, para que possam realizar alguns
atos civis em sua vidas, deverão ser assistidos. E ainda será perguntado se se
necessita de pais; tutor e curador, por que não se rebaixa a maioridade de vez
por todas? Porque ninguém melhor do que estas pessoas para saber se tem ou não
condições daquele menor gerir sua própria vida e por condições entenda-se
capacidade.
Outro aspecto interessante sobre
a maioridade aos 18 anos é que até se atingir essa idade o menor será
considerado desde o início de sua vida até os 18 anos absolutamente incapaz.
Neste sentido com muita
propriedade, o Min. Moreira Alves, do STF discorreu:
"Não há dúvida de que a
tendência mundial é manter a maioridade aos 18 anos. Por isso mesmo tivemos
aquele problema. Eu disse que não é possível também ficar do início da vida até
os 18 anos absolutamente incapaz. Já temos em nosso sistema que aos 16 anos o
indivíduo é relativamente incapaz. Ele não depende, portanto, de representante,
mas apenas de um assistente. Mas os atos são simplesmente anuláveis e podem ser
confirmados. Enfim, há toda aquela série de princípios que procura, de certa
forma, dar validade aos atos que eles praticam, ainda que sem assistência, o
que não acontece na representação e, portanto, na incapacidade absoluta. Ora,
se já admitimos que dos 16 até aos 21 anos haja uma incapacidade relativa, não
tem sentido que agora os indivíduos de até 18 anos fiquem absolutamente
incapaz. É preciso Ter um parâmetro ou limite para incapacidade absoluta".
(g.n.)
Devemos ainda considerar que se
ter a maioridade fixada aos 18 anos teremos reflexões no instituto do
casamento, no Direito de Família e Sucessões e até mesmo no Direito Penal.
Sobre o Direito Penal, nos
defrontaremos com uma questão curiosa e por isso não menos importante.
Aos menores que cometem atos
infracionais são remetidos, muitos deles, quando não se verifica outra
possibilidade, a sua internação em estabelecimentos educacionais (FEBEM). Há
neste estabelecimentos menores internado além dos 17 anos, ou sejam, há os que
já completaram 18 anos e ali permanecem por força de uma medida adotada pelo
Eca.
Como se operará diante desta
questão, pois de um lado teremos o Direito Civil impondo a maioridade aos 18
anos e nos deparamos com o ECA nos impondo medida como esta, de se manter o
jovem infrator com mais de 18 anos ainda sob a custódia desses estabelecimentos
para menores? Ou se apanhará todos esse que se encontram em tais situações e
transferimos para penitenciária ou deixamos como se apresenta?
Vejamos que o rebaixamento da
maioridade implicará em diversos ramos e institutos do Direito pátrio.
Uma das implicações que ainda não
está definida é a que será aplicada as novas regras aos processos pendentes ou
não?
O instituto da capacidade civil,
ao trata da maioridade será abruptamente modificado com o rebaixamento da
maioridade dos 21 para 18 anos, e, neste sentido, há se fazer uma reflexão
criteriosa para tal pretensão. Pretensão esta que, por sua natureza puramente
política, irá integrara o novo Código Civil.
Todos nós sabemos que os Códigos
em nosso país, vigem em todo território nacional por igual, não temos diversas
codificações para cada unidade federativa.
Assim, pensar que os valores são
iguais para todas as cidades que compõem nosso país, seria no mínimo infantil,
pois nem todos os jovens são iguais aos jovens de cidades como São Paulo ou Rio
de Janeiro, ou ainda como nas de grande porte. Temos que nos apercebemos de que
há cultura e valores bem distintos de populações nacionais. Conceber que todos
os valores são iguais nos mais diferentes rincões desse país continental, é
estar errando conscientemente de que se está cometendo.
Há que se preservar certos
princípios gerais, ainda mais em se tratando de Direito, pois nossa cultura
jurídica está balizada nos princípios dos tempos de Roma, assim como em muitas
outras culturas. Derrubar todos estes anos de cultura, apenas por um propósitos
eleitoreiros não nos parece sensato.
Apenas para reafirmar nossa posição, temos nos
dias de hoje um sem número de Ações de Alimentos, intentadas por pais que,
ainda que por força de Lei têm a obrigação de prestarem alimentos aos seus
filhos, mas ainda assim mesmo não a cumprem. Imaginemos o que acontecerá quando
o Código Civil entrar em vigor e dirá que aos 18 anos os pais não têm mais
qualquer obrigações de sustento para com seus filhos.
Se apesar da imposição da Lei impor esta
obrigação já temos um Judiciário abarrotado de ações desta natureza, qual será
então o acervo que teremos com a não obrigatoriedade?
É preciso cautela.
NOTAS
1 Said Cahali, palestra realizada
na Câmara dos Deputados, em 01/09/99.
2. Moreira Alves, palestra
realizada na Câmara do Deputados em 25/08/99.
*Ricardo Braga Lou
Acadêmico de Direito em São Paulo.