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Robô-Juiz

 

(Artigos - 18.06.2003)

 

José Maria Rosa Tesheiner (*)

 

    Em chat do Curso de Especialização em Processo Civil à Distância, edição de 2003, promovido pela PUC-RS, veio à tona o tema do robô-juiz, que desencadeou as presentes reflexões.

 

    Deve-se indagar, inicialmente, se se trata de ficção ou de possibilidade próxima? Não creio que se cogite, no momento, de análise e avaliação das provas produzidas, por um computador em substituição ao juiz de carne e osso. Essa hipótese não foi sequer considerada.

 

    Mas, apresentados os fatos (da mihi factum), não tenho dúvidas quanto à possibilidade de aplicação maquinal do direito (tibi dabo jus), mesmo no estado atual da tecnologia. Aos que possam duvidar, lembro um livro, não tão antigo, de Gustavo Corção, “As fronteiras da técnica”, em que apontava como impossível a tradução de textos, de uma para outra língua, o que já se revelou perfeitamente possível, embora ainda necessitada de aperfeiçoamentos a técnica correspondente.

 

    Um temor, manifestado por muitos, foi o da possível aplicação de uma norma geral implacável a situações que exigiriam ponderação humana.

 

    Mas, pergunta-se, o que são as súmulas, vinculantes ou não, o que são as próprias normas legais senão respostas padronizadas para situações iguais ou, pelo menos semelhantes?  Seja como for, essa objeção não tem caráter peremptório, porque devemos imaginar o juiz-robô não como uma máquina com poder jurisdicional, mas como auxiliar do juiz. E, ainda que se lhe atribuíssem poderes jurisdicionais, poderíamos ter uma segunda instância, de juízes humanos, para detectar possíveis casos de “summum jus summa injuria”.

 

    Observo, de passagem, que, para a aplicação implacável da lei não se exige máquina. Apontam-se, aqui e ali, casos de aplicação do que chamo de “lógica da guilhotina”. Recordo-me de certo funcionário, com muitos anos de serviço, que requereu certa vantagem. Examinado o expediente, constatou-se a nulidade da investidura, por defeito formal insanável. Solução proposta, felizmente não aceita: negar ao requerente, não apenas a vantagem requerida, como determinar seu imediato afastamento do serviço público...

 

    É de se observar também que possíveis exceções à regra geral poderiam ser introduzidas no “programa”, de modo que a própria máquina posteriormente as levaria em consideração. Quem alguma vez jogou algum dos modernos “games” não pode ter dúvida alguma quanto à possibilidade de uma máquina reagir diferentemente, em função da variedade das situações que se lhe apresentem. Sendo muitas as exceções e não revelando a máquina o iter lógico percorrido, poder-se-ia chegar ao ponto de se obter respostas aparentemente aleatórias, como as produzidas por juízes humanos.

 

    Uma visão prospectiva nos aponta o desenvolvimento provável. A informática, restrita, no início, a tarefas meramente burocráticas, de caráter manifestamente repetitivo, acabará por se introduzir na própria fundamentação das sentenças. De certo modo já é assim. Partes da sentença são simplesmente copiadas do banco de dados de cada juiz e coladas na erudita sentença. Já se fala mesmo em “causas dos computadores”. Recortando e colando, os advogados das partes produzem longos arrazoadas e contra-arrazoados, a que o juiz responde com uma longa sentença, igualmente recortada e colada.

 

    É, para o bem e para o mal, o mundo dos computadores que se vai introduzindo nas atividades forenses.

 

    Os homens vão se tornando cada vez mais dispensáveis. Por isso aumenta o desemprego. Mas resta intocável esta afirmação: o Direito não existe senão para o homem.

 

 

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(*) Professor de Processo Civil na PUC-RS.

E.mail: jmrt@terra.com.br>

(Artigo originalmente inserido em http://www.tex.pro.br/