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Virtualização do Processo Judicial
André Luiz
Junqueira*
Trabalho elaborado em julho de 2006.
RESUMO: Neste trabalho analisaremos o
Projeto de Lei n° 5828/2001 da Câmara dos Deputados, que dispõe sobre a
informatização do processo judicial. Relacionando também algumas medidas
tomadas pelo Poder Judiciário para a instauração do processo virtual no Brasil.
SUMÁRIO: 1.
Introdução. 2. O Processo Virtual. 3. Exemplos de Informatização no Poder
Judiciário. 4. Conclusão. 5. Fontes
A Associação dos Juizes Federais do
Brasil (AJUFE) encaminhou um projeto de lei sobre a informatização do processo
judicial à Câmara dos Deputados em 2001.
O Projeto foi remetido à Comissão de Constituição e Justiça e de Redação sob o número 5828. O projeto foi aceito após o parecer da comissão. O Projeto de Lei (PL) foi alterado e renomeado para 5828-A. Logo, em junho de 2002, o PL n° 5828-B foi remetido à apreciação do Senado Federal.
No Senado, o PL foi chamado de
Projeto de Lei da Câmara n° 71/2002. O Senado terminou a sua apreciação somente
em janeiro de 2006, quando emitiu parecer favorável aprovando um texto
substitutivo ao original. Este substitutivo do Senado recebeu o nome de 5828-C
quando enviado novamente para a Câmara, onde obteve aprovação da Comissão de
Constituição e Justiça e Cidadania (com 6 Emendas de
Redação).
O andamento dos trabalhos
legislativos se deve também ao empenho do Conselho Nacional de Justiça para com
a Reforma do Judiciário. Vale dizer que, desde a criação do Conselho Nacional
de Justiça – CNJ (pela Emenda Constitucional n°45/2004), o mesmo vem
empreendendo grandes esforços com o objetivo de alcançar o uso pleno da
Tecnologia de Informação (TI) no Judiciário, para que a tutela jurisdicional prestada
pelos seus órgãos seja realizada de forma mais rápida e com maior qualidade.
Graças
aos esforços do CNJ, brevemente o projeto em questão será votado. Embora haja
um previsível atraso em decorrência das Eleições Presidenciais de 2006.
O
presente trabalho pretende analisar as disposições do último texto do Projeto
de Lei n° 5828, que foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e
Cidadania da Câmara. Relacionando também alguns exemplos de informatização de
atos processuais no Poder Judiciário.
2. O
PROCESSO VIRTUAL
Primeiramente, o projeto de lei em
questão não impõe aos tribunais a obrigatoriedade da informatização dos
processos judiciais, na verdade lhes concede a faculdade de manter processos
exclusivamente em meio eletrônico.
O principal intuito da futura lei é
estabelecer de forma inequívoca que o valor probante dos documentos eletrônicos
não é menor que os impressos. Dessa forma, a lei dispõe sobre as diretrizes
básicas que os tribunais deverão seguir para manterem processos virtuais.
Em outras palavras, o uso do meio eletrônico somente estará liberado após a publicações das normas internas dos respectivos tribunais (algumas já vigoram em determinados tribunais), sendo que estas deverão estar em consonância com as diretrizes desta futura lei.
Na forma de tópicos, apresentaremos
comentários sobre a maioria dos artigos do projeto.
Da
informatização do processo judicial:
·
A tramitação de processos judiciais (civil, penal,
trabalhista, de juizados e de qualquer instância), comunicação de atos e
transmissão de peças poderão ser feitas em meio eletrônico (Art. 1° caput e § 1°);
·
Os documentos digitais (petições, recursos e atos
processuais em geral) só terão validade se possuírem assinatura eletrônica
baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada
(Art. 2° caput); e cada usuário terá
a sua assinatura digital se fizer um credenciamento prévio junto ao órgão do
Poder Judiciário que irá atuar (Art. 2° e parágrafos);
·
O credenciamento mencionado no item anterior é facultativo
para as partes, contudo, é obrigatório para as entidades da administração
pública direta e indireta (Art. 17°);
·
A petição eletrônica é tempestiva se enviada até a
meia-noite do seu último dia (Art. 3°, parágrafo único).
Da
comunicação eletrônica dos atos processuais:
·
A publicação de Diários Oficiais poderá ser realizada
totalmente em meio eletrônico, até dispensando o meio impresso (Art. 4° caput c/c § 2°) – diversos diários já
são publicados em meio eletrônico, mas sempre com a sua cópia impressa;
·
Os casos previstos em lei que exijam intimação ou
vista pessoal não podem ser supridos por meio virtual (Art. 4°, § 2° parte
final);
·
As intimações serão feitas em meio eletrônico, mas
apenas aos que se cadastraram junto ao órgão judicante, tal situação dispensa a
publicação em diário oficial impresso ou eletrônico (Art. 5° caput) – intimação semelhante já é
utilizada pela Justiça Federal de Santa Catarina;
·
A intimação virtual somente será considerada realizada
quando: (1) o intimado acessar a mensagem com o inteiro teor da intimação (o
Poder Judiciário deverá criar um software
que possibilite o envio de aviso de leitura, similar ao utilizado no Microsoft Outlook e ao Sistema utilizado
pela Justiça Federal de Santa Catarina), ou (2) ao decorrer de 10 dias do aviso
de recebimento, ou seja, mesmo que o intimado não leia a intimação (Art. 5°, §§
1°, 2° e 3°) – a atual e vigente Resolução n° 30/2004 do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região dispõe de forma semelhante;
·
O juízo poderá considerar outro meio de intimação se
houver chance de causar prejuízo a quaisquer das partes (Art. 5°, § 5°);
·
As citações também obedecerão o
disposto das intimações, com exceção do Direito Processual Penal e Infracional (Art. 6°);
·
Todas as comunicações oficiais dos órgãos do judiciário
(cartas precatórias, rogatórias, de ordem, e outras entre órgãos do Estado)
poderão ser transmitidas em meio eletrônico (Art. 7°).
Do processo
eletrônico:
·
O processo poderá ser instaurado pelos tribunais de
forma total ou parcialmente eletrônica (Art. 8° caput e Art. 11°, § 5°); os autos
dos processos devem ter sua segurança e integridade resguardados (Art. 12°, §
1°), e somente as partes e o Ministério Público poderão ter acesso ao seu
inteiro teor, respeitando o sigilo e o segredo de justiça (Art. 11°, § 6°);
·
Na distribuição de quaisquer peças processuais em meio
eletrônico, dispensa-se a intervenção do cartório ou secretaria judicial (de
forma semelhante ao programa de envio da declaração de Imposto de Renda da
Secretaria da Receita Federal – o ReceitaNET), a autuação
será automática com emissão de recibo eletrônico de protocolo (Art. 10° caput);
·
Na hipótese do Sistema do Poder Judiciário ficar
indisponível por motivo técnico no último dia de um prazo processual, o prazo
se prorroga automaticamente ao primeiro dia útil seguinte à solução do problema
(Art. 10, § 2°);
·
Todos os órgãos do Poder Judiciário que se utilizam do processo eletrônico são obrigados a
disponibilizar à qualquer interessado equipamentos com acesso à Internet para digitalizar e distribuir
suas peças processuais (Art. 10, § 3°) – este dispositivo tenciona impedir a
elitização do processo eletrônico e da justiça;
·
Todo documento eletrônico juntado aos processos
eletrônicos terá o mesmo valor que o original (Art. 11° caput c/c § 1°);
·
Qualquer argüição de falsidade do documento original
deverá respeitar o Código de Processo Civil (Art. 11°, § 2°);
·
Os documentos originais deverão ser guardados até o
fim do prazo para interposição de ação rescisória, ou seja, 2
anos após o trânsito julgado (Art. 11°, § 3°);
·
No caso de remessa dos autos eletrônicos para
tribunais que não possuem sistemas compatíveis, o processo deverá ser impresso
por inteiro (Art. 12°, §§ 2°, 3° e 4°);
·
Sob determinação do juiz, os dados e documentos
necessários à instrução do processo poderão ser enviados por meio eletrônico
(Art. 13° caput); sendo que os entes
e órgãos que detém tais dados deverão obedecer a
solicitação judicial em até 90 dias (Art. 13°, § 3°).
Das
disposições gerais e finais:
·
Salvo justo motivo que comprometa o acesso à Justiça,
os processos virtuais sempre serão vinculados aos números de CPF ou CNPJ das
partes (Art. 15° caput); assim como
as acusações criminais deverão conter os números dos registros dos acusados no
Instituto Nacional de Identificação do Ministério da Justiça – INI (Art. 15°,
parágrafo único);
·
Os órgãos da Justiça deverão editar regulamentos
suplementares sobre o processo virtual (Art. 18°);
·
São considerados válidos todos os atos praticados em
meio eletrônico antes da publicação da lei (Art. 19°) – tal efeito retroativo
se mostra necessário, uma vez que já existem tribunais
procedendo com atos processuais exclusivamente virtuais.
Alterações
no Código de Processo Civil:
·
Art. 38, parágrafo único – é admissível a procuração
com assinatura digital;
·
Art. 154, parágrafo único – todos os atos e termos
processuais podem ser produzidos em meio eletrônico (o atual texto, decorrente
da alteração promovida pela Lei n° 11280/2006, já dispõe que os tribunais podem
se utilizar do meio eletrônico para a prática de atos
processuais, seguindo o padrão da Infra-Estrutura de Chaves Públicas – ICP);
·
Art. 164, parágrafo único – a assinatura dos juizes
poderá ser feita digitalmente;
·
Art. 169, §§ 1°, 2° e 3° – possibilidade de
armazenamento dos dados do processo em meio virtual;
·
Art. 202, § 3° – as cartas podem ser feitas digitalmente;
·
Art. 221, IV – é admissível a citação por meio eletrônico;
·
Art. 237, parágrafo único – é admissível a intimação
por meio eletrônico;
·
Art. 365, IV, V, §§ 1° e 2° – a força probante dos
documentos eletrônicos equipara-se aos originais;
·
Art. 399, §§ 1° e 2° – é possível fornecimento de
documentos pelas repartições públicas por meio eletrônico;
·
Art. 417, §§ 1° e 2° – os depoimentos em juízo podem
ser armazenados em meio eletrônico;
·
Art. 457, § 4° – todos os atos da instrução e
julgamento podem ser armazenados em meio eletrônico;
·
Art. 556, parágrafo único – os votos, acórdãos e
demais atos processuais podem ser armazenados em meio eletrônico.
3. EXEMPLOS
DE INFORMATIZAÇÃO NO PODER JUDICIÁRIO
Este
trabalho não comportaria todos os exemplos bem sucedidos no uso da Tecnologia
de Informação na Justiça, uma vez que muitos tribunais já possuem sistemas
informatizados internos, sistemas de acompanhamento processual por correio
eletrônico (chamado de Push),
bibliotecas jurídicas eletrônicas, etc.
O
Diário Oficial da União e o Diário da Justiça já são publicados na Internet há alguns anos (vide o
endereço: www.in.gov.br). A Imprensa Oficial do Estado
do Rio de Janeiro, por exemplo, também está tomando medidas para disponibilizar
o seu Diário Oficial em meio eletrônico. A partir de julho de 2006, somente
serão aceitas para publicação, as matérias enviadas eletronicamente pelos
órgãos públicos. Vide o sítio: www.imprensaoficial.rj.gov.br.
Vários juizados especiais espalhados pelo Brasil estão adotando a “justiça sem papel”. Exemplificando: o Juizado Especial Federal de Rio Sul (Santa Catarina) já adotou o processo eletrônico para causas de Benefícios Previdenciários (em face do Instituto Nacional do Seguro Social) e Fundo de Garantia por Tempo e Serviço (em face da Caixa Econômica Federal). Diversas outras sedes do Judiciário de Santa Catarina também já aderiram ao processo eletrônico (Seção de Comunicação Social da JFSC, 14 de julho de 2006). Todos os atos processuais são feitos eletronicamente, incluindo as intimações (a auto-intimação para os advogados cadastrados, regulamentada pela Resolução n° 30/2004 do TRF 4ª Região).
A Seção Judiciária de Santa Catarina da Justiça Federal também iniciou uma campanha recente para diminuir o consumo de papel digitalizando documentos (Seção de Comunicação Social da JFSC, 14 de julho de 2006). Campanha esta que visa também a preservação ambiental. Citamos a página: www.jfsc.gov.br.
Recentemente,
o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro adicionou um novo item para a
sua gestão de trabalho, mais especificamente em seu plantão judiciário noturno:
“trata-se de um programa de informática [elaborado pela Corregedoria Geral de
Justiça] que reúne as questões mais comuns surgidas nos plantões, com modelos
de decisões e a respectiva jurisprudência, autorizações, certidões, ofícios,
além de toda a legislação necessária para a fundamentação dos atos” (Assessoria
de Imprensa do TJ/RJ, 17 de julho de 2006). O sítio oficial do tribunal é: www.tj.rj.gov.br.
Devemos salientar o trabalho
desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça (desde a sua instalação em 14 de
junho de 2005) no acompanhamento do PL n° 5828 e no estímulo e adoção de
medidas administrativas para a uniformização do uso das tecnologias disponíveis
em prol do exercício das atividades meio e fim dos órgãos do Judiciário.
Entre
outras questões, a Comissão de Informatização do CNJ vem trabalhando na
padronização processual, para a utilização em um sistema único de classificação
processual e até de tramitação eletrônica de processos. Assim como estuda os
melhores sistemas de informação a serem adotados pelos tribunais (no momento,
13 sistemas de tramitação processual diferentes são utilizados por tribunais
brasileiros). Para mais detalhes, o relatório das atividades da comissão
mencionada está disponível n página oficial do CNJ: www.cnj.gov.br.
4. CONCLUSÃO
Concluímos que o projeto de lei em
questão tem o objetivo fundamental de eliminar as dúvidas sobre a licitude da
adoção de um processo judicial totalmente realizado em meio eletrônico. E já
existem diversos exemplos desse tipo de uso da Tecnologia de Informação no
Poder Judiciário brasileiro.
Finalizando, o Projeto de Lei n° 5828 é um excelente instrumento para uniformizar o uso da Tecnologia de Informação na prestação da tutela jurisdicional, diminuindo as despesas e morosidade da Justiça brasileira. Em nossa opinião, este projeto representa a peça mais importante da Reforma do Judiciário.
A tramitação do PL n° 5828 pode ser acompanhada pelo website oficial da Câmara dos Deputados no endereço: www.camara.gov.br.
5. FONTES
Câmara dos Deputados: www.camara.gov.br
Conselho Nacional de Justiça: www.cnj.gov.br
Justiça Federal de Santa Catarina: www.jfsc.gov.br
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: www.tj.rj.gov.br
Imprensa Nacional: www.in.gov.br
Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro: www.imprensaoficial.rj.gov.br
*Advogado e Consultor Empresarial, formado pela Universidade
Veiga de Almeida (RJ). Orientador Jurídico do Grupo APSA - Gestão Patrimonial e
Negócios Imobiliários. Associado ao escritório Schneider Advogados Associados, Coordenador
do portal JurisIntel
(www.jurisintel.com).
JUNQUEIRA, André Luiz. Virtualização
do Prcesso Judicial. Artigo disponibilizado pelo
autor em: 01 ago. 2006.