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A
Propriedade Intelectual dos Programas de Computador
Jader Wallauer[1]
A Constituição Federal de nosso país
garante que a exclusividade da utilização, publicação ou reprodução das obras
criadas pertença à pessoa que as desenvolveu, ou seja, ao seu autor.
Isso porque enumera, entre os direitos
fundamentais do homem, descritos em seu art. 5°, o privilégio para as
invenções, proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos
nomes de empresa e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse
social e o incentivo ao desenvolvimento tecnológico.
Vejamos:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
IX - é livre a expressão da
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença;
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de
utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros
pelo tempo que a lei fixar;”
É de importância ressaltar que o direito
de propriedade decorrente da atividade intelectual foi prevista desde a
Constituição brasileira de 1824, não sendo, portanto, uma inovação dos
constituintes de nossa atual Carta Magna.
Na tentativa de garantir o direito autoral
e a propriedade intelectual fora da esfera de proteção do Estado, foram
firmados diversos acordos internacionais, tais quais:
- a Convenção de Paris para a Proteção da
Propriedade Industrial;
- o Tratado de Cooperação em Patentes;
- a Convenção de Berna para a proteção de
obras literárias e artísticas;
- a Convenção Internacional de Roma para a
Proteção dos Artistas e Intérpretes ou Executantes;
- dos Produtores de Fonogramas e dos
organismos de radiodifusão;
- o Acordo sobre direitos relacionados à
propriedade intelectual firmado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (“TRIPS”).
De acordo com o sistema legal brasileiro,
ficou estabelecida a divisão dos direitos da propriedade intelectual em duas modalidades:
Propriedade Industrial e Direito Autoral.
Na propriedade industrial, os direitos e
obrigações são regulados no âmbito do Direito Comercial e dizem respeito
àqueles bens intangíveis que se prestam, principalmente, ao cumprimento de uma
finalidade econômica.
Por causa do direito de propriedade
conferido sobre bens intangíveis, estes poderão ser objeto de uso, fruto e
disposição, podendo ser transferidos a terceiros pelos seus titulares ou servir
como investimentos na integralização de capital em empresas nacionais.
Na propriedade industrial estão previstas as patentes de invenção,
modelos de utilidade, desenhos industriais, marcas, indicações geográficas,
nomes comerciais, domínios de internet, franquias, tecnologias não patenteadas como
um todo.
Já o direito autoral, decorrente da
criação de obra artística, científica ou literária independe de qualquer
registro para a sua efetiva proteção, sendo apenas facultado ao autor o registro
de sua obra em instituições como a Biblioteca Nacional ou a Escola de Belas
Artes.
De
acordo com a Lei que regula o tema no Brasil, a Lei 9.610 de 16 de Fevereiro de
1998, para todos os efeitos, os direitos autorais são classificados como bens
móveis.
Já os programas de computador, excluídos pela Lei de Propriedade
Industrial do sistema de patentes, foram incluídos por lei no conjunto dos
direitos autorais, recebendo a mesma proteção conferida às obras literárias.
Por este motivo, sua proteção independe de registro prévio e, em
virtude de sua fácil e ampla divulgação, ela é objeto de Convenções
Internacionais como a Convenção de Berna, já citada, ficando esta obra
protegida em nível internacional, ao contrário do que ocorre com as obras submetidas
à Lei de Propriedade Industrial.
Justamente por esta fácil e ampla
divulgação é que a propriedade intelectual dos programas de computador assumiu,
hoje, grande importância social, econômica e política, pois estes programas,
que vêm sendo utilizados em todos os ramos das atividades humanas no intuito de
solucionar problemas, pessoais ou profissionais, são facilmente pirateados.
Pode-se constatar que, há fatos
importantes, capazes de modificar a sociedade, considerados fatos estratégicos
do ponto de vista político, econômico e, principalmente, social. Assim são as
atividades relacionadas com os programas de computador.
Mas o que é um programa de computador?
Segundo a definição da Lei de Direitos
Autorais (Lei 9610/98), ele constitui uma:
“Expressão
de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codigicada,
contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em
máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou
equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
funcionar e para fins determinados.”
Assim, podemos concluir que os programas
de computador são criações decorrentes do esforço e trabalho intelectual,
enquadrada nas criações do espírito, de uma pessoas ou grupos de pessoas,
existindo, assim, a figura de seu criador ou autor, que será, até que se prove
o contrário, aquele que primeiramente anunciar a obra.
Tais direitos de titularidade sobre a
autoria de um programa possuem cinqüenta anos de duração, iniciando-se a contagem
do prazo a partir do dia 1º de Janeiro do ano subseqüente ao de sua criação ou
divulgação.
No entanto, quando da existência de
contrato pré-estipulado, a titularidade para pleitear direito sobre programa de
computador criado a partir de uma prestação de serviço ou vínculo empregatício,
será sempre do contratante.
No caso de transferência de tecnologia,
tal situação deverá ser averbada no Instituto Nacional de Propriedade
Intelectual, para que, assim, possa produzir efeitos contra terceiros.
A Lei nº. 9.609/98, que trata especificamente sobre a política
nacional de informática, como consta de sua ementa, sendo por isso, indigitada
como Lei do Software, cuja
origem pode ser encontrada no copyright
norte-americano.
O copyright é aceito em
todo mundo como base para o regime de proteção da propriedade intelectual
dos programas de computador. Inclusive no Brasil, que aceita as delineações
legislativas deste instituto, visto que possui flexibilidade suficiente para
atender aos nossos interesses.
“A recomendação básica aqui é explicitar
mais precisamente na legislação os desdobramentos da concepção central
subjacente ao copyright, de que
a proteção se aplica à expressão de idéias e não a estas propriamente ditas.
Neste sentido, seria interessante incorporar na Lei de Software ressalvas
indicando que:
(i) o copyright não estende sua proteção ao look and feel dos programas, ou seja, à sua aparência na tela e
à funcionalidade da interface com os usuários.
(ii) a estrutura geral de um programa e
de suas funções constituem idéias que não são passíveis de proteção pelo copyright.
(iii) o estudo de um programa no âmbito
de atividades de engenharia reversa não constitui uma violação dos direitos do
autor.”
(Estudo da competitividade da indústria brasileira. Programa
de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico)
- Software de Domínio Público:
Passamos, então, a um ponto conflitante
deste artigo: com a promulgação das Leis nos 9.609/98 e 9.610/98, os usuários dos softwares de domínio público
estariam à mercê de serem autuados pela fiscalização dos direitos
autorais, ou é possível a utilização de softwares de domínio público atualmente?
Para respondermos tal pergunta, é
necessário que analisemos, primeiramente, o conceito de domínio público que,
quando envolve a noção de direito autoral, refere-se às obras que constituem coisa comum a todos, de modo que
podem ser utilizadas livremente por quem quer que seja, com ou sem intuito de
lucro, ou seja, a obra que se encontra em domínio comum e por isso não depende
de autorização para sua utilização. Em termos práticos é o que ocorre com a
obra não protegida, ressalvados alguns direitos morais, que compete ao estado
por eles velar.
Isso acontece porque a Lei nº 9.609/98, específica sobre software, se omitiu de regular a
respeito das obras de domínio público, prevalecendo, portanto, os preceitos
gerais supramencionados.
Conclui-se, assim, que a utilização ou
reprodução de obra de domínio público não configura "pirataria", não
é crime e não é ato ilegal, de forma que juridicamente no Brasil fica liberada
sua utilização por completo.
Mesmo as obras estrangeiras obtidas na
rede mundial e que se enquadrem como sendo de domínio público, podem ser
utilizadas sob o mesmo princípio, desde que este direito seja recíproco entre
os países envolvidos. Assim, não poderá tal utilização ou reprodução ser motivo
de autuação pelos fiscais de direito autoral.
No entanto, não é permitido utilizar
programas onde é clara a necessidade da obtenção de licença para seu manuseio,
baseado na alegação de que algo novo será produzido a partir deste software
pré-existente. Isso fica evidente, com a redação do art. 33 da Lei nº 9.609/98, que reza:
“Ninguém
pode reproduzir obra que não pertença ao domínio público, a pretexto de
anotá-la, comentá-la ou melhorá-la, sem permissão do autor."
- Da Transgressão do Direito Autoral:
É de conhecimento público que a Internet,
enquanto importante meio de comunicação, não se resume apenas em benefícios
para as pessoas. A partir de sua utilização quase generalizada tem lugar,
também, as práticas criminosas, sejam elas tradicionais, na forma tipificada
pelo Direito Penal positivo, ou não, a ponto de reclamarem novas definições e
meios aptos a coibi-las.
A preocupação com as investidas criminosas
deve ocupar um espaço maior de debate no meio jurídico e nas faculdades de
Ciências da Computação, porque, embora a internet e toda a tecnologia que lhe
ampara sejam um marco divisório na história da humanidade devido aos benefícios
que proporciona, também podem ser utilizados como instrumento para realização de
crimes, ficando evidente que, a resposta para este novo tipo de delito só
poderá ser encontrada num esforço multidisciplinar.
Até porque, é fato que a preocupação com a
rede não se restringe apenas aos crimes da informática, ultrapassando essa
fronteira e atingindo, até mesmo, áreas diretamente relacionadas com a
soberania de uma nação, com o mercado, os trabalhadores, política, justiça,
enfim, uma infinidade de segmentos sociais que, diariamente, se vêm obrigados a
atentar para os problemas crescentes da rede.
Indivíduos que ultrapassam o limite, mesmo
que de forma tênue, da responsabilidade, usando os benefícios do progresso para
a obtenção de vantagens pessoais, via de regra em detrimento de um trabalhador,
de sua família, enfim, de um cidadão que ainda vê no Estado uma fonte de
segurança para a resolução dos conflitos sociais gerados pela distribuição
desigual de renda.
Em linhas gerais, um número significativo
de condutas ilícitas perpetradas na rede mundial de computadores podem ser
convergidas para ações do tipo: sabotagem; acesso ilegal; violações de segredos
profissionais, bancários, comerciais, informáticos; falsificações; fraudes
informáticas; furtos; extorsões, e, merecendo maior destaque, a violação do direito
autoral, além de tantas mais possibilidades.
Em termos virtuais, hacker é aquela pessoa
que possui grande capacidade técnica sobre os sistemas de informática em geral.
Ao contrário do que comumente se propaga pelos meios de comunicação, o hacker
não se presta a cometer crimes virtuais, é somente uma espécie de “pesquisador”
da rede. Por outro lado, o cracker já é o hacker malicioso, ou seja, aquele
indivíduo que, possuindo grandes conhecimentos técnicos em informática,
utiliza-o para a prática de ações delituosas por meio da rede – grosso modo é
uma espécie de hacker não ético.
Nesse mundo virtual e quase particular
também existe a figura do pheaker, que é o hacker ou cracker da telefonia.
Corresponde ao indivíduo especializado em fraudes nos sistemas telefônicos,
tendo surgido antes mesmo dos hackers e crackers atuais, muitas vezes indicado
como modelo de inspiração para estes. Numa espécie de estágio de evolução é
possível identificar o aspirante de hacker, denominado lammer, ou seja, aquele
indivíduo que, embora tenha acabado de adquirir ou receber o seu computador, já
se julga capacitado para invadir os sistemas informáticos mais avançados do
mundo, como por exemplo, o do Pentágono, apenas utilizando artefatos de
software ou dicas, disponíveis na rede mundial de computadores, relacionadas a
segurança, as chamadas “receitas de bolo”.
De igual modo, a própria divulgação de
informações injuriosas, difamatórias ou caluniosas a respeito de determinadas
pessoas físicas ou jurídicas, a qual poderá, não raras vezes, ser considerada
como violação do direito à honra e imagem dessas pessoas, sujeitando os agentes
causadores ou aqueles legalmente responsáveis à indenização dos prejuízos
experimentados pelas vítimas, sejam estes materiais ou morais.
Valendo ressaltar que são dois os danos
morais do autor: o primeiro baseado no direito de reivindicar a paternidade do
programa e, o segundo, no direito de vetar modificações indesejadas ou que
venham a deformar ou mutilar o programa, prejudicando, assim, a honra ou reputação
de seu criador.
Por estes motivos, várias empresas
privadas que vêem investindo quantias vultosas em segurança eletrônica, e
assim, acabam por obter algum sucesso na garantia – ainda que temporária – de
inviolabilidade e confiabilidade de seus sistemas. No entanto, a dinâmica que
as novas tecnologias permitem aos seus atores, somada à falibilidade da
natureza humana (basta lembrar que, por mais segurança que se ofereça, o
usuário tem sua parcela de responsabilidade) impede qualquer afirmação quanto a
solução definitiva de todos os problemas decorrentes do uso e difusão das novas
tecnologias.
Porém, a violação dos direitos autorais é
algo mais comum do que, talvez, estejamos imaginando.
Isso porque, segundo a definição constante
nos dicionários, pirataria é:
"Copiar programa de computador, material audiovisual ou fonográfico,
etc., sem autorização do autor ou sem respeito aos direitos de autoria e cópia,
para fins de comercialização ilegal ou para uso pessoal.”
Logo, quando você copia um CD, um DVD ou
outra mídia semelhante, cujo conteúdo é protegido por direito autoral ou exija
licença de uso, mesmo que seja para o seu próprio uso e mesmo que você não
tenha nenhum lucro comercial com isso, está cometendo pirataria. Ainda que você
apenas instale em sua casa um software a partir do CD original de um amigo ou
de sua empresa e depois devolva o CD sem copiá-lo, o software instalado no seu
computador é uma cópia sem licença de uso e, portanto, é pirata.
Dito isto, podemos perceber que a
pirataria é, hoje, um problema cultural. Estamos acostumados a pensar que a
pirataria só acontece quando está presente a pretensão de obter lucro e que, se
tirarmos apenas uma “copiazinha”, não estaremos afetando o direito de outro, ou
transgredindo as normas vigentes.
Esta situação e as proporções que o
problema vem ganhando no decorrer desta década reclamam ação mais efetiva e
urgente por parte do Poder Público, seja aperfeiçoando sua legislação, os meios
de combate aos crimes cibernéticos ou mediante treinamento de suas polícias, seja
buscando solução numa convergência de esforços, tanto da iniciativa privada
como da participação da própria sociedade, sobretudo porque os prejuízos
experimentados acabam, ainda de forma indireta, sendo suportado por todos.
Outro ponto que merece atenção é a venda
de hardware com software instalado, geralmente, pirateados. Nesse caso, é
essencial que o usuário exija do fornecedor seu certificado de licença do
produto. Caso contrário, também corre o risco de ser processado, por receptação
de mercadoria falsificada e infração ao direito autoral.
Estando seu violador passível de responder
ação criminal e cível de indenização. O infrator fica sujeito a detenção de 6
meses a 2 anos e multas diárias pelo uso ilegal dos programas.
Combinada com a Lei do Direito Autoral, a Lei de Software permite que as perdas e danos do titular do programa sejam ressarcidos pelo valor equivalente a 3.000 cópias de cada software ilegalmente produzido. Caso a infração seja feita com o intuito de comercialização, a pena passa a ser de reclusão de 1 a 4 anos.
Esta lei prevê, ainda, que praticada a
pirataria, o Poder Fiscalizador do Estado passa a investigar a sonegação fiscal
relacionada à atividade da reprodução ilegal do software, seja para fins
comerciais ou não.
Dito isso, fica fácil percebermos que
existe um esforço legislativo no intuito de garantir o direito autoral diante
desta nova e virtual realidade, restando, entretanto, esperarmos para descobrir
qual será a posição doutrinária e jurisprudencial que se firmará nos próximos
anos.
- Da
obtenção do Registro:
O pedido de registro dos programas de
computador deverá ser entregue na sede do Instituto Nacional de Propriedade
Industrial (INPI), em suas delegacias regionais ou remetido por via postal,
acompanhado dos dados referentes ao autor do programa e dos trechos suficientes
para identificá-lo e caracterizar sua originalidade. Os trechos enviados
deverão ser mantidos em segredo pelo INPI por um período mínimo de dez anos.
O nome dado ao programa de computador não
poderá ser descritivo nem evocativo da função executada.
Vale salientar que este registro não é
obrigatório, mas que constitui prova de originalidade e identidade do software,
quando afrontado por outro que não tiver obtido o registro, nem possuir prova
capaz de questioná-lo.
BIBLIOGRAFIA:
- Estudo da
competitividade da indústria brasileira. Programa de Apoio ao Desenvolvimento
Científico e Tecnológico - PADCT
Retirado de: http://www.mct.gov.br/publi/Compet/nts_sof.pdf, em 05/06/2005.
- Propriedade
intelectual. Fiec – Ceará.
Retirado de http://www.fiec.org.br/cin/negocios/negocios_ce.pdf,
em 04/05/2005.
- SANTOS, Daison
Fabrício Zilli dos. A propriedade intelectual dos programas de computador. Florianópolis:
UFSC : 1997. 56 p. Monografia (graduado em Direito) - Universidade Federal
Santa Catarina, 1997. Orientador(es): PILATI, José Isaac
- DIAS, Maurício
Cozer. Utilização musical e direito autoral. Campinas, SP : Bookseller,
2000. 176 p.
- BASTOS, Aurélio
Wander. Propriedade industrial : política, jurisprudência, doutrina. Rio
de Janeiro : Liber Juris, 1991. 173 p.
- BARBOSA, Denis
Borges. Propriedade intelectual : a aplicação do acordo TRIPs. Rio de
Janeiro : Lumen Juris, 2003. 286 p.
* Artigo apresentado na disciplina de Informática Jurídica
semestre 2005.1 ministrada pelo professor Dr. Aires José Rover.