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aspectos jurídicos
do spam
Introdução
Com o avanço
tecnológico constante e a integração cada vez maior da Internet na vida
e dia-a-dia das pessoas, o uso de e-mails (correio eletrônico) torna-se
corriqueiro e um meio muito utilizado por todos, tendo, por exemplo, enorme
utilidade no desenvolvimento das atividades dentro de empresas, recebimento de
publicações por advogados, facilitador e agilizador de troca de informações por
todo o mundo, dentre milhares de outros.
Mas do mesmo
modo que a troca de e-mails traz diversos benefícios aos seus usuários,
também tem trazido alguns empecilhos e complicações, dando-se principal
destaque ao chamado spam.
E para que
abordemos o assunto, faz-se mister que a priori conceituemos esta
expressão, o que faremos a seguir.
Origem e
significado de spam
A expressão spam
tem duas prováveis origens:
1. Em 1937 surge a marca Spam,
tratando-se de carne suína enlatada de uma empresa americana, a Hormel Foods.
Esse mesmo nome foi utilizado em um episódio do grupo humorístico inglês Monty
Python, que na década de setenta estreava um programa televisivo, a
mini-série MASH e em um dos episódios um grupo famintos de vickings
entrava em um bar e começava a gritar Spam de forma incessante e
repetitiva, pedindo pelo presunto.
Alguns anos depois, quando a Internet
estava em seu primórdio, alguém resolve enviar mensagens comerciais aos
participantes de grupos de chats, invadindo esses grupos e atrapalhando
a comunicação entre os participantes. Surge assim a expressão spam na Internet,
comparando-se o envio dessas mensagens não solicitadas com a gritaria do
programa humorístico inglês.
2. Outra origem citada em algumas
fontes é um laboratório de computação da South Carolina University, nos
EUA, significando spam algo que não é solicitado e se “engole”.
Assim,
atualmente spam pode ser conceituado como correspondência via e-mail,
não solicitada, e destinada a usuários múltiplos.
O spam
é também conhecido como “UBE”, uma expressão em inglês e que significa
“unsolicited bulk e-mail”. Sua definição original, dada por Paul
Hoffman, in “Unsolicited Bulk Email: Definitions and Problems”, obtida via Internet
[http://www.imc.org/ube-def.html] em 28.12.02 é exposta a seguir, in verbis,
tendo-se em vista sua importância para entendermos o significado de spam
de forma completa e clara:
“Unsolicited Bulk E-mail, or UBE, is Internet mail (“email”) that
is sent to a group of recipients who have not requested it. A mail recipient
may have at one time asked a sender for bulk email, but then later asked that
sender not to send any more email or otherwise not have indicated a desire for
such additional mail; hence any bulk email send after that request was received
is also UBE”
Prejuízos
causados pelo spam
Após breve
explanação do surgimento e conceito do spam, precisamos agora saber
quais os prejuízos que são causados por sua prática, considerada tão
inconveniente. Vejamos os principais deles:
1. Há custos para manter conexão à Internet,
como os com o provedor, linha telefônica e luz, e quanto mais tempo
permanece-se on line, maiores os custos. No caso do spam, quem o recebe
é obrigado a ficar mais tempo no computador, esperando até que todas as
mensagens sejam baixadas;
2. Grande desperdício de tempo.
Primeiro porque o usuário é obrigado a ficar mais tempo on line, como supra
citado. Segundo perde-se um tempo terrível para bloquear cada um dos e-mails
dos spammers, tempo este que poderia ser utilizado para outras
atividades úteis;
3. Há enormes dificuldades e
prejuízos para provedores e servidores também, haja vista que quanto mais
“lixo” acumulado, maior será o custo de armazenamento e comunicação. Ademais, o
mau uso da Internet poderá retardar o tempo de resposta das conexões.
Spam e a Constituição Federal Brasileira
A
Constituição Federal é a lei suprema do país, e em seu artigo 5º, inciso X, que
se trata de cláusula pétrea, aliás, discorre que: “são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o
direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”
(grifo nosso).
Assim,
entendemos que o fato de termos nosso e-mail utilizado de forma não
autorizada, recebendo material que não solicitamos, é uma invasão na intimidade
e privacidade, principalmente porque para a obtenção dos e-mails que
serão objeto de spam, os spammers utilizam-se de formas
invasivas, como a obtenção de dicas sobre hábitos de consumo do internauta por
meio de cookies, que são arquivos de dados gerados por meio de
instruções que os servidores web enviam aos programas de navegação e que
são guardados em um diretório específico do computador do usuário, ou seja,
nossas informações partem de nosso próprio computador.
Aliás, muitas
vezes essas listas com e-mails e perfis de usuários são negociadas entre
empresas, o que além de anti-ético, também está violando a privacidade das
pessoas, por meio da exposição de informações pessoais.
Assim, não há
dúvidas que a prática do spam é inconstitucional, pois ofende o artigo
5º, X da Carta Magna.
Spam e o Código de Defesa do Consumidor
Foi na década
de 70 que teve início a defesa do consumidor como reivindicação da sociedade
civil no Brasil, e por meio dos PROCONs, associações de consumidores e
Ministério Público, entidades que possuíam o maior conhecimento prático dos
problemas corriqueiros dos consumidores, houve a contribuição para a elaboração
de um texto de lei amplo de defesa dos consumidores, bem como sua aprovação.
Desse modo que,
em 11 de março de 1991 entra em vigência a Lei n.º 8.078/90, o Código do
Consumidor, o qual trouxe diversas mudanças no meio empresarial, que passa a
buscar a compreensão deste novo instrumento jurídico, a fim de se adaptar a
ele, e assim manter a preservação de sua imagem no mercado e evitar processos
administrativos ou judiciais. Preza-se pelo tripé produtividade, qualidade e
respeito.
Nossa lei,
aliás, é considerada umas das mais modernas do mundo no assunto, e logicamente
deverá ser levada em consideração quando o assunto é Internet, tendo-se
em vista que a relação de consumo vem crescendo muito, por meio do comércio
eletrônico.
Em relação ao
spam devemos atentar para dois artigos do Código em análise:
a) Artigo 39, III:
“É vedado ao fornecedor de produtos
ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
(...)
III. enviar ou entregar ao
consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer
serviço
(...) ”
Por meio
deste artigo podemos considerar o envio de spam como ato abusivo contra
o consumidor, já que o fornecedor visa fazer com que o consumidor contrate seus
serviços, ou compre seus produtos, e para atrair o consumidor acaba criando
alguns benefícios caso haja a adesão, impondo sua propaganda por meio do e-mail
não foi solicitado. O consumidor é molestado, recebendo e-mail de
fornecedor para quem nunca deu seu endereço eletrônico, e recebendo em grande
parte das vezes conteúdo que não tem o mínimo interesse, apenas dando-lhe um
enorme trabalho para baixar a mensagem, abri-la e deparar-se com algo inútil,
deletando de sua caixa de entrada.
A prática
abusiva é aquela que desatende ao princípio da boa-fé, que é exatamente o que
ocorre no caso do spam, e, portanto, o consumidor lesado tem o direito
de exigir a reparação dos danos que lhe forem causados com essa prática, não
apenas de cunho patrimonial indenizatório, mas também os danos morais.
b) Artigo 43, § 2º:
“O consumidor, sem prejuízo do
disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros,
fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como
sobre as suas respectivas fontes.
(...)
§ 2º A abertura de cadastro, ficha,
registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao
consumidor, quando não solicitada por ele.
(...) ”
Assim,
trata-se de conduta ilegal a prática dos spammers que simplesmente
utilizam-se de cadastros de consumidores, sem nenhuma comunicação de que esse
cadastro foi efetuado, e, conseqüentemente, sem a anuência de quem recebe o spam.
Spam e a Lei de Contravenções Penais
O Decreto-Lei
3.688, de 03.10.41, também conhecido como a Lei de Contravenções Penais também
poderá ser invocado para a defesa contra o spam, tendo-se em vista que
em seu capítulo VII, quando trata das contravenções relativas à polícia de
costumes, mais especificamente em seu artigo 65, tipifica a contravenção penal
denominada de perturbação da tranqüilidade: “Molestar alguém ou perturbar-lhe a
tranqüilidade, por acinte ou por motivo reprovável: Pena - prisão simples, de
15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa”.
É indubitável
que o spam encaixa-se nesta tipificação legal, e os spammers
possuem dolo assumido e presumido, pois o envio destas mensagens molesta quem
as recebe, lotando suas caixas de correio eletrônico, e tirando a tranqüilidade
e o bom andamento das atividades corriqueiras, já que o tempo despendido na
eliminação de todo o “lixo eletrônico” é enorme.
O que
precisamos saber sobre o 105º Congresso Base das Normativas Internacionais
sobre o SPAM
Muito comum
encontramos na parte inferior de spam que recebemos os seguintes
dizeres:
“Esta mensagem é enviada com a
complacência da nova legislação sobre correio eletrônico, Seção 301, Parágrafo
(a) (2) (c) Decreto S. 1618,Título Terceiro aprovado pelo “105 Congresso Base
das Normativas Internacionais sobre o SPAM”. Este e-mail não
poderá ser considerado SPAM quando inclua uma forma de ser removido.”
Na verdade,
trata-se de um grande mal entendido, pois o que realmente ocorreu foi uma
reunião na 105ª legislatura do Senado dos EUA, onde foi proposto pelo Senador Robert
McCain um projeto, denominado Anti-Slamming Amendments Acts, visando
criar um Code of Federal Regulations, regulando a conduta para envio de e-mails
e seus abusos.
Ademais, além
de nem ao menos tratar-se de lei ainda, é uma norma que está sendo debatida
internamente em seu país de origem, os EUA, e não há como ser regra no Brasil
(o que poderia ser feito apenas por tratado ratificado pelo Brasil, o que não é
o caso).
Finalmente,
devemos ressaltar que para que uma lei seja criada no Brasil, há que se seguir
um processo legislativo, exposto no artigo 59 e seguintes da Constituição
Federal, sendo impossível sua promulgação por meio de um Congresso.
Enfim, esta
frase, muito utilizada pelos spammers, além de ser um tanto quanto
jocosa, também não faz sentido algum, tratando-se apenas de um ato de má-fé de
quem a envia, pois o que se pretende é enganar o internauta.
Conclusão
Legislação
específica sobre spam e envio de e-mails está em discussão no
Congresso atualmente, por meio de alguns projetos de lei (PL 1589/99, PL
2358/00, PL 6210/02 e PL 7093/02), mas enquanto não se há nada de concreto,
podemos muito bem fazer valer nossos direitos por meio da legislação já
existente, bastando para tanto comprovar a existência de algum dano.
Posto isso,
podemos concluir que a prática do spam é inconstitucional e ilegal,
ferindo a intimidade e privacidade de quem o recebe, e sendo considerado como
uma contravenção penal e prática abusiva contra o consumidor.
Referências
Bibliográficas
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SAAD, Eduardo Gabriel. Comentários ao Código de Defesa do
Consumidor. 3. ed. São
Paulo: LTR. 1998.
Disponível em:< http://www.advogado.com/fas/noticiaspam.html>. Acesso em 20 de maio de 2005.
(*) Renata de Freitas Martins é uma advogada
paulistana, cujas principais atividades compreendem: consultoria ao terceiro
setor (principalmente a associações ambientalistas). É, outrossim, pesquisadora
de assuntos pertinentes ao Direito e à Informática. Seu email: renata@spambrasil.com.