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INFORMÁTICA
JURÍDICA,
JUSCIBERNÉTICA
E A ARTE DE GOVERNAR
Omar Kaminski*
A Informática Jurídica é o processamento e armazenamento eletrônico das
informações jurídicas, com caráter complementar ao trabalho do operador do
Direito; é o estudo da aplicação da informática como instrumento, e o
conseqüente impacto na produtividade dos profissionais da área. E também a
utilização do computador como ferramenta na Internet.
Há, praticamente, um consenso entre os estudiosos da área na utilização
desta nomenclatura. Não se confunde com o Direito da Informática (também
chamado de Direito Eletrônico, Direito da Internet, Direito do Ciberespaço,
Ciberdireito, Direito Online), que por sua vez estuda os valores éticos e as
relações jurídicas derivadas da informatização latu sensu.
Pierre de Latil, na obra "O Pensamento Artificial - Introdução à
Cibernética" (São Paulo: Ibrasa, 1968), entende que nenhuma ciência jamais
conheceu desenvolvimento tão rápido quanto a cibernética (do grego kubernétikê,
a "arte de governar"), que procura unir os mecanismos dos seres vivos
e os das máquinas mais diferenciadas e aperfeiçoadas. Platão falava em
"arte de governar os homens". Latil falou em "qualidades"
de liberdade:
"Mas principalmente, é preciso ver (...) uma conquista da
liberdade: um sistema é tanto mais livre , quanto mais prove a sua
independência diante da contingência. Tôda liberdade tem um limite: não se pode
exercer senão no sentido impôsto a todo o sistema pela finalidade absoluta de
equilíbrio que, para o universo, é a lei das leis."
Mário Losano, em sua obra pioneira "Lições de Informática
Jurídica" (São Paulo: Resenha Tributária Ltda, 1974) cunhou o termo
"juscibernética" (giuscibernetica), dividindo-a em quatro temas:
1º) o estudo da inter-relação entre normas jurídicas e atividade
social;
2º) a concepção do direito como um sistema auto-regulado;
3º) a aplicação da lógica e outras técnicas de formalização ao Direito;
4º) as técnicas para utilização do computador no setor jurídico.
Decorre, em aspecto mais profundo, a equiparação e comparação entre do
direito natural (jus naturale, do Direito Romano) e o novo paradigma que surge:
o direito artificial, da cibernética.
Uma definição atual de Informática Jurídica é a de Celso Ribeiro Bastos
e André Ramos Tavares, em "Revolução Tecnológica e Direito
Artificial" (1):
"Pode-se afirmar que a Informática Jurídica é a parte da ciência
jurídica que estuda as possibilidades e limitações da aplicação da informática
ao Direito. A Informática Jurídica pode ser dividida, cronologicamente, em três
etapas evolutivas. Trata-se de uma disciplina que tem início com a informática
documental. Nesta fase, floresceram os bancos de dados jurídicos, que
possibilitam a ordenação da informação e sua posterior recuperação. A
informática jurídica, contudo, toma fôlego com a informática de gestão, em que
são criados sistemas que permitem controle de processos, tratamento de textos,
geração automática de documentos e decisões rotineiras, mas sempre como
auxiliar (dinamizador) da decisão humana, sem substituí-la. A última e
derradeira etapa aparece com a denominada informática jurídica decisória.
Situa-se, nesta última fase, a elaboração e criação de sistemas capazes de
produzirem decisões por si mesmos. (...) O produto final da aplicação da
informática jurídica poder-se-ia designar por Direito Artificial, em
contraposição à toda fórmula jurídica criada naturalmente, vale dizer, pelo
Homem, e não pela máquina. Note-se: tais sistemas estariam capacitados não
apenas a oferecerem decisões administrativas, mas também judiciais e até
legislativas, concentrando-se aqui a maior polêmica dentre todas polêmicas que
o tema inequivocamente suscita."
Não se pode remover jamais o inerente caráter humano e substituir seus
critérios de julgamento por frias máquinas que, dotadas de inteligência
artificial, qual os filmes de ficção científica, iriam analisar os casos
jurídicos e confrontá-los, comparativamente, com aqueles que foram inseridos em
sua database.
Helena Donatelli de Moura, em seu artigo "Informática aplicada ao
Direito" (Revista Estudos Jurídicos, vol. VI, nº 17), citando Alain
Chouraqui, tece brilhantes considerações:
"Antes de definir a informática jurídica, é interessante
observarmos o significado da palavra 'informare' do latim, que originou o termo
informação, qual seja: dar forma ou aparência , criar uma idéia ou noção. A
palavra informação significa colocar 'alguns elementos ou partes - sejam
materiais ou imateriais - em alguma forma, em algum sistema classificado'. Sob
essa forma geral, a informação é também a classificação dos símbolos e de suas
ligações em uma relação, seja a organização dos órgãos e funções de um ser vivo
ou a organização de um sistema social. Enfim, a informação exprime a
organização de um sistema que pode ser descrito matematicamente". (2)
Consagrados doutrinadores, como Cândido Rangel Dinamarco e Damásio E.
de Jesus, observaram o impacto da tecnologia sobre o Direito:
"Aos anti-reformistas lembro as vacilações da jurisprudência das
primeiras décadas do século, quanto à validade ou invalidade de sentenças
datilografadas (e não mais grafadas de próprio punho)." (Cândido Rangel
Dinamarco, "A reforma do CPC", 2ª ed., São Paulo: Malheiros, 1995).
"A diferença entre a primeira e segunda fase, a anterior com a
máquina de escrever e a atual, com o micro, é a mesma entre andar no lombo de
um burro e voar num jato. Um abismo. Irreversível. Atualmente, a tarefa de
escrever artigo, livro ou tese, emendá-los, ampliá-los, restringi-los, corrigir
erros ou mudar títulos é realizada em muito menos tempo. Alguns trabalhos são
feitos em minutos; as correções, emendas, supressões etc., em segundos.
Terminado um trabalho, como se ele fosse uma estátua e eu o escultor, vou
alterando, melhorando, substituindo palavras e frases. Dou-me ao luxo de
procurar palavras repetidas no mesmo parágrafo ou na mesma página para
substituí-las por sinônimos." (Damásio E. de Jesus, "Eu e o
Computador", artigo escrito em 1994, e publicado no livro "Novíssimas
Questões Criminais", São Paulo: Saraiva, 1998).
Ao reduzir drasticamente a burocracia e automatizar um número imenso de
rotinas, a tecnologia também amplia a liberdade e o poder de organização da
atividade profissional.
"Para que serve a internet? Não existe uma única resposta a essa
pergunta, mas várias porque são muitos os serviços possíveis na rede, seja do
ponto de vista do cidadão, seja das empresas e das instituições acadêmicas.
Para utilizá-los algumas exigências-dificuldades devem ser levadas em conta.
Uma, de ordem geral, é que, por enquanto, é muito difícil fazer qualquer coisa
na rede que não em inglês. Na prática o ciberespaço é uma linguagem, mais do
que uma estrada ou uma rede; a maioria dos sistemas que nos permitem obter
qualquer resultado são em inglês, desde aqueles que gerenciam a rede até
aqueles que gerenciam a informação. Aos poucos estes últimos estão sendo
criados no Brasil e em português-inglês. O caso dos sistemas operacionais de
rede é diferente. Na sua grande maioria se utiliza o Unix, pai da internet.
Seus comandos permanecerão em inglês por muito tempo. De outra maneira, esses
comandos de navegação e suas sintaxe são pouco próximas da linguagem natural.
Isso obriga o usuário a se acostumar com determinados procedimentos técnicos.
Cada dia que passa sistemas mais amigáveis e em português surgem. Mesmo assim
não há como escapar de procedimentos mínimos, a não ser que sistemas como o WWW
venham desbancar os outros sistemas." (Marco Antônio Machado Ferreira de
Melo e Aires José Rover. "Perspectivas do uso da Internet no curso de
Direito", in "Seqüência" nº 30 - Revista do Curso de
Pós-Graduação em Direito da UFSC, 1995).
O aporte da informática, como ferramenta para o tratamento da
informação jurídica, transformou a atividade própria dos profissionais da área.
Porém, a relação entre informática e Direito não se esgota na recepção da
primeira pelo segundo: também existe um fenômeno inverso.
"En efecto,
los avances tecnológicos que introducen cambios profundos en las actividades
humanas - y en especial si se trata de actividades con contenido económico -
originam siempre nuevos intereses susceptibles de entrar en conflicto y
plantear perplejidades no resueltas adecuadamente por las normas
preexistentes." (Ricardo A.
Guibourg; Jorge O. Alende e Elena M Campanella, in "Manual de Informática
Jurídica", Argentina: Astrea, 1996).
O computador e seus efeitos, nos poucos anos que vêm trazendo
modificações para as mais diversas práticas, tem suscitado novos problemas e
ressaltado outros. Deixou de ser apenas uma máquina de escrever moderna.
Com a Internet, o elemento de composição "ciber" passou a ser
amplamente utilizado. E a juscibernética de Losano extrapolou a informática
jurídica. Rumo ao ciberespaço.
Notas de rodapé:
(1) http://www.ibdc.com.br/ap6.html
(2) http://www.serrano.neves.nom.br/textafins/JUSCIBERNÉTICA%20Prática%20e%20Problemática.htm
Referências:
Procuramos pela palavra "Internet" nos mecanismos de busca
das páginas de notícias do STF, STJ, TST e TSE, e localizamos os seguintes
links associados à informática jurídica, de inegável importância histórica.
Servem para demonstrar a crescente preocupação dos Tribunais Superiores com a
informatização, e com a agilização das informações obtidas, disponibilizadas e
processadas:
STF
14/08/2001 - Pautas das sessões plenárias do STF disponíveis na Internet
08/04/2002 - Supremo lança nova versão de site na Internet
STJ
24/08/1998 - Presidente do STJ inaugura Intranet
26/11/1998 - Decisões do STJ chegam mais rápido ao Diário da Justiça
07/12/1998 - Página do STJ na Internet recebe 70 mil visitas por dia
14/12/1998 - Decisões da justiça mais rápidas por e-mail
14/12/1998 - Presidente do STJ lança sistema de atendimento a advogados via
Internet
22/01/1999 - STJ PUSH tem mais de mil advogados cadastrados
01/03/1999 - STJ disponibiliza seus 240 mil acórdãos na Internet
16/12/1999 - Site do STJ muda visual para o ano 2000
18/09/2000 - Página do STJ na Internet é a 6ª mais acessada do país
27/03/2001 - Presidente do STJ lança pesquisa de satisfação do usuário
03/05/2001 - Pesquisa revela alto grau de satisfação do usuário com os
serviços do STJ
17/09/2001 - STJ: acesso à internet mais rápido
21/11/2001 - STJ torna disponível via e-mail o seu site de Notícias
06/02/2002 - Maior banco de dados de jurisprudência do País já pode ser
acessado pela Internet
TST
11/04/2002 - Novidades sobre jurisprudência no TST estão em sua página da
Internet
24/04/2002 - Site do TST tem média de doze mil consultas por dia
28/05/2002 - TST estuda rede para interligar toda a Justiça do Trabalho
04/06/2002 - TST recebe meio milhão de consultas desde 10 de abril
TSE
04/04/2002 - Eleitor pode treinar o voto pela Internet
10/05/2002 - TSE vai divulgar registro de pesquisas na Internet
04/06/2002 - TSE vai divulgar dados de candidatos pela Internet
*Omar
Kaminski é editor de Internet e Tecnologia da Revista Consultor Jurídico,
advogado especializado em Direito da Informática e responsável pelo site
InternetLegal. omar@kaminski.adv.br
Disponível em: http://www.neofito.com.br/artigos/art03/eletronico_doc029_neofito.doc.
Acesso em 26 de Abril de 2005.