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A garantia
constitucional da intimidade e a quebra do sigilo bancário consoante a Lei
Complementar nº 105/2001
Marcelo Amaral Colpaert Marcochi
Reinaldo Ribeiro Checa Júnior
Capítulo I: Da Intimidade
Com a evolução natural do homem, este passou a integrar a
sociedade e o meio em que vive não apenas como mais um dentre tantos iguais;
adquiriu personalidade e cada vez mais busca seu espaço com o fito de tornar-se
especial dentre tantos iguais; o homem reconhece suas obrigações e, sobretudo,
pleiteia seus direitos, quer diante da sociedade, quer intimamente.
No entanto, em que pese a necessidade de evoluir, oq eu
impõe a relação com seus iguais, o homem é carente de sua individualidade, da
querida restrição de seus pensamentos e valores. Paulo José da Costa Jr.
preconiza que a intimidade é "a necessidade de encontrar na solidão
aquela paz e aquele equilíbrio, continuamente prometidos pela vida moderna; de manter-se
a pessoa, querendo, isolada, subtraída ao alarde e à publicidade,fechada na sua
intimidade, resguardada dos olhares ávidos. A intimidade corresponderia à
vontade do indivíduo de ser deixado só" (1).
Nesse diapasão, a intimidade guarda relação com a vontade
individual, com a necessidade de se expor e, igualmente, de se retrair frente
aos demais homens, guardando para si, assim necessitando, seus pensamentos,
seus desejos, suas informações pessoais. Nessa seara, "é a personalidade
parte do indivíduo; é a parte que lhe é intrínseca, pois através dela a pessoa
poderá adquirir e defender os demais bens. É da personalidade que emanam os
demais bens jurídicos" (2); nesse sentido é que afirmamos que a
intimidade integra a personalidade do indivíduo.
Sendo assim, o sigilo às informações financeiras consta
daqueles direitos inerentes à intimidade do homem, do livre arbítrio de dispor
daquilo que é inerente à sua personalidade.
A Constituição da República Federativa do Brasil tutela a
intimidade em seu artigo 5º, X, a seguir:
"Art.5º.
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
X
– são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação;
Nesse lanço, forçoso é afirmar que a intimidade encontra
respaldo no sobre dito artigo; contudo, consoante o sigilo bancário a discussão
já se impõe: - acentuam alguns doutrinadores que o sigilo tem fundamento não na
intimidade preconizada no inciso X, mas guarda relação com o sigilo de "dados"
apontado no inciso XII do artigo 5º da Consituição, a seguir:
XII
– é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de
dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem
judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação
criminal ou instrução processual penal.
Nessa vereda, doutrinadores há que apontam para o inciso X
do artigo 5º, apregoando que o sigilo guarda assento e relação com a
intimidade. Nesse diapasão, Tércio Sampaio Ferraz Jr. (apud Paulo
Quezado e Rogério Lima, Sigilo Bancário, pág.31), ensina "que a
privacidade se funda no princípio da exclusividade, o qual tem como
característica a solidão ("desejo de estar só"), o segredo
("exigência de sigilo") e a autonomia ("liberdade de decidir
sobre si mesmo emanador de informações"). Ademais, descarta a
possibilidade de o sigilo encontrar fundamento no inciso XII porquanto "dados,
no inciso XII, quer significar, restritivamente, dados informáticos".
Em sentido contrário, Ives Gandra da Silva Martins aponta que o sigilo de dados
abarca o conceito de sigilo bancário. Com mais razão, uma terceira corrente se
faz presente, da qual comungo, idealmente, seguidor dos pensamentos de Paulo
Quezado e Rogério Lima (op. cit. pág.36), na qual o sigilo bancário
encontra guarida no inciso X por tratar-se de característica da intimidade,
porquanto há o direito de exercer a liberdade de negação, e, igualmente, no
inciso XII, conquanto a interpretação de dados não pode ser feita de
maneira restritiva, o que nos obriga a firmar que dados faz referência
ao sigilo bancário.
Posta assim a questão, mister acentuamos as minúcias em
face do sigilo e de sua (in)violabilidade.
Capítulo II: Do Sigilo Bancário
Postas as assertivas consoante à intimidade, faz-se
necessário discorrer acerca do sigilo das informações e dados pessoais
assegurado na Carta Constitucional hodierna. Todavia, sem o fito de
procrastinar o entendimento do presente trabalho, necessário se faz, s.m.j.,
situar a garantia ao sigilo frente às Constituições Brasileiras pretéritas,
ademais de conceitua-lo, a seguir:
1.Sigilo e Segredo
O "sigilo" há muito é discutido, sobretudo
quanto ao seu caráter garantidor, demonstrando sua real importância. Contudo,
necessário se faz entender o significado jurídico de "sigilo", com o
fito de encerrar – pretensiosamente – um completo estudo acerca do tema. De
Plácido e Silva impõe que o sigilo " (3)é empregado na mesma
significação que segredo (4). No entanto, imperando nele a
idéia de algo que está sob selo ou sinete, o sigilo traduz, com
maior rigor, o segredo que não pode nem deve ser violado, importando o
contrário, assim, em quebra de dever imposto à pessoa, geralmente em razão de
sua profissão, ou ofício". Nesse diapasão, Marco Antonio de Barros apregoa
que "sigilo é o meio, o instrumento de que servem os interessados para
manter íntegro o desconhecimento de um fato" (5). Assim,
necessário esclarecer que, ademais de um e outro conceito guardarem relação,
sigilo "é o segredo que não deve ser violado" (6).
2.Histórico Constitucional
2.1. A Constituição Política do Império do Brasil -
1824
As primitivas linhas traçadas em nosso Ordenamento acerca
do sigilo de informações pessoais nos remetem à Constituição jurada em 25 de
março de 1824 por D.Pedro I. Poder-se-ia dizer, permissa vênia., guardar
semelhança o artigo 179 da Carta Imperial com o hodierno artigo 5º,
resguardando – com as devidas proporções (temporais, inclusive) – os direitos e
as garantias de cada cidadão.
A inviolabilidade individual vinha consubstanciada no
citado artigo 179, in verbis:
"Art.179.
A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que
tem por base a liberdade,a segurança individual, e a propriedade, é garantida
pela Constituição do Império, pela maneira seguinte: XXVII: O Segredo das
Cartas é inviolável. A administração do correio fica rigorosamente responsável
por qualquer infracção deste Artigo(...)" (7).
Vê-se que o "sigilo" não era citado
explicitamente; fazia menção à garantia da liberdade e a segurança individual,
conceitos tais que, certamente, haviam de englobar quaisquer direitos
civis ou políticos, dentre os quais as informações e os valores (individuais),
resguardando-se, outrossim, o seu sigilo.
Menção explícita havia consoante as cartas porquanto os
"segredos" nelas contidas eram, sob a égide Constitucional,
invioláveis. Nesse diapasão, mister atentarmos para o período temporal no qual
a sobre dita Carta Constitucional foi promulgada, conquanto a correspondência,
por via de cartas, era o único meio utilizado para a comunicação entre os
cidadãos, quer de um mesmo Estado, quer além de suas terras. No mais, a Lei
reflete, dentre outros valores e sentimentos, a realidade temporal em que se
vive, e assim sendo, seria abstrair-se hipocritamente esperar do legislador
Constitucional assegurar meios de comunicação, v.g., sigilo das
informações bancárias, eis que não existiam à época de sua promulgação, ou
seja, não deixou de lado certas inviolabilidades – permitindo-as; mas sim, não
citaram-nas, porquanto inexistentes.
Ademais, o citado segredo das cartas era resguardado não
só pela Carta Maior, eis que "o Estado tomou para si o privilegio de
correio de cidadãos, e pune os que transportão cartas sem ser pelo seu
vehiculo, e esquivando-se do pagamento" (8), mas igualmente
pelas Cartas Penais, a demonstrar sua necessidade e importância: O Código
Criminal do Império do Brasil, nos Artigos 215 a 218, da Secção VII, do
Capítulo I, sob a rubrica "Abertura de Cartas", impunha pena aos que
violavam o segredo das cartas que variava de 1 a 3 meses, havendo casos em que
tais penas eram tidas em dobro, somando-se, ademais, àquelas do uso da
violência ou arrombamento (9).
2.2. Constituição da República dos Estados Unidos do
Brasil - 1891
Adiante, em 24 de fevereiro de 1891, a fim de organizar um
regime livre e democrático foi promulgada a Constituição da República dos
Estados Unidos do Brasil. Cuidou esta Carta Maior de unir as existentes
províncias, transformando-os em Estados, assim como o Distrito Federal; como
não havia de ser diferente, passou a tutelar novos direitos e garantias; os
Estados possuíam a prerrogativa de editar suas próprias Leis, seguindo, de
certo, a norma Constitucional.
Consoante o sigilo, encontrava-se subscrito na Secção II
sob a rubrica das Declarações de Direitos, no artigo 72, in verbis:
"Art.72.
A Constituição assegura a brazileiros e estrangeiros residentes no paíz a
inviolablidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança, individual e
á propriedade nos termos seguintes:
§18.
É inviolável o sigilo da correspondência" (10).
Vê-se que o legislador não aponta explicitamente as
cartas, mas fala, sim, da "correspondência" em linhas gerais. Nesse
sentido, o Código Penal Brasileiro, promulgado em 11 de Outubro de 1890 passou
a tutelar não só os segredos das cartas; cuidava-se de um Capítulo especial
(IV), do Título IV, sob a rubrica "Dos crimes contra o livre gôso e
exercício dos direitos individuais" (11), nos artigos 189 a
195, ad litteram:
"Art.189.
Abrir maliciosamente carta, telegramma, ou papel fechado endereçado a outrem, e
apossar-se de correspondência epistolar ou telegraphica alheia, ainda que não
esteja fechada, e por qualquer meio lhe venha ás mãos; tiral-a de repartição
publica ou do poder de portador particular, para conhecer-lhe o conteúdo:
Pena-
de prisão cellular por um a seis mezes.
Paragrapho
único. No caso de ser revelado em todo, ou em parte, o segredo da
correspondência violada, a pena será augmentada de um terço.
Art.190.
Supprimir correspondência epistolar ou telegraphica endereçada a outrem:
Pena-
de prisão cellular de um a seis mezes.
Art.191.
Publicar o destinatário de uma carta, ou correspondência, sem consentimento da
pessoa que a endereçou, o conteúdo, não sendo em defesa de direitos, e de uma
outra, restando damno a remettente:
Pena-
de prisão cellular por dois a quatro mezes.
Art.192.
Revelar qualquer pessoa o segredo de que tiver notícia, ou conhecimento, em
razão de officio, emprego ou profissão:
Penas
– de prisão cellular por um a três mezes e suspensão do officio, emprego ou
profissão por seis mezes a um anno.
Art.193.
Nas mesmas penas incorrerá o empregado do correio que se apoderar de carta não
fechada, ou abril-a, si fechada, para conhecer-lhe o conteúdo, ou comunical-o a
alguém, e bem assim o do telegrapho que, para fim idêntico, violar telegramma,
ou propagar a communicação nelle contida.
Paragrapho
único. Si os empregados supprimirem ou extraviarem a correspondência, ou não a
entregarem ou communicarem ao destinatário:
Penas
– de prisão cellular por um a seis mezes e perda do cargo.
Art.194.
A autoridade que, de posse de carta ou correspondência particular, utilisal-a
para qualquer intuito que seja, embora o da descoberta de um crime, ou na prova
deste, incorrerá na pena de perda do emprego e na multa de 100$ a 500$000.
Art.195.
As cartas obtidas por meio criminosos não são admittidas em juízo".
Como se verifica – repita-se – poder-se-ia afirmar que o
conceito "correspondência" apontado na Carta Magna de 1891 abarca uma
gama maior de "meios de informações", a despeito de não citar,
explicitamente, o sigilo das relações bancárias.
2.3. Constituição da República dos Estados Unidos do
Brasil - 1934
Seguindo os passos históricos, o sigilo – consoante a
Carta promulgada em 16 de julho de 1934 – estava assegurado no artigo 113,
VIII, in verbis:
"Art.
113. A Constituição assegura a brasileiros e estrangeiros residentes no paiz a
inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á subsistência, á
segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes:
VIII
-É inviolável o sigilo da correspondência" (12).
2.4. Constituição dos Estados Unidos do Brasil -
1937
A Magna Carta decretada em 10 de novembro de 1937
assegurava o sigilo consoante seu artigo 122, sob a rubrica Dos Direitos e
Garantias Individuais, a seguir exposto:
"Art.122.
A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no país o
direito à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos
seguintes:
VI
– A inviolabilidade do domicílio e de correspondência, salvas as exceções
expressas em lei".
Nesse diapasão, a exemplo da Carta pretérita, o legislador
assegura outras inviolabilidades, ademais daquela postada nas cartas. No mais,
acentuou que tal inviolabilidade pode excluir-se por exceção constada em Lei.
Cuida-se, s.m.j., do que vem regrado no artigo 123 da Mesma ordem legal,
in verbis:
"Art.123.
A especificação das garantias e direitos acima enumerados não exclue outras
garantias e direitos, resultantes da forma de governo e dos princípios
consignados na Constituição. O uso desses direitos e garantias terá por limite
o bem público, as necessidades da defesa, do bem estar, da paz e da ordem
coletiva, bem como as exigências da segurança da Nação e do Estado em nome dela
constituído e organizado nesta Constituição" (13).
2.5. Constituição dos Estados Unidos do Brasil -
1946
Promulgada em 18 de setembro de 1946, sob a égide de um
regime democrático, a Constituição de 1946 resguardou o sigilo em seu artigo
141, §6º, a seguir:
"Art.141.
A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança
individual e à propriedade, nos termos seguintes:
§6º.
É inviolável o sigilo da correspondência.
Ademais da garantia Constitucional, o sigilo encontrava
respaldo no Ordenamento Penal (14), sob o manto dos artigos 153 e
154, ad litteram:
"DIVULGAÇÃO
DE SEGREDO
Art.153.
Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou
correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja
divulgação possa produzir dano a outrem:
Pena
– detenção, de um a seis meses, ou multa.
§1º-A.
Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas
em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da
Administração Pública:
Pena
– detenção, de um a quatro anos e multa.
(...)
VIOLAÇÃO
DO SEGREDO PROFISSIONAL
Art.154.
Revelar a alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão da
função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a
outrem:
Pena
– detenção, de três meses a um ano, ou multa (...)
Nesses termos, a Carta penal impunha ao violador dos
segredos uma pena que variava de um mês a um ano, em casos tais. No mais, cuidou
o legislador de criar duas vertentes para o sigilo, ou seja, àquele inerente à
determinada função, ministério, ofício ou profissão do agente infrator, e ao
constante de documentos ou correspondências particulares, violadas por
distintas pessoas.
2.6. Constituição do Brasil - 1967
Publicada no Diário Oficial da união em 24 de janeiro de
1967, e sob a guarda do artigo 150, §9º, o sigilo manteve-se inviolável, nos
exatos termos:
"Art.
150. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
§9º.
São invioláveis a correspondência e o sigilo das comunicações telegráficas e
telefônicas.
Aqui, tratou o legislador de acrescentar o sigilo expresso
das comunicações telegráficas e telefônicas. Igualmente, a Constituição da
República federativa do Brasil, acrescida pela Emenda Constitucional nº. 1, de
17 de outubro de 1969 – que vigorou em seu período – manteve a guarda do sigilo
em seus ulteriores termos.
2.7. Constituição da República Federativa do Brasil
- 1988
Atualmente, passados mais de dezesseis décadas da primeira
Carta Magna brasileira, vige a Constituição da República Federativa do Brasil,
promulgada em 05 de outubro de 1988. Este atual "conjunto de normas que
regem uma corporação" (15), funda-se na soberania, na
cidadania, na dignidade da pessoa humana e nos valores sociais do trabalho e da
livre iniciativa, resguardando seu caráter de "Lei fundamental de um
Estado" (16); qualquer direito, garantia ou dever instituído
deve, necessariamente, basear-se nos sobre ditos conceitos - ainda que
implicitamente - sob pena de eivar-se de inconstitucionalidade, sendo, por
conseqüência, inaplicável.
O sigilo, nestes termos, encontra guarida no citado artigo
5º, X e XII, o qual se faz necessário transcrever, novamente, in verbis:
"Art.5º.
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
X
– são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação;
XII
– é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de
dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem
judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de
investigação criminal ou instrução processual penal.
Assim sendo, vê-se que o sigilo encontra-se resguardado
desde a primeira Carta Constitucional; certamente, o legislador tratou de
inovar – no tempo – os conceitos e os direitos resguardados pelo sigilo.
Todavia, mister apontar que em nenhuma Carta o sigilo bancário – móvel do
presente estudo – foi citado de maneira explícita. Nesse diapasão, QUEZADO e
LIMA (17) acentuam que, "a despeito de nenhuma trazer
expressamente o direito ao sigilo de informações bancárias, deixam claro, em
suas disposições, o intuito de resguardar-se a intimidade das pessoas".
Com mais razão asseveram ademais os doutrinadores que, "evidentemente,
nenhum legislador pode fugir, pois a esfera íntima do cidadão, em diversos
aspectos, faz parte da natureza humana".
Desta arte, ainda que não expressamente apontado na
Constituição, o sigilo encontra-se resguardado pelos incisos X e XII, por
caracterizar, s.m.j., os conceitos de "intimidade" e
"dados" – constante- da Carta – respectivamente.
3.Fundamento Jurídico
Consoante o sigilo lato sensu e o sigilo bancário –
como espécie daquele, sem o condão de procrastinar o entendimento do presente
estudo, repita-se, não podemos olvidar de esclarecer qual o seu fundamento, ou
seja, "dizer o seu porque, a sua razão de ser" (18);
muitas teoria foram elaboradas com o fito de esclarecer tais questionamentos; a
seguir vejamos – em epítome – algumas delas:
3.1.Teoria Consuetudinária
Segundo a teoria consuetudinária, o sigilo bancário
funda-se no costume comercial dos bancos de respeitar o segredo bancário; com
assento nas doutrinas jurídicas italianas e espanholas, "o equívoco dessa
teoria está em confundir fundamento jurídico com fonte jurídica"
(19).
3.2.Teoria Contratualista
Igualmente esclarecendo qual é a fonte, e não o seu
fundamento, os defensores dessa teoria "justificam o sigilo como um dever
jurídico oriundo da relação contratual que une o banco ao cliente. Dentro deste
quadro, o sigilo bancário coloca-se como uma das arestas fundamentais em que se
sustentam as operações bancárias, ou seja, os contratos bancários que
constituem sua forma jurídica principal" (20).
3.3.Teoria da Responsabilidade Civil
Assim como as citadas teorias, essa limita-se a esclarecer
qual a fonte do sigilo, deixando-nos carente quanto ao seu fundamento, ou seja,
não responde o porque de sua existência. Àqueles que comungam dessa teoria
afirmam que o sigilo tem assento no dever do banco de não prejudicar aqueles
que se servem de seus serviços, sendo certo que "a conseqüência de uma possível
violação será a reparação do dano pelo responsável" (21).
3.4.Teoria do Segredo Profissional
Com assento na doutrina jurídica francesa, os seguidores
dessa teoria apregoam que o fundamento do sigilo encontra-se no dever de
segredo, que é inerente ao profissional bancário. Mais uma vez, a tese afirmada
pela maioria dos doutrinadores franceses limita-se a determinar a fonte do
sigilo, e não o seu fundamento.
3.5.Teoria da Liberdade de Negação
Apregoam os doutrinadores afeitos a essa teoria – na qual,
permissa vênia – me incluo, que o fundamento do sigilo é a liberdade,
"especificamente, a liberdade vista por uma ótica negativa. Com base na
liberdade, tem o cidadão o direito de não permitir que sua privacidade seja
revelada. Todo sigilo existe, em última análise, como expressão da liberdade;
direito este inerente ao ser humano. O homem exercita a liberdade tanto de
maneira positiva, como negativa" (22).
Assim sendo, o porque da existência do sigilo está,
fundamentalmente, na necessidade e no direito de um cidadão desejar que seu
segredo não seja revelado, importando conhecimento apenas aos seus
interessados. Vale dizer, que o sigilo não guarda relação – consoante seu
fundamento – com a profissão ou o exercício financeiro; este, a exemplo de
outros serviços prestados é que depende, sob pena de falibilidade – do sigilo e
do segredo entre seus operadores, bancos e clientes.
Desta arte, em que pese a existência de teses e teorias
com o escopo de determinar o fundamento do sigilo, bancário inclusive, a teoria
da liberdade de negação o faz com esmero, apontando àquelas apenas a sua fonte.
Assim sendo, posta desta feita as assertivas consoante ao
conceito e ao fundamento do sigilo (bancário), ademais dos apontamentos
históricos e da necessidade de se tutelar – Constitucionalmente – a intimidade,
faz-se necessário acentuar, adiante, questões deveras imperiosas acerca da
quebra do sigilo bancário.
Capítulo III : Exceção ao Direito de Sigilo
Bancário
O sigilo bancário – como dito anteriormente – há tempos
permanece garantido pela Constituição, a qual lhe empresta a condição de
direito e de garantia fundamental. Não se discute, pois, a necessidade de o
Estado tutelar tal direito, inerente a todos indistintamente.
1. Garantias Fundamentais: Absolutas ou Relativas?
Quebrar o sigilo bancário é dizer, em linhas gerais,
violar uma garantia e um direito fundamental; nesse itinerário, mister é
questionar se é possível, sob a égide da legalidade, postular a inviolabilidade
de um direito fundamental. Para tanto, necessário é determinar qual o caráter
dessas garantias: absolutas ou relativas.
- Àqueles que emprestam caráter absoluto aos direitos e
garantias fundamentais, apregoam que nenhum direito deve ser tolhido, ainda que
se coloque outro direito ou garantia em conflito, vale dizer, o sigilo bancário
não pode e não deve nunca ser violado, em nenhuma hipótese. Comunga com esse
entendimento Ives Gandra da Silva Martins, acentuando que sequer a decisão
judicatória tem o condão de violar tal garantia. Outros contudo, emprestam
caráter relativo aos direitos e garantias fundamentais, apontando que "o
direito ao sigilo bancário, assim como todos os direitos, são relativos, pois o
ordenamento jurídico, como se infere na própria terminologia, consiste em uma
ordem de direitos, os quais devem conviver harmoniosamente, sem que a prática
de um inviabilize a de outro" (23); assim, é de se emprestar
caráter relativo ao sigilo bancário.
Nesse passo, forçoso afirmar que um direito ou uma
garantia, ainda que fundamental e resguardada pelo manto Constitucional, e em
que pese o entendimento contrário, pode ser excepcionado com o escopo de se
garantir o exercício de outro direito, desde que respeitadas e resguardadas
todas as garantias processuais.
Desta feita, considerando-se a possibilidade de se violar
o sigilo bancário, eis que possui caráter relativo, importa-nos sobremodo
estabelecer quais os critérios legais que devem ser utilizados e respeitados,
com o fito de se chegar a este fim.
A expressão quebra do sigilo bancário há muito vem sendo utilizado
nos manuais jurídicos, nas decisões judiciais e imprensa para designar aquela
situação na qual, mediante ordem legal se permite a determinados agentes do
Estado a tomar conhecimento de operações financeiras com o intuito de apurar-se
eventual ilícito cometido, seja ele fiscal ou bancário.
Em que pese tal terminologia ser amplamente aceita tanto
pelo meio acadêmico como pelos profissionais e operadores do direito, havia
aqueles que se insurgiam em face de tal nomenclatura, alegando que o verbo quebrar,
no vocabulário comum, por significar fragmentar, despedaçar, infringir,
transgredir, violar, no Direito significaria a violação da norma
jurídica (24).
Tais doutrinadores apregoavam que o mais correto seria
utilizar-se da expressão exceção do direito ao sigilo, porquanto esta
expressão significaria procedimento revelador de informações secretas por
permissão legal, nos estreitos ditames da lei, ao passo que, a expressão quebra
significaria a violação do sigilo, tipificada como crime, nos termos do artigo
38, parágrafo 7º da Lei 4.595/64 (25).
Ocorre que, com o advento da Lei Complementar 105/2001,
tal discussão perdeu o sentido porquanto a própria lei veio expressamente a
consagrar em alguns de seus dispositivos a terminologia quebra de sigilo
(26).
Cumpre-nos, neste momento, ressaltar que é mais relevante
discutir a aplicabilidade e constitucionalidade da Lei Complementar 105/2001,
do que as expressões utilizadas tanto pela legislação pertinente como pelos
operadores do direito, a doutrina e a jurisprudência.
Nesse diapasão, cabe perquirirmos quem possui a
titularidade ativa para a quebra do sigilo bancário e qual o meio adequado para
realizá-la.
2. Poder Judiciário
Conquanto seja matéria quase que pacífica que ao Poder
Judiciário fora dada permissão constitucional para excepcionar o sigilo
bancário, em situações concretas de conflito entre interesse privado e público
é importante discutirmos em que condição poderá fazê-lo.
Ao Poder Judiciário cabe, em síntese, a função de dizer o
direito, ou seja, dirimir conflitos de interesses. Denomina-se tal função como
jurisdição.
A função precípua de dizer o direito, ou seja, de exercer
jurisdição decorre do instituto jurídico da "coisa julgada", que
proporciona a força e a solidez necessária à decisão judicial, em última
instância, porquanto garante a imutabilidade dos efeitos da sentença, nos
termos do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal.
Não é só. Além disso, a função jurisdicional encontra
respaldo no princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º,
inciso XXXV, CF), segundo o qual o Poder Judiciário tem o dever de prestar a
tutela jurisprudencial postulada, seja negativa ou positiva.
Nesse contexto, ensinam Paulo Quezado e Rogério Lima que
"Infere-se, portanto, da própria natureza da função do Poder Judiciário,
que a este cabe, mesmo sem autorização expressa constitucional, excepcionar o
direito fundamental à privacidade de quem quer que seja, diante de situações
especiais em que haja verdadeiro comprometimento do interesse público. Isto
porque o Judiciário foi criado, justamente, com a finalidade primordial de
solucionar os conflitos em sociedade, resguardando a harmonia do ordenamento
jurídico." (27)
A discussão é relevante, posto que a doutrina e
jurisprudência pátria vêm dando especial relevo ao chamado princípio da reserva
de jurisdição.
2.1. Princípio da Reserva de Jurisdição
Antes de delimitarmos a aplicação do princípio da reserva
de jurisdição, devemos suscitar a seguinte indagação: A terminologia reserva de
jurisdição é correta ou não ?
É notório que ao tratarmos da repartição de poderes, ou da
chamada teoria dos freios e contrapesos, não estamos na verdade preconizando
uma divisão do poder do Estado em Poder Judiciário, Poder Executivo e Poder
Legislativo.
Na verdade o poder do Estado é uno e indivisível, a
repartição se dá no tocante às funções exercidas pelo Estado, mediante a qual
cada uma delas impõem limites umas às outras, objetivando assim atingir o
equilíbrio necessário a um Estado Democrático de Direito.
O eminente constitucionalista Michel Temer assevera, ao
meditar sobre o tema que "o valor da doutrina de Montesquieu está na
proposta de um sistema em que cada órgão desempenhasse função distinta e, ao
mesmo tempo, que a atividade de cada qual caracterizasse forma de contenção da
atividade de outro órgão do poder. É o sistema de independência entre os órgãos
do poder e do inter-relacionamento de suas atividades. É a fórmula dos ‘freios
e contrapesos’ a que alude a doutrina americana." (28)
Destarte, o tecnicamente correto é dizer função
jurisdicional, função executiva e função administrativa.
É pacífico o entendimento que as funções do Estado se
entrelaçam, ou seja, cada uma das funções do Estado possuí uma atividade típica
e outras atividades atípicas. Assim, a título de exemplo, para não nos
estendermos demais no assunto, ao Poder Executivo cabe de forma precípua a
função de administrar, mas nada impede que em determinadas circunstâncias
julgue um caso concreto.
Devemos ter em mente, no entanto, que o Poder Executivo ao
julgar determinado caso está exercendo uma função judicante, portanto, atípica
e não jurisdicional. Ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo foi permitido,
no mais das vezes, tão somente dar "a primeira palavra", jamais a
"última".
Somente ao Poder Judiciário foi conferido o poder de dar a
última palavra, porquanto está é sua função típica, ou melhor, esta é a função
a ele inerente.
Diante dessas considerações é que ensinam Paulo Quezado e
Rogério Lima que na verdade não é correto dizer jurisdição reservada, afirmando
que "somente teria sentido a terminologia reserva de jurisdição se fosse
para frisar a exclusividade do exercício dessa função." (29)
Ocorre que, em determinadas matérias, há reserva ao Poder
Judiciário de dizer, além da "última palavra", também fazê-lo
exclusivamente quanto à "primeira palavra", estando os demais poderes
impedidos. Daí infere-se o conceito do princípio da reserva de jurisdição.
Cumpre neste momento verificarmos como a doutrina e
jurisprudência atual vêm aplicando o princípio em apreço.
Hugo de Brito Machado, insigne jurista e estudioso do
direito tributário, preconiza que o artigo 6º da Lei Complementar 105/2001 é
inconstitucional exatamente por afrontar o princípio da reserva da jurisdição
(30).
Assim dispõe o citado artigo:
Artigo
6º. As
autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e
registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas
depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo
instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados
indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
Parágrafo
único. O
resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este
artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.
Depreende-se daí que, para o renomado jurista, somente o
juiz de direito poderá manifestar-se quanto à conveniência ou não da quebra do
sigilo bancário, não devendo admitir-se que autoridade ou fiscal tributário o
faça.
Todavia, vale ressaltar que a matéria é controvertida,
porquanto há doutrinadores que, não obstante reconheçam a existência do
princípio da reserva de jurisdição, entendam que o mesmo não se aplica a quebra
do sigilo bancário.
Argumentam os defensores dessa tese que "considerando
o princípio da reserva de jurisdição assim como têm conceituado a doutrina e a
jurisprudência, ou seja, como princípio que resguarda a primeira e última
palavra da tutela constitucional para a solução de conflitos, envolvendo
matérias expressamente determinadas na Constituição, sustentamos que o sigilo
bancário não se encontra sob sua proteção. Apesar de ser um direito fundamental
do cidadão, o sigilo bancário não foi inserido entre as matérias reservadas à
função jurisdicional." (31)
No que tange a jurisprudência, em que pese ainda haver
divergência no Supremo Tribunal Federal sobre a aplicação do princípio em
comento no caso do sigilo bancário, os Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio,
Sepúlveda Pertence, Néri da Silveira e Carlos Velloso admitem a aplicação do
princípio para negar a possibilidade das Comissões Parlamentares de Inquérito
efetuarem a quebra do sigilo bancário (32)
2.2. O Advento da Lei Complementar 105/2001
Neste tópico passaremos a abordar a Lei Complementar
105/2001 que trata do sigilo das operações de instituições financeiras, sendo
contudo importante fazer breves considerações acerca do disposto na legislação
que regulava a matéria anteriormente.
Antes do advento da legislação vigente a matéria era
regulada pelo artigo 38, da Lei nº 4.595/64, denominada Lei do Sistema
Financeiro Nacional.
Tal artigo preceituava que a competência do Judiciário
para ordenar ao Banco Central do Brasil e às instituições financeiras que
prestassem informações sobre o segredo bancário de seus clientes, permitindo
inclusive ao Poder Legislativo e a CPI, por aprovação do Congresso Nacional,
que requisitassem diretamente dos bancos as informações necessárias.
A Lei Complementar foi além e passou a permitir ao Poder
Legislativo e a CPI requisitarem informações das instituições financeiras, sem
autorização judicial, bem como declarou expressamente poderes à Receita Federal
para abrir o sigilo bancário (33).
2.3. Autorização Judicial e o Devido Processo Legal
Ao Poder Judiciário portanto é dado autorizar mediante
decisão fundamentada a abertura do sigilo bancário, desde que haja fundada
suspeita, tais como indícios idôneos e reveladores de possível autoria de
prática delituosa. A questão que se impõe é: Tal autorização somente dar-se-ia
no bojo de um processo com todas as implicações jurídicas do devido processo
legal ?
Quando ainda vigorava o art. 38 da Lei do Sistema
Financeiro Nacional, havia determinação expressa para o Poder Judiciário
ordenar, em juízo, às instituições financeiras a prestação de
informações sigilosas. Com o advento da LC 105/2001, nos termos do par. 4º, art
1º, permitiu-se à exceção ao direito ao sigilo tão somente através de
inquérito.
Paulo Quezado e Rogério Lima entendem tal disposição como
inconstitucional por violar o princípio do devido processo legal. Argumentam
que a Lei Maior determina no art. 5º, LIV, que ninguém terá sua liberdade
restringida, total ou parcialmente, ou privado de seus bens sem o devido
processo legal. Para estes não é possível decretar a abertura do sigilo
bancário privando o titular do sigilo sem o contraditório e ampla defesa,
porquanto se trata de um direito fundamental. (34)
Cumpre ressaltar, no entanto, que a doutrina e a jurisprudência
majoritária entendem possível à exceção ao direito de sigilo bancário no âmbito
de inquérito judicial ou administrativo.
Resume tal posição o ensinamento de Marco Antônio de
Barros, na sua obra Lavagem de Dinheiro, na qual o autor preconiza a
importância da autorização judicial para a quebra do sigilo bancário já na fase
das investigações asseverando que tal medida "é da essência da persecução
penal deste tipo de crime (...). A preservação do elemento ‘surpresa’ dessa
medida é inevitável, pois a ninguém é dado o direito de menosprezar a
volatilidade que distinguem as operações financeiras no âmbito da
macrocriminalidade organizada." (35)
3. Poder Legislativo e a CPI
Portanto, em razão dos argumentos expostos linhas atrás,
podemos afirmar que é consenso a possibilidade da quebra do sigilo bancário
pelo Poder Judiciário. Cabe agora indagarmos se ao Poder Legislativo fora dada
a mesma prerrogativa.
A matéria que enseja maior controvérsia tanto na doutrina
quanto na jurisprudência se dá no tocante à permissão constitucional conferida
as Comissões Parlamentares de Inquérito de efetuar investigação com poderes
inerentes as autoridades judiciais.
Por oportuno, merece transcrição ad litteram o
artigo o art. 58, parágrafo 3º da CF:
Artigo
58. O
Congresso Nacional e suas casas terão comissões permanentes e temporárias,
constituídas na forma e atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato
de que resultar sua criação.
(....)
Parágrafo
3º. As
comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação
próprias das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das
respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado
Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus
membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas
conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova
a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.
A doutrina majoritária assevera, utilizando-se da
expressão "que terão poderes de investigação próprios das autoridades
judiciais", que é possível a quebra do sigilo bancário por parte das
Comissões Parlamentares de Inquérito, sem autorização judicial para tanto.
Não é só. Faz uso do parágrafo 1º do art. 4º, da LC
105/2001 para reforçar sua posição, uma vez que o mesmo dispõe:
(....)
Parágrafo
1º. As
comissões parlamentares de inquérito, no exercício de sua competência
constitucional e legal de ampla investigação, obterão as informações e
documentos sigilosos de que necessitarem, diretamente das instituições
financeiras, ou por intermédio do Banco Central do Brasil ou Comissão de
Valores Mobiliários.
De outra feita, parte da doutrina não entende possível à
quebra do sigilo bancário sem prévia decisão judicial, elencando uma série de
argumentos.
O primeiro é que se tal prerrogativa não foi concedida
pela Carta Política ao Poder Legislativo como aceitar que uma Comissão
Parlamentar de Inquérito, a qual deriva tanto formal como substancialmente do
Legislativo, possa dispor de poderes para tanto? Afirmam que concordar com essa
possibilidade é subverter princípio elementar de lógica, o qual informa que a
criatura não pode mais do que o criador.
Alegam que a norma extraída do parágrafo 3º do art. 58 da
CF trata-se de norma de exceção e, portanto, deve ser entendida
restritivamente. Sendo assim as CPIs apesar de possuírem poderes próprios
das autoridades judiciais, não podem quebrar o sigilo bancário por
tratar-se de direito fundamental.
Citam os defensores dessa tese que "por essa razão a
teoria dos direitos fundamentais, com força nas lições de Jellinek, classificou
os direitos fundamentais em: direitos de defesa (não intromissão estatal
na esfera da liberdade individual) e direitos à prestação jurídica
(intervenção estatal em prol do gozo efetivo da liberdade). Destarte, o
exercício dos direitos fundamentais é a regra; a intervenção do Estado no
exercício desses direitos, a exceção." (36)
Por derradeiro afirmam, pelas razões já aduzidas, que o
parágrafo 1º do art. 4º da LC 105/2001 é inconstitucional, apregoando que
somente é possível as comissões parlamentares que inquérito quebrar o sigilo
das repartições públicas e autarquias, em razão do disposto no art. 2º, caput
da Lei 1.579/52 (Lei das CPIs) (37) e dos órgãos públicos.
São defensores dessa tese, dentre outros, Rogério Lima e
Paulo Quezado. (38)
Em que pesem tais considerações, o Supremo Tribunal
Federal firmou entendimento unânime, não obstante ainda não tenha analisado a
LC 105/2001, de que a CPI pode quebrar o sigilo bancário, independente de
autorização judicial. (39)
Ressaltam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, como
embasamento para tais decisões, o caráter relativo do direito fundamental ao
sigilo bancário e a exceção da função investigatória da CPI ao princípio da
reserva de jurisdição, podendo este órgão dar a "primeira palavra" em
termos de restrição de direitos fundamentais. (40)
Nessa esteira cumpre lembrar que comungamos do
entendimento declinado pela doutrina e jurisprudência majoritária, não por mera
conveniência mas sim por convicção.
4. Ministério Público
A Constituição Federal em seu art. 129, conferiu ao
Ministério Público, entre outras, as funções institucionais de "expedir
notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando
informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar
respectiva" (VI), e "requisitar diligências investigatórias e a
instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas
manifestações processuais (VIII)."
Por sua vez a LC 75/93, Lei Orgânica do Ministério
Público, dispôs que "nenhuma autoridade poderá opor ao MP, sob qualquer
pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do caráter sigiloso
da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja
fornecido".
Duas correntes se formaram em razão de tais disposições.
A primeira apregoa a permissão legal ao Ministério Público
para requisitar informações bancárias sigilosas diretamente às instituições
financeiras, sem qualquer intervenção do poder judiciário (41).
Em contrapartida, outra corrente preconiza que o sigilo
bancário só pode ser excepcionado por meio de requisição motivada, comprovando
a real da medida e sob decisão judicial (42), porquanto os
dispositivos citados não autorizam a quebra sem a intervenção da autoridade
judiciária. Argumentam seus adeptos que o sigilo bancário é espécie de direito
à privacidade que a Constituição Federal consagra no artigo 5º, inciso X e, em
sendo direito fundamental somente autorização expressa da Magna Carta
legitimaria ação do Ministério Público para requerer, diretamente, sem
intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de qualquer
pessoa.
Nesse diapasão, o jurista e ex-Ministro da Justiça Miguel
Reali e o Ministro do Superior Tribunal de Justiça Domingos Franciulli Netto,
defendem que ao Ministério Público não foi dado efetuar a quebra do sigilo
bancário, sem a devida autorização judicial emanada de processo no qual se
garanta o contraditório e a ampla defesa. (43)
O Superior Tribunal de Justiça, vem-se posicionando contra
a quebra do sigilo bancário pelo Ministério Público (44), sem
autorização do judiciário. Por outro lado, caso o Ministério Público
requisite-a judicialmente não necessitará instaurar processo.
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, está dividido
entre duas correntes: uma que defende a possibilidade de o Ministério Público
quebrar diretamente o sigilo bancário quando o caso envolver verbas públicas
(45)
Esta posição de parte dos ministros do Supremo Tribunal
Federal, ensina que ato de órgão ligado ao governo, direta ou indiretamente,
como a origem já indica, é público. Por isso a obediência ao princípio da
publicidade. Sendo o assunto dinheiro público, maior razão há de transparência
em sua administração, pois, do contrário, estará comprometido o próprio Estado
Democrático de Direito.
Assim, para os adeptos desse entendimento, com o qual nos
filiamos, o Ministério Público em tratando-se de dinheiro público está
autorizado para requerer diretamente informações às instituições financeiras.
(46)
Explica-se, se o sigilo bancário está entre os direitos
individuais, e, por isso, só podendo ser quebrado excepcionalmente, com a
"coisa pública dá-se o inverso" - afirma o Prof. Hugo de Brito
Machado. "O princípio é o da publicidade, e só excepcionalmente prevalece
o sigilo". Em suma para o campo do direito privado a exceção é a
publicidade; para o campo do direito público, a privacidade. (47)
De outra feita, outra corrente do Supremo Tribunal Federal
diz ser necessário para a decretação da quebra do sigilo bancário uma decisão
judicial.
O Supremo Tribunal Federal no entanto, é unânime em
afirmar que vê motivo para instauração de processo, no qual se exercitará o
contraditório e a ampla defesa, podendo portanto, ser decretada a exceção ao
direito do sigilo bancário durante inquérito.
5. Poder Executivo
O art. 6º da LC 105/2001, regulada pelo Decreto
3.724/2001, veio a permitir à Fazenda Pública, de forma irrestrita, conhecer
tanto em processo administrativo, como em procedimento fiscal as informações
sigilosas do contribuinte, sem a prévia interferência do Judiciário.
No que tange a quebra do sigilo bancário pelos agentes do
Fisco nos posicionamos pela inconstitucionalidade do dispositivo em apreço como
tantos outros desta Lei Complementar 105/2001, pelos motivos exaustivamente
expostos no presente ensaio.
Por derradeiro, entendemos que outra não poderá ser a
conclusão senão a inconstitucionalidade também dessa disposição, em razão das
opiniões doutrinárias já aduzidas e das decisões proferidas até o presente
momento tanto pelo Superior Tribunal de Justiça quanto pelo Supremo Tribunal
Federal.
Conclusão
A intimidade integra a personalidade que é a liberdade
plena do homem de dispor de sua vida. A manutenção do sigilo de suas
informações reflete-se um desejo pessoal, limitado pelo Direito;
O sigilo é inerente ao homem porquanto integraliza a sua
personalidade, sua intimidade;
Na qualidade de garantia, o sigilo é tutelado pelo
ordenamento Jurídico, e, em que pese o entendimento contrário, encontra-se
fundado no artigo 5º, X e XII e da Constituição federal;
O sigilo, não obstante seja um direito fundamental, não
possui, a exemplo de outras garantias, caráter absoluto; deve-se empresta-lo
caráter relativo, podendo ser excepcionado.
A violação da garantia ao sigilo relativo das informações
financeiras deve seguir critérios tais que, ao se sopesar sua necessidade
frente ao direito individual, prevaleça, sem que isso implique na destruição –
sob a ótica legal – daquele.
Em regra, a violação do sigilo deve preceder a autorização
e o requerimento judicial.
Seguindo o juízo de nossos Tribunais, certo seria afirmar
que a Lei Complementar 105, que autoriza a quebra do sigilo bancário sem a
necessidade da intervenção judicial esta eivada de inconstitucionalidade; o
contrário seria ferir o Direito, sempre vivo.
Compilação Jurisprudencial
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. COMISSÃO PARLAMENTAR
MISTA DE INQUÉRITO. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO, FISCAL E TELEFÔNICO. FALTA DE
FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE DO ATO IMPGNADO. PRECEDENTES. 1. Se não
fundamentado, nulo é o ato da Comissão Parlamentar de Inquérito que determina a
quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico. 2. Meras ilações e
conjecturas, destituídas de qualquer evidencia material, não têm o condão de
justificar a ruptura das garantias constitucionais preconizadas no artigo 5º, X
e XII, da Constituição Federal. Segurança concedida.
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. OFÍCIO AO BANCO CENTRAL DO
BRASIL PARA LOCALIZAÇÃO DE CONTAS EM NOME DO EXECUTADO. O interesse
patrimonial do credor não autoriza, em princípio, a atuação judicial, ordenando
a quebra de sigilo bancário, na busca de bens do executado para satisfação da
dívida. Precedentes. Recurso não conhecido.
Data da Decisão 17/12/1998
Orgão Julgador STJ T4 - QUARTA TURMA
Decisão Por unanimidade, não conhecer do recurso.
Acórdão RESP 128461/PR ;
RECURSO ESPECIAL (97/0026977-9)
Fonte DJ DATA:12/04/1999 PG:00156
Relator Ministro CESAR ASFOR ROCHA (1098)
PROCESSUAL CIVIL - EXECUÇÃO - REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕES
A ÓRGÃO PÚBLICO, PARA LOCALIZAÇÃO DE BENS PENHORÁVEIS - AUSÊNCIA DE PROVA
QUANTO AO ESGOTAMENTO DE DILIGÊNCIAS - IMPROVIMENTO DO AGRAVO.
Órgão: Quarta Turma Cível
Classe: AGI - Agravo de Instrumento
Num. Processo: 1998 00 2 002648-0
Agravante: SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial - Departamento Nacional
Agravado: EMBRACO - Empresa Brasileira de Construção Ltda.
Relator: Des. ESTEVAM MAIA
1. O pedido de requisição de informações a órgão público,
destinado à localização de bens penhoráveis, somente se justifica em situações
excepcionais e ante a prova de exaurimento das diligências empreendidas pelo
credor.
2. Agravo improvido.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores da Quarta Turma Cível do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal, ESTEVAM MAIA - Relator, MÁRIO MACHADO
e LECIR MANOEL DA LUZ - Vogais, sob a presidência do Desembargador MÁRIO
MACHADO, em NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME. Tudo de acordo com a ata de julgamento e
notas taquigráficas.
Brasília (DF),23 de novembro de 1998.
Des. MÁRIO MACHADO
Presidente
Des. ESTEVAM MAIA
Relator
RELATÓRIO
Cuida-se de agravo de instrumento tirado contra a r.
decisão do MM. Juiz da Primeira Vara Cível da Circunscrição Judiciária de
Taguatinga, consistente no indeferimento de expedição de ofício ao Banco
Central do Brasil, requisitando informação sobre contas-correntes, com os
respectivos números, em nome da agravada, para fins de bloqueio, até que se
alcance o valor da dívida em execução.
Argumenta, em apertada síntese, que, após grande esforço,
foram localizados três veículos antigos, insuficientes à satisfação da dívida,
bem como um imóvel, sobre o qual incidem penhoras para garantia de créditos do
INSS e da Fazenda Pública do Distrito Federal.
Doutra parte -- acrescenta --, esgotou os meios de que
dispunha para localizar bens da devedora, passíveis de penhora, de sorte que
não pode prevalecer o decisório recorrido.
Cita jurisprudência e pede a reforma da r. decisão impugnada,
para deferir-se o pedido formulado, possibilitando o prosseguimento da
execução.
A petição interpositiva veio instruída com a guia de
preparo e cópias autenticadas de peças do processo (fls. 11/113).
Requisitadas informações, prestou-as o ilustrado juiz
processante (fls. 117/118). Após confirmar os fatos narrados na petição
interpositiva, acrescenta que o agravante exibiu certidão, apenas, do 4º ofício
de Registro de Imóveis, que abrange apenas as regiões do Guará e Núcleo
Bandeirante, não havendo falar em esgotamento de diligências tendentes à
comprovação da inexistência de bens penhoráveis, a justificar a quebra do
sigilo bancário da agravada. Informou, também, ter sido observada a norma
inscrita no art. 526 do CPC.
A agravada não respondeu, embora regularmente intimada
(fls. 115 e 119).
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador ESTEVAM MAIA - Relator
Conheço do agravo, eis que presentes os pressupostos de
sua admissibilidade.
Consoante se vê do relatório, pretende o agravante a
quebra do sigilo bancário da agravada, com a expedição de ofício ao Banco
Central, "a fim de possibilitar a localização e penhora das contas
bancárias da execução do julgado".
Encarado sob rigor técnico, poder-se-ia considerar inepto
o pedido formulado neste recurso, por isso que a execução do julgado não dispõe
de contas bancárias, nem são estas passíveis de penhora. O que pode ser objeto
de constrição judicial são os valores de saldos nelas existentes.
De qualquer sorte, e, consoante a própria jurisprudência
colacionada pelo agravante, o deferimento do pedido de requisição de
informações sobre contas bancárias do executado, para possibilitar a penhora de
saldos porventura existentes, somente é admissível em caráter excepcional,
quando se comprovar terem sido frustadas as diligências do exeqüente com vistas
à localização de bens, hipótese que não se verifica no caso sob exame.
De fato. A agravante não comprovou ter esgotado as
diligências tendentes à localização de bens da agravada, para penhora. Exibiu,
apenas, expedientes do DETRAN/DF (fls. 99/101) e certidão do 4º ofício do
Registro de Imóveis (f. 102), que abrange, tão-somente, as regiões
administrativas do Guará (I e II) e do Núcleo Bandeirante. É dizer: não
realizou a condição prévia que justificaria o pedido que formulou ao juiz da
causa.
Não há dúvida que o Estado tem interesse em ver cumprida a
sentença que ele próprio emitiu na sua condição de monopolizador da jurisdição.
Entretanto, não se tem admitido que, a despeito disso, e,
em nome do atendimento de interesse meramente patrimonial, se viole o direito
de sigilo, constitucionalmente assegurado (art. 5º, XII), de sorte que o r.
decisório vergastado, a meu juízo, não está a merecer censura.
Com tais fundamentos, NEGO PROVIMENTO ao agravo.
É como voto.
O Senhor Desembargador MÁRIO MACHADO - Presidente e Vogal
Com o Relator.
O Senhor Desembargador LECIR MANOEL DA LUZ - Vogal
De acordo.
DECISÃO
Negou-se provimento. Unânime.
TJDF-A110812
MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO. RECURSO ORDINÁRIO.
SIGILO BANCÁRIO: QUEBRA. LEI Nº 4.595/64, ART. 38, E CF, ART. 5º, X.
O Superior Tribunal Militar denegou mandado de segurança
impetrado contra decisão que deferiu a quebra do sigilo bancário dos ora
recorrentes, porquanto reconhecera, a partir de informações providenciadas pela
Comissão de Inquérito, que existem dados que, nas circunstâncias descritas,
precisam ser apurados, sendo manifesto o interesse da Comissão de Inquérito em
sua obtenção como providência essencial à satisfação das finalidades
inderrogáveis da investigação penal. Esta Corte tem admitido a quebra do sigilo
bancário quando há interesse público relevante, como o da investigação criminal
fundada em suspeita razoável de infração penal. Recurso improvido.
Observação
Votação: Unânime.
Resultado: Improvido.
Veja : HC-55447, HC-69372, RE-136239, PETQO-577,
AGINQ-877,
RMS-15925, E-71640, MS-1047, RE-94608.
N.PP.:(09). Análise:(AL). Revisão:(JBM/AAF).
Inclusão: 12/01/99, (SVF).
Indexação
PC1035,
MANDADO DE SEGURANÇA, ATO JUDICIAL, QUEBRA DE SIGILO
BANCÁRIO, PEDIDO, DEFERIMENTO, FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE, INVESTIGAÇÃO CIMINAL,
ATO ESSENCIAL, INTERESSE PÚBLICO SELEVANTE
Classe RMS-23002
Origem RJ
RECURSO DE MANDADO DE SEGURANCA
Relator Ministro ILMAR GALVAO
Publicação DJ DATA-27-11-98 PP-00033
EMENT VOL-01933-01 PP-00059
Julgamento 02/10/1998 - Primeira Turma
STF-RMS23002
PROCESSO CIVIL - EXECUÇÃO FISCAL - INFORMAÇÕES SOBRE
BENS A SEREM PENHORADOS - REQUISIÇÃO - SIGILO BANCÁRIO - QUEBRA -
IMPOSSIBILIDADE EM PROCESSO ADMINISTRATIVO.
A obtenção de informações sobre a existência ou não de
bens a serem penhorados é obrigação do exeqüente.
O juiz da execução fiscal só deve deferir pedido de
expedição de ofício à Receita Federal e ao BACEN após o exeqüente comprovar não
ter logrado êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado
e seus bens.
Recurso improvido.
Decisão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os
Exmºs. Srs. Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na
conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade,
negar provimento ao recurso.
Votaram com o Relator os Exmºs. Srs. Ministros Demócrito
Reinaldo, Humberto Gomes de Barros e José Delgado.
Ausente, justificadamente, o Exmº. Sr. Ministro Milton
Luiz Pereira.
Data da Decisão 25/05/1999
Orgão Julgador STJ T1 - PRIMEIRA TURMA
Acórdão RESP 206963/ES ;
RECURSO ESPECIAL (99/0020660-6)
Fonte DJ DATA:28/06/1999 PG:00067
Relator Ministro GARCIA VIEIRA (1082)
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. SIGILO
DE DADOS.QUEBRA. BUSCA E APREENSÃO. INDÍCIOS DE CRIME. INVESTIGAÇÃO
CRIMINAL.LEGALIDADE. CF, ART. 5º, XII. LEIS 9.034/95 E 9.296/96.
- Embora a Carta Magna, no capítulo das franquias
democráticas ponha em destaque o direito à privacidade, contém expressa
ressalva para admitir a quebra do sigilo para fins de investigação criminal ou
instrução processual penal (art. 5º, XII), por ordem judicial. - A
jurisprudência pretoriana é unissonante na afirmação de que o direito ao sigilo
bancário, bem como ao sigilo de dados, a despeito de sua magnitude
constitucional, não é um direito absoluto, cedendo espaço quando presente em
maior dimensão o interesse público. - A legislação integrativa do canon
constitucional autoriza, em sede de persecução criminal, mediante autorização
judicial, "o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancários,
financeiras e eleitorais" (Lei nº 9.034/95, art. 2º, III), bem como "
a interceptação do fluxo de comunicações em sistema de informática e telemática"
(Lei nº 9.296/96, art. 1º, parágrafo
único).
- Habeas-corpus denegado.
Data da Decisão
24/09/2002
Orgão Julgador
T6 - SEXTA TURMA
Decisão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes
as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de
Justiça, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto
do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Hamilton
Carvalhido e Fontes de Alencar votaram com o Sr. Ministro-Relator. Ausente,
justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Gallotti. Sustentaram oralmente o Dr.
Antônio Nabor Areias Bulhões e o Dr. Wagner Gonçalves, Subprocurador-Geral da
República.
HABEAS CORPUS. CONFLITO APARENTE DE NORMAS RELATIVAS
A CRIMES DE REVELACAO DE SEGREDO EM RAZAO DE FUNCAO, MINISTERIO, OFICIO OU
PROFISSAO (ARTIGO 154 DO CODIGO PENAL) E QUEBRA DE SIGILO BANCARIO (ARTIGO 38
PARAGRAFO 7 DA LEI 4.595/64). PRINCIPIO DA ESPECIALIDADE, ARTIGO 12 DO CODIGO
PENAL. DISPOSICAO QUE DISTINGUE O DELITO DO TIPO GENERICO DA NORMA CODIFICADA.
DESNECESSIDADE DE REPRESENTACAO COMO CONDICAO DE PROCEDIBILIDADE, NA HIPOTESE
DE QUEBRA DE SIGILO BANCARIO. BANCARIOS QUE, ASSINARAM A COMUNICACAO VIOLADORA
DO SIGILO, SAO EXECUTORES DA CONDUTA DELITUOSA. RECURSO IMPROVIDO
Notas
1. Paulo José da Costa Jr. O Direito de EstarSó. Apud
Maria José Oliveira Lima Roque. Sigilo Bancário & Direito à Intimidade,
pág.42.
2. Maria José Oliveira Lima Roque. Sigilo Bancário
& Direito a Intimidade. Pág.19.
3. Vocabulário Jurídico. Vols.III e IV. Pág.231.
(grifo do autor).
4. Segredo "exprime o que se tem conhecimento
particular, sob reserva ou ocultante. É o que não se deve, não se quer, ou não
se pode revelar, para que não se torne público, ou conhecido". Idem; pág.182.
5. A Busca da Verdade no Processo Penal. pág.225.
6. De Plácido e Silva. Op. cit. pág. 182.
7. Campanhole. Constituições do Brasil. Pág. 832 (redação
original).
8. Comentário à Constituição Política do Império. In
Código Philippino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal. Primeiro Livro
das Ordenações, pág. 260. (redação original)
9. "Artigo 215. Tirar maliciozamente do
correio cartas, que não lhe pertencerem, sem autorização da pessoa, a quem
vierem dirigidas: Penas – de prizão por 1 a 3 mezes, e de multa de 10$000 a
50$000 réis; Artigo 216. Tirar, ou aver as cartas da mão, ou do poder de
algum portador particular, por qualquer maneira que seja: Pena – as mesmas do
artigo antecedente, além das em que incorrer, si para commeter este crime usar
o réo de violência, ou arrombamento; Artigo 217. As penas dos artigos
antecedentes serão dobradas, em cazo de se descobrir a outro o que nas cartas
se contiver, em todo, ou parte. Artigo 218. As cartas, que forem tiradas
por qualquer das maneiras mencionadas, não serão admitidas em juízo". Código
Criminal do Império do Brasil, pág. 108.
10. Campanhole. Op.cit., pág.768. (redação
original).
11. Affonso Dionysio Gama. Código penal Brasileiro. Pág.209,
edação original).
12. Campanhole. Constituições do Brasil. Pág.716. (redação
original).
13. Idem. pág.621.
14. O Código Penal vigente hodiernamente é o mesmo
aplicado ao tempo da Constituição de 1946 – Decreto-lei nº. 2848, de 7 de
dezembro de 1940. Os parágrafos do artigo 153 foram acrescentados pela Lei 9983
de 14.07.00.
15. José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional
Positivo. Pág. 41.
16. Idem.
17. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário. Pág.31.
18. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário. Pág.
21.
19. Idem. pág.23. Acerca do conceito de fonte,
acentuam os doutrinadores que é o lugar de onde provém algo(...)a fonte
pergunta de onde?; o fundamento, o porquê.
20. Álvaro Mello Filho, Apud Paulo Quezado e
Rogério Lima. Op. cit. pág.24.
21. Maria José Lima Roque. Idem.
22. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário. Pág.28.
23. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário. Pág.
36.
24. Paulo Quezado e Rogério Lima. Quebra do Sigilo
Bancário: uma Análise Constitucional (Doutrina e Jurisprudência), pág. 15-18.
25. O parágrafo 7º do artigo em apreço previa como crime à
quebra do sigilo bancário, sujeitando os responsáveis à pena de reclusão de um
a quatro anos,e aplicando-se no que coubesse, o Código Penal e o Código de
Processo Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.
26. Art.1º, par. 4º; Art. 3º, par.2º e art. 10º da LC
105/2001.
27. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário, pág.
54.
28. Michel Temer. Elementos de Direito Constitucional,
pág. 18.
29. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário, pág.
55.
30. Hugo de Brito Machado.Quebra do Sigilo Bancário, pág.
240/257.
31. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário, pág. 58
32. Ementa: Comissão parlamentar de inquérito. Poderes de
investigação (cf.art.58, par. 3º). Limitações constitucionais. Ilegitimidade do
controle jurisdicional. Possibilidade de a CPI ordenar, por autoridade própria,
a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico. Necessidade de
fundamentação do ato deliberativo. Deliberação da CPI que, sem fundamentação,
ordenou medidas de restrição a direitos. Mandado de segurança deferido.
Comissão parlamentar de inquérito. Competência originária do Supremo Tribunal
Federal(...) Postulado constitucional da reserva de jurisdição: um tema
ainda pertinente de definição pelo Supremo Tribunal Federal.
O postulado da reserva constitucional de jurisdição
importa em submeter, à esfera de decisão dos magistrados, a prática de
determinados atos cuja realização, por efeito de explícita determinação
constante do próprio texto da Carta Política, somente pode emanar do juiz, e
não de terceiros, inclusive daqueles a quem se haja eventualmente atribuído o
exercício de ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais’. A
cláusula constitucional da reserva de jurisdição – que incide sobre
determinadas matérias, como busca domiciliar (CF, art.5º,XI), a interceptação
telef6onica (CF, art 5º, XII), e a decretação de prisão de qualquer pessoa,
ressalvada a hipótese de flagrância (CF, art 5º, LXI) – traduz a noção de que,
nesses temas específicos, assiste ao Poder Judiciário, não apenas o direito de
proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa de dizer, desde logo,
a primeira palavra, excluindo-se, desse modo, por força da autoridade do que
dispõe a própria Constituição, a possibilidade do exercício de iguais
atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades do Estado.
Doutrina. – O princípio constitucional da reserva de jurisdição não foi objeto
de consideração por parte dos demais eminentes Ministros do STF, que entenderam
suficiente, para efeito de concessão do writ mandamental, a falta de
motivação do ato impugnado.
MS 23.452/RJ, Tribunal Pleno, Min. Rel. Celso de Mello, j.
16/9/99, DJU 15/12/2000;
MS 23.652/DF, Tribunal Pleno, Min. Rel. Celso de Mello, j.
22/11/200, DJU 16/2/2001;
MS 23.466/DF, Tribunal Pleno, Min. Rel. Sepúlveda
Pertence, j. 4/5/2000; DJU 6/4/2001;
33. Art. 3º, par. 1º; art. 4º, par. 1º e art. 6º,
"caput" da LC 105/2001.
34. Ob. cit, pág, 61.
35. Marco Antônio de Barros. Lavagem de Dinheiro:
Implicações Penais, Processuais e Administrativas, pág. 147.
36. Gilmar Ferreira Mendes e outros, Apud Paulo
Quezado e Rogério Lima. Op. cit., pág. 71.
37. Art. 2º. "No exercício de suas atribuições,
poderão as comissões Parlamentares de Inquérito determinar as diligencias que
reputarem necessárias e requerer a convocação de ministros de Estado, tomar o
depoimento de quaisquer autoridades federais, estaduais ou municipais, ouvir os
indiciados, inquirir testemunhas sob compromisso, requisitar de repartições
públicas e autarquias informações e documentos, e transportar-se aos lugares
onde se fizer mister a sua presença."
38. Paulo Quezado e Rogério Lima. Sigilo Bancário, pág.
70-73.
39. MS nº 23.480-6/RJ, Acórdão unânime do STF-Pleno, Rel.
Min. Sepúlveda Pertenc, j. 4/5/00, DJU-e 1 15/9/00, p.119.
40. MS nº 23.491/DF, Rel. Min. Celso de Mello, j. 1/7/99,
DJ 2/8/99; MS nº23.652/DF, Min. Celso de Mello, j. 22/11/00, DJ 16/2/01; MS nº
23.669/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJU 17/4/00; MS 23.452/RJ, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Celso de Mello.
41. Alexandre de Moraes. Direito Constitucional, pág.
84-86.
42. Carlos Alexandre Marques. A Natureza do Pedido de
Quebra de Sigilo Bancário e Fiscal e......, pág. 535-538.
43. Ives Gandra da Silva Martins (coord.). Direitos
Fundamentais do Contribuinte, pág. 121-150.
44. STJ, Resp 37.566-5/RS, 1ª T., DJU 28/3/94.
Habeas-Corpus nº 5287/DF, Rel. Edson Vidigal, DJ 4/3/97.
45. STF, MS nº 21.729-4/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
DJ 16/10/95. Informativos STF nº 8 e 27.
46. MS 21.729-DF, Informativo do STF nº 8.
47. Hugo de Brito Machado. Um Introdução ao Estudo do
Direito, pág. 250.
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Retirado: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3756