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A evolução da internet no Brasil e a dificuldade de
sua regulamentação
A internet começou a ser utilizada no Brasil, em meados de
1989 e 1990, somente por Instituições de pesquisas e um pouco depois por
Universidades, permanecendo, assim, até o final de 1995, quando a exploração
comercial teve início com a liberação de um BackBone lançado pela EMBRATEL, com
um grande incentivo para a sua propagação da mídia, que passou a abordar o
assunto, utilizando-se até de novelas.
Há dois anos atrás, o país contava com cerca de 6 milhões de usuários de
INTERNET, enquanto em todo mundo existiam aproximadamente de 349 milhões de
usuários . Em janeiro de 2003, já existia no Brasil 22,4 milhões
de usuários enquanto nos Estados Unidos são 120,5 milhões de internautas . De acordo com os dados acima, não é difícil imaginar o atraso que
estamos em relação a outros países, apesar de estarmos na 9ª posição em relação
à quantidade de usuários, razão pela qual Lawrence Lessing, jurista
norte-americano e um dos mais respeitados cyberlaw, aconselhou aos brasileiros:
“Liberem as estruturas físicas da INTERNET – o telefone, o cabo, o acesso sem
fio – e irão libertar o Brasil para criar e construir a INTERNET ”.
Nos Estados Unidos, por exemplo, “em 1995, os consumidores americanos
preencheram 49,5 bilhões de cheques. Já, em 2000, esse número caiu de 14%,
passando para 42,5 bilhões. Isso se deu em razão do aumento da procura pelo
pagamento de fatura on-line que vem sendo utilizado atualmente por cerca 12
milhões de famílias norte-americanas, isto é, um número em franco crescimento
em relação aos 10 milhões de lares que utilizam essa forma de pagamento”. Esta mentalidade na América Latina, como um todo, é algo ainda
bastante atrasado haja vista que a utilização de banda larga está começando só
agora a popularizar-se, enquanto nos Estados Unidos a tendência são as conexões
sem fio (Wireless ou Wi-fi).
Enquanto este mundo novo cresce a cada dia, o Brasil vem
lentamente tentando acompanhá-lo. Em contra partida, o conceito de “dados” se
intensifica no contexto globalizado da propriedade intelectual, bem como a
discussão sobre o uso justo e a necessidade de conscientização sobre os efeitos
marcantes da tecnologia na rotina das pessoas. Um dos maiores desafios continua
sendo a compreensão do potencial intangível e da latente virtualidade do
ciberespaço.
Um dos maiores entraves da internet no país, segundo Omar Kaminski, “é o fato
da falta de confiança em algo imaterial”. Para Aires José Rover, coordenador do
curso de Ciências Jurídicas da UFSC em Florianópolis, professor e autor da obra
“informática no direito – inteligência artificial” (Juruá, 2001) “nunca vivemos
um momento de paradoxos. Se por um lado a tecnologia e suas manifestações
evoluíram qualitativa e quantitativamente, por outro, aumentaram a insegurança
e a ansiedade. Insegurança das leis ineficazes e ansiedade diante de um
universo inatingível de informação. A tecnologia avançou na abertura e
aprofundamento de novos caminhos, mas falta muito para que a humanidade se
sinta bem diante do admirável mundo digital. Eis o problema: precisamos de mais
leis, sim, mas que sejam fruto de um direito aberto; precisamos de mais
códigos, inteligentes, mas que sejam códigos abertos. Este é um desafio
político e não tecnológico, de uma insustentável leveza”
A comunicação digital via INTERNET não se submete a limites geográficos,
tradições nacionais e outras características intrínsecas do relacionamento entre
nações ainda fortemente presentes na comunidade internacional e superá-las será
uma tarefa bastante complexa mesmo para países industrializados que capitaneiam
a revolução tecnológica. Portanto, o crescimento desta interação de
informações, pode acarretar violações de direitos que normalmente ocorrem nas
relações sociais e comerciais das comunidades. Isso significa uma necessidade
de se encontrar um sistema jurídico de repercussão mundial, suficiente para
atender, administrar e solucionar questões oriundas da rede eletrônica.
“Vários países já se preocuparam em consolidar sua legislação interna, tratando
de criar mecanismos para salvaguardarem os seus interesses no meio etéreo e
impalpável do ciberespaço, mas é mister que esses estudos sejam estendidos ao
patamar mundial, para que possam, com sucesso, superar os ainda distantes
obstáculos que impedem a migração absoluta de todos os usos e costumes da
sociedade do mundo físico para o mundo virtual.
Já existem iniciativas nesse sentido, com o painel denominado Global Cyberspace
Jurisdiction Project ou Projeto de Jurisdição Global do Ciberespaço, em
desenvolvimento pela Ordem dos Advogados dos Estados Unidos (American Bar
Association) e por alguns órgãos do governo estaduniedense. O tema central é
alçar, a nível global, um sistema rápido, eficiente e confiável para acompanhar
a celeridade dos negócios e das comunicações digitais que ocorrem a cada
segundo, sem contudo precisar alterar profundamente a legislação já existente,
bem como integrar as diversas culturas existentes no planeta sem lhes suprimir
as características mais tradicionais.
Cibertribunais, cortes inteiramente eletrônicas, julgamento à distância e penas
econômicas virtuais são apenas algumas das idéias que já estão sendo debatidas
por advogados, juristas e estudiosos do direito eletrônico, no afã de conseguir
acompanhar, com dispositivos e sistemas de controle correspondentes, a
celeridade com que o mundo digital arrasta a humanidade para novos horizontes
de conhecimento
E a sombra da convergência tecnológica de todas as mídias da sociedade
precisará encontrar esteio nesse “admirável mundo novo”, de forma a se integrar
pacificamente no cotidiano do novo milênio, que cada instante transforma
inexoravelmente as nossas vidas em “zeros e uns” do código binário”.
Diversas são as entidades no mundo que abordam o tema da internet e sua
normatização. Em primeiro lugar, temos a ONU (Organização Das Nações Unidas),
Através da OMPI/WIPO – Organização Mundial Da Propriedade Intelectual/World
Intellectual Property Organization, Com sede em Genebra, na Suíça e da UNCITRAL
– United Nations Commission On International Trade Law / Comissão Das Nações
Unidas Para O Direito Comercial Internacional. Há outras como a ICC – OECD
(Organização For Economic Cooperation Anda Developmen t- Organização Para O
Desenvolvimento e Cooperação Econômica; ICANN (Internet Corporation For
Assingned Names Anda Numbers – www.icann.org), uma instituição sem fins
lucrativos, formada para assumir responsabilidades e estabelecer normas de
caráter técnico que envolve a internet, tais como endereços de IP (internet
protocol), administração de DNS (Domain Name System) e outros; a IANA
(Internet Assigned Numbers Authority); ICANN WATCH (www.icannwatch.org),
formada por acadêmicos de vários países; INTERNET SOCIETY (www.isoc.org); CIVIL
SOCIETY FOR INTERNET FORUM (www.cpsr.org); IFCC (Internet Fraud Of
Investigation); NW3C (National White Collar Crime Center / Centro Nacional do
Crime do Colarinho Branco; E-PING (European Parliamentarians Internet Group –
www.eping.org); Dr ECOMMERCE (www.drecommerce.com), entre outros. Todavia, o
assunto é muito polêmico e diverge em várias vertentes, pois há os favoráveis a
uma regulamentação a nível mundial, outros ao nível das próprias nações e
alguns acreditam que a própria internet tratará de regularizar com mecanismos
próprios de programas avançados.
Para Tarcísio Queiroz Cerqueira, “é precipitado legislar
sobre algo ainda tão prematuro e desconhecido quando a INTERNET, e, sem dúvida,
o excesso de regulamentação exacerba o risco de inibir o desenvolvimento da
“Grande Rede”. Em segundo lugar, quaisquer normas jurídicas a serem adotadas
para regulamentar a rede devem considerar, de forma geral: 1) os parâmetros
técnicos como elementos fundamentais, simultaneamente, para a consecução do
ilícito e para sua prevenção e repressão, e 2) a universalidade da norma a ser
aplicada, e sua independência quanto a limites e valores nacionais, como fator
preponderante para sua eficácia” . Segundo ainda o autor, a
regulamentação da internet deve ser de âmbito internacional, portanto, só
poderia ser feita partindo de fóruns e internacionais que fossem neutros e
isentos de interesses para que representasse de maneira equilibrada todas as
comunidades.
‘”Em excelente artigo intitulado "A Lei e o Comercio Eletrônico", o
advogado Gustavo Testa Correia menciona: ‘há mais de 4 anos estão sendo
realizados congressos com a participação de todos os setores da sociedade,
dentre estes um comitê formado por 43 Estados norte-americanos e a American Bar
Association (espécie de Ordem dos Advogados), objetivando, em conjunto, a
elaboração do UNIFORM COMPUTER INFORMATION TRANSACTIONS ACT ‘ (Lei Uniforme
Para Transação de Informações no Computador). Intenta-se, através da elaboração
da citada lei, não só a regulamentação dos atuais meios de exploração comercial
da Internet, como também analisar as potencialidades do comercio eletrônico.
Trata-se indiscutivelmente de proposta louvável por parte das instituições
americanas acima citadas; mas se deve ressaltar a complexidade envolvida para a
consecução plena dos objetivos apontados. As dimensões da rede mundial e a
quantidade de informações nela contidas consubstanciam-se em empecilhos a um
controle mais rígido das relações travadas em seu ambiente.A superveniência de
normas com a função teleológica de impor uma maior fiscalização, uma maior
gerência sobre as operações na Internet, pode resultar na ineficácia da lei
correspondente; tendo em vista as características dessa forma revolucionárias
de comunicação. Em ocorrendo tal hipótese os esforços no sentido de a Web
podem, ser inútil”
Ocorre que há diferenças culturais, sociais e políticas entre os países,
portanto, além de provavelmente não se conseguir encontrar um consenso entre as
nações, demoraria anos para estas normas se consolidarem o que significa em
leis superadas. A informática se transforma muito rápido, “o prazo máximo da
curva de obsolescência da tecnologia dos computadores é de 18 meses. E esse
prazo vem se estreitando cada vez mais. A celeridade da internet e dos seus
subprodutos que já assomam no horizonte, como a convergência de mídias e a
super-rodovia de informação (information superhighway) são apenas alguns dos
novíssimos desafios que precisam ser imediatamente acessados e enfrentados
pelos estudiosos do Direito, na tentativa – isso mesmo, tentativa – de conferir
algum controle à miríade de violações e contrafações que se processam a cada
segundo no cyberespaço”
Para o professor da UFSC, Aires José Rover “os códigos são mais eficazes, já
que os produtores de programas podem, ao mesmo tempo em que lançam um produto,
criar códigos para proteger o produto contra a pirataria. Podem também evitar o
acesso de determinados conteúdos por pessoas não autorizadas. Neste caso, as
empresas fariam um cadastro dos internautas e o manteria em um banco de dados” . Entretanto, esbarra-se no fato deste mecanismo ser uma invasão
de privacidade porque através deste sistema, uma empresa poderia deter dados do
internauta e conhecer os seus hábitos de consumo, acarretando em informações
muito pessoais que poderiam ser usadas.
Segundo Eurípes Brito Cunha Júnior, advogado em Salvador-BA, professor e
presidente do IBDI (Instituto Brasileiro de Direito de Internet), eleito para a
gestão de 2003/2004, sobre a questão da regulamentação da internet teve um
posicionamento mais ponderado diante da novidade da internet e sua necessidade
de regulamentação: “legislar ou não legislar? Eis a questão. Uma das lições
proveitosas que pode tirar a comunidade jurídica ao final deste ano de 2002 é a
de que o ponto de equilíbrio é mais recomendável do que o radicalismo. Assim,
entre o ‘não legislar em nada’, que tem à frente o Amaro de Morais, e o
‘legislar, porque tudo é novo’, capitaneado por Góis Júnior, prefiro me
associar à corrente do ‘legislar apenas no que for necessário e não esteja
abrigado pelo direito posto’.” . Esta talvez seja a corrente
mais correta a seguir, pois apesar da internet não possuir fronteiras e ser de
âmbito mundial, seria muito difícil construir uma legislação que se adequaria a
todos os países.
No Brasil, há diversos projetos de Lei sobre internet que ainda estão
tramitando no Congresso Nacional: Projeto de Lei n.º 1489/99, 1530/99,
1590/99, 1783/99, 1806/99, 1806/99, 2231/99, 2300/00, 2535/00, 3360/00,
3576/00, 3781/00, 4426/01, 4833/98, 5888/01, 5989/01, 6210/02, 6434/02,
6434/02, 6541/02, 6837/02, 7120/02, 7153/02, 7318/02, 7385/02, 7432/02,
7485/02, entre outros. Vale ressaltar que temos o projeto de Lei nº 1.483/99, 1.589/99,
4.906/01, 6.210/02, 7.093/02, 84/99, 71/02, 234/02. Quanto às Leis 9.609/98 e
9.610/98 que tratam da proteção aos programas de computador são consideradas
pré-históricas. Vale dizer ainda que no ano passado, foi regulamentado o
certificado digital, por uma medida provisória (nº2.200/02).
Enfim, ainda temos uma legislação fraca quanto ao Direito de informática, pois
“a tecnologia não dá trégua ao Direito e os governos não conseguem promulgar e
aplicar leis na mesma velocidade do desenvolvimento da técnica. Um dos pontos
unânimes é que nenhuma nação do mundo atualmente tem a capacidade de conferir
plena eficácia ao ciberespaço por si própria, devido à sua volatilidade,
velocidade e simultaneidade”. Hoje, vivemos em um espaço
virtual sem lei, onde as informações estão cada vez mais globalizadas e se
difundem pelo mundo inteiro. Diversos países encontram dificuldades em buscar
uma solução para as questões de informática. Não há dúvidas que estamos nas
mãos das grandes empresas de informática, pois a única forma de buscar uma
regulamentação do direito de informática é a associação de programas de
computadores eficazes no combate de comportamentos considerados não éticos,
como, por exemplo, o spam que não possui regulamentação, juntamente com leis
que sejam realmente necessárias. Neste sentido, isso vai depender da boa
vontade das empresas de informática e dos provedores de Internet em buscar
mecanismos para bloquear atitudes caracterizadas como não éticas e da
capacidade do poder legislativo de perceber o que realmente é necessário
legislar.