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Liberdade ameaçada: altas tarifas e desrespeito à privacidade atrapalham Web



por Raphael Mandarino
Presidente da Associação Nacional dos Usuários de Internet (Anui) e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil

 

 


Oi colegas,

Escrevo esta minha estréia diretamente da Cidade do México para onde vim a fim de participar de um Fórum da Enred e do Walc 2000 - III Taller sobre Tecnología de Redes e Internet para América Latina y el Caribe.

O importante nesta informação não é onde eu estava e nem os encontros em si, - até porque certamente falarei deles oportunamente - mas sim o fato conhecido por todos nós de que a Internet é uma rede mundial e que não tem barreiras. Portanto, viajei sem me preocupar com os prazos de entrega deste artigo, já que poderia redigí-lo em qualquer lugar e remetê-lo pela Internet.

Já nos acostumamos a pensar que, via Web, alguns poderão exercer suas atividades a partir de qualquer lugar. Aqui mesmo no Brasil, temos visto e acompanhado notícias de intervenções cirúrgicas experimentais dentro da chamada Telemedicina, ou em um caso de uso real, o "teledepoimento" : um sistema de teleconferência via Web, implantado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal que evita o deslocamento do acusado já preso para prestar depoimento, diminuindo os prazos, os riscos e principalmente os custos desse tipo de operação.

Que a Web vem modificando o nossos usos e costumes, não temos dúvidas, mas será que sempre para melhor? E a garantia de total liberdade que ela nos traz, será verdadeira?

Todo o espantoso crescimento que a Internet vem experimentando no Brasil e no mundo está intimamente ligado à liberdade no uso e à forma anárquica que as ligações e interligações à grande rede são feitas, sendo portanto, em essência, a materialização da teoria do caos - com o perdão dos matemáticos puristas.

Entretanto, a cada dia fico mais convicto de que esta liberdade está sendo ameaçada por todos os lados: Para mandar este artigo tive que me conectar à Web. Para isso precisei ter um acesso internacional ou teria que procurar um Cibercafé. Pequeno obstáculo? Pode ser.

De qualquer forma, temos custos envolvidos: conexões telefônicas, tarifas de provedores (se bem que no meu caso foi uma cortesia da Via-Net-Works, a quem agradeço), taxas de uso - no caso dos cibercafés - além, neste caso, do desconforto de alguns não aceitarem que se copiem arquivos de disquetes, o que quer dizer, mais tempo de uso e conseqüentemente mais custos.

Que custo é uma das ameaças no Brasil, não temos dúvidas. Como se não bastasse pagarmos uma das mais caras tarifas de conexão do mundo, ainda ganhamos de presente, recentemente, um substancial aumento nas nossas contas telefônicas.

Além, é bom não esquecer, das estonteantes alíquotas de impostos incidentes sobre aquelas tarifas, como os 25% de ICMS - olhe a sua conta - incidência que só é superada quando da aquisição de supérfluos como jóias, bebidas e cigarros, por exemplo. Realmente não consigo achar uma explicação apenas razoável para uma alíquota tão alta em um bem de primeira necessidade. E nem para as tarifas. Alguém aí sabe?

Outra ameaça é a lei. Sabemos que o incremento dos negócios via Web merecerá cada vez mais, em todos os países, medidas restritivas da legislação.

No Brasil, em uma pesquisa simples no dia 30 junho, encontrei catorze projetos de lei em tramitação no Congresso. Todos bem-intencionados. Alguns deles buscam regular e proteger direitos, outros me desculpem a franqueza, parecem querer manter "cartórios" e "privilégios" - como o que trata de assinaturas eletrônicas. Claro que são ainda projetos e espero que muita discussão se faça com toda a sociedade antes da implantação legal de tais idéias.

Mas a maior de todas as "cyberespadas" que pairam sobre nossas cabeças é a ameaça à nossa privacidade. Um simples acesso a uma página qualquer na Web, e já podemos estar sendo monitorados via cookies, que se auto-instalam. Sites gratuitos são os mais vorazes controladores de nossos hábitos. Nossos dados circulam livremente pela rede vendidos ou utilizados em prol do lucro fácil e descompromissado.

Não só os dados daqueles usuários mais corajosos ou desavisados que os passam diretamente em suas compras, por exemplo, mas também os nossos, não importam os cuidados que tomemos, já que empresas que detêm informações sobre nós, como cadastros bancários ou comerciais, as comercializam, sem muitos escrúpulos.

Não estou pregando o fim da Web e nem querendo criar uma paranóia coletiva. Estou simplesmente nestes superficiais comentários - pois não tive a pretensão de esgotar o assunto - chamando a atenção para uma série de problemas que a Internet traz, junto com os inúmeros e inegáveis benefícios que ela nos dá.

A solução para estes problemas eu não tenho, mas tenho o caminho para nos proteger deles: conhecê-los, entendê-los e discutí-los até concluirmos o que queremos. Talvez o mais importante seja descobrirmos o que não queremos que a Internet mude em nossos usos e costumes, em nosso modo de vida.

É a isso que me proponho aqui neste espaço - criar uma caixa de ressonância dos problemas que nós usuários enfrentamos todos os dias. Convido a todos para arregaçar as mangas e juntos enfrentarmos esta enorme tarefa de proteger o nosso futuro.

Até a próxima.

 

 

Retirado de: http://www.cg.org.br