Ana Amelia Menna Barreto de Castro Ferreira
(*)
O
largo crescimento do uso dos meios eletrônicos acelerou o processo de
desenvolvimento da Internet, que agora vivencia sua fase adolescente da segunda
geração, apesar de ainda não compreendido integralmente o mundo eletrônico.
A inicial zona de dados desorganizada
adquiriu nova arquitetura dotada de tecnologia inteligente de coleta e
processamento de dados em sistemas interconectados, com programas que
compartilham informações e inserem espécies de anzóis para pescar dados dos
usuários.
A
recém criada sociedade que se aconchega no berço da rede pública mundial de
computadores, tem como principal alimento a informação. O mercado em franca
expansão negocia informações pessoais identificáveis, consideradas blue
chips eletrônicas.
Podemos imaginar a Internet como um
enorme mercado persa, aberto e ao ar livre, onde a mercadoria oferecida é você:
seus hábitos de consumo, navegação e preferências.
A nova geração interconectada interage
na vida eletrônica fornecendo seus dados pessoais nas mais variadas formas.
Disponibiliza o nome, endereço eletrônico, número de telefone e cartão de
crédito em cada visita a uma página eletrônica. Torna, assim, pública a vida
particular.
Em
nosso ordenamento jurídico o direito à intimidade e à vida privada está
protegido constitucionalmente, mas, certamente, privacidade e segurança não
encontram ambiente seguro na tecnologia. Porém, o ponto central reside na forma
como são obtidos, utilizados, gerenciados e controlados os dados pessoais nessa
coleta seletiva de informação.
As
empresas da nova economia descobriram um nicho de mercado que segue atachado
a sua atividade fim, comprando e vendendo DNA eletrônico dos usuários. Essa
criativa fonte de receita concebida como serviço de valor agregado ao produto,
na verdade comercializa o conhecimento dos hábitos pessoais de seus assinantes
e pode ser interpretada como sinônimo de invasão de privacidade.
O endereço eletrônico espontaneamente
fornecido a uma determinada página, termina por ser negociado a empresas cuja
única atividade reside em comercializar listagens. A versão digital da clássica
mala direta, conhecida como spam, além de molestar causa ainda enormes
prejuízos, tendo em vista que o custo da conexão é suportado pelo consumidor
final.
O promissor mercado que vem se consolidando através do meio
eletrônico, antes mesmo do amadurecimento do comércio desenvolvido através de
dispositivos fixos, se depara com os novos horizontes proporcionados pelo
comércio móvel, sem se comentar o futuro início de operação da TV digital no
País.
Essa
nova modalidade de mercancia encontra outras aplicações e utilidades, passando
a contar com poderosas ferramentas de identificação do perfil eletrônico do
usuário, onde o direito de ser deixado em paz, pode parecer estar
definitivamente sepultado.
O serviço
de telecomunicação móvel dispõe de funções mais criativas que operam no
conceito de ofertar qualquer coisa, a qualquer pessoa, a qualquer hora, em
qualquer lugar e durante a locomoção.
As
próximas redes que entrarão em funcionamento, utilizam tecnologia de alta
precisão que permite a localização dos assinantes. Por um lado, passarão os usuários a receber o disparo certeiro de
anunciantes de telemarketing. O conhecimento da posição geográfica pode ensejar
a ligação publicitária de comerciantes localizados na área onde se encontra o
assinante. Está, portanto, lançada a modalidade spam sem fio, onde ao
invés de receber uma mensagem silenciosa, será o aparelho celular que emitirá
sinal sonoro ao recebimento de cada indesejada chamada. Por outro lado, se bem empregada, a
tecnologia poderá possibilitar o socorro em situações de emergência, bem como
precisar a localização em caso de desaparecimento.
Algumas
iniciativas regulatórias prevêem a necessidade do prévio e expresso
consentimento do usuário para que sua localização possa ser divulgada, restando
ainda ser desenvolvida a implantação de mecanismos capazes de garantir a
privacidade do assinante que não deseja receber mensagens comerciais.
Sabe-se
que os usuários da terceira geração de telefonia móvel em funcionamento no
Japão, estão insatisfeitos com a grande quantidade de mensagens não solicitadas
recebidas em seus aparelhos. A alternativa inicialmente apontada não foi
considerada suficiente pelo Governo, pelo que a operadora se viu forçada a
desenvolver solução tecnológica que possibilite a filtragem de endereços, além
de oferecer redução do custo da tarifa como uma tentativa de minimizar o
descontentamento de seus assinantes.
Sob
outro prisma, os Estados Unidos, costumeiramente ferrenhos defensores da
liberdade, estão vivenciando um processo de revisão de seus conceitos
primordiais, após o atentado terrorista a que foram vítimas. O programa do FBI de monitoramento de
correio eletrônico, que encontrou forte resistência de grupos defensores da
proteção de dados pessoais na web, volta a ser analisado sob um novo conceito
de confidencialidade das comunicações. Instaurado o temor coletivo, foi
aprovado pela Câmara dos Deputados, projeto de lei que garante ao governo
americano a possibilidade de monitorar comunicações de dados e de voz.
Ressalte-se
que a questão crucial reside na forma de utilização da tecnologia. Em ambiente
de consumidores cada vez mais esclarecidos, as empresas envolvidas no mercado
digital devem estar atentas à questão da privacidade pessoal. A correta
avaliação da eficácia da propaganda, bem como a divulgação das práticas de
manipulação de dados, podem se transformar em um diferencial e se traduzir em
vantagem competitiva.
Deve-se enfrentar a necessidade de
revisão da idéia de proteção em um ambiente em que a auto-regulamentação pode
surtir melhores e mais eficazes efeitos, se traduzindo, na prática, em adesão
compulsória aos princípios da ética e transparência.
Assim, a solução seria
encontrada no próprio mercado, uma vez que previsível a migração dos usuários a
outras empresas que pautam sua atuação baseada nos conceitos de
responsabilidade, confiança e respeito ao consumidor.
De
qualquer forma, é imprescindível a adequação do ordenamento jurídico à
plataforma eletrônica, direcionando sua atenção ao respeito à privacidade
individual, sem promover uma avalanche regulatória que possa impedir o
desenvolvimento tecnológico.
(*) Advogada do
Escritório José de Castro Ferreira, Décio Freire & Associados no Rio de
Janeiro
Presidente da
Comissão Permanente de Comunicação e Informática do IAB
RETIRADO DE:
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