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PREPARE-SE PARA O BUG DO MILÊNIO


Autor: Renato M.S. Opice Blum
jroblum@aasp.org.br
Advogado e economista.
Sócio de OPICE BLUM Advogados Associados.
Pós Graduando em Processo Civil pela PUC-SP.

Trezentos milhões de computadores pessoais ("Pcs"), cem mil computadores de grande porte ("mainframes"), vinte e cinco bilhões de produtos eletro-eletrônicos equipados com microprocessadores ("embedded systems"). Esses números aproximados representam o mercado mundial da informática.

Y2K, vírus do ano 2000, bug do milênio, são nomes distintos, mas que representam o mesmo problema, com data marcada para acontecer. No dia 1º de janeiro de 2000, em torno de 80% a 90% dos computadores e artefatos eletro-eletrônicos poderão ficar confusos em razão de uma falha (bug) de memória ou programação. Nos primórdios da informática, como o custo da memória era alto, os fabricantes de computadores, programas e microprocessadores decidiram usar o campo para a representação da data com apenas dois dígitos. Assim, muitos computadores e utensílios interpretam 1998 como 98, 1999 como 99 e 2000 como 00. Dessa forma, no dia 01.01.2000, às 00:01 horas, muitos equipamentos poderão ter como data o ano 1900 ou simplesmente "00", desencadeando uma série de operações ilógicas e equivocadas.

O problema vai atingir todas as áreas, negócios e até pessoas que não estejam relacionadas ou não possuam computador e equipamentos eletro-eletrônicos. Será uma reação em cadeia que especialistas americanos comparam com os reflexos de um meteoro atingindo o nosso Planeta. Estão corretos. Vejamos a seguinte suposição: Atualmente muitas aeronaves estão equipadas com sistemas informatizados denominados "fly by wire". Um desses aviões está voando na transição do ano 1999 para 2000 e sofre pane generalizada nos sistemas. Para piorar, o controle de vetoração radar executado em terra também falha, pois seus computadores são antigos "mainframes". A aeronave entra em colapso e também não conta com a devida vetoração da sua posição pelo controle de tráfego aéreo. O avião cai próximo ao aeroporto. Dezenas de vítimas.

Essa hipotética descrição serve como um alerta. Além do conteúdo drástico, enseja responsabilidades civis e criminais. Civis no sentido da atribuição de indenização aos legitimados. Criminais buscando impor a sanção ao responsável, seja por homicídio culposo múltiplo ou lesões corporais culposas.

Há pouco tempo calculava-se U$ 600 bilhões para o custo de adaptação e indenizações judiciais. Agora, segundo novas estimativas o valor já supera 1 trilhão de dólares. José Roberto Faria Lima, especialista na área, afirma que os valores são muito superiores aos gastos na guerra do Vietnã e nos terremotos de Kobe e Los Angeles (U$ 500, 100 e 80 bilhões, respectivamente). Segundo o Gartner Group, há 70% de possibilidade de abalo na economia mundial. Estudos revelam que 30% dos computadores não serão corrigidos em tempo hábil. Em recente relatório a Central de Inteligência Americana (CIA) divulgou parecer alertando que as nações não estão prontas para o Y2K.

As pessoas ainda não pensaram sobre isso. Nos Estados Unidos, os principais escritórios de advocacia formalizaram mais de 200 acordos, com cifras entre U$ 1 a 10 milhões, a grande maioria por divergências entre consumidores e fornecedores. O Procurador Geral do Estado da Carolina do Norte (EUA) estuda processar os fornecedores cobrando U$ 132,8 milhões em despesas de adaptação. Diversos Estados Americanos contam com projetos de lei em tramitação objetivando limitar a responsabilidade inerente ao bug do milênio. Já existem quatro processos discutindo responsabilidades decorrentes do bug e respectivas indenizações. São ações ajuizadas nos estados da Califórnia, New York, Michigan e Ohio, envolvendo questões como fraudes, infrações contratuais, leis do consumidor, declarações falsas e práticas comerciais abusivas. Um dos processos foi movido por uma empresa agrocomercial de Detroit que utilizava em sua rede de computadores um programa gerenciador de vendas. O problema ocorria quando os consumidores utilizavam cartões de crédito com validade igual ou superior ao ano 2000. No momento da compra o sistema travava, ficando inoperante por horas. O prejuízo era enorme visto que a rede agrupava dez terminais, todos inoperantes ao mesmo tempo. Dos 500 dias de utilização do software, apenas 400 foram aproveitados.

Responsabilidade é a palavra mágica que norteia os procedimentos reparatórios ou preventivos, objetivando resguardar ou valer direitos. O cerne da questão encontra-se na responsabilidade do fornecedor de produtos ou serviços inerentes à informática e do respectivo usuário. Todo aquele que sofrer prejuízo em virtude da falha (bug) poderá processar o responsável e cobrar os danos ocorridos. Danos de caráter moral e material.

Alguns já estão se preparando para o esperado. Aqueles que ainda têm tempo para o reparo e adequação devem fazê-lo o quanto antes, sob as expensas do responsável. Se já não há tempo, devem proceder de forma a noticiar o fato, uma espécie de "recall", nos termos das disposições legais em vigor. O seguro também deve ser cogitado como instrumento de apoio.

Para cada real não gasto na adaptação, espera-se o desembolso de dez reais em indenizações judiciais. O gasto de adaptação, na maioria dos casos é responsabilidade do fornecedor do computador, do programa ou do equipamento defeituoso.

O Brasil, sexto maior usuário de computadores no mundo, com mínimas exceções, não parece preocupado com o assunto. O problema do Bug é sério. A responsabilidade jurídica é gravíssima. Todos nós vamos sentir os efeitos. Aqueles que forem lesados podem e devem buscar a reparação. Aqueles que devem reparar podem e devem agir preventivamente, procurando, dessa forma, resguardar suas atividades, sob risco de não conseguirem saldar suas responsabilidades e falirem.




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