Após a publicação do artigo sobre
a reprodução não autorizada na internet, envolvendo conteúdo de terceiros,
alguns profissionais me consultaram sobre problemas variados de seu dia-a-dia,
envolvendo contratos, questões trabalhistas, de responsabilidade civil, de
direitos autorais e até mesmo processuais.
Escolhi uma questão sobre direitos
autorais para este artigo. Fui consultado acerca da legalidade de se
"vender" clipping. Clipping, como bem sabem os senhores, se trata de
uma compilação de notícias que tenham algo em comum, a temática ou o objeto na
maioria das vezes.
Antes de tocarmos o cerne da
questão, devo me ater a uma breve introdução sobre os direitos autorais. Os
direitos do autor no Brasil estão materializados na lei 9.610/98. Tais direitos
surgiram como a necessidade de se proteger a produção intelectual e são
prerrogativas e poderes que o criador tem sobre sua obra e negócios que a cerquem.
Estes direitos são divididos em dois grupos: os morais e os patrimoniais.
Entre os direitos morais do autor,
encontra-se o de o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra; o de
ter seu nome aposto como autor daquela obra; o de conservar a obra inédita; o
de assegurar a idoneidade e originalidade da obra. A lei diz que tais direitos
morais não podem ser vendidos ou transferidos, ninguém pode sequer abrir mão
deles.
Portanto, qualquer negociação que
os tenha como objeto são consideradas nulas. Os direitos morais persistem até
mesmo à morte do autor, ocasião a partir da qual o Estado poderá agir frente a
ilicitudes cometidas por terceiros para preservar a cultura nacional. A uma
violação dos direitos de um autor cuja maior ofensa recaia sobre os direitos
morais, chamamos plágio. Verifica-se o plágio quando alguém "toma para
si" a autoria de uma obra já existente (ou pedaço significativo
desta).
Os direitos patrimoniais do autor
são aqueles que têm como fundo a exploração econômica da obra, aqueles que
garantam ao autor o retorno financeiro desejado sobre sua criação. Uma das
maneiras de se proteger os direitos patrimoniais é impedir a
"vulgarização" da obra, para que ela não se torne pouco atraente aos
"consumidores". A fim de viabilizar a exploração econômica da obra e
assegurar algum retorno financeiro ao autor, a lei de direitos autorais põe sob
expressa autorização do autor sua reprodução parcial ou integral; sua adaptação
e quaisquer outras transformações; sua tradução para qualquer idioma; sua
distribuição/transmissão; dentre outras situações. Se verificada a reprodução
não autorizada de conteúdo produzido por terceiro, mesmo que legitimamente se
credite a autoria, verifica-se a contrafação. Contrafação é, portanto, uma
lesão aos direitos de exclusividade ou legitimidade quanto à exploração
patrimonial da criação.
Agora vamos ao ponto: é ilegal
vender clipping? Na verdade, nem se trata de uma venda. É uma prestação de
serviços, até porque seria ilegal negociar notícias produzidas por terceiros
sem a devida autorização. O serviço consiste em pesquisar e compilar
determinadas notícias. Tal ato, a princípio, não configura nenhuma afronta aos
direitos patrimoniais do autor ou daquele que legitimamente o detenha, quando
em nada afetar a atratividade da obra original. Ninguém deixará de consumir um
jornal por ter outro meio de acesso às notícias que aquele e outros veículos
semelhantes publicarem sobre, por exemplo, sua empresa.
Diz o artigo 46 da lei de direitos
autorais que "não constitui ofensa a publicação na imprensa diária ou
periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou
periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de
onde foram transcritos".
Há outro ponto importante que deve
ser levado em consideração: as notícias nestes veículos (diários ou periódicos)
se renovam. Um jornal, por definição etimológica, não é um meio que conserva um
texto acessível permanentemente como, por exemplo, um site.
São modelos de sustentação
aparentemente iguais, mas que diferem na forma de exploração do conteúdo
produzido. Aliás, a discussão que recai sobre a possibilidade de considerar-se
"imprensa" qualquer site que reúna notícias e acontecimentos cuja
renovação não se dê de forma tão dinâmica é bastante interessante, e pode ser
tema de outra coluna.
Existirá prejuízo se, por exemplo,
alguém resolver replicar todo ou parte significativa do conteúdo do Webinsider
que trate de intranets. A obra original, que é a compilação de todos estes
artigos, ou seja, o site, se tornará menos atraente.
Vale o princípio da razoabilidade,
é importante verificar a abrangência do clipping. Um clipping realizado sobre
internet que compile os cadernos de informática dos principais jornais e
revistas vai refletir nas vendas destas publicações.
Portanto, é indispensável variar
as fontes de pesquisa do clipping, reduzir ao máximo sua abrangência temática,
renová-lo de forma a jamais mantê-lo estático; e SEMPRE citar o autor e a fonte
da notícia.
Assim espero ter ajudado o colega
que fez a consulta e também ter iluminado um pouco o caminho daqueles que
trabalham com desenvolvimento e publicação de conteúdo. [Webinsider]
Dagoberto
Luiz M. De Miranda Chaves é acadêmico de Direito e faz parte do jurídico da
Globo.com.
Retirado de: www.webinsider.com.br