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Maioridade por conta de economia própria

 

Celso Fioravante Rocca

O Novo Código Civil, no inciso V de seu artigo 5o, introduziu a figura da emancipação do menor trabalhador que, por conta de seu trabalho, tenha economia própria.

 

 

Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.

Art. 9º. Aos vinte e um anos completos acaba a menoridade, ficando habilitado o indivíduo para todos os atos da vida civil.

Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:

§ 1º. Cessará, para os menores, a incapacidade: (Antigo parágrafo único renumerado pelo Decreto n.º 20.330, de 27.08.1931)

I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;

I - Por concessão do pai, ou, se for morto, da mãe, e por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezoito anos cumpridos.

II - pelo casamento;

II - Pelo casamento.

III - pelo exercício de emprego público efetivo;

III - Pelo exercício de emprego público efetivo.

IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;

IV - Pela colação de grau científico em curso de ensino superior.

V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.

V - Pelo estabelecimento civil ou comercial, com economia própria.

§ 2º. Para efeito do alistamento e do sorteio militar cessará a incapacidade do menor que houver completado 18 anos de idade. (Parágrafo acrescentado pelo Decreto n.º 20.330, de 27.08.1931) (Atualmente 17 anos, conforme a Lei n.º 4.375, de 17.08.1964) CC, artigos 142, III, 1.650 e 1.298. Lei n.º 4.121/62 e Lei n.º 6.015/73, CF/88, artigo 226, § 3º. Lei n.º 8.069/90, artigo 148, § único. CPC, artigo 1.112. Lei n.º 4.375/64, artigo 73, § 2º.

 

O artigo 5o do Novo Código Civil corresponde ao artigo 9o do Código Civil de 1916 e, no mesmo inciso em ambos, traz sutis alterações na redação.

Uma delas é a inclusão, no referido inciso V, da “existência de relação de emprego” como permissiva da emancipação, por assim dizer-se, do menor.

Outra alteração percebida, é a inversão da exigência ali estipulada: anteriormente exigia-se, tudo indicava, que o estabelecimento civil ou comercial fosse aberto com economia própria; hoje, de forma clara, estipulou-se que a economia própria seja decorrente ou do estabelecimento civil ou comercial, ou da relação de emprego.

Desta forma, mister se faz que a economia própria, agora, seja decorrente do trabalho do menor. A Realidade é que permitirá ao menor pleitear sua emancipação.

Ora, isto implica em que o menor trabalhador consiga manter-se com o rendimento de seu trabalho, independente de seus pais.

Provavelmente tal situação ocorre nos casos em que o menor deixa o lar paterno e procura resolver sua vida independente dele. Ou, morando na casa dos pais, deles não exige ajuda financeira de qualquer espécie.

Obviamente, que nos casos em que a ligação com os pais se mantém íntegra, mesmo havendo a indicada independência financeira, pouco provavelmente será necessária a declaração da emancipação.

Tal emancipação será necessária quando o menor, necessitando realizar atos da vida civil, não puder contar com a presença dos pais, ou de tutor, por qualquer eventualidade ou razão. Ou, ainda, por que se entende capaz e não quer mais a dependência filial.

No primeiro caso, caberá a ele, provando esta situação, buscar a sua emancipação junto ao judiciário. No segundo caso, terá que ultrapassar a barreira representada por seus pais, que deverão anuir com seu intento.

Obviamente que a emancipação poderá ser de iniciativa dos pais, conjuntamente, ou, na falta de um, pelo outro (ou, ainda, pelo tutor), por instrumento público, independentemente de providência judicial.

Depende de sentença, proferida em procedimento de jurisdição voluntária, a emancipação de menor por requerimento dele próprio, contra seus pais ou seu tutor, que poderão, querendo, impugnar o pleito ou com ele concordar. A sentença ali proferida dará (ou não) a buscada emancipação.

A sentença, neste caso, deve ser levada a registro no Cartório competente (artigo 29 da lei 6.015/73).

Quanto ao menor trabalhador, atualmente, a partir dos 16 anos é permitida sua entrada no mercado de trabalho. Menores de 16 anos estão impedidos por lei de manter relação de emprego (mas trabalham da mesma forma, claro).

Quanto ao trabalho do menor, em outros tempos, com outros limites etários, ensinaram-nos os mestres Orlando Gomes e Élson Guttschalk que:

(...) a maioridade trabalhista é alcançada aos 18 anos, entre os 12 e os 18 anos é o menor relativamente incapaz, sendo absolutamente incapaz se conta com menos de 12 anos. Relativamente incapaz, não pode o menor em seu próprio nome, celebrar contrato de trabalho. Ao lado da incapacidade, existe também uma incompatibilidade para exercer certas atividades reputadas insalubres, perigosas ou imorais. (...) Não pode celebrar, entretanto, em seu próprio nome, o contrato de trabalho. Não é, neste ato, representado pelos pais ou tutor, mas apenas assistido por eles. Esta assistência se concretiza com a autorização. Não há forma especial para esta autorização. Pode ser expressa ou tácita, verbal ou escrita. Entre nós, exprime-se, normalmente, por ocasião da emissão da carteira profissional do menor. (in curso de direito do trabalho, ed. Forense, 1972, pág. 394).

A autorização para trabalhar é presumida juris et de jure para os menores de 21 anos e maiores de 18 anos (artigo 446 da CLT). Com essa idade o menor realiza, plenamente, a coincidência das capacidades de direito material e de direito processual ou instrumental. Pode manifestar uma vontade própria na estipulação do contrato individual de trabalho, sem se tornar necessário o reforço da assistência, que é um direito de vigilância dos conselhos da experiência. O indivíduo com mais de 18 anos possui a plena capacidade física e intelectual para estipular o contrato de trabalho. Os que contam com mais de 18 anos e menos de 21 anos podem pleitear perante a Justiça do Trabalho sem assistência de representantes legais (art. 792 CLT). Têm, assim, o direito de residir em juízo, promovendo em seu próprio nome a ação trabalhista. A capacidade processual do menor de 21 anos e maior de 18 anos representa uma forma de tutela perfeita, porque atribui o direito de fazer valer os seus legítimos interesses na justiça, a quem já possui uma capacidade plena para estipular o contrato de trabalho. (idem, ibidem, pág. 395).

Observadas as mudanças nos limites de idade, assim se mantém até nossos dias a legislação, a doutrina e a jurisprudência.

Portanto, o menor trabalhador, nos nossos dias, o será no curto espaço de tempo de dois (2) anos. E nestes dois anos é que poderá pretender sua emancipação, que no caso de haver resistência de seus pais ou tutores, acabará ela, pretensão, derrotada pela passagem do tempo na discussão da lide.

É certo que, embora se trate de procedimento de jurisdição voluntária, a mesma dependerá da participação da parte contrária. Haverá, como ensina Carnelutti, lide instaurada, portanto.

Hoje se entende obrigatória a necessidade do procedimento de jurisdição voluntária, vez que sem ele o menor não conseguirá impor sua vontade (ou necessidade) de contratar, seja no trabalho, seja no comércio.

Entende J. M. Carvalho Santos que abrindo o menor seu estabelecimento comercial, menor deixava de ser, independente de homologação judicial.

A emancipação opera-se com o fato de o menor abrir o seu estabelecimento civil ou comercial, como economia própria, e desde essa hora produzirá todos os seus efeitos jurídicos, independentemente de qualquer homologação. (in código civil interpretado, livraria Freitas Bastos, 1958, pág. 307).

A complexidade da vida e das relações sociais contemporâneas não mais permite que assim seja.

Ninguém em sã consciência firmará contrato com menor nos dias atuais, independentemente da certeza da boa-fé no negócio. Mister se faz, hoje, a instauração do procedimento de jurisdição voluntária para que a maioridade, nestes casos, seja judicialmente declarada por sentença e, ainda, registrada no respectivo cartório. A segurança das relações comerciais, bem como a cautela, assim exige.

Somente a certeza da maioridade é que permitirá a realização de negócios, obviamente os mais complexos e os de valor econômico mais elevados.

Estando a maioridade fixada para os “maiores de dezoito anos”, ultrapassada esta data, não haverá insegurança desta natureza na relação comercial a ser estabelecida entre as partes. Antes desta data, somente a emancipação dará tal espécie de segurança.

Buscada e obtida a emancipação, removem-se os tais obstáculos e a necessária segurança dos atos fica preservada e garantida.

Em conclusão, podemos dizer que a existência de estabelecimento comercial, ou a existência de uma relação de emprego, por si sós, não promovem, automaticamente, o menor de dezoito anos e maior de dezesseis anos à condição de maior, por emancipação, nos termos do inciso V do artigo 5o do Novo Código Civil.

Mister se faz que tal emancipação seja obtida judicialmente, com posterior registro da sentença junto ao assentamento de nascimento do menor.

Celso Fioravante Rocca

Advogado em São Carlos - SP

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